Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/cubatao/ch016c.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 12/30/10 11:34:28
Clique aqui para voltar à página inicial de Cubatão

HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO
A casa do principal escritor (3)

Leva para a página anterior

Considerado o maior escritor nascido em Cubatão, Afonso Schmidt descreveu em suas obras a casa em que morou, no tempo em que a então futura cidade era apenas um bairro suburbano de Santos. Ela não mais existe, da mesma forma como vão desaparecendo outros antigos chalés na cidade e na região, como relata o jornal santista A Tribuna em matéria publicada em 31 de outubro de 2010, página A-13:

Na Rua Armando de Sales Oliveira fica um dos mais belos e bem conservados chalés de Cubatão, que abriga um restaurante, o Cantinho do Sabor
Foto: Raimundo Rosa, publicada com a matéria

A história que nasceu num chalé

Local da casa do escritor Afonso Schmidt, no bairro da Água Fria, em Cubatão, pode abrigar um Jardim Botânico

Manuel Alves Fernandes e Thiago Macedo

Da Redação

Afonso Schmidt, uma das glórias de Cubatão, nasceu em um chalé, no bairro Água Fria. No local, o governo do Estado quer implantar um Jardim Botânico. A casa do escritor, às margens do Rio Cubatão, foi demolida na década de 1970, apesar dos protestos do ex-vereador Romeu Magalhães.

Ele descreveu em suas obras a casa em que morou, no tempo em que a então futura cidade era apenas um bairro suburbano de Santos. Quando tinha 14 anos, saiu desse chalé e seguiu por aí viajando, até parar na Europa, onde viveu mais de um ano na maior das misérias. Em fins de 1908, ele retornou à sua cidade. Desceu no Porto de Santos e tomou o trem para Cubatão.

Da estação até o sítio onde seus pais moravam, ele andou pelos caminhos dos trilhos do trenzinho que levava a Itutinga. Para lá da ponte preta sobre o Rio Cubatão, ele avistou a sua casa, onde a mãe se assustou ao vê-lo. O nome do menino se transformou, 70 anos depois, no maior orgulho de Cubatão.

No livro A Primeira Viagem, Schmidt conta toda a aventura. Moradores antigos da Cidade se deleitam ao ver a descrição de um caminho que muitos fizeram há menos de 30 anos, quando ainda existia o trenzinho que os levava da estação da atual Santos-Jundiaí até a adutora dos Pilões, em Itutinga.

Caixotes de bacalhau - Essa era a Cubatão original, dos chalés de tábuas de ipê, madeira brasileira, resistente à ação do tempo e aos cupins. Mas, havia alguns de pinho de riga. Os segredos da construção vieram dos Açores e da Ilha da Madeira, que os portugueses trouxeram de lá e os filhos aprenderam com os avós. Filho de um português de Palhaça, região de Aveiro em Portugal, Armando Campinas Reis (ex-presidente da Câmara e ex-vice-prefeito de Cubatão) nasceu em um chalé na Vila Nova, onde hoje está o Supermercado Krill, em 31 de agosto de 1940. Três anos depois, seu pai construiu um conjunto de chalés nas proximidades da atual Rua São Paulo.

"Muita gente começou a vida construindo chalés mais rústicos, utilizando madeira de caixotes de bacalhau que os portugueses pescavam na Noruega. Era madeira de pinho de riga, bem rija e que durava anos. Não se assemelhavam a favelas porque os donos tinham títulos de propriedade e organizavam arruamentos.

"Eram poucas casas, com grandes áreas de lazer e muitos bananais", conta. Com o tempo, surgiram os primeiros chalés mistos: as cozinhas e os banheiros eram de alvenaria. "Na década de 1970, vi os primeiros banheiros com azulejos, coisa que cubatenses só assistiam em filmes", revela.

Os chalés mais conhecidos foram de Miquelina Domingues, a matriarca (hoje nome de praça na cidade), que tinha uma pensão na Avenida Nove de Abril onde hoje fica o supermercado Barateiro (antigo Peralta). Miquelina importou os primeiros aveirenses. "Ela foi uma das mais dignas de Cubatão. Abrigava os portugueses que vinham de Aveiro para trabalhar na sua pensão, até que pudessem ter vida própria. A cidade deve muito a essa mulher que tive o prazer de conhecer". Miquelina foi também uma das primeiras a construir casas de alvenaria na Cidade.

Mas a história ainda existe e resiste em Cubatão. Pelas ruas da Cidade ainda é possível encontrar algumas dessas construções. Na Rua Armando de Sales Oliveira fica um dos mais belos e bem conservados chalés de Cubatão, que abriga um restaurante, o Cantinho do Sabor.

Carlos Alberto da Rocha, descendente de família tradicional na cidade, é o proprietário do restaurante. Com 65 anos, ele conta que nasceu no chalé. "Nós morávamos próximo ao Vale Verde, onde o meu pai, sitiante, plantava bananas, e meu pai comprou esse chalé dias antes de eu nascer".

Depois de viver por muitos anos na casinha de madeira, Carlos se mudou, mas manteve o chalé com as mesmas características. Foi ao viajar para a região Sul do País que teve a idéia de transformar a velha propriedade da família em um negócio lucrativo. "No Sul eu vi vários cafés e restaurantes que funcionavam em chalés como o nosso. Foi então que decidi restaurá-lo e montar um restaurante em Cubatão". A idéia deu certo e o Cantinho do Sabor já existe há dezessete anos e meio.

Chalé em Cubatão: segredos da construção vieram de Açores e Madeira
Foto: Raimundo Rosa, publicada com a matéria

Crescimento da população

No início dos anos 1950, com a Cidade já se tornando município (autonomia m 1949) e a chegada das indústrias - a partir da construção da Refinaria Presidente Bernardes Cubatão - começou o crescimento populacional. O setor secundário (produção industrial, principalmente) já reunia 62,1% da força produtiva, e o setor terciário (serviços) 22,4%.

A historiadora Wilma Terezinha afirma que em 1961, segundo o Departamento de Estatística do Estado de São Paulo, era cerca de 56.200 o número de pessoas empregadas no setor industrial, com um aumento de 75% em relação a 1950. Praticamente no mesmo período, isto é, entre 1950 e 1960, o crescimento da população urbana foi de 193%. As áreas agrícolas começaram a ser aterradas para a construção de indústrias e surgiram os primeiros bairros.

Como diminuiu também a importação de caixotes de bacalhau da Noruega feitos em Portugal, segundo Armando Campinas Reis, o número de chalés foi decrescendo. Apareceram então as primeiras favelas, erguidas por trabalhadores não qualificados vindos de todo o País, atraídos pela oferta de empregos nas indústrias.

Barracos, e não mais chalés, construídos com sobras de madeira dos caixotes que traziam equipamentos industriais, apareceram na paisagem cubatense. Com o tempo, os operários das indústrias de Cubatão melhor remunerados deixaram de lado os chalés e foram atraídos pelas praias de Santos.

Carlos Alberto da Rocha, descendente de família tradicional na cidade, é o proprietário do restaurante
Foto: Raimundo Rosa, publicada com a matéria

Até década de 50, setor agrícola era muito forte

Vem da época dos chalés e do trenzinho de Itutinga, que trazia a produção agrícola até à estação de trens na Nove de Abril em frente à Avenida Martins Fontes, a fama de Cubatão como "exportador de bananas para a Argentina". Até 1950, 15,3% da população ativa de Cubatão ainda exercia atividade no setor agrícola e de extração de tanino e de areia nos mangues e rios.

"Com a construção da Via Anchieta, o DER construiu chalés de madeira na Cota 200, o que seria o embrião dos bairros-cota. Na época, havia poucas casas de alvenaria. Mas eram boas casas. As mais célebres eram as da Vila Fabril, erguidas pela Santista de Papel, e as da Vila da Light, na Usina Henry Borden, em estilo canadense ou inglês", conta Romeu Magalhães, que nasceu em uma casa de alvenaria na Vila Fabril.

Também moravam em chalés os funcionários da antiga São Paulo Railway Company e, posteriormente, da Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFFSA), que administrava a estrada de ferro Santos-Jundiaí. Ainda há poucos exemplares no Município. Onze deles ficam na Vila Ferroviária, que já abrigou mais de 70 casas, escola, hospital. Outros estão próximos à antiga estação de trem na Cidade.

Na Vila Couto, no Centro da Cidade, aos 77 anos, vive dona Argentina Maia da Costa Ferreira. Ela nasceu em Santos e chegou em Cubatão quando tinha 26. O prefeito era Armando Cunha, padrinho da sua cunhada. Ela foi morar no chalé 33 da Rua Maranhão. "No meu tempo, era tudo chalé. Eu falava com Deus: 'olha o senhor tem que me ajudar a comprar o chalé azul da Rua Maranhão'. Nós não tínhamos nada, só o dia e a noite. Um dia, o Jaime, dono do chalé, anunciou que queria vender. Meu marido tinha acabado de vender um fusca. Foi com o dinheiro do fusca que compramos o chalé, onde vivo até hoje".

Em tom nostálgico, Armando Campinas lembra da época em que Cubatão era tomada por chalés. "Tenho saudades da pequena Cubatão, onde todos se conheciam e viviam em harmonia", lamenta.

Mas, não há nada, é verdade, que não faça esses "antigos" cantarem a nostalgia de Adoniram Barbosa ao ver demolir a antiga casa onde morou: "Cada táuba que caía/Duía no coração/... E prá esquecê nóis cantemos assim: Saudosa maloca, maloca querida/... Donde nóis passemos os dias feliz de nossas vidas".