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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - URBANISMO (O)
A urbanização da Zona Noroeste (3-a)

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Metropolização, conurbação, verticalização. Os santistas passaram a segunda metade do século XX se acostumando com essas três palavras, que sintetizam um período de grandes transformações no modo de vida dos habitantes da Ilha de São Vicente e regiões próximas.

Depois de ocupar quase todos os espaços em direção às praias, Santos passou a se expandir no sentido contrário, nos dois lados da Avenida Nossa Senhora de Fátima, em direção à divisa com São Vicente. Uma análise do desenvolvimento dessa região de Santos foi feita pelo jornal A Tribuna, em uma série de reportagens que começou com a apresentação em 3 de março de 2005:


A edição de 4/3/2005 publica a primeira das reportagens tendo como tema a Zona Noroeste
Foto: Nirley Sena, publicada com a matéria

Zona Noroeste será tema de reportagens

Da Reportagem

A partir de amanhã, A Tribuna publica uma série de reportagens sobre a Zona Noroeste (ZN). Além de retratar a história da região, com relato de antigos moradores e curiosidades sobre a formação do núcleo habitacional, as matérias também vão abordar questões relacionadas ao desenvolvimento socioeconômico da área, considerada estratégica para a expansão urbana da parte insular de Santos.

Com cerca de 12 quilômetros de extensão, distribuídos em 12 bairros, a ZN tem uma população com mais de 80 mil habitantes, de acordo com o último Censo do IBGE.

Uma boa parte da sua população é formada por migrantes nordestinos que vieram para esse ponto da Cidade no inicio da década de 50. Na época, ocuparam terrenos sem qualquer infra-estrutura. Muitas casas foram erguidas em manguezais, aterrados no processo de loteamento.

Diante da carência de imóveis para a construção civil, a região é uma das opções para novos projetos habitacionais, que não se restringem às camadas mais pobres da população.

Atualmente, as casas predominam. Porém, prédios com três andares começam a ganhar espaço no mercado imobiliário.

A perspectiva da construção do túnel, ligando a região à Zona Leste, pelo Marapé, é outro ponto favorável à expansão para a ZN, lugar que muitos santistas ainda desconhecem.

As obras públicas para a região também serão destacadas na série de reportagens. Entre as prioridades, está a implantação de projeto de drenagem para eliminação definitiva das enchentes que, desde a fundação do núcleo, atormentam os moradores.

Outro projeto, embora ainda no campo das idéias, é a implantação de um campus de uma universidade pública na ZN. Um empresário até já se dispôs a facilitar a venda de um terreno à Prefeitura, para viabilizar o centro de estudo.

80 mil

pessoas moram na Zona Noroeste,
região da Cidade que concentra 12 bairros

 

Auto-estima - Em uma das reportagens, A Tribuna discutirá a rede de solidariedade que funciona na ZN. O trabalho envolve organizações não-governamentais, igrejas e o Poder Público. Atuando nos lugares mais carentes da região, como o Dique da Vila Gilda, no Rádio Clube, voluntários se esforçam para aumentar a auto-estima dos excluídos.

No próximo dia 10, o grupo voltará a se reunir para discutir estratégias para o fortalecimento das relações de solidariedade, tendo como base a integração familiar.

No dia 4/3/2005, o jornal A Tribuna publicou a primeira matéria desta série:


A OCUPAÇÃO da Zona Noroeste começou ainda na década de 20. 
Desde então, o desenvolvimento é visível
Foto: Nirley Sena, publicada com a matéria

DESENVOLVIMENTO
No começo era só um mangue

Primeiros habitantes da Zona Noroeste podem ser chamados de desbravadores, tamanha a quantidade de desafios que enfrentaram

Rivaldo Santos
Da Reportagem

No começo, a Zona Noroeste era um imenso manguezal, cortado por rios que invadiam as casas em dias de chuva ou maré alta. Não havia água, luz ou qualquer sinal de infra-estrutura. Tudo era precário, a começar pelas moradias, pequenos chalés fincados em terrenos aterrados, onde passavam riachos com fartura de peixes.

Os primeiros moradores podem ser chamados de desbravadores, tamanho o número de adversidades que tiveram que enfrentar. A paisagem era bem diferente da atual. Nas extensas faixas de mangue, alagadiços e terras arenosas, os bananais dominavam, espalhando-se em uma exuberante vegetação tropical.

Em uma natureza ainda selvagem, do início do século passado, a fauna local era um recanto de animais silvestres, como veados e gambás. Os mais antigos juram de pés juntos que jacarés e onças apareciam por lá.

Exageros ou não, a história da ZN é recheada de relatos curiosos e de declarações de amor por uma região que não pára de crescer. Apesar das inúmeras dificuldades, que ainda persistem, como o eterno problema de enchentes, é difícil encontrar quem pensa em mudar de bairro.

De bonde - A história da Zona Noroeste começou, de fato, na década de 20, com a implantação da linha de bondes da Companhia City. Na época, os burros puxavam os carros. Mais tarde, os animais foram "aposentados" com a introdução do sistema elétrico.

O povoamento incipiente ocupou uma área conhecida como "atrás dos morros", em referência aos morros que cercam a região. Para chegar ao inóspito lugarejo, o bonde saída do Largo do Rosário (atual Praça Rui Barbosa) até o Matadouro Municipal (atual Centro Educacional e Esportivo do Sesi, na Avenida Nossa Senhora de Fátima).

A linha passava pelo Bairro Chinês (atual Valongo, na Avenida São Leopoldo) e Saboó (Cemitério da Filosofia), sempre contornando os morros. Só mais tarde, os trilhos da chamada "Linha 1" chegaram a São Vicente, pela Avenida Antônio Emerich.

Como os trilhos se limitavam às avenidas principais, o acesso aos atuais bairros Jardim Santa Maria, Jardim Bom Retiro, Jardim Rádio Clube, entre outros, tinha que ser feito a pé. Em dias de fortes chuvas, o barco era o meio de transporte mais apropriado.

Boi na rua - O povoamento da região se intensificou na década de 50, quando muitos nordestinos vieram trabalhar no pólo industrial de Cubatão, que estava se formando com a construção da Cosipa. Sem escolaridade e qualificação profissional, os migrantes tinham no cais santista um promissor mercado de trabalho.

Entre tantas curiosidades sobre a região, o Matadouro Municipal é o que melhor retrata os primeiros conflitos do cenário bucólico com o progresso.

O prédio era o principal estabelecimento do povoado. O gado chegava de trem, em vagões da São Paulo Railway (SPR), que mais tarde foi incorporada à Rede Ferroviária Federal. Por um desvio na atual Rua Bóris Kauffmann, no Saboó, onde havia um entreposto, os bois seguiam para o local de abate, posteriormente arrendado pela Prefeitura na década de 60.

Durante o transporte, feito por ruas e avenidas, alguns animais desgarravam da manada, indo se abrigar em residências. De laços em mãos, como cowboys americanos, os funcionários disparavam a cavalo para laçar os bois fujões. O trânsito também se complicava quando um dos animais se desembestava no trânsito.

Dez anos depois, o matadouro foi desativado, mas o nome até hoje identifica o local. O fim da era "boi na rua" marcou o início da explosão demográfica na região. Foi nessa época que houve a desativação dos bondes e a remoção dos trilhos para a duplicação da Avenida Nossa Senhora de Fátima, via que se transformou em principal corredor de ônibus.

Ironicamente, a primeira grande obra na Zona Noroeste "beneficiou" apenas os que já não moravam mais lá. Foi o Cemitério da Areia Branca, inaugurado em 1953, pelo então prefeito Antônio Ezequiel Feliciano.

O alargamento da Avenida Nossa Senhora de Fátima foi um indício do rápido crescimento
Foto: Evaristo Pereira de Carvalho, de A Tribuna, em 20 de janeiro de 1966,
republicada com a matéria

Mais velhos chegaram na infância

Maria Auxiliadora é uma das habitantes mais antigas da Zona Noroeste. Chegou no início dos anos 50. Era uma menina. Veio acompanhada dos pais, que abandonaram Aracaju (SE) em busca de uma vida melhor. Daquele período, tem boas recordações. E também lembranças de momentos difíceis, como a enchente de 1969, evento que arrasou as precárias moradias do povoado.

Acostumada com as mazelas geradas pela pobreza, a família de dona Maria não se desanimou com o que encontrou. "Tínhamos que andar mais de um quilômetro para pegar água em uma torneira em São Vicente".

Por ironia do destino, só havia água em abundância em dias de chuva forte. A enchente do final da década de 60 foi uma das dezenas que presenciou. "Era tanta água que a gente tinha que sair de casa de barco".

Lucinéia Marques de Lima Souza é outra que vive na ZN há mais de quatro décadas. Paraibana de Patos, a moradora considera "maravilhosa" a região. Da infância, restaram boas recordações do lugar. "Aqui era uma festa. A gente brincava no morro e pegava peixes no rio", conta Lucinéia, apontando para o poluído Rio dos Bugres, hoje dominado por palafitas.

Em 1953, período de pós-guerra, um grupo de retirantes deixou a pequena Canhotinho (PE). A família Camboim estava entre os migrantes que foram parar na Areia Branca, bairro que já abrigou uma das maiores favelas da Cidade.

Todos vieram em busca de empregos. "Os únicos disponíveis eram na antiga Companhia Docas e na Refinaria da Petrobrás", relata Sonival Camboim, hoje dono de uma mercearia no Dique da Vila Gilda.

Acostumado com as enchentes, Camboim já deixou de acreditar na solução do problema. "O povo vive em um lugar que naturalmente é da água. E ela, mais cedo ou mais tarde, vai ocupar o seu lugar".

Quando o aposentado Sílvio Roupa decidiu sair do confortável Bairro Campo Grande para morar na Zona Noroeste, os amigos o chamaram de louco. Porém, a vontade de deixar a "rotina neurótica" do apartamento prevaleceu. A mulher só deixou de reclamar quando conheceu a casa, no Jardim Bom Retiro.

Hoje, 30 anos depois, Sílvio é um fervoroso defensor da região. "Tenho um apartamento em frente à praia, mas não troco a minha casa por nada", diz o aposentado, que atua como voluntário em uma ONG que presta assistência a crianças e jovens da ZN.


Ladrilhagem e arborização do canteiro central mudaram a paisagem da principal avenida
Foto: arquivo, 30 de agosto de 1966, publicada com a matéria

Origem dos nomes

Alemoa - O nome é uma referência à presença do alemão Adam Kunem, dono de um sítio na área. Depois de sua morte, a viúva continuou vivendo no local. moradores, de forma errada, passaram a chamar o lugar de Sítio da Alemoa. Com 140 anos, o bairro é um dos mais antigos de Santos.

Areia Branca - A denominação se deve à cor da areia que havia em abundância naquela área. Inaugurado em 1953, o cemitério é um dos principais pontos de referência do bairro.

Caneleira - Até a metade do século XX, havia uma grande quantidade de árvores que produziam canela, dando assim origem ao nome do bairro, oficializado em 1955, com os primeiros loteamentos.

Chico de Paula - É uma homenagem a Francisco de Paula Ribeiro, vereador em Santos no século 19. Chico de Paula era engenheiro e foi um dos projetistas do cais corrido da Codesp.

Jardim Bom Retiro - Recebeu a denominação por causa de uma imobiliária do mesmo nome, de propriedade de Ézio Testini, responsável pelo loteamento da maior parte do bairro. O Bom Retiro tem no Jardim Botânico a sua maior atração.

Jardim Santa Maria - O bairro foi batizado pelos primeiros moradores, no início da década de 40, quando a região era um imenso manguezal. Mais tarde, ao ser loteado, o nome foi mantido.

Saboó - De origem indígena, o nome significa "pouca vegetação", uma referência ao morro de vegetação rala existente no local. Saboó também é o nome do riacho que havia na área.

Jardim Castelo - A inspiração para a denominação do bairro veio do conjunto habitacional, construído na década de 60. O núcleo de moradias, que leva o nome do ex-presidente Humberto de Alencar Castelo Branco, foi erguido na década de 60, em uma área que faz divisa com o Rádio Clube. (N.E.: não confundir esse conjunto de casas construído em 1966 pela Cohab Santista com o conjunto de apartamentos com o mesmo nome que começou a ser construído em 1967 no bairro Aparecida, na zona Leste, ou com o conjunto General Dale Coutinho, inaugurado em agosto 1980 no Jardim Castelo).

Jardim São Manoel - Foi uma homenagem dos irmãos Varella (empreendedores portugueses do ramo imobiliário) ao pai, o senhor Manoel de Souza Varella. Os primeiros lotes do bairro foram vendidos na década de 50.

Jardim Piratininga - Não há uma versão definitiva sobre a origem do nome. A explicação mais comum é de que o nome se deve à proximidade da região com a Serra do Mar ou, mais precisamente, com a Capital, originalmente chamada de Vila de São Paulo de Piratininga.

Jardim Rádio Clube - O nome é uma referência à antena de transmissão da Rádio Clube de Santos, primeira emissora da Cidade. O bairro foi ocupado a partir da década de 50.

Vila São Jorge - Reproduz o nome do Engenho de São Jorge dos Erasmos, do século XVI, um dos primeiros do País. São Jorge também é o nome do rio que corta o bairro que faz divisa com São Vicente.


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