Santos inaugurou oficialmente o seu
porto organizado no dia 2 de fevereiro de 1892, com um trecho de 260 metros lineares construído no lugar dos
trapiches do até então conhecido como Porto do Bispo. A inauguração ocorreu com a atracação do
navio a vapor Nasmyth, da armadora inglesa Lamport & Holt. O navio, construído em 1880, continuou em tráfego até 1902:
O Nasmyth, em foto da época
Imagem: Rota de Ouro e Prata, José Carlos Rossini
A inauguração foi registrada no dia 4 de fevereiro de 1892 pelo jornal O Estado de
São Paulo, com esta pequena notícia: "O Sr. vice-presidente deste Estado recebeu ontem, de Santos, dos srs. Gaffrée,
Guinle e Companhia, o seguinte telegrama: 'Com satisfação comunicamos a Vossa Excelência que foi entregue ao tráfego o primeiro trecho do cais de
Santos'".
No dia seguinte, esse jornal descrevia: "O trecho do cais
entregue ao tráfego tem 260 metros de comprimento e fica entre a rua nova aberta junto ao Arsenal de Marinha e a Alfândega. Passada a quadra
epidêmica, a Empresa Melhoramentos do Porto de Santos conta que poderá entregar todos os meses um novo pedaço para o serviço. A inspetoria da
Alfândega foi autorizada de acordo com as cláusulas 8ª e 9ª do contrato celebrado com a empresa, a servir-se da parte do mesmo cais já concluída".
Anúncio dos agentes do navio, em um jornal santista da época
Imagem: Rota de Ouro e Prata, José Carlos Rossini
Sobre o navio e a inauguração do cais, narra o pesquisador de assuntos marítimos José
Carlos Rossini, de Genebra (Suíça), em artigo publicado no jornal A Tribuna de Santos em 17/6/1993, na série Rota de Ouro e Prata:
Em 1880, foi lançado ao mar, nos estaleiros A.Leslie & Co., de Hebburn-on-Tyne (perto
de Newcastle, Inglaterra), o vapor Nasmyth. Este estaleiro era o tradicional fornecedor e construtor de navios da Lamport & Holt (L-H), pois
antes do Nasmyth já havia construído outros 27 vapores para a armadora, sendo o Nasmyth o único entregue naquele ano para a L-H.
Sua viagem inaugural ocorreu com a saída de Liverpool em 30 de abril de 1880 e escalas
em Lisboa e Rio de Janeiro. O Nasmyth permaneceu em serviço na Rota de Ouro e Prata por bem 22 anos, servindo fielmente as cores da Lamport &
Holt até sua demolição em 1902, na Itália, em Gênova.
Não era um navio excepcional, bem ao contrário. Suas linhas de construção eram típicas
das de um cargueiro, com perfil baixo (só possuía dois conveses), casco alongado em linhas retas e sem superestrutura de popa. Sua capacidade de tão
somente 50 passageiros de primeira classe raramente se completava e em várias travessias oceânicas os passageiros não eram mais do que um punhado.
Inauguração em Santos - Coube, porém, ao Nasmyth uma distinção
particular, que o fez entrar nos registros históricos marítimos.
A primeira grande obra de construção civil na então Província de São Paulo foi a
ferrovia destinada a ligar o Interior ao porto de Santos. Constituída em 1859 pelo então senhor Irineu Evangelista de Sousa (o futuro Barão de Mauá)
com capitais ingleses incorporados à São Paulo Railway, a nova empresa iniciou as obras para ligar a cidade de Jundiaí, que
era entreposto do café produzido nas regiões vizinhas, e a cidade e porto de Santos, onde esse mesmo café era embarcado para o exterior.
Depois de sete anos de trabalho, a ferrovia foi completada em 1867, e sua inauguração
tornou evidente a necessidade da construção de um cais de atracação no porto de Santos.
Nessa época, o porto propriamente dito era constituído de trapiches de madeira
erguidos em diversos pontos ao longo da bacia do estuário e às margens da antiga cidade. Esses trapiches principais levavam os nomes de Trapiche da
Alfândega, do Arsenal, Onze de Junho, da Praia, do Consulado, da Capela, do Sal, da Banca e da Estrada de Ferro.
Este último era o mais próximo à estação da São Paulo Railway e era situado no chamado
Porto do Bispo. Este Porto do Bispo foi um dos principais ancoradouros de Santos no século XVIII e situava-se na área do Valongo. Neste trapiche
desembarcou em 1797 o bispo português Dom Mateus de Abreu Pereira, o quarto nomeado para a cidade de São Paulo, derivando daí o nome do trapiche.
Vinte e um anos depois da inauguração da ferrovia, em julho de 1888, foi assinado
contrato entre o Governo do Império e um grupo de concessionários para execução e exploração das obras de melhoramento do porto de Santos.
Quase quatro anos mais tarde, concluídos os trabalhos no primeiro trecho de 260 metros
de cais que se situava exatamente no antigo Porto do Bispo, as principais autoridades locais e da província assistiram, no dia 2 de fevereiro de
1892, à atracação do primeiro vapor no cais linear. Este vapor levava na proa o nome Nasmyth e na chaminé as cores azul, branca e preta da
Lamport & Holt.
O Nasmyth encontrava-se naquela ocasião sob o comando do capitão Holt,
aparentado à família do fundador da empresa. Havia largado as amarras do porto de Liverpool no dia 13 de junho de 1891 com destino a Salvador da
Bahia, Rio de Janeiro e Santos, onde chegou em 8 de julho.
Depois de longa estadia no porto santista - por razões desconhecidas (o vapor pode ter
sido retido no porto santista, ou por razões sanitárias - epidemias da época -, ou, afretado pela Cia. Docas de Santos, para servir como navio-apoio
na construção do cais linear) -, foi para o Rio de Janeiro em janeiro de 1892, voltando a Santos no começo de fevereiro para embarcar café destinado
à Europa. Era o início da viagem de número 40 e o início das operações da Cia. Docas de Santos no seu novo cais linear.
O navio, identificado como Nasmyth, com as velas desfraldadas e o apoio da
propulsão a vapor
Foto: jornal A Tribuna, caderno especial em 1942 sobre o cinqüentenário da Cia.
Docas de Santos
|