Imagem: reprodução da publicação original
As feiras-livres de Santos
O que viu e ouviu a nossa reportagem, na manhã de ontem, na feira do Campo
Grande - Um imposto sui generis
Lançadas
em 1923, as feiras-livres sofreram, logo após, uma interrupção prolongada, vindo a ser instaladas, novamente, há pouco mais de um ano.
Em se tratando de um assunto que interessa muito de
perto à economia da nossa população, achamos que seria proveitoso uma investigação sobre o que se tem conseguido com a implantação das feiras-livres
nesta cidade, após um ano de pleno funcionamento.
Deliberamos, pois, iniciar uma reportagem a respeito,
para o que visitamos, na manhã de ontem, a feira-livre do Campo Grande, justamente uma das mais movimentadas e que serve
à densa população daquele bairro, bem como aos moradores do Marapé, Nova Cintra e
circunvizinhanças.
A feira do Campo Grande, como já é do domínio público,
efetua-se no cruzamento da Rua Carvalho de Mendonça com a Avenida Bernardino de Campos, no local denominado
Vila Belmiro.
Alinhadas paralelamente aos passeios daquela via
pública, as barracas apresentam bom aspecto, no tocante à higiene e conforto.
À proporção que elas aumentam em número, vai se
estendendo o cordão formado pelas mesmas, já ocupando as margens do canal que fica ao centro da Avenida Bernardino de Campos, já se agrupando no
largo formado pela confluência daquelas rua e avenida com a Rua dos Guararapes.
Inúmeros são os comerciantes de secos e molhados, desta
cidade, que, com os procedentes da capital, concorrem para o desenvolvimento das feiras.
Caminhões, carroças e carrinhos de mão estacionam nas
proximidades, à espera do encerramento da feira, a fim de transportarem, de regresso, o saldo de mercadoria não negociada.
A feira, que se inicia habitualmente às 6 horas,
termina às 11 horas, quando os mercadores são advertidos por um toque de sineta, dado pelo encarregado da fiscalização, por parte da Prefeitura
Municipal.
Um segundo sinal avisa que estão definitivamente
encerradas as operações de venda e que as barracas devem ser prontamente desmontadas e removidas do local.
As barracas destinadas às verduras e legumes, por
exemplo, são de pequenos chacareiros das estações que marginam as linhas da Sorocabana e da S.P.R.
ou situadas à beira da rodovia que liga esta cidade à capital.
Outro tanto sucede com os fornecedores de ovos e
galinhas, que oferecem realmente regular vantagem, visto que apresentam à venda excelente artigo por preço bastante convidativo.
Os sacos de produtos - como açúcar, farinha e outros
similares, são cobertos por telas de gaze ou folhas de vidro, impedindo, assim, a penetração da poeira.
Igualmente estão os queijos, manteiga e demais artigos, protegidos contra as
moscas e o contato das mãos dos que têm por hábito examinar o artigo, apalpando-o e revirando-o muito a seu sabor.
***
Na verificação que fizemos, pudemos notar que vigoravam na feira livre do
Campo Grande os seguintes preços, tomando por base o quilo: açúcar, $800 e $900; batatas, $400, $450, $500 e $600; feijão, preto, mulatinho,
manteiga ou fradinho, de $400 a $500; farinha de mandioca, $500; arroz, $400, $500 e $600; milho, $500; charque, especial, 2$600, 1ª 2$200 e 2$000;
bacalhau, 3$000; mate, 1$600; carne de porco salgada, 3$000, 2$800 e 2$700; cebola, $500 e $600; paio, especial, 5$000; comum, 4$200; café (torrado
e moído), especial, 3$000, os demais, 2$000 (com 1 colherinha de brinde) e 1$800; chocolate em pó, 2$400 e 2$600; massas, 1$100, 1$200 e 1$300;
batata doce, $250; vagem, 1$400; tomate, 1$400; ervilha, 2$000; couve-flor (uma) 1$500 e 2$000; repolho (um) $800 e 1$000; peixe, corvina, 2$500,
galo, 1$100 e 1$200; tainha, 2$000; outras qualidades, 1$500, 1$800 e 2$000; camarão, 6$000 e 5$000; (camarão lagosta), 8$000; frutas, laranja,
$400, $500 e $600 a dúzia; tangerinas, $400 e $500 a dúzia; bananas, $200 e $300 a dúzia; abacaxi, $200, $300 e $400 cada um; galinhas, 4$000, 4$500
e 5$500; frangos, 3$600 e 3$500; ovos, 2$200 e 2$300 a dúzia.
Percorrendo a feira, tivemos a oportunidade de ouvir
vários meninos que se ocupam em transportar a mercadoria adquirida pelos compradores, mediante uns níqueis com que auxiliam seus pais, gente humilde
e que luta com dificuldades para obter o sustento da família, na maioria das vezes numerosa.
Esses menores, que usam - para transporte das compras
que lhes são confiadas - toscos carrinhos de madeira, são, todavia, sujeitos a um imposto de "locação", conforme tivemos ocasião de ouvir dos
mesmos.
Veio mesmo às nossas mãos um talão do Tesouro
Municipal, referente às feiras-livres, que assinala: "Locação rs. 1$000", e que foi fornecido a um dos meninos que se ocupam no transporte de
mercadorias como recebido da taxa de $400 que lhe foi imposta.
Estranhando tal fato, indagamos de um empregado da
Prefeitura Municipal sobre o que havia a respeito de tal imposto.
Disse-nos, então, textualmente o referido funcionário:
"Primeiro cobrávamos $400 cada carrinho; agora, essa taxa passou a ser de $200 apenas".
Estava, assim, confirmado o que nos dissera um pequeno
que conduzia um carrinho de madeira e que nos presenteou com um dos ditos talões, justamente o que possui o n. 022443.
Achamos descabida a cobrança de tal "imposto de
locação", tanto mais que se trata de meninos, alguns deles com 10 anos, apenas, que labutam penosamente durante toda a manhã para, na maioria das
vezes, não chegar a ganhar 2$000.
É deveras rigorosa a Prefeitura ao proceder dessa forma para com uma dúzia de
pequenos, que bem mereciam estar ainda numa escola, ou empregando a sua atividade de trabalhador precoce em outro ofício mais rendoso.
***
De várias pessoas que efetuavam suas compras na feira, indagamos da maneira
como eram servidas e a quase totalidade afirmava que, se bem não fizessem grande pechincha, era sempre razoável comprar mantimentos ali, onde a
concorrência ampla dava margem a uma pequena baixa de preços.
Quanto à qualidade das mercadorias, com algumas exceções, todos se davam por
satisfeitos.
***
Mas, convém reparar que as feiras já existentes não satisfazem plenamente a
população.
Em alguns bairros, por ficarem mais afastados, preciso
se torna a criação de feiras, a fim de que os seus moradores possam também gozar das vantagens que com as mesmas possam obter.
A Ponta da Praia, onde
reside um sem-número de operários e famílias de pescadores, não tem a sua feira-livre.
Os moradores daquele ponto extremo da cidade, para
poderem atingir a feira que lhe fica mais próxima, têm necessidade de ir até a Encruzilhada, para o que há necessidade de
tomarem o bonde 4, tanto mais que a distância que separa a Ponta da Praia daquele local é bastante longa, o mesmo
sucedendo se desejarem atingir a feira da Avenida Floriano Peixoto, no Gonzaga, que se acha
tão afastada quanto aquela.
Assim, fica evidenciada plenamente a necessidade de ser
instituída uma feira na Ponta da Praia, onde há locais amplos e de fácil acesso aos veículos e pedestres, visto que três linhas de bonde ligam
rapidamente aquele local ao Boqueirão, que assim seria também aquinhoado. |