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Edição 124 - SET/2003 

Turismo

"Mais um dia... no Litoral"

Novo Conselho Estadual de Turismo quer convencer os viajantes a negócios a ficarem um dia mais em São Paulo

Carlos Pimentel Mendes (*)

"Em pouco mais de uma semana, 196 municípios do Estado de São Paulo aderiram à idéia de incentivar o intercâmbio de turistas, informações e projetos, entre as cidades paulistas". Parece notícia do jornal de hoje, mas foi publicada por este jornalista em 2/12/1977 no jornal santista A Tribuna. No momento em que o secretário da Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento Econômico e Turismo, João Carlos Meirelles, anuncia que o turismo é – mais uma vez – uma das prioridades do governo paulista para a geração de emprego e renda, vale a pena refletir sobre o que foi feito no setor no quarto de século que se passou desde aquela publicação.

Disse em 1977 o então secretário interino de Turismo de Santos, B. Franco: "Pretende-se sobretudo criar no Estado uma mentalidade turística verdadeira, não somente para o poder público, mas também para o povo (turista em potencial) e para aqueles que se envolvam comercialmente no turismo, a fim de que – esses últimos principalmente – acabem com a mentalidade de tirar dinheiro do turista num dia só. O turista bem tratado sempre volta e é um propagandista da localidade que visitou".


São muitas as opções para entreter o turista no Litoral: de passeios pelas belezas naturais a roteiros pelo rico patrimônio histórico, berço da nossa civilização

É inegável que hoje existe uma preocupação um pouco maior com o turismo, mas se lembrarmos, para comparação, como o movimento ecológico começou e evoluiu nesses 25 anos, fica evidente o enorme descompasso entre ambos e o atraso da Baixada Santista, de São Paulo e do Brasil em termos de mentalidade turística. Hoje, já se pode até dizer que existe uma mentalidade ambientalista, mas não há ainda a mentalidade turística que encontramos em outros povos ao redor do mundo.

A idéia do intercâmbio não prosperou. Ainda hoje, mesmo estando constituída há anos como região metropolitana, a Baixada Santista não tem implantado um projeto integrado de atração do turismo nacional e internacional, capaz de atender prontamente ao chamado do governo estadual, que anunciou planos para a atração do turista de negócios: são 6 milhões de pessoas por ano, que comparecem a exposições, congressos, feiras e seminários, e que poderiam permanecer mais um dia no Estado de São Paulo, conhecendo lugares de interesse.

O que é preciso – Para atrair esse turista, é importante contar com uma boa infra-estrutura de atendimento (e é neste sentido que as autoridades santistas estão se movimentando). Porém, só isso não basta. É preciso desenvolver um trabalho específico para que esse turista sem tempo possa aproveitar da melhor forma a sua estadia na região, chova ou faça sol, com alternativas para todos os gostos. Não basta que existam os equipamentos, é preciso um roteiro específico que inclua os traslados entre as atrações visitadas e os hotéis e aeroportos, guias especialmente treinados no atendimento às necessidades desses turistas, facilidades de comunicação destes com suas empresas (acesso Internet, fax) em pontos estratégicos do roteiro, segurança com preparo para lidar com situações imprevistas. Tudo isso embalado em uma identidade específica que não deixe a idéia de pacotes fragmentados, costurados

E é preciso que os órgãos de turismo das várias cidades conversem entre si, pois um dos atrativos da região é o fato de ser o berço da colonização brasileira, e muitas vezes a história que começa em São Vicente continua em Santos ou em Cubatão. Um exemplo flagrante é representado pela Serra do Mar, onde falta um roteiro – já há muito tempo planejado, nunca executado – para mostrar aos turistas como os índios e depois os portugueses conquistaram o altiplano paulista, usando a cada momento a mais avançada tecnologia viária do mundo (na Calçada do Lorena, que rivalizava em sua época com as melhores estradas européias e na ferrovia Santos-Jundiaí, com projetos ingleses e execução brasileira). No mesmo roteiro, vale citar a usina Henry Borden, que fascinou engenheiros de todo o mundo pelo arrojo da idéia de desviar um rio para jogar suas águas serra abaixo e assim gerar a eletricidade que impulsionou o crescimento da Grande São Paulo. 

Com grandes atrativos também para os amantes da natureza, e paisagens deslumbrantes que – se conhecidas – poderiam ser um dos grandes cartões postais do mundo, a região (por onde passou D. Pedro I a caminho de proclamar a Independência) essa área está entretanto abandonada, numa situação que poderia ser revertida se todos os municípios da região se unissem no sentido de obter das autoridades as necessárias licenças ambientais e para melhorias e uso do parque estadual.

Anoitece na Ponta da Praia, em Santos
Foto: Decom/Prefeitura Municipal de Santos

Encantamento - Roteiros que contem as histórias do início do Brasil, em meio a cenários paradisíacos de praia e serra, com direito a passeio em bondes históricos e trens turísticos, e tendo uma infra-estrutura que dê ao visitante apoio e segurança constantes, podem servir como peças-chave para a atração de um grande contingente de turistas. Que não se encantariam apenas com chavões - importantes, mas não só eles - como a beleza das praias da região.

A palavra chave é encantar o turista, fazendo com que ele queira voltar sempre para conhecer mais, ou ficar mais tempo na região. E a Baixada Santista têm diversidade e riqueza cultural mais do que suficientes. Que visitante não gostaria de voltar à sua terra dizendo que visitou a terra da Ypupiara (São Vicente), percorreu os mesmos caminhos do Boitatá (Cubatão), conheceu os caminhos do Atlântico para as minas do El Dorado (o caminho do Peabiru, em direção às minas dos Andes peruanos começava em São Vicente), pisou o mesmo chão que Hans Staden (Bertioga)? 

A Baixada Santista pode até se gabar de ser o portal de entrada no Paraíso Terrestre: na época em que o Brasil era conhecido como a Terra dos Papagaios, ocorreram grandes debates entre os teólogos europeus, muitos deles afirmando que o Paraíso ficava na América do Sul, não por acaso uma terra em forma de coração, com os quatro rios bíblicos (seriam o Amazonas, o Prata, o São Francisco e o Orinoco), a flora e a fauna exuberantes, a dificuldade do acesso (pela Serra do Mar). O turista poderia inclusive afirmar que cruzou a lendária trilha de São Tomé (que teria vindo da Índia para o interior da América do Sul, passando pela Baixada Santista, fazendo milagres ao longo da trilha do Peabiru até as minas de prata de Potosi, na Bolívia, e o lago Titicaca, no Peru).

Não bastassem as lendas, a região pode ainda oferecer ao turista relatos sobre as curiosas figuras de João Ramalho e do bacharel de Cananéia, ou sobre os túneis secretos de Santos, e como a padroeira de Santos defendeu a então vila de um ataque pirata. Os turistas podem ainda conhecer os vários fortes que defendiam a região contra os ataques dos corsários... São enfim tantas histórias que muitas vezes nem os habitantes da região sabem. Devidamente pesquisadas, transformadas em roteiros de visitação bem elaborados, encantarão visitantes de todas as idades, que assim levariam para suas terras uma lembrança inesquecível da estada na região. Atraindo novos turistas. Que, com a fama criada, certamente gostariam de conhecer esta pitoresca região – mesmo que por um dia apenas.

(*) Carlos Pimentel Mendes é jornalista, editor do jornal eletrônico Novo Milênio.

Pérgula do Boqueirão, em Santos
Foto: Decom/Prefeitura Municipal de Santos