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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA
Ângelo de Souza


Um resumo biográfico foi publicado na seção Literatura do Almanaque de Santos para 1959 (Santos/SP, 1ª edição, 1959 - exemplar no acervo da Sociedade Humanitária dos Empregados no Comércio - SHEC), página 74, além de soneto (página 76):
 


Imagem: reprodução do poema publicado no Almanaque de Santos para 1959

BIOGRAFIAS - Ângelo de Souza

Nasceu em Santos e quase toda a sua vida foi consagrada à literatura e ao jornalismo. Era um fino e elegante prosador, caracterizando-se pela suavidade de seu estilo e profundidade de seus conceitos. Figurou com brilho na imprensa santista e paulistana.

Descendo ao Túmulo

Eis-me chegado ao pé da sepultura,

Desapareço para o mundo agora,

Entre as névoas mortais da noite escura

Só tu cintilas, imortal aurora!

 

Minha existência, cheia de amargura,

Foi um poema imortal, senhora

- viçosa flor que ao galho se pendura

E que ao rigor do tempo se descora.

 

Que importa a morte da infeliz matéria,

misto de dor, de fome e de miséria,

e que a tumba, afinal, resume e encerra?

 

Cesse a vida o lúgubre escarcéu...

Eu subirei cantando para o céu,

Tu ficarás chorando sobre a terra!

Esse poema, com ligeiras variações, foi publicado pelo antigo jornal Commercio de Santos, na edição especial pelo centenário da Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1922:

Imagem: reprodução de trecho da matéria original de 7/9/1922

Na edição de 3 de maio de 1892, o jornal paulistano O Estado de São Paulo publicou em sua primeira página estes versos (Acervo Digital Estadão - ortografia atualizada nesta transcrição):

Dádiva excêntrica

A Filinto de Almeida

Nada neste mundo me agita o seio senão o teu amor

Lenda de S. Pedro o Confessor - IX

 

Vivia no Aqueronte, o inferno dos poetas,

Na grande solidão dos meus grandes pesares,

Não me vinham banhar de teus olhos os luares,

Nunca tiveram fim minhas mágoas secretas.

 

Tu moravas no céu, aonde, broslado a rosas,

Mais macio que a flor da trapoeiraba, o louro

Sol vomitava ao azul grandes golfadas de ouro

E cantava canções gentis e luminosas.

 

Eu quis ver e quis dar-te original presente:

Pus meu coração numa esfera de neve

E parti. Mas, que longa e terrível a breve

Viagem que eu fiz com toda a fé de um grande crente

 

Quando, enfim, terminei a penosa jornada

Vi teu vulto assentado em belo slio rubro,

Tinhas todo o frescor dos pomares de outubro

E havia em teu olhar a luz de uma alvorada.

 

De tua boca eu beijei a rubida caçoula

Cascateando volúpia; os dentes pequeninos

Mostravas, descolando os lábios coralinos:

Eram pedras de gelo em cálix de papoula.

 

Aproximei-me e a esfera eu levava orgulhoso,

E ao abri-la notei que dentro nada estava,

Começaste a sorrir e a tua mão apontava

Para o tímido seio, a palpitar, medroso...

 

Célere tu rasgaste o corpete apertado,

E vi saltarem dele outras duas esferas

Aonde havia o calor das nossas primaveras

Que dão vida e dão luz ao trigal alambreado.

 

Apontaste de novo os pomos. O desejo

De os beijar e morder invadiu a minha alma

Tinhas tu no semblante indefinida calma

E errava em minha boca a saudade de um beijo.

 

Procuras por acaso a tua dádiva? Como?

Eu guardei-a comigo, ah! que joia adorada!

cheia de religião, em esta urna sagrada...

E mostraste-me o seio. A flor do cinamomo

 

Nunca teve um olor tão penetrante e suave

Como o teu seio, loura, aonde guardaste, amante,

O coração feliz que em teu colo radiante

Foi amar e viver mais alegre que uma ave.

 

O sol cantava no alto, o sol fulgido ria,

Todo o céu era azul, como azul é a turquesa.

Foi-se as asas batendo a lúgubre tristeza

Para trás, para trás, atra melancolia!

 

Desde então eu não vivo em o inferno dos poetas,

Na grande solidão dos meus grandes pesares,

Pois já me vêm banhar de teus olhos os luares

E se foram de todo essas mágoas secretas.

 

Angelo de Souza.

(Das Campânulas)

 

Imagem: reprodução parcial da pág. 1 de A Província de São Paulo de 3/5/1892 (Acervo Estadão)

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