Teatro Parque Balneário
Com a onda dos cassinos, surge no Gonzaga o
Teatro Cassino Parque Balneário, uma das mais tradicionais casas de espetáculos e cinema. Foi em 1923, a inauguração contou com a representação
da Companhia Francesa de Revistas Bataclan. Outra opção na época do teatro de revista era o Cassino Monte Serrat que, em
1927, levava os passageiros gratuitamente no "bondinho".
Outros espaços
Entre 50 e 60, apareceram outros espaços para o teatro,
que não só os das sociedades e clubes. O Círculo dos Operários de Santos, com uma pequena sede na esquina da Rua da
Constituição com Marechal Pego Junior; Associação Atlética Portuguesa (no estádio Ulrico Mursa) e o Teatro
Sesc-Senac, que ficava na Avenida Conselheiro Nébias, 303, conhecido como teatro de arena, ou
dos comerciários.
Um teatro de estilo elizabetano. Tinha as poltronas da platéia
dispostas em ferradura, comportando mais espectadores. E sua proposta era para ser de uso exclusivo de grupos amadores. No ano de 1960, a peça que
estreou para a inauguração foi o Santo Milagroso, de Lauro Cesar Muniz. Depois estava programado Os Físicos, pelo grupo dos
Independentes e o Infantil, O Pequeno Reformador, de Roberto Villani, com o grupo da Sociedade Cultural Teatro Evolução.
No It Clube, que ficava no canal 2, foi improvisado um palco
para que pudesse acontecer o I Fextin – Festival Experimental de Teatro Infantil, idealizado por Villani e organizado pela Federação Santista de
Teatro Amador, sob a presidência de Carlos Pinto no ano de 1969. Depois o Fextin foi incorporado ao Festa.
Da iniciativa de um grupo de estudantes do Colégio Martins
Fontes nasceu o TEN – Teatro Estudantil de Novos, que depois passou a usar o teatro de arena do Sesc. O grupo iniciou-se com a montagem de Toda
Donzela Tem um Pai Que é uma Fera, dirigido por Reinaldo Pereira. Em seguida encenou-se o Santo Inquérito, uma adaptação da peça O
Santo Inquérito, de Dias Gomes, que foi dirigida por Antonio Carlos Morezetti.
Um ano depois veio CIA – Coletânea de Informações Absurdas, de
Tabajara Campos. Mas nenhum desses espetáculos fez sucesso. Até que se uniram ao Gene e veio Testemunha de Acusação, dirigida por João Zibel.
Depois seguiram-se: Pedreira das Almas, Um lobo na Cartola, O asfalto, A Inconveniência de se ter Coragem, Parallelus
e A Falecida, estas duas últimas já sofrendo corte da Censura Federal.
O grupo foi um dos poucos que sobrevivia à fase difícil que
foram os anos 70, com a ditadura militar e a falta de público. O elenco completo do TEN era: Cláudio Ribeiro,Marlene Marques, Carlos Gilberto,
Valter Rodrigues, Tabajara Campos, Juarez Sonigg, Elisa Corrêa, Isamar, Maria Tereza Alves, Aparecida Celestino, Adolfo Andrade, Levy Deodato,
Sergio Gomes, Elmo Cardoso, Mário Vaz Filho, Lealdo Maia, Stelo Gonzales, Ana Maria, Neuza, Odair, Amilcar e Ronaldo. O grupo era extremamente
organizado e sólido, com registro em cartório (pesquisa de Vanessa Campos).
Minhas primeiras imagens da cidade são do tempo da
guerra. Nasci em 1939. A guerra terminou em 45. Minha mãe foi da primeira turma de normalistas da Escola José Bonifácio. Meu avô materno era fiscal
aduaneiro.
Meu avô paterno era italiano, capitão de longo curso, que
viajou o mundo inteiro. Falava onze línguas e estabeleceu-se em Santos com mais de 50 anos, onde casou-se com minha avó. Como bom italiano, gostava
muito de arte e transmitiu isso para os sete filhos.
Minhas primeiras lembranças são de uma vida diferente. Minha
mãe saía para trabalhar, não tínhamos empregada e eu e meu irmão esquentávamos nossa comida. Tivemos uma visão muito democrática de convivência, com
bastante autonomia. Nos finais de semana quem cozinhava era o meu pai. Era uma família moderna para a época (década de 40).
Meus pais gostavam de teatro e cinema. Meu primeiro contato
com a arte foi através do cinema. Eu ia muito no Carlos Gomes, ali na Ana Costa, no Bandeirantes na Lucas Fortunato, na
Matinée Baby do Cine Atlântico, onde um
show de luzes esverdeadas aparecia nas paredes quando apagava a luz e depois, as imagens na tela na sala escura.
Meu imaginário foi formado dentro desse universo do cinema.
O cinema tinha o papel que a TV tem hoje. Santos tinha uma grande agitação cultural. As grandes companhias de teatro estrangeiras, antes de partir,
passavam por aqui e se apresentavam no teatro Coliseu.
Duas coisas marcaram a minha infância: os artistas que se
apresentaram no Clube Internacional de Regatas e as notícias da guerra. Meu pai era responsável
pela parte recreativa, social e cultural do clube. Ele trazia integrantes do elenco das rádios, que naquela época tinham um papel importante.
Várias vezes Jorge Goulart, Nora Ney, Hebe Camargo
participaram da nossa mesa nos bailes do clube. Uma vez vieram até artistas internacionais como Glenn Ford, Eleanor Powell e Mary Martin, casada com
um produtor da Broadway e que comprara uma fazenda em Goiás.
Me lembro aos quatro ou cinco anos de ler o noticiário da
guerra pela A Tribuna. Me impressionavam os acontecimentos
relacionados à guerra: o racionamento de leite e pão, as notícias dos bombardeios, o fato de uma senhora alemã, nossa vizinha, vir escutar o rádio
em nossa casa porque o dela fora confiscado.
Lembro também da participação comunitária da cidade. Como as
pessoas se conheciam, se freqüentavam, ocupavam os espaços urbanos, o bonde era um espaço de convivência social. Todo mundo
se falava, comentava coisas da cidade. Tínhamos prazer em receber os turistas.
Quando demoliram o Parque Balneário foi como se tivessem
tirado um pedaço de mim. A Cadeia Velha, por exemplo, era uma coisa sombria, sinistra, por causa dos presos. Mas quando se pensou em demoli-lo para
passar uma avenida, fui contra e me engajei em sua defesa. O antigo prédio da Santa Casa Velha era extraordinariamente bonito e foi destruído pra
fazer o túnel.
Fazia parte do folclore virmos ver os bichos-preguiças na
Praça dos Andradas. Me lembro da procissão do Senhor Morto, na General
Câmara, que era linda, de emocionar, como um espetáculo com seus cânticos. Outra manifestação de rua importante era o Banho
da Dorotéia.
Íamos a São Paulo nas férias para assistir teatro, de roupas
novas compradas no crediário de lojas de departamento como o Preço Fixo. Tudo isso era parte da vida cultural de uma
família classe média, que vivia controladamente, contando seu dinheiro, mas com uma decência e dignidade que a gente perdeu nesse processo todo.
O Coliseu foi importante não só como teatro mas também como
cinema. Foi onde assisti todos os filmes da Atlântida. Eram sessões ininterruptas, as pessoas vinham de todo canto da cidade e as filas eram
enormes. Não se podia perder um filme de Oscarito e Grane Otelo porque você ficava em falta com a cultura brasileira, da qual fazia parte o teatro
de revista, uma vertente que ficou meio esquecida e ainda não foi recuperada. Por não ter idade suficiente, nunca pude ver uma companhia de revista.
Mas lembro a repercussão que elas tinham na vida da cidade. Eram um acontecimento.
Meu pai organizava festas, carnavais e bailes no
Internacional, com decorações que eram verdadeiros cenários. A chegada dos navios também era um acontecimento. Me lembro de meu pai organizando uma
festa para a despedida de um navio português. Parecia o Amarcord e La Nave Va de Fellini, identifiquei depois ao ver estes filmes.
Meu irmão e eu representávamos espetáculos de teatro nos
fundos do quintal de casa, tendo como partner uma empregada.
Cobrávamos ingressos e com o dinheiro comprávamos balas. O Cláudio começou a participar de operetas na escola bem antes do que eu. Eu achava o ator
um ser tão místico, que não tinha coragem de pisar num palco na escola.
Só mais tarde, em 1955, comecei a representar na Aliança
Francesa com Odila de Barros Pimentel, Beatriz Forbes, Tereza de Almeida, Joaquim Augusto de Souza Jr. e Milene Pacheco na peça
Revélation, dirigida por Roland e Monique Graf, diretores da Aliança, em francês.
A sensação que eu tive no momento de pisar o palco pela
primeira vez era que havia uma parede de vidro e eu não conseguia me mover. Alguém me empurrou e comecei a dizer o texto com a segurança que o
ensaio dá. O personagem era um mordomo e depois de dez minutos em cena já estava adorando e não quis parar nunca mais.
Santos tinha uma visão cosmopolita do mundo, que era dada
pelo porto. Embora não fôssemos a metrópole, o porto era uma porta aberta para o mundo. Todas as viagens se faziam a partir de Santos, que teve um
papel muito importante na vida cultural e política deste país. A lição de luta política dada pelos trabalhadores do porto foi um exemplo na minha
vida.
Havia a figura de Patrícia Galvão magnetizando e
polemizando. Ela gostava muito de falar com os jovens e sua presença era muito estimulante. Foi um período rico e forte para a cidade. Depois Santos
se transformou num balneário e me deu muita pena não ter os bondes, o Coliseu ficar como ficou, a luta para construir o Teatro
Municipal, a perda do Teatro Independência, que hoje é discoteca.
O Independência era uma gracinha de
teatro. Vi Cacilda Becker se apresentando lá com Raízes. Tinha uma
platéia confortável, palcos, bons camarins, era bem localizado, na praia.
Embora tenha me distanciado muito
de Santos pelo envolvimento com minha vida profissional, voltei várias vezes como ator e convivi na cidade durante muito tempo. Mas ultimamente
tenho me envolvido e participado da luta eleitoral da cidade, onde vim dar apoio ao David. Participei de um Congresso há um ano com grupos da cidade
e estou informado sobre a vida cultural de Santos através da Carmelinda. Me sinto bastante ligado a Santos.
Sérgio Mamberti. |