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Galeria dos poetas, prosadores e jornalistas de Santos
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Arthur Bastos - Arthur
Bastos nasceu em Santos, a 26 de julho de 1858. Viveu no comércio, mas nascera antes para a literatura e para o jornalismo. Pobre, lutando pela
vida, empregou-se muito cedo nos armazéns da Estrada de Ferro e, fora do serviço, todo o resto do seu tempo dedicou-o aos estudos, lendo e
escrevendo muito.
Tendo recebido pouca instrução nas escolas primárias desta cidade, de onde nunca saiu,
Arthur Bastos, talento de eleição, cultivou de tal forma, no recesso do gabinete, o seu espírito privilegiado, que se tornou uma pena de primeira
ordem, quer na poesia, para a qual tinha verdadeiro estro, quer na prosa, onde abordou diversos gêneros com facilidade e correção.
Colaborou por muito tempo no Diário de Santos e fundou vários periódicos
literários e humorísticos, que foram de franco sucesso, em sua época. Vive até hoje esparso o seu escrínio literário.
Foi um dos fundadores do Indicador santista, em 1884 - o primeiro livro no
gênero, aparecido na cidade, e que hoje, dentro do progresso espantoso do século, não encontra símile em nosso pais.
Dando o seu retrato, o Indicador Santista, de 1886, assim se referiu ao seu
fundador:
"Temperamento verdadeiro de artista, Arthur Bastos lutou
durante os poucos anos de sua vida curtíssima, com todos os obstáculos, arcou com todos os sacrifícios, mas, através de tudo, conservou sempre na
alma o culto pelo ideal que o deslumbrava, e queimou sempre incenso no turíbulo que agitava diante dos altares da Arte.
"Como poeta, aí deixou esparsas pelos jornais, pérolas soberbas: há naquelas estrofes,
incorretas às vezes, ressentindo-se da falta de trabalho acurado que lhe não concedia a laboriosa vida, rasgos admiráveis de sentimentos e de
espontaneidade. A poesia jorrava da alma de Arthur Bastos, espontânea, viva, transparente com um lirismo verdadeiro e suave. Seus versos não eram
simples variações sobre temas envelhecidos; eram a poesia sempre nova da mocidade, cantos de amor em que a ternura murmurinhava, num tom plangente
de adoração concentrada, de sofrimento sincero. Às vezes um raio de sol rompia as tristezas íntimas, e um verso alegre gargalhava; mas
empanava-se-lhe a alegria e expirava o riso no dolorido epílogo de uma lágrima. Era a vida, aquilo; era aquela alma de poeta que se retratava nos
versos como num cristal puríssimo.
"Entretanto, curioso contraste! Se nos versos de Arthur Bastos predominava a sombra de
suas tristezas íntimas, na prosa o seu espírito delicado adejava levemente sobre o papel em períodos burilados cuidadosamente, em frases cheias de
verve, com um modo seu de dizer as coisas, original, gracioso, pitoresco. Não falava de si, em prosa cantava espontaneamente o que sentia;
mas, descrevia conscienciosamente o que via, tinha minúcias de analista, quando largava mão da lira para empunhar a pena severa de crítico e
jornalista.
"Infelizmente, o jornalismo absorveu aquela existência e aquele talento; nenhum
trabalho de fôlego resta de tantos que ideara a fantasia de artista de Arthur Bastos".
A seu respeito escreveu Vicente de Carvalho, também no mesmo Indicador:
"Sucedo hoje a Arthur Bastos, nestas páginas que sua
ausência descora: é justo, pois, que seja uma lágrima o primeiro comentário desta crônica. Arthur Bastos! Este nome simples e modesto simboliza um
conjunto extraordinário do que há de nobre, de generoso, de inteligente e de trabalhador. E contudo passou entre nós, desapercebido na multidão,
oculto na capa andrajosa de uma modéstia exagerada, ele que podia envergar a púrpura da realeza do talento. Morreu quando alcançava pleno
desenvolvimento na força da vida, quando tudo se podia esperar de seu espírito brilhante e de sua atividade infatigável. Foi ele o escolhido pela
morte, quando aí pulula pelo mundo a multidão incentivadora dos inúteis...".
Em 28 de dezembro de 1885, alguns amigos de Arthur Bastos inauguraram sobre o seu
túmulo um modesto monumento à grandeza do seu espírito e do seu coração.
No mais - bem poucos ainda guardam hoje a memória no seu nome! Não admira, ele próprio
escrevera num dia de Finados: "Os mortos vão depressa, disse Mousset! Quem se recorda deles, dos pobres que
desapareceram para sempre na viagem negra da morte? Egoístas que nós somos! Os nossos mortos descansam no esquecimento, e nós que nos primeiros
momentos julgamos impossível a separação, deixamos que durmam o seu eterno sono no silêncio do túmulo. Vamos uma vez por ano, no dia marcado pela
folhinha, enfeitar de custosas galas as sepulturas ricas, não por amor daqueles que empreenderam a longa jornada da morte, mas para mostrarmos ainda
aí a nossa vaidade. O túmulo engrinaldado! A retórica da Morte...".
Arthur Bastos faleceu em Santos, a 28 de dezembro de 1884, quando
ainda muito esperava dele sua terra.
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