Imagem: reprodução da página 15 do álbum de
2000
A evolução histórica do Porto de Santos
Os desdobramentos da história marítima da região podem ser divididos em quatro grandes
períodos.
1º) O período colonial, que se estende de 1502 até o ano da Independência do Brasil,
1822, abrangendo, portanto, este período,um total de 320 anos,
2º) O período imperial, que por sua vez deve ser dividido em duas partes:
a) de 1822 a 1851 e
b) de 1852 a 1892, ou seja, 70 anos.
3º) O período moderno, que de 1892 nos leva até 1982 (90 anos).
4º) O período contemporâneo, de 1982 até os dias de hoje.
Estes quatro períodos podem ser definidos em síntese, como se segue:
Primeira Parte - Período Colonial - 1502 a 1822
Pequeno porto regional da colônia portuguesa, tráfego veleiro de pouca intensidade,
intercâmbio transoceânico muito reduzido e feito quase exclusivamente com a Lisboa Real de então, ciclos econômicos localizados e de relevância
inferior, documentação histórica praticamente inexistente nos arquivos locais e dispersa em arquivos portugueses.
Imagem: reprodução da página 16 do álbum de
2000
Segunda Parte - Período Imperial - 1822 a 1892
Deve ser dividido em duas fases. Na primeira, de 1822 a 1852, o Porto de Santos
consegue um desenvolvimento relativo devido à condição de independência do país e à abertura dos portos do País, decretada no fim do primeiro
período, por vontade do príncipe regente, dom João VI.
A expansão, ainda embora modesta, do cultivo do café nas terras do planalto acentua a
tendência de crescimento nesta fase e, em 1845, realiza-se o primeiro grande embarque desse produto para a Europa (excluindo-se Portugal).
Na segunda fase do Período Imperial, de 1852 a 1892, o marco da expansão do porto
chegou verdadeiramente com a vinda dos primeiros navios a vapor provenientes da Europa, por volta de 1856.
Coincidentemente, mas não por acaso, nesse mesmo período, a visão futurista de Irineu
Evangelista de Souza, barão e mais tarde visconde de Mauá, imprimia a grande mudança nos rumos e destinos da região com o planejamento e o início da
construção de uma moderna estrada de ferro entre Santos e as terras do planalto.
Esta ferrovia, construída com tecnologia inglesa e capitais mistos anglo-brasileiros,
levou o nome de São Paulo Railway Company (SPR).
A inauguração de seus serviços, em 1867, coincidiu com o início do período da grande
emigração estrangeira para a então Província de São Paulo, permitindo o desenvolvimento de novas culturas agrícolas nas férteis e vastas terras do
planalto paulista.
Estava formado assim o trinômio que faria detonar o crescimento e o progresso do
ancoradouro santista, trinômio esse formado pela equação de terras férteis, café e imigrantes conjugado com ferrovia e navios a vapor.
O que deixava a desejar eram as precárias condições de atracação e operacionalidade do
Porto de Santos, extremamente rudimentares para fazer face a esta onda de evolução.
Tornava-se urgente, portanto, modernizá-lo e adaptá-lo e, conscientes dessa
necessidade, os governos imperiais e provinciais estabeleceram uma primeira concessão para a construção de um porto moderno em 1870.
Em 1886, falida esta concessão sem dar resultados, foi aberta concorrência pública e
dois anos mais tarde, assinada a lei que autorizava um grupo de concessionários (formado por José Pinto de Oliveira, João Gomes Ribeiro de Avelar,
Alfredo Valdetaro, Benedicto Antônio da Silva, Francisco Ribeiro, Eduardo Guinle e Cândido Gaffrée) a executar as obras de melhoramento.
Em 1892, foi criada juridicamente a sociedade de Eduardo Guinle e Cândido Gaffrée com
a denominação de Companhia Docas de Santos (CDS) e poucos meses mais tarde inaugurava-se o primeiro trecho de cais linear
em pedra e cimento do novo Porto de Santos.
Completava-se assim o quarteto ideal, pois ao trinômio mencionado vinha-se, a partir
de 1892, conhecer a existência de um porto adequado e Santos, cidade marítima e portuária, assumiria feições modernas.
Imagem: reprodução da página 17 do álbum de
2000
Terceira Parte - Período Moderno - 1892 a 1982
O terceiro grande período histórico do porto (1892 a 1982) ficou caracterizado pela
existência e expansão da CDS e pode ser resumido da seguinte forma:
- Ampliação do cais de atracação e zonas de armazéns, na segunda fase de expansão,
conforme os planos da CDS.
- Saneamento da área portuária e citadina.
- Expansão econômica marcante do Estado de São Paulo.
- Afluxo ou defluxo acelerado de novos ciclos de produção agrícola e/ou industrial.
- Aumento sensível do tráfego de cabotagem e interoceânico.
- Forte concorrência no setor armatorial.
- Aparecimento dos primeiros grandes transatlânticos de passageiros.
- Crises passageiras no tráfego durante os períodos bélicos internacionais.
- Modernização e adaptação às mudanças do perfil operacional marítimo.
- Terceira e quarta fase de expansão do cais, criação dos terminais privativos.
- Documentação local não facilmente acessível.
No espaço restrito destas linhas, não podemos elaborar em detalhes todo o gigantesco
trabalho realizado sob a égide da CDS ao longo desses 90 anos da concessão que usufruiu para a exploração dos serviços do porto.
Vamos nos restringir a fornecer algumas informações cronológicas referentes à expansão
do porto nas duas primeiras fases de crescimento.
3A) Primeira fase - 1892 a 1898
Realização do trecho de 2.200 metros, que iam do cais do Armazém 1 (próximo ao
Largo de Monte Alegre) até o cais do Armazém 10.
Os primeiros 260 metros iam da área do Arsenal (atual Armazém 4) à
Alfândega. É fato bem conhecido a atracação do vapor Nasmyth, da armadora britânica
Lamport & Holt (L&H), inaugurando o cais linear em 2 de fevereiro de 1892.
Em setembro daquele ano, estava pronto o primeiro Armazém, o de número 5.
O prosseguimento das obras ocorreu em direção à ponte trapiche da São Paulo Railway (SPR),
correspondendo aos cais dos armazéns 4 ao 1.
Nessa fase, as diversas epidemias que afetaram Santos (febre
amarela, varíola e tifo) afugentavam a mão de obra contratada; eram necessários cerca de 2 mil trabalhadores braçais para dar bom andamento às
diversas empreitadas.
Em meados de 1894, o cais já possuía cerca de mil metros, da Alfândega até a altura da
estação da SPR, cujos trilhos penetravam ao longo do cais.
De 1895 a 1898, construiu-se a faixa portuária que da Alfândega ia até o cais do
Armazém 10, representando pouco menos de 2 mil metros.
Imagem: reprodução da página 18 do álbum de
2000
3B) Segunda fase - 1898 a 1913
Em 1899 iniciou-se a demolição dos antigos trapiches que se encontravam próximos à
curva do Paquetá, como, por exemplo, o trapiche Brazil.
Em 1900, já existiam os 11 primeiros armazéns e o cais era
iluminado em toda a sua extensão por luz elétrica.
Na área de Outeirinhos, a CDS havia criado um enorme
depósito para 5 mil toneladas de carvão, com uma ponte de desembarque, em dois pavimentos, com trilhos e guindastes a vapor.
Nesse mesmo ano começou a tarefa hercúlea da construção da
muralha do cais entre Paquetá e Outeirinhos, seguida do aterro da lagoa formada pelo aparecimento do cais linear entre os
atuais armazéns 12 e 23.
Seja para o aterro, seja para a muralha, foi utilizado o material proveniente do
desmonte dos Outeirinhos e da Pedreira da Jabaquara.
Em dezembro de 1909, foi assentado o último grande bloco, com a presença de convidados
e autoridades que percorreram toda a extensão do cais, ou seja, 4.726 metros, subdivididos em 2.200 metros, do Valongo ao Paquetá, e 2.526 metros,
do Paquetá ao Outeirinhos.
Até essa mesma data, a CDS já havia construído 12 armazéns internos (ao longo do cais
do nº 1 ao nº 12), além de ter equipado o cais com duas estações geradoras de energia elétrica (as casas-matrizes nº 1 e nº 2) para iluminação das
áreas portuárias.
Estavam em fase de construção as duas torres transmissoras dos
fios condutores de energia da nova Usina Hidrelétrica de Itatinga, assim como a infraestrutura dos armazéns que iam da
curva do Paquetá a Outeirinhos.
As fotografias que ilustram este livro datam do período entre 9101 a 1904 e
correspondem às obras desta segunda fase de expansão do porto no seu terceiro grande período histórico.
Datam também desta segunda fase outras construções de importância para a
concessionária portuária, como por exemplo:
- O edifício da seção controladora do tráfego e contabilidade,
ainda hoje existente na curva do Paquetá.
- O edifício da sede de administração e as residências dos dois principais
responsáveis da CDS em Santos, Ismael de Souza, inspetor-geral, e o engenheiro Guilherme Weinschenck, construções essas feitas com excelentes
materiais e de fino acabamento, todas elas situadas na Avenida Conselheiro Rodrigues Alves, no local dos Outeirinhos.
Em pleno auge das atividades portuárias do primeiro e segundo período da CDS, falecia,
em 10 de março de 1912, Eduardo Palassin Guinle, um dos seus fundadores. Em 1919, desaparecia por sua vez, após longa enfermidade, Cândido Gaffrée.
Guilherme Guinle, filho de Eduardo Palassin Guinle, assumiu como sucessor a direção da
empresa, em 1915, e, com o falecimento de Cândido Gaffrée, foi nomeado presidente da CDS, a empresa que mais prosperava no Brasil de então.
Guilherme Guinle ocupou este cargo e função de forma brilhante durante bem 40 anos.
José Carlos Rossini
Pesquisador de assuntos marítimos, portuários
e autor da Rota de Ouro e Prata
Imagem: reprodução da página 19 do álbum de
2000 |