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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - BIBLIOTECA - TEATROS
Memórias do Teatro de Santos (12)


Clique na imagem para voltar ao índice da obraComo em muitas outras cidades brasileiras, a memória do teatro santista raramente é registrada de modo ordenado que permita acompanhar sua história e evolução, bem como avaliar a importância dos artistas no contexto nacional, rememorando as grandes atuações, as principais montagens etc.

Uma tentativa neste sentido foi feita na década de 1990 pela crítica teatral santista Carmelinda Guimarães, que compilou depoimentos escritos e orais, documentos e outros registros, nas Memórias do Teatro de Santos - livro publicado pela Prefeitura de Santos em 1996, com produção de Marcelo Di Renzo, capa de Mônica Mathias, foto digitalizada por Roberto Konda. A impressão foi da Prodesan Gráfica.

Esta primeira edição digital em Novo Milênio foi autorizada pela autora, Carmelinda Guimarães, em 6 de janeiro de 2011. O exemplar aqui utilizado foi cedido pelo ator santista Osvaldo de Araujo:

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Memórias do Teatro de Santos

Carmelinda Guimarães

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O teatro amador desponta

Retomemos a história por volta de 1940. Com a guerra, as companhias estrangeiras deixaram de viajar e muitos artistas vieram para a América e aqui se radicaram. Foi quando em São Paulo fundou-se o TBC (Teatro Brasileiro de Comédia), marco de início de uma fase de profundas mudanças no teatro brasileiro, inclusive em Santos. Nesta época a cidade tinha no teatro do Centro Português o centro de sua atividade cultural. O diretor era Alberto Vieira, que fazia o teatro de ponto, montando em geral comédias de costumes.

Outros clubes da cidade mantinham grupos amadores, mas foi com o aparecimento do Clube de Arte (1955) que começou a fase de efervescência do amadorismo. O Clube foi para nós o que o TBC representou para o país, comparação feita pela crítica de arte de A Tribuna, Carmelinda Guimarães, em artigo de 9 de agosto de 1983. "Eles aboliram o ponto e trouxeram a presença do diretor que trabalhava o espetáculo como um todo".

No final dos anos 50, início dos anos 60, o movimento era impulsionado pelo Clube de Arte e por uma de suas mais ilustres freqüentadoras, Patrícia Galvão, a Pagu, musa da Semana da Arte Moderna de 1922, do teatro de vanguarda santista e do cárcere político.

O Clube, que ficava na Avenida Ana Costa, tinha como associados nomes de grandes intelectuais, artistas e arquiteto: Pagu, Evaristo Ribeiro, Paulo Lara, Oscar Von Pfull e sua esposa Gilberta Autran, Evêncio da Quinta, o Zêgo, entre outros.

Na época, o Coliseu além de ser muito caro era por demais espaçoso. O Teatro da Rádio Clube era muito usado (hoje Cine Alhambra) (N.E.: já demolido).

O Teatro Independência, hoje discoteca Zoom (N.E.: depois casa de bingo), localizado na Avenida Ana Costa, substituiu o Teatro do Rádio, sendo às vezes alugado pelos grupos. O Festival realizado por Paschoal Carlos Magno no Teatro Coliseu, a Comissão Municipal de Cultura e o departamento cultural do jornal A Tribuna, que existia na época, foram os grandes responsáveis pelo crescimento do amadorismo. Antes restrito aos clubes e centros de sociedade.

Nessa década de 60 os grupos dependiam das instalações e ajuda destes. Os espaços eram: Círculo Operário de Santos - uma pequena sede na esquina da Rua da Constituição com Marechal Pego Júnior -, o A. A. Portuguesa (Estádio Ulrico Mursa), o Clube Sírio Libanês, o Centro Português de Santos e o Teatro do Sesc-Senac que ficava na Avenida Conselheiro Nébias, 303, conhecido como Teatro de Arena.

O I Festival Regional

Em 1968, o jornal A Tribuna, através de seu departamento cultural, chefiado pelo professor Luís F. Carranca, e com o incentivo de Patrícia Galvão, que também ra funcionária do jornal e promovia cursos de Arte Dramática, resolve em conjunto com a Comissão Estadual de Teatro organizar o I Festival de Teatro Amador para Santos e Litoral, aos cuidados da Comissão Municipal. O objetivo dos santistas era que se tivesse um teatro de Santos com qualidade. Na época, éramos visitados apenas quatro vezes por mês pelas representações teatrais que eventualmente vinham da capital.

Todos os espaços da cidade foram utilizados pelos amadores. Os grupos que participaram na época foram: Geti (Grupo Experimental de Teatro Infantil), dirigido por Patrícia Galvão - Os Independentes, dirigido por Evêncio da Quinta - Conjunto Teatral São José - Teatro do Clube Sírio Libanês de Santos, Corporação Cênica do Centro Português, Clube de Arte de Santos, Teatro do Comerciário Sesc-Senac e o City Atlético Clube.

No ano seguinte, o Departamento de Cultura teve a iniciativa de trazer o II Festival Nacional de Estudantes para ser sediado em Santos. Foi o maior evento do período. Hospedaram-se cerca de 800 estudantes, dezenas de críticos e jornalistas de todo o país. Foram erguidos palcos nos logradouros públicos, promoveram transporte urbano gratuito (na época feito pelos bondes) e complementaram os cenários que os grupos de fora não puderam trazer.

Nunca a cidade teve tanto movimento. Foi o impulso necessário que o nosso teatro precisava, pois, na época, os espetáculos produzidos já eram de primeira qualidade.

Foram os amadores, nos anos 60 e início dos 70, que mantiveram vivo todo o universo da cultura através do teatro, enfrentando e ludibriando a censura. Quem acompanhou a trajetória do Geti, Tevec, Independentes, Tev, Teatro Clássico, bem como o teatro amador produzido pelo Clube de Arte, Centro Português, Teatro Estudantil de Novos e nos clubes perceberá a importância para o teatro santista de Paulo Lara, Patrícia Galvão, Dráusio da Cruz, Luiz Freire e Evêncio da Quinta.

No resgate da memória viva temos profissionais como Plínio Marcos, Gilberto e Oscar Von Pfuhl, Greghi Filho, Gilberto Mendes, Nélio Silva, Paulo Jordão, Serafim Gonzalez, Lizete Negreiros, Cleide Eunice Queiroz, Nei Latorraca, Jonas Mello, Nélio Mendes, Ademir Fontana, Newton Telles, Roberto Peres, Jandira Martini, Neyde Veneziano, Carlos Alberto Sofredini, Rubens Ewald Filho, Carlos Pinto, Tanah Correa, entre outros. São profissionais que iniciaram na cidade uma revolução cultural. Enquanto amadores tinham a consciência de que deveriam ousar tanto na forma e linguagem quanto na escolha de autores para encenar.

De 1959 a 1977 desfilaram pelos palcos santistas espetáculos produzidos pelos amadores citados que deixaram marcas. Época dos Inocentes, Fando e Liz de Arrabal, Os Físicos de Friederick Durrenmatt, A Falecida de Nelson Rodrigues, Electra de Sófocles, Pic-Nic no Front de Arrabal, Vocês Querem Representar Comigo de Marcel Achard, A Farsa do Mestre Pathelin, Unicórnio de Vidro, A Margem da Vida, de Tennessee Williams, A Paz de Aristófones, O Traído Imaginário de Moliére, Pedreira das Almas de Jorge Andrade, Prometeu Acorrentado de Ésquilo.

Foram espetáculos que surgiram como pontos altos dentro de um movimento que permaneceu sempre intenso, que, segundo Roberto Peres em matéria publicada no jornal Cidade de Santos de 18/07/1982, ofereciam propostas cênicas ousadas e um verdadeiro laboratório para autores. Em 1972, Jorge Andrade veria seu texto As Confrarias pela primeira vez no palco, sob direção de Wilson dos Santos.

Nesse mesmo ano Valter Rodrigues dirigiu a adaptação de "Z" de Vassili Vassilikis para o teatro feita por Dimitris Diritríades, num tempo em que a censura retinha o filme de Costa Gravas para o Brasil. O público, que na maior parte das vezes correspondeu ao trabalho dos amadores, achava que o trabalho amador feito em Santos era melhor que os espetáculos profissionais que aqui chegavam do eixo Rio-São Paulo.

Em 1977, com o movimento amador bastante esvaziado, Valter Rodrigues dirige Panorama Visto da Ponte, de Arthur Miller, com o Tevec, que encerra suas atividades. O movimento se esvazia e os grupos praticamente desaparecem, Neyde Veneziano cria a partir de trabalhos anteriores o grupo Gextus. Ao assumir a Secretaria Municipal de Cultura, em 1986, Tanah Correa inicia junto à Federação de Teatro Amador um trabalho que visava oferecer espaços para ensaios dos grupos espalhados. Embora o Gal e Teca realizassem espetáculos infantis anteriores a 1986, é somente em 1987 que acontece o Festa - Festival de Teatro Amador de Santos.

De 1987 a 19894, acompanhando os festivais como espectadora, percebo uma mudança de mentalidade e formação dos grupos existentes. Espetáculos que me emocionaram, quer seja quanto ao conteúdo, forma de linguagem: A Lenda do Guará Encantado, Revista do Henfil, A Relativa Revista, Capitães de Areia, Bailei na Curva, Absurda Noite dos Absurdos e o Projeto Carlitos, o espetáculo Terra, no teatro universitário. Cenas para uma Proposta por universitários do Carmus sob a direção de Roberto Peres, Antígona de Sófocles direção de Tanah Correa, destaque para o trabalho de Iracema de Paulo Ribeiro no último festival com a Árvore que Andava de Oscar Von Pfuhl e Jogo do Jogo direção de Filomena Porto.

Gilson de Melo Barros, André Leachen, Dagoberto Feliz, Miriam Vieira, Célia Abadia, Eliel Ferreira, Bartô, Toninho Dantas e os profissionais do teatro de hoje como Giácomo Pinotti, Nivia Diegues, Amauri Alves, Charles Miller, Marco Antonio Rodrigues, Orteyde Faia, Sérgio Guerreiro e Roberto Marchesi, estão em cena provando que a cidade de Santos tem contribuído para a cultura nacional, revelando através do movimento amador grandes artistas de hoje quanto os de décadas passadas.

Os amadores de teatro contemporâneo buscam espaços alternativos. Alguns trabalham fundamentados na pesquisa, outros ousam experimentar idéias e efeitos, aprendendo com os erros e procurando um crescimento e conteúdo em suas propostas. Eles continuam fazendo a festa.

É uma geração que reflete as marcas da transformação ocorrida na sociedade.

(Pesquisa de Vanessa Campos).

A primeira peça que eu assisti foi Romeu e Julieta, de Shakespeare, no Morro de São Bento, com o Circo Teatro Bibi. Eu tinha dez anos. O circo vinha uma vez por ano, nas férias, e para o pessoal pobre era a única diversão e o único contato com o teatro.

O Céu Uniu dois Corações era uma coisa sublime. Eu era pequena e não tinha dinheiro para a entrada. Um senhor que trabalhava no circo permitia que as crianças pobres entrassem por baixo da lona depois que o espetáculo começava.

Também a Caravana do Peru que Fala, do Sílvio Santos, fazia circo-teatro na periferia.

Jane.

Lenimar Rios em A Paz

Foto publicada com o texto