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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - BIBLIOTECA - TEATROS
Memórias do Teatro de Santos (08)


Clique na imagem para voltar ao índice da obraComo em muitas outras cidades brasileiras, a memória do teatro santista raramente é registrada de modo ordenado que permita acompanhar sua história e evolução, bem como avaliar a importância dos artistas no contexto nacional, rememorando as grandes atuações, as principais montagens etc.

Uma tentativa neste sentido foi feita na década de 1990 pela crítica teatral santista Carmelinda Guimarães, que compilou depoimentos escritos e orais, documentos e outros registros, nas Memórias do Teatro de Santos - livro publicado pela Prefeitura de Santos em 1996, com produção de Marcelo Di Renzo, capa de Mônica Mathias, foto digitalizada por Roberto Konda. A impressão foi da Prodesan Gráfica.

Esta primeira edição digital em Novo Milênio foi autorizada pela autora, Carmelinda Guimarães, em 6 de janeiro de 2011. O exemplar aqui utilizado foi cedido pelo ator santista Osvaldo de Araujo:

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Memórias do Teatro de Santos

Carmelinda Guimarães

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Primeiros Teatros

Bandeira Júnior – A Tribuna, 16/5/93

Nossa primeira casa de espetáculos resultou da adaptação de um prédio inacabado, obra do século XVIII destinada ao hospital da Santa Casa de Misericórdia, no Largo da Misericórdia (e sucessivamente, da Coroação, do Chafariz e atual Praça Visconde de Mauá), esquina da Travessa do Teatro (11 de Junho e Rua do Riachuelo).

Pesquisa do professor Costa e Silva Sobrinho revelou a existência desse teatro antes de 1830, o que lhe confere o título de um dos mais antigos do País, não obstante estar ausente da obra O Teatro no Brasil, de J. Galante de Souza (Rio, 1960).

Em 1854, o Teatro de Santos abriu completamente reformado, diz Costa e Silva: "...a fachada toda pintada de novo e o tom castanho do óleo a brilhar nas cinco portas da Rua do Campo, denominação esta mais tarde desaparecida, para formar o Largo do Chafariz, ou da Coroação, hoje Praça Visconde de Mauá".

"As paredes, teto, assoalhos, assentos etc., tudo foi reformado e pintado com gosto e simplicidade" (Revista Comercial – 30/1/1854).

A direção do teatro apelava para o público de Santos para que auxiliasse "com sua concorrência este espetáculo, em atenção às despesas que se fizeram, visto que, por infelicidade, nenhum outro divertimento se encontra nesta cidade" (idem).

Os preços cobrados eram: camarotes de primeira ordem 7$000 (sete mil réis); de segunda ordem, 6$000 (seis mil réis) e platéia, 2$000 (dois mil réis).

Nesses espetáculos, os santistas tomaram conhecimento de consagrados autores teatrais como Gil Vicente, Antonio José (O Judeu), Gomes Amorim, Giarret, Gomes Leal, Burgan, Beribe, Dumas (pai e filho), Gonçalves Magalhães, Porto Alegre, Martins Pena e outros.

O empresário-ator Domingos Martins de Souza acabou adquirindo da Santa Casa o velho teatro em 12/11/1859.

Mesmo depois de reformada, nossa pioneira casa de espetáculos (com palco, rotunda, pano-de-boca, a clássica caixa de ponto, camarotes e platéia) obrigava os espectadores a levar cadeiras, se quisessem sentar...

Apesar dessa deficiência, nosso teatrinho foi visitado por importantes companhias nacionais e estrangeiras como: a Lírica Italiana (Lúcia de Lamemor – 1861), a Zarzuela Espanhola (1862), as dramáticas de Sales Guimarães, Di Giovanni e inúmeros grupos amadores de Santos e São Vicente.

Igualmente nesse teatro ocorreu o primeiro 'bal masqué' dos foliões santistas, no Carnaval de 1851, e com tal sucesso que se repetiu por muitos anos, dentro e fora do tríduo momístico, como o anunciado para agosto de 1859, aliás de muito mau gosto...

A "pequena e úmida casa de armazém" que "como teatro era um escárnio à face de civilização", segundo o Diário de Santos, alcançou sua noite superlativa no recital do pianista e compositor americano Luiz Moreu Gottschalk, quando executou sua belíssima (e difícil) Fantasia sobre o Hino Nacional Brasileiro, em 6/9/1869.

Lamentavelmente, o insigne artista dos teclados faleceu três meses depois, numa clínica da Tijuca, Rio de Janeiro (18/12/1869).

Com o boato de que estava prestes a ruir, a centenária edificação deixou de funcionar como teatro em 1879, porém, com pequenos reparos, ela ainda serviu como armazém cafeeiro e, já neste século (N.E.: século XX), foi filial das Casas Pernambucanas e loja Duarte Pacheco, pioneira no ramo de material radiofônico.

Demolida na década de 40, deu lugar ao Edifício Novo Mundo, que inclui o Banco Econômico.

Em abril de 1879 abria, provisoriamente, o Skating Rink, em terreno cedido pela Câmara Municipal na Rua São Francisco, esquina do Largo do Itororó (Praça Correia de Melo), oficialmente inaugurado pelo seu diretor, major Antonio Eustaquio Lagarcha, no dia 7 de setembro desse ano.

Armado em zinco e madeira, o Rink era admiravelmente versátil, podendo promover, além da patinação, luta romana, corrida de touros, atividades circenses, teatrais e dançantes – mormente para festejar Rei Momo. Aliás, foi com grandioso baile na noite de São Silvestre de 1889 que o Rink encerrou suas portas, ao ser superado por concorrente mais poderoso: o Teatro Guarani.

No que restou do Rink foi instalada, pelo Governo Estadual, a Comissão de Saneamento, depois Repartição do Saneamento e hoje Sabesp.

Com ruidosos festejos foi inaugurado, na noite de 8/12/82, o Teatro Guarani, projeto e obra do engenheiro Garcia Redondo, com pinturas de Benedito Calixto, apresentando em seu palco o drama Mário – extraído do romance Marthe de Kervin, por Eduardo Capendu, e vertido ao vernáculo pelo próprio Garcia Redondo. Durante os intervalos a orquestra, sob a batuta do maestro Luiz Arlindo da Trindade, executava trechos da ópera de Carlos Gomes, inclusive a arrebatadora Protofonia.

A nova casa de diversões, instalada em local privilegiado, no recém-inaugurado jardim da Praça dos Andradas, pertencia aos srs. Francisco Martins dos Santos (pai do futuro biógrafo de Santos), Joaquim Xavier Pinheiro e José Viana que, posteriormente, a doaram à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia.

O Guarani teve sua noite de glória em 30/6/1886, quando encenou A Dama das Camélias com a divina Sara Bernhardt, em carne e osso (mais osso que carne, no dizer de Zola...).

Nos carnavais de 1930 a 36, esse palco serviu de passarela para os concursos de choros, ranchos e blocos, promovidos pelos cronistas carnavalescos Espião da Esquina (Décio Villares de Andrade), V. Neno (Esmeraldo Tarquínio de Campos), Reco Reco (Oswaldo Du Pain) e outros.

À medida que os interesses sociais de Santos convergiam para a zona praiana, começava a decadência das casas de diversões (oito cinemas) e clubes (mais de 12) do centro comercial. Atualmente, dos clubes, resta o Centro Português – com o teatro e o salão camoniano que é uma das coisas mais belas da arquitetura praiana.

O primeiro Coliseu Santista projetado por sociedade local (formada pelos srs. José Luiz de Almeida, Heitor Peixoto, Ricardo Travassos e Henrique Porchat de Assis), em meio às obras, foi encampado pela União Sportiva, da Capital, que o transformou em frontão e velódromo, duas práticas esportivas em grande voga no fim do século XIX. A nova entidade atlética começou com grande alvoroço em 19/7/1897, para dois anos depois fechar. Reabriu para o jogo da pelota basca em 1901 e, nesse mesmo ano, faliu ruidosamente. Seus bens foram adquiridos em hasta pública (14/8/1903) pelo capitalista Antonio Ferreira de Carvalho e constava de vasto terreno (4.808 m²), na esquina das ruas General Câmara e Conselheiro Nébias (lado direito).

O Teatrinho Variedades – construído em persianas de madeira, próprias para o clima tórrido de Santos – por Manoel Teixeira da Silva & Cia., pelo preço de 42.000$000 (quarenta e dois mil contos de réis), na esquina da Praça dos Andradas com Rua XV de Novembro (lado par), foi inaugurado em 3/12/1899, com a comédia Mosquitos por Corda, do lusitano Eduardo Garrido, desempenho a cargo do Grupo Dramático Arthur Azevedo. Vendido em 1902, o Variedades virou café-concerto, filial do Moulin Rouge, famoso cabaré de São Paulo, e esta foi sua melhor fase.

Nesse ambiente de boemia não e de admirar que o Carnaval começasse na "quinta-feira das comadres", isto é, três dias antes, sendo que, em 1902, para incentivar o uso de fantasias, a direção do Variedades instituiu concurso onde foi escolhido o Rei Momo (mais antigo do Brasil), Waldemar Esteves da Cunha, que ocupou o posto por 41 anos (1950/1991).

O teatrinho da Praça dos Andradas – que testemunhou o nascimento do primeiro time de futebol do litoral paulista (07/11/1902, aquele mesmo futebol que, através do Santos F. C., chegaria ao topo do mundo!) - encerrou as atividades depois da fracassada tentativa de transformá-lo em cinema (abril de 1903).

No terreno antes ocupado por unidade de cavalaria da Força Pública, entre as ruas do Rosário (João Pessoa), Amador Bueno e Braz Cubas – o Caminho da Barra Grande dos primórdios da Vila de Santos – o empresário carioca Francisco Serrador fez construir o segundo Coliseu Santista para funcionar como cinema e teatro em 23/7/1909, com sessão cinematográfica cuja renda reverteu em favor da Santa Casa.

O novo cine-teatro possuía "um aperfeiçoado aparelho cinematográfico e foi construído com muita segurança, sendo os pilares de tijolo e cimento, amparando estes as galerias". A platéia media 22 metros por 40, comportando 800 poltronas.

Para melhor ventilação, das galerias ao teto o tapamento era de madeira semelhante a venezianas. O salão era iluminado por 400 lâmpadas elétricas. Fora do teatro havia um terraço onde foram colocadas mesas e cadeiras. Nesse local, destinado ao buffet, foi servida fina mesa de doces, salgados, champanha, cerveja e o indefectível Port d'honneur.

O anúncio esclarecia que o povo de Santos teria o prazer de assistir à sessão cinematográfica ao mesmo tempo em que praticava ato de caridade.

À cerimônia de inauguração compareceram as autoridades, principalmente policiais, sendo a imprensa representada pelos srs. Lopes Ventura, da Vanguarda; Antonio Augusto de Barros, de A Tribuna; Júlio Santiago, de São Paulo; Astrogildo de Andrade, do Estado de São Paulo; Carlos Martins, do Jornal do Comércio; Dirceu Ferreira, da Cidade de Santos, e Alberto Campos, do Diário de Santos.

Alguns anos depois, o Coliseu passou às mãos do santista Fins Freixo, que realizou grandes reformas: no teatro aumentou dois andares; o pátio de entrada foi substituído por artístico hall encimado por moderno salão de baile (o célebre cabaret do Coliseu).

Terminadas as obras, o nosso melhor teatro (até hoje) foi reinaugurado em 21/6/1924, com a peça A Bela Adormecida, assinado pelo sr. Carlos de Campos, presidente do Estado de São Paulo, que se fez presente e foi veementemente ovacionado antes e depois do espetáculo.

Reciclado tecnicamente, pôde o Coliseu, em 1929, entrar na era do movie talkie, pois na noite de 28 de setembro exibiu, com muita propaganda, o filme Broadway Melody, falado, cantado, musicado e dançado, por esforço da Empresa Cine-Teatral (leia-se Manoel Fins Freixo) que, na seqüência, apresentou o Follies-1929 e o fabuloso O Cantor de Jazz, com Al Johnson, considerado então o maior crooner dos Estados Unidos.

Em oitenta e quatro anos de gloriosa existência, nosso Coliseu recebeu em seu palco os mais renomados artistas nacionais e estrangeiros, mormente da música lírica; conseqüentemente, sua noite insuperável aconteceu em 23/09/1936, quando foi representada a ópera O Guarani, de Carlos Gomes, com a soprano Bidu Sayão, o nome mais expressivo do bel-canto nacional; o corpo de ballet do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, sob a direção da famosa Maria Olenewa; coral e orquestra com 70 componentes e a prestigiosa presença da escritora Ítala Gomes de Moraes, filha do expoente máximo da música sul-americana, maestro Carlos Gomes.

No Carnaval, o Coliseu teve papel preponderante. Por ser maior e mais confortável, a partir de 1937 foi passarela para os concursos das entidades ditas "de rua", que se apresentavam dos fundos (rua diretamente no palco, entrando pela porta da João Pessoa).

Ocupando o teatro (vestíbulo, platéia, camarotes, frisas, palco) e o salão (antigo cabaré), o Santos F.C. (1934/59) e depois o Nacional A. C. (1950) realizaram bailes de carnaval.

Voltando ao teatro, vale a pena destacarmos detalhes técnicos importantes, como a acústica perfeita. Basta lembrar que os artistas do palco eram ouvidos tanto pelos espectadores da platéia (ao rés do chão) como do quarto andar, nas populares torrinhas (hoje diríamos galeras), numa época em que se desconhecia o milagre eletrônico dos microfones e caixas de som.

A Inconveniência de Ser Esposa: da esquerda para a direita, Iracema Carvalhal, Célia Ferraz, Ednor Messias, Antonio Carvalhal. No alto, Silvio Ropa

Foto publicada com o texto