Capa da obra editada pela Prefeitura Municipal de Cubatão
Ilustração de Jean Luciano
Introdução
Ao dar início às minhas palavras, nada mais oportuno e justo do que agradecer à Câmara
Municipal a subida honra de que me fez objeto, convidando-me para, na qualidade de orador oficial, participar da sessão solene de encerramento da
III Semana "Afonso Schmidt".
As observações que vou proferir não constituem tão somente uma obediência às praxes e
cerimônias desta índole. Não, senhores, pois brotarão do íntimo do modesto conferencista, que confessa de público, ademais, os temores de que se
acha tomado no momento, de não estar à altura do autor homenageado, de sua obra e até mesmo do tema selecionado.
As limitações pessoais do orador, entretanto, não podem permitir que se obscureça a
circunstância particular e acentuadamente significativa de demonstrar a reunião a que assistimos neste momento, que o nome de Afonso Schmidt possui
o condão especial de despertar energia nos mais tímidos e de unir a seu redor todo o povo cubatense, aqui presente na pessoa de seus mais legítimos
líderes, quer do Legislativo, quer do Executivo, assim como dos homens da indústria e do comércio, professorado, estudantes e - aqueles cuja
assistência mais agradaria ao homenageado - os simplesmente leitores de seus escritos nesta "terra feliz" e invejável, para utilizar as
suas próprias palavras.
O escritor Afonso Schmidt, aos 63 anos de idade,
em fotografia doada por sua irmã Maria Clara Schmidt à "Coleção Afonso Schmidt", da Prefeitura Municipal de Cubatão
Foto publicada no livrete de 1974 da P.M.C.
O ano corrente e Afonso Schmidt - Poucos anos seriam mais propícios a
comemorações desta natureza do que o corrente (N.E.: 1972), em que se deu a coincidência
de celebrar-se, no plano mais elevado e empolgando a todos os brasileiros, o Sesquicentenário da Independência Pátria.
No setor artístico, especificamente, e tendo sido levado a efeito no Estado do mais
paulista dos escritores paulistas, como já foi chamado Afonso Schmidt, e (como por sinal também o acontecimento anteriormente registrado) ocorre
agora o cinquentenário da Semana de Arte Moderna, por muitos considerada a Independência Cultural do País ou, pelo menos, a primeira arrancada neste
sentido.
No terreno ainda da arte, mas já compreendendo um plano superior ao nosso território e
estendendo-se a toda a comunidade luso-brasileira, comemora-se este ano, ademais, o quadricentenário da primeira edição de Os Lusíadas, com
que Luís Vaz de Camões veio garantir ao idioma português a ascensão à maioridade.
E, finalmente, no nível internacional, celebra-se atualmente o "Ano Internacional do
Livro", sob os auspícios da Unesco, entidade filiada às Nações Unidas, ao qual Afonso Schmidt, sem sombra de dúvida, dedicou toda sua vida.
Por que tratará de Cubatão esta palestra? - Uma primeira pergunta se impõe: Por
que tratará de Cubatão esta palestra, e em segundo lugar, por que se referirá à obra de Afonso Schmidt?
Tratará de Cubatão, evidentemente, por todo o seu passado ligado à História Brasileira
(N.A.: "No Rancho de Paranapiacaba", Júlio Prestes, pág. 20), que constitui para
todos, e para nós em especial, um tema de suma relevância.
Um pequeno parêntesis nos permitiria, neste momento, fazer rapidamente um retrospecto
da evolução do Município. Um porto apenas e um caminho e depois um posto fiscal deram início a Cubatão: era um reduzido número de casinholas ao
redor d'água no lugar que se tinha como porto, um caminho cantado em versos do maior escritor deste rincão, e uma "alfândega" (entre aspas) para a
fiscalização das mercadorias embarcadas.
Já em 1553, Martim Afonso chamava o Porto de Cubatão, "de Santa Cruz"
(N.A.: "Memórias para a história da Capitania de São Vicente", Frei Gaspar, pág. 175-176),
por coincidência exatamente o primitivo nome do nosso próprio País.
Mais tarde, em 12 de agosto de 1833, no período da Regência, sancionou o Imperador
Pedro II a Lei nº 24, elevando o referido Porto, abreviado depois para simplesmente Cubatão, à categoria de Município. O sonho, contudo, de
transformar esta parte em Municipalidade, só haveria de concretizar-se no século seguinte, a 9 de abril de 1949.
Fechando o parêntesis, examinaremos de que épocas da história desta Comunidade tratará
a presente palestra. Na verdade, de todas: de seu passado, do presente e do futuro de Cubatão, sempre, porém, como os viam os olhos, muitas vezes os
da própria alma, do escritor Afonso Schmidt.
E por que tratará a palestra da obra de Afonso Schmidt? - Porque -
atrever-me-ia a afirmar - ninguém amou mais e de tal forma este solo, estas montanhas, esta vegetação, fauna e rios, e esta gente cubatense, e
ninguém foi capaz de transmitir tão intensamente a paixão que o dominava, que este literato, aqui nascido.
O tema serão os escritos schmidtianos ainda, porque o escritor, em sua obra, jamais
esqueceu este ponto do mundo. Foi sempre aquele Menino Felipe, "que atravessou a nado o Rio Cubatão (lá em cima)..., e que trazia por toda a parte
ao pescoço, como um bentinho, o nome de Cubatão..." (N.A.: O Diário, de Santos, de 19 de abril de 1964, artigo
de Antônio Simões de Almeida).
Assim é que, auxiliados por ele e somente por ele, faremos uma incursão no passado e
no futuro e deitaremos uma olhada no presente de Cubatão. Fundamentalmente, recorreremos a "O Enigma de João Ramalho"
e a "Zanzalá", dois dos trabalhos de Afonso Schmidt. Deter-nos-emos mais, todavia, na consideração deste último,
pois ele, seguramente, cataloga, em forma a mais preciosa, as aspirações do coração de Afonso Schmidt quanto a seu berço, quanto à sua terra natal. |