VIII
Quando no dia 10 de fevereiro de 1912
Santos recebeu a dolorosa notícia da morte do grande e inesquecível brasileiro, o barão de Rio Branco, o luto em respeito a esse grande homem
alastrou-se por toda a parte. Além de outras demonstrações de pesar, os teatros foram fechados; recolhiam-se ao silêncio as diversões costumeiras:o
pranto era geral.
No dia 11, o Coliseu reabriu as suas portas, dando isso lugar a um
conflito naquele teatro. Muitos populares opuseram-se a esse alvitre da Empresa Cinematográfica: queriam que o luto se prolongasse por mais dias.
Foi essa oposição uma demonstração do respeito e carinho que os brasileiros consagravam e consagram à memória do ilustre morto.
Passado isto, voltemos as vistas para a casa da Rua Senador Feijó, 278,
antigo, onde reinava alegria, pois ali dava-se um enlace matrimonial, revestido de todas as galas, nada faltando para a completa felicidade dos
nubentes.
Terminado o ato das bodas nupciais, os convivas retiravam-se, deixando os noivos, por certo, no
início da lua-de-mel, entre carícias, doces afagos e tudo quanto consta do rol da noite de núpcias. Mas, egoísta de sua honra, como é e deve ser
todo o homem, o noivo Francisco Venâncio dos Santos pôs em dúvida a virgindade de sua noiva, Maria Luiza da Conceição. Desesperado, aturdido,
julgando-se vilmente traído, fere a noiva, deixando-a entregue aos cuidados da Santa Casa de Misericórdia, que, solícita,
socorreu a vítima do infortúnio, a esposa da necrópole...
Venâncio evadiu-se.
No dia seguinte ao deste desastre social, a natureza presenteou-nos com um
ciclone, ocasionando desastres no mar, sofrendo muito a Ponta da Praia e o Itararé. Alguns embarcadiços e viajantes
em pequenas embarcações foram vítimas dessa tempestade.
Cessou a tempestade dos elementos e surgiu outra em casa de Pedro Tabarula, que, furioso devido à
grande quantidade de álcool ingerido, amarrou de pés e mãos a amante, Raphaela Sacaneja, de 22 anos, cortou-lhe os cabelos e os supercílios. Assim,
defeituando a pobre Sacaneja, Pedro tirou uma desforra gratuita, pois a sua amante, segundo diziam, era uma verdadeira escrava dos seus caprichos e
de uma fidelidade a toda prova.
.................................................................
Procuremos agora os artistas e vamos esbarrar com eles
numa exposição de pintura iniciada e posta em prática por Mario de Mello. A esta exposição concorreu com belos trabalhos o nosso artista
conterrâneo, o Wladimir Alfaya, que a morte nos roubou tão cedo quando ele corajosamente trabalhava
conquistando aplausos em todas as ocasiões que expunha um trabalho seu.
***
A arrojada arte da aviação prometia visitar-nos. Corriam
notícias de que o aviador Garros viria de S. Paulo a Santos em 40 minutos, num Bleriot. A nossa população, no dia marcado, ansiosa esperava a
chegada de Roland Garros. Milhões de olhos levantavam-se para o espaço, para o infinito, a ver se lobrigavam o Bleriot.
De repente, explodiram as exclamações:
- Lá vem ele! É ele! E como vem rápido e sereno! Que belo!
Apontavam com entusiasmo um ponto preto, em forma de aeroplano, que se destacava no claro
horizonte.
O suposto Bleriot baixou mais. Não havia dúvida: era Garros que nos visitava pelo ar. Aclamações,
palmas, risos, assobios, estrugiam em profusão.
O ponto preto baixou mais ainda, muito mais, e... verificou-se com espanto, com decepção, ser um
representante das aves de rapina - era um corvo...
Horas depois, recebia-se telegrama avisando que fora
adiado para outro qualquer dia o raid de Roland Garros.
***
Para compensar o logro que levamos, 3 dias depois recebemos a ilustre
literata d. Julia Lopes, acompanhada de seu venerando pai, o sr. visconde de São Valentim. Realizou algumas conferências no
Real Centro Português, sendo a primeira sob o tema "Jardins da História". A ilustre conferencista foi fartamente aplaudida, deixando-nos
logo, pois ia a Poços de Caldas.
Em 1911, outro aviador francês, Planchut, visitou Santos, sobrevoando o Gonzaga
Foto: cartão
postal, coleção de Marcelo Tállamo |