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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SANTOS EM... - BIBLIOTECA NM
1915 - por Carlos Victorino (10)

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Carlos Victorino apareceu na imprensa santista como tipógrafo no jornal Gazeta de Santos (de 1883) e reapareceu como revisor no Jornal da Noite, criado em 1920. Também escreveu para teatro e nos gêneros romance e comédia.

Suas lembranças de Santos, vivenciadas entre 1905 e 1915, foram reunidas na obra Santos (Reminiscências) 1905-1915, cujo Livro II (com 125 páginas) foi em 1915 impresso pela tipografia do jornal santista A Tarde (criado em 1º/8/1900). O Livro I, correspondente ao período 1876-1898, já estava com a edição esgotada quando surgiu a segunda parte.

Nesta transcrição integral do Livro II - baseada na 1ª edição existente na biblioteca da Sociedade Humanitária dos Empregados no Comércio de Santos (SHEC) -, foi atualizada a ortografia:

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Santos (reminiscências) 1905-1915

Carlos Vitorino

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X

Passemos a uma das muitas fases do Diário de Santos, e esta é a atual sob a direção muito competente do dr. Tito Livio Brazil, que o adquiriu das mãos do sr. José Maria, quando ainda na Praça da República. Esta aquisição foi um salva-vidas do Diário, o velho órgão da nossa imprensa.

O dr. Tito Brasil não queria o naufrágio desse escrínio de tradições do Estado de S. Paulo, porque orgulhando-se de ser paulista, magoar-lhe-ia muito o desaparecimento do Diário. Deu-lhe, portanto, a tábua de salvação, tendo até agora mantido o Diário numa feição puramente democrata, tanto quanto é o dr. Tito.

Muitas úteis lembranças de proveito geral deve-se ao Diário de Santos em sua atual direção, tais como o albergue noturno. A idéia foi do Diário. Receberam-na bem, mas até agora ainda não a aproveitaram, dando ensejo aos quadros noturnos que os olhos da população estão cansados de admirar constantemente, e sejam eles o crescido número de desprotegidos da sorte dormindo nos bancos dos jardins, abrigando-se embaixo do alpendre da estação da Estrada de Ferro Inglesa, ou miseravelmente agasalhados sob as bordas dos telhados dos armazéns da Companhia Docas de Santos, fugindo assim aos temporais...

Há em Santos um pavilhão para tuberculosos, anexo à Santa Casa de Misericórdia. Considero um feito que não terá a glória de ver sanado o mal da tuberculose, porque os infelizes dele atacados surgirão aos centos enquanto a nossa sociedade, com a ajuda dos poderes públicos, não providenciar no sentido de retirar do relento essa multidão de infelizes que por aí andam a mendigar pão e abrigo.

Temos, é verdade, graças aos dotes filantrópicos do dr. Antenor de Moura, um asilo para inválidos, mas, unicamente para inválidos. Não foi criado para receber aquele que pode trabalhar, ou dar agasalho a um viajante que por qualquer motivo perdeu o rumo de sua hospedagem.

Muitos há que não são inválidos, querem trabalhar, mas, nesta época, não encontram facilmente trabalho. É natural, pois, que, desprovidos de dinheiro para solver as despesas de cama e mesa, procurem os bancos dos jardins, mormente quando não têm família constituída.

Criem o albergue noturno e no Pavilhão para Tuberculosos diminuirá a entrada de pessoas afetadas dos órgãos respiratórios devido aos maus tratos. Enquanto assim não fizerem, o Pavilhão regurgitará...


Dr. Tito Livio Brasil, atual diretor-proprietário do Diário de Santos

Foto e legenda publicadas com o texto

Voltando ao Diário de Santos, encontramo-lo na Rua Santo Antonio n. 7 (antigo). Acompanhei-o na mudança e foi naquela rua que eu vi passar dois homens ilustres, jubilosamente recebidos: o dr. Bernardino Machado, embaixador de Portugal no Brasil, e o dr. Campos Salles, ex-presidente da República Brasileira.

Mas, a fatalidade quis também que eu fosse o primeiro a saber da notícia do falecimento do dr. Campos Salles. Eram duas e poucos minutos da madrugada. Em minha companhia achavam-se na redação os companheiros de trabalho - o Lúlú (Luiz Xavier) e Francisco Sá. Palestrávamos sobre... sobre... não me recordo agora... Sei que a palestra era agradável e provocava gargalhadas. Com certeza ouvíamos alguma pilhéria contada pelo Sá.

O bem-estar em que encontrávamo-nos foi bruscamente interrompido pelo alarme da campainha do telefone que servia para o serviço direto entre o Diário de Santos e o Correio Paulistano. Rápido, atendi, resmungando:

- Agora é que o Correio lembra-se de transmitir notícias?

E antes de ouvir bem o que o fone me transmitia, gritei impaciente.

- Aláo! Não recebemos mais nada. O serviço está fechado.

- ...

- Hein!

- ...

- O quê?! É exato, isso?!

- Que é, Victorino, pergunta-me o Xavier.

A Bragantina comunica o falecimento de Campos Salles!

- Peça ligação para o Guarujá.

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- Guarujá?

- ...

- É exato o falecimento de Campos Salles?

- ...

- É exato, infelizmente. Faleceu agora.

Cavou-se logo o cliché que estava no Jornal de Santos. Fizemos às pressas um necrológio e mandamos retirar da página alguma coisa, ainda que importante, para dar lugar à notícia do que era de mais alta importância - o falecimento do venerando estadista.

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Passa agora, pela Rua Santo Antonio, o esquife conduzindo Campos Salles.

Um mês antes, passou ele por ali, risonho, cumprimentando e cumprimentado... (29 junho de 1913).

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O saudoso poeta e jornalista santense, Valentim de Moraes

Foto e legenda publicadas com o texto

O Diário recebe a infausta notícia do falecimento de Valentim de Moraes, seu ex-redator-secretário. Deixava, pois, de existir mais um vate santense, abrindo enorme vácuo nas letras pátrias e nos corações de seus inúmeros amigos.

Lá foi... unir-se aos queridos Angelo Souza, Arthur Peixoto, Arthur Bastos e outros nossos conterrâneos fadados para as letras e arrebatados de nosso seio quando ainda no início da vida intelectual.

Valentim de Moraes era noivo, o seu casamento deveria realizar-se breve. Uma pertinaz enfermidade arrebatou-lhe estupidamente dos braços daquela que deveria ser sua esposa...

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Outro choque sofreu Santos. Corriam insistentes notícias do falecimento de Wladimir Alfaya, o jovem artista pintor, e amigo sincero, o ídolo de seus progenitores. Wladimir, ao lado de Benedicto Calixto, o artista pintor das estupendas marinhas, concorreu com belos trabalhos em uma exposição levada a efeito no saguão do Polytheama Rio Branco. Nessa exposição, que era unicamente de trabalhos de artistas santenses, Octavio Silveira, como amador, apresentou algumas telas originais.

Mimi era dotado de espírito empreendedor, ativo. Não se encostava unicamente ao melindroso e delicado trabalho de reunir tintas e com elas colorir paisagens: cultivava também as letras e emprestava a sua atividade ao comércio, tanto que, alguns meses antes de sua morte, fundou a Casa Reibrandt, à Rua 15 de Novembro. Deixou-nos ainda moço, quando todas as esperanças lhe sorriam.

Antes de Mimi retirar-se para a Europa, a fim de estudar a bela arte da pintura, estive com ele em São Paulo, na oficina Risso, onde se confeccionava o periódico humorístico O Linguarudo, de propriedade do falecido Paulo Cunha.

Mimi prestava o seu valioso concurso ao O Linguarudo, unicamente como caricaturista, tendo, na ocasião em que estivemos juntos, executado um trabalho a crayon para ser reproduzido em cliché e estampado no O Linguarudo. Era esse trabalho o busto da vencedora no concurso de beleza que aquele jornal estabeleceu.


O artista pintor santense Wladmir Alfaya

Imagem e legenda publicadas com o texto