Embora a lei tenha sido modificada para permitir edifícios mais altos,
por enquanto predominam os prédios de três andares...
Foto: Ricardo Nogueira, publicada com a matéria
HABITAÇÃO
Área supervalorizada
Confundida com cidades do interior, a Zona Noroeste começa a ganhar outra
paisagem. Os prédios de apartamentos tomam o lugar das casas
Rivaldo Santos
Da Reportagem
A paisagem típica de interior, com casas modestas e
baixas construções, pode estar com os dias contados na Zona Noroeste. Ainda de forma lenta, mas progressiva, a expansão urbana na região ganha
literalmente terreno, cuja cotação de venda já está supervalorizada.
A procura por áreas livres e desembaraçadas, para projetos habitacionais, acelera no
vácuo da especulação imobiliária. A carência de espaço físico em outras regiões faz com que a Zona Noroeste seja uma opção natural para
investimentos.
Diante da perspectiva de execução da obra do túnel ligando as zonas Noroeste e Leste,
construtores e corretores de imóveis acreditam em uma rápida expansão. Hoje, um terreno de 250 metros quadrados na ZN pode custar de R$ 40 mil a 60
mil, dependendo do bairro.
Custo - Os altos prédios, como os arranha-céus de vários pavimentos, comuns em
outras áreas da Cidade, ainda não chegaram à região. Por enquanto, a preferência recai sobre os edifícios com três andares, que não precisam de
elevadores e, portanto, têm um custo menor.
Só nos últimos dois anos, cinco novos prédios foram concluídos nos bairros Bom Retiro,
Santa Maria e Vila São Jorge. Antes mesmo do término das obras, as unidades estavam praticamente vendidas.
Gabarito maior - O impulso para a construção de prédios com mais de dois
pavimentos na ZN começou em 1998, quando a Câmara aprovou alterações no Plano Diretor. O projeto aumentou de dois para quatro o coeficiente de
aproveitamento dos terrenos da ZN. "Foi uma proposta amplamente debatida com a comunidade e que já apresenta resultados", ressalta o secretário
municipal de Governo, Márcio Lara.
Desde que sejam respeitados o coeficiente e a taxa de ocupação dos imóveis, a
legislação permite a construção de prédios com mais de 15 pavimentos na ZN.
Em um terreno de 250 metros quadrados, por exemplo, um construtor pode aprovar um
prédio de até seis andares e com uma área construída de 150 metros quadrados por pavimento. Se o terreno tiver 500 metros quadrados, a altura está
liberada para dez andares. Porém, a área construída deve ser de 100 metros quadrados por pavimento.
Preferência - O delegado distrital do Conselho Regional dos Corretores de
Imóveis (Creci), José Manoel Vieira, confirma o sucesso de vendas de prédios na Zona Noroeste.
"Em média, um apartamento de dois quartos é vendido por R$ 75 mil. Praticamente o
mesmo preço de uma casa na região", diz Vieira, que atua há 23 anos como corretor na ZN.
As vendas só não são melhores por causa da situação jurídica dos terrenos da Zona
Noroeste. Mais de 80% dos lotes estão em área de marinha.
Como muitas transações são feitas com contrato de gaveta, ou seja, sem a averbação no
Cartório de Registro de Imóveis, não há a obtenção da escritura. Por conseqüência, a venda financiada, mediante saque do Fundo de Garantia por Tempo
de Serviço (FGTS), fica inviabilizada.
Por isso, para fechar negócio, os construtores oferecem várias facilidades. A
principal é o financiamento a longo prazo. Geralmente, aceitam uma entrada de 50% do valor do apartamento, parcelando o restante em prestações fixas
a perder de vista.
Qualidade - Mesmo se destinando a uma camada social com um menor poder
aquisitivo, as novas construções não deixam nada a desejar em matéria de acabamento e conforto.
A maioria das construções é revestida com cerâmica e com garagem coletiva demarcada.
"Sem dúvida, apartamento na ZN é um bom negócio", garante o corretor.
...que não precisam dispor de elevador. Os
apartamentos são vendidos por preços mais acessíveis
Foto: Ricardo Nogueira, publicada com a matéria
Burocracia prejudica as vendas financiadas
Sem escritura, não há venda financiada. E sem venda financiada o apartamento não é
comercializado. Este é o maior dilema dos empresários que investem na construção de apartamentos na Zona Noroeste.
Como a maior parte da região fica em área de marinha, os imóveis carregam ônus
tributário e burocrático. Outra dificuldade está na transferência de domínio na Secretaria de Patrimônio da União (SPU).
Um simples processo de mudança de titularidade da posse do imóvel pode demorar mais de
uma década. Sem a legalização na SPU, o comprador não pode registrar a escritura no Cartório de Registro de Imóveis. Por conseqüência, fica impedido
de obter financiamento bancário para a compra.
Para complicar, o comprador precisa pagar o laudêmio, tributo federal recolhido a
partir da legalização na SPU. A soma corresponde a 5% do valor da transação.
Depois de obter a titularidade, o adquirente ainda arcará com a Taxa de Foro. Por ano,
recolherá de 1% a 3% do valor venal do imóvel. Tudo isso acumulado com o IPTU, Taxa de Coleta de Lixo, Taxa de Sinistro e demais tributos
municipais.
"Desse jeito, o construtor não tem estímulo para investir", reclama o delegado
distrital do Conselho Regional dos Corretores de Imóveis (Creci), José Manoel Vieira. "A SPU está totalmente perdida".
Dificuldade |
"Há quatro meses tento conseguir ligações elétrica
e telefônica para o prédio e não consigo"
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Francisco Luiz Farias de Abreu
Empresário
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Revolta - O empresário Francisco Luiz Farias de Abreu é um dos mais revoltados
com a demora na legalização de imóveis na SPU. Ele construiu um prédio de três andares em um terreno de marinha no Bairro Santa Maria, mas não sabe
quando obterá a escritura dos apartamentos.
"Por causa do laudêmio tudo fica mais complicado. Há quatro meses tento conseguir
ligações elétrica e telefônica para o prédio e não consigo", protesta Abreu, que já pensa em desistir de investir na região. "Tenho ótimos
apartamentos à venda. Só que a falta de escritura desanima. Desse jeito, fica impossível construir na ZN".
O engenheiro Paulo Graça, que já construiu quatro prédios na região, faz a mesma
reclamação. A demora na tramitação dos processos na SPU faz com que apartamentos construídos há 10 anos ainda não tenham a escritura. "A ZN é um
mercado bastante promissor, mas a condição de área de marinha prejudica os investimentos".
Durante a semana, A Tribuna fez contatos telefônicos com a SPU, mas, até o
fechamento desta edição, não obteve retorno das ligações.
Levi dos Santos, que morou no Canal 2, enfatiza a "conquista de mais tranqüilidade e
segurança"
Foto: Ricardo Nogueira, publicada com a matéria
Ex-morador da Zona Leste destaca vantagens
Depois de morar por vários anos em um bom imóvel no Canal 2, o eletricitário Levi dos
Santos Silva decidiu comprar um apartamento na Zona Noroeste. Para o morador, a troca só lhe trouxe vantagens. "Aqui conquistei mais tranqüilidade e
segurança. É um ótimo local para se viver".
A fuga das altas despesas condominiais também está entre os motivos apresentados por
quem decide migrar para a região. Em média, o valor do condomínio fica entre R$ 80,00 e R$ 100,00 nos apartamentos com dois dormitórios.
Mas, por que não investir na compra de uma casa, considerando que esse tipo de moradia
tem quase o mesmo preço na ZN?
"Já morei em casa. Só que o apartamento é muito mais seguro. Além disso, tenho uma
ótima convivência com os meus vizinhos", responde Silva, que não pensa em mudar de bairro novamente. "Gosto daqui e não troco a Zona Noroeste".
Privacidade - A chegada dos prédios mudou a vida de quem sempre morou na ZN.
Antes acostumados com a maior liberdade no quintal de casa, os antigos habitantes precisam se adaptar à nova realidade.
Dormir com a janela aberta requer agora alguns cuidados para não ser flagrado
pelo vizinho do apartamento, em uma cena indiscreta.
Encobertas por um paredão de concreto, as casas baixas tiveram a iluminação solar e a
ventilação afetadas. Apesar das restrições e de algumas reclamações, a convivência é pacífica.
"Não tenho nada contra os moradores de apartamento. Todos são meus amigos. Só que
agora tenho que ter mais cuidado quando estou na sala com a janela aberta", conta, sorrindo, Alcides Fonseca, que mora em frente a um prédio de três
andares. |