HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS -
Clubes
Centro Português de Santos (1)
Em
sua Poliantéia Santista (Editora Caudex Ltda., São Vicente/SP, 1996), Fernando Martins Lichti incluiu este artigo sobre a história do Centro
Português de Santos, com dados extraídos da revista Centro Português de Santos e seu Centenário, de autoria de Maria de Fátima Pereira Alves,
Maria Luiz Quaresma, Maria dos Anjos R. Gomes, Maria da Conceição Sousa Teixeira, Zilda Ventura de Almeida, Fernanda Pires Gomes e Émerson Franco Rocha
da Silva:
O prédio-sede, em estilo neomanuelino
Foto: Centro Português
Centro Português de Santos
Esta entidade, que tanto exalta a cultura portuguesa e que há
mais de cem anos confraterniza brasileiros e lusitanos, passou a ter a denominação de Centro Português de Santos, a partir da assembléia geral de
seus associados, realizada a 3 de junho de 1945. Até então era o tradicional Real Centro Português, o grande elo da
colônia portuguesa, em Santos, fundado a 1º de dezembro de 1895, em reunião que lotara o Teatro Guarani, com a finalidade precípua de congregar
todos os portugueses, proporcionando-lhes atividades literárias, científicas, recreativas, educacionais e sociais.
Manuel Homem de Bittencourt, o primeiro presidente
Foto: Centro Português
Foi
seu primeiro presidente o Dr. Manuel Homem de Bittencourt. A primeira sede social do Real Centro Português foi na Praça da República nº 11 e sua
primeira atividade foi a criação da Escola João de Deus, objetivando dar aos portugueses humildes a oportunidade de instrução. Essa escola mantinha
o curso primário, com aulas gratuitas, à noite. Posteriormente, esse estabelecimento escolar passou a proporcionar curso de francês, aulas de
esgrima, de tiro ao alvo, de dança, de música e de arte dramática - que veio a gerar o Corpo Cênico do Centro Português, criado a 2 de maio de 1899
e que manteve atividades, com destacada atuação, por mais de cinqüenta anos.
A 12 de abril de 1908 o Real Centro Português, correspondendo à relevância do seu movimento
teatral, inaugurou o seu Salão-Teatro, que permaneceu em atividade até 1951, quando passou por grande reforma, sendo reinaugurado a 13 de outubro de
1956, com modernas poltronas, finíssima decoração, como Teatro do Centro Português e uma das mais modernas casas teatrais de Santos, com a
denominação de Teatro Júlio Dantas.
Em seu ato inaugural apresentou a Orquestra Sinfônica de Santos, sob a regência do maestro
Moacyr M. Serra. A 4 de dezembro de 1979, em razão de crise financeira da entidade, o teatro foi alugado à Empresa Cinematográfica Haway Ltda. e
Empresa de Cinemas de Santos, as quais o mantiveram sob locação por mais de 15 anos, com ambiente em decadência pela apresentação de filmes
pornográficos - o que motivou a retomada do teatro, através de ação judicial, ocorrida a 27 de janeiro de 1995.
Os Lusíadas, de Luiz Vaz de Camões, com
dedicatória a Dom Pedro II pelo editor Emílio Biel. Tipografia Giesecke e Devrient, Leipzing, 1880, guardado em caixa de metal com as insígnias do
Real Centro Português de Santos.
Foto: Centro Português
Desejando acompanhar o impulso sócio-cultural da sociedade santista, no final do século XIX,
o quadro associativo do Real Centro Português passou a querer ter sua sede própria e com esse propósito adquiriu o terreno de esquina da Rua Amador
Bueno com a Rua Martim Afonso.
O edifício-sede foi projetado pelos engenheiros portugueses Ernesto Maia e João Esteves
Ribeiro da Silva, em estilo manuelino, e para início das obras foi constituída uma comissão especial integrada por António Domingues Pinto, Dr.
Manuel Homem Bittencourt, António Marques Bento de Sousa e Viriato Correa da Costa.
As Pupilas do Senhor Reitor - de Julio Diniz
(Lisboa - A Editora).
Foto: Centro Português
A construção foi iniciada a 15 de maio de 1898 e a 8 de outubro de 1900 foi inaugurada,
ainda incompleta, sendo terminada em 1901. A sede, um palacete majestoso, com muita pompa e riqueza, foi construída com recursos financeiros
levantados através de leilões, tômbolas e quermesses promovidas em praça pública, especialmente nos jardins da Praça dos Andradas. Mas, em verdade,
a sede só se tornou realidade com a grande colaboração dos beneméritos António Domingues Pinto e António dos Santos Coelho Germano.
Esse edifício, ainda hoje, ostenta grande destaque arquitetônico em seu estilo neomanuelino,
sendo um dos mais belos da Baixada Santista. É mobiliado e decorado com extraordinário requinte e riqueza, em todas as suas dependências, com realce
de seu Salão Cerejeira e de seu Salão Camoniano, ornamentados com magníficas obras de arte.
A biblioteca do centro Português, com cerca de 2.500 volumes, é de excepcional valor por
suas obras de Literatura, de História, de Cultura, de Artes, de Educação, de Comércio, de Administração e Jurisprudência, possuindo algumas
relíquias - de grande valor - da literatura luso-brasileira.
Salão de festas foi erguido ao lado do palacete-sede, a
partir de 1984
Foto: Centro Português
Prevendo a necessidade de expansão de suas atividades recreativas e
culturais, em 1926 foi feita a aquisição do terreno nº 190 da Rua Amador Bueno, ao lado do palacete-sede. Essa área foi ocupada, durante muitos
anos, como um Jardim-Grill, complementando suas grandes festas, inclusive de Carnaval, e suas apresentações teatrais.
Inauguração do salão em 1985
Foto: Centro Português
Em
1984 foi iniciada nesse local a construção de um amplo salão, com cerca de 800 m², com palco, cozinha, bar, sanitários e residência do zelador, que
foi inaugurado a 19 de janeiro de 1985, com a denominação de Salão Alberto Ferreira dos Santos - num pleito de reconhecimento aos relevantes
serviços prestados por esse atuante cidadão português, não só à entidade, à colônia luso-brasileira, como também à comunidade santista.
Rancho Folclórico do Centro Português de Santos foi
formado em dezembro de 1961
Foto: Centro Português
Em 1961, sensível à realidade da grande motivação da colônia portuguesa, tentando resgatar a
música e a dança do folclore lusitano, o Centro Português formou o primeiro rancho folclórico do Estado de São Paulo.
A 2 de dezembro de 1961 deu-se a primeira apresentação desse conjunto. Em 1962, em razão de
desentendimento entre a diretoria do centro Português e os responsáveis pelo Rancho, a maioria de seus componentes se desvinculou da entidade,
formando um novo grupo folclórico sob a denominação de Tricanas de Coimbra.
Rancho Mirim, formado em 1963
Foto: Centro Português
Atendendo aos anseios do quadro associativo, a diretoria do Centro Português organizou um
novo conjunto folclórico, e o fez sob a coordenação geral do sr. Luís de Figueiredo - profundo conhecedor do folclore português. Quatro meses após,
em dezembro de 1962, o Rancho Folclórico do Centro Português voltava a se apresentar, com grande sucesso.
Em 1963 foi formado o Rancho Mirim, sob a direção de Cleide de Abreu, o qual passou a ser um
magnífico celeiro de novos talentos. Em 1966, em pleno apogeu, o rancho passou a chamar-se Verde Gaio - nome de um pássaro muito popular em
Portugal.
O Rancho Verde Gaio, marcando sucessivos sucessos, teve sua coroação ao apresentar-se nas
plagas portuguesas em 1986. O rancho é constituído por 13 dançadeiras, 12 dançadores, 1 cantadeira, 1 cantador, 3 porta-bandeiras e uma tocada, com
7 músicos. |
O Verde Gaio, com trajes originais adquiridos em Viana
do Castelo, região portuguesa do Minho
Foto: Centro Português
O Centro Português revela outros detalhes sobre sua história, em sua páginas na Internet. Sobre a sede em estilo
manuelino, conta: "Às 2 horas da tarde do dia 2 de maio de 1899, em comemoração do 399º aniversário da descoberta do Brasil, realizou-se uma
cerimônia para colocação da última telha, que contou com a presença maciça dos associados, dando grande brilhantismo ao fato.
"O edifício foi decorado com motivos próprios do estilo evocado: janelas e portas em arcos redondos, com cordas,
estrelas, cruzes de Cristo, escudos reais, esferas anilares entre colunas em forma de troncos esguios, com espiral nas pontas. Apenas outros dois
edifícios mantêm essas características no Brasil: Gabinete Português de Leitura, de Recife, Pernambuco, e o Real Gabinete Português de Leitura do
Rio de Janeiro".
Bandeira com o símbolo do clube e as fitas presenteadas
por outras agremiações, além de galhardete que é entregue na primeira visita do Rancho a outras agremiações
Foto: Centro Português
As páginas Web do clube também complementam informações sobre o Rancho Verde Gaio, relembrando: "O nosso rancho
foi o pioneiro a se apresentar na TV Tupi, TV Excelsior e TV Cultura. Também fez história em memoráveis festivais, no ginásio do Ibirapuera, em São
Paulo, organizado pelo programa Caravela da Saudade, com a participação de todos os grupos existentes na época.
"O Rancho Folclórico Verde Gaio destacava-se, e fazendo jus à sua fama, era ovacionado pelo público que
superlotava o ginásio. O Rancho foi e é um exemplo a ser seguido por outros, sendo agraciado com muitos troféus, em vários festivais em que
participou ao longo dos anos".
O escrínio, pequeno cofre de aço com as relíquias do
clube
Foto: Centro Português
Sobre o salão de festas inaugurado em 1985, o clube destaca: "A partir de então, são o ponto alto deste salão as
festas tradicionais portuguesas, onde são servidas comidas típicas (sardinha assada, chouriço, alheiras, salpicão, caldo verde, pastéis de nata,
etc.) e apresentação de vários Ranchos Folclóricos.
Dentre essas festas destaca-se a "Festa da Cereja", realizada em junho com cerejas importadas de Portugal, e
orgulho de ter sido o Centro Português de Santos a primeira entidade da Baixada Santista a realizá-la. Outras festas típicas relembram as tradições
de Portugal e entre elas temos: Festa das Vindimas, com ornamentação de parreiras e representação da colheita da uva; Magusto, com
suas tradicionais castanhas e vinho português; São Martinho, a prova do vinho, quando são colocados barris e os convidados se servem nas
tradicionais canecas da casa; Pousada da Saudade, realizada mensalmente quando são convidados outros ranchos quer brasileiros, quer
portugueses, para um maior entrelaçamento da cultura e da arte popular portuguesa.
"O Salão Alberto Ferreira dos Santos veio acrescentar mais um espaço para acolher no seu seio maior número de
público para prestigiar e assistir as inesquecíveis apresentações de grandes nomes do cenário artístico luso-brasileiro: Carlos do Carmo, Roberto
Leal, Adélia Pedrosa, Tuna Acadêmica da Universidade Lusíada do Porto, entre muitos outros".
Salão Cerejeira é usado como sala de reuniões
Foto: Centro Português
Ainda nas páginas eletrônicas do clube, referências ao Salão Cerejeira: "A sala fronteiriça do belo edifício do
Centro Português, com janelas neomanuelinas que dão para a rua Amador Bueno, servia, no começo do século como bar e sala de jogos. Nesta sala do
andar superior havia mesas de bilhar e carteado. Com a aquisição do prédio vizinho, à Rua Amador Bueno 190, passaram os jogos para este novo local,
surgindo assim o Salão das Damas, que servia para as conversas informais, durante os bailes no Salão Camoniano.
"Este salão, perfeitamente integrado à atividade da casa, passou a denominar-se Salão Cardeal Cerejeira, em
homenagem ao digníssimo Cardeal Patriarca de Lisboa, quando em visita ao Centro Português, em 15 de setembro de 1946. É tradição desta Sala ser o
primeiro local de acolhimento a visitantes ilustres, assim como sala de exposições de arte: pintura, fotografia, jóias etc."
O Salão Cerejeira passou por várias reformas até ser transformado em Sala de Reuniões, quando foi inaugurada a
galena dos presidentes. Nele há um piano de cauda, relíquia da casa: um Steinmay & Sans de 1876: "Em tempos áureos, ao iniciar uma festa havia
sempre um prelúdio musical ao piano, que tanto agradava os convidados".
"Sob a mesa de reuniões existe um precioso escrínio vindo de Portugal, em 1947, a pedido da diretoria da época e
doado por Carlos Herdade. Este escrínio contém terra extraída do Castelo de Guimarães - berço da nacionalidade portuguesa - e pedras do Promontório
de Sagres (de onde o Infante D. Henrique vislumbrou com o auxílio da ciência da época as terras ainda ignoradas e donde partiram as primeiras naves,
rumo aos descobrimentos). Junto estão Os Lusíadas, bíblia dos argonautas portugueses onde se cantam os feitos do povo predestinado a dar o
nome à História da Humanidade, gravando-lhe página soberba de amor e heroísmo". |
Painéis do teto do Salão Camoniano:
Esquerda: Visita do Samorim à Nau Capitania (canto VII, estância LXXV)
Direita: Visita do rei de Melinde ao Gama (canto II, estância CI)
Fotos: Centro Português
Uma página
Web dedicada à entidade conta ainda:
"1896 - O Rei D. Carlos I de Portugal, transforma-o em Real Centro Português.
Em 21 de janeiro o Rei de Portugal Dom Carlos I agraciou a instituição com o honroso direito de usar a denominação Real antecedendo seu nome,
passando a chamar-se Real Centro Português de Santos, em agradecimento aos benéficos serviços prestados à Pátria Mãe pela Colônia Portuguesa de
Santos. O Rei D. Carlos I foi homenageado tornando-se Presidente Honorário do Real Centro Português.
"1945 - Votada a supressão do título dado por D. Carlos I. O Decreto-Lei
nº 383 de 1945 exigia que uma associação estrangeira não poderia ter sócios brasileiros como ocorria com o Real Centro Português. Em três
Assembléias Gerais, presididas por José Antônio Prior, os sócios discutiam sobre a alteração dos estatutos e a mudança do título dado por D. Carlos
I. Na Assembléia Geral de 3 de junho de 1945, 113 sócios decidiram pela supressão do título "Real" e pelo novo estatuto que nacionalizava a
instituição, mas 55 foram contra.
Apesar da decisão soberana da Assembléia Geral, o presidente Joaquim Moreira, que
ocupava o cargo a 20 anos consecutivos, discordou de tal decisão renunciando ao cargo com mais 6 diretores, movendo em seguida uma ação judicial
juntamente com Acácio Augusto de Almeida e José Antônio Prior, presidente da Assembléia Geral. Manuel Souza Peres, novo presidente eleito,
convenceu-os a desistirem da ação judicial, com o propósito de contribuírem para uma maior união dos portugueses de Santos."
Painéis do teto do Salão Camoniano:
Esquerda: Conselho dos Deuses (canto I, estância XXXIII)
Direita: Ilha de Vênus (canto IX, estância LXXXIV)
Fotos: Centro Português
A mesma página eletrônica acrescenta:
"1913 - Inauguração do Salão Nobre: o Salão Camoniano. Em
1º de dezembro de 1913, após a conclusão do edifício, realizou-se com grande júbilo a inauguração do Salão Nobre. Para este grande evento, o Real
Centro Português cobriu-se de luzes e beleza, ostentava na sua fachada azul e branco a coroa real sobre a esfera armilar, adornado de pequenas
palmeiras.
Painel Gruta de Camões em Macau (canto I, estância X)
Foto: Centro Português
"O
Salão Nobre foi concluído graças ao empenho do benemérito Antônio Pereira de Carvalho que custeou toda a decoração artística, que foi iniciada no
ano de 1909 pelos espanhóis Antônio Fernandez e João Bernils. O Salão possui obras de arte e uma decoração característica em combinação com o
estilo neomanuelino do edifício. Nas paredes foram executadas pinturas de imitação a damasco, adornadas com ricos medalhões da nobreza e com das
cidades e vilas mais importantes de Portugal. As janelas realçadas com cortinas em azul forte, tendo em suas sanefas o símbolo social bordado em
branco e sob estas, filó branco bordado.
"As pinturas a óleo no teto representam episódios de Os Lusíadas, extraídos
de estâncias de diferentes cantos do poema, originando assim o atual nome: Salão Camoniano Para a grande noite de inauguração o salão foi
decorado com festões e flores, pratarias e cristais, a cargo das senhoras pertencentes ao Grêmio das Camélias.
"Criação do Grêmio das Camélias. No dia 3 de março de 1913, foi
formada a primeira diretoria do Grêmio das Camélias, à proposta de Antônio Monteiro Morgado. O grêmio era composto por esposas e filhas de
associados do Real Centro Português, que elevaram o nome da entidade, com seus Chás Dançantes, saraus literários, concertos ao piano e famosos
bailes, como Baile Azul e Baile de Carnaval. O grêmio persistiu até o ano de 1915, graças ao empenho de mulheres desbravadoras,
sendo que as atividades só foram retomadas em 1994 com a formação do atual departamento feminino."
Painéis do teto do Salão Camoniano:
Esquerda: Vênus aconselha as nereidas, a bem receberem os nautas (canto IX, estância
L)
Dir.: A mandado de Vênus, a Fama vai a pregar às ninfas o nome português (canto IX, est.
XLV)
Fotos: Centro Português |
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