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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SANTOS EM... - BIBLIOTECA NM
1915 - por Carlos Victorino (21)

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Carlos Victorino apareceu na imprensa santista como tipógrafo no jornal Gazeta de Santos (de 1883) e reapareceu como revisor no Jornal da Noite, criado em 1920. Também escreveu para teatro e nos gêneros romance e comédia.

Suas lembranças de Santos, vivenciadas entre 1905 e 1915, foram reunidas na obra Santos (Reminiscências) 1905-1915, cujo Livro II (com 125 páginas) foi em 1915 impresso pela tipografia do jornal santista A Tarde (criado em 1º/8/1900). O Livro I, correspondente ao período 1876-1898, já estava com a edição esgotada quando surgiu a segunda parte.

Nesta transcrição integral do Livro II - baseada na 1ª edição existente na biblioteca da Sociedade Humanitária dos Empregados no Comércio de Santos (SHEC) -, foi atualizada a ortografia:

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Santos (reminiscências) 1905-1915

Carlos Vitorino

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XX

Outra onda artística vem deleitar-nos, rodeada de triunfos, numa impetuosidade glorificada: às 7 horas da noite, o singelo coreto levantado no centro da Praça Mauá recebia a corporação musical dos Bombeiros, que trazia em seu programa-concerto uma peça nova, de principiante na divina arte.

Era a valsa Primeira Impressão, da menina Carvalhal, filha do conceituado dr. Manoel Carvalhal. A execução da Primeira Impressão foi magistral e as ovações à jovem autora foram delirantes. Realmente, a Primeira Impressão causou boa impressão aos ouvintes, fazendo acreditar num futuro gênio musical para Santos. Patricio instrumentou a Primeira Impressão com muito gosto.

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Entra, logo depois, no Coliseu, com toda a galhardia, a Companhia Galhardo, trazendo em seu repertório galhardas peças teatrais.

Fez boas casas e ruidoso sucesso e, depois, quando cansou o repertório, a Companhia Galhardo galhardamente retirou-se de Santos.

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Mais tarde, estoura das campanas dos instrumentos musicais outra adorável composição da senhorita Novita - a valsa Primicias -, executada com brilhantismo pela Banda do Corpo de Bombeiros, no coreto do jardim da Praça dos Andradas, e magistralmente instrumentada pelo talentoso músico daquela corporação, o sr. André Buongermino, e habilmente regida pelo nosso patrício maestro - o Patricio.

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Agora estamos no salão de honra do Centro Republicano Português. Ensaia-se a peça Vampiros Sociaes. Os amadores encarregados dos papéis mostram rara habilidade para o palco.

A convite do amador Amadeu Vianna, fui prestar uma pontinha de auxílio nesses ensaios, e aí senti-me bem junto àqueles rapazes duma educação esmerada e dotados de talento para a interpretação da arte de Talma.

Estava pois a jogar com eles um duelo de arte, e eles obedeciam à minha fraca opinião sobre a compostura dum gesto, a dicção duma frase, a linha do corpo, o modo de pisar, a expansão na cólera e a benevolência do perdão; a gargalhada do cômico, o pranto da ingênua, a severidade do centro-nobre, o ardil canalha do cínico e a nobreza do galã.

Tudo isto os distintos amadores fizeram com verdadeira arte, colhendo muitos aplausos da platéia do Carlos Gomes, em Vila Mathias. Merecem eles que os seus gloriosos nomes como amadores aqui fiquem estampados, pois a glória para o ator do drama Vampiros Sociaes deve ser dividida entre Amadeu Vianna, que é consagrado desde o palco do Real Centro Português, quando, entre outras peças ali representadas, conquistou vitórias no drama O Sorvedouro, fazendo o protagonista; J. Moraes Sarmento, Arthur Carbone, Vicente Bruno, Jorge Schmidt, A. Valente e a senhorita Guiomar Schmidt. Foi este o inteligente conjunto que desempenhou com inigualável correção do drama Vampiros Sociaes.

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Euclides Andrade, um dos fundadores do jornal A Tarde

Foto e legenda publicadas com o texto

Depois, o tufão das Novidades atirou-nos uma carga de jornais novos, aparecendo em primeiro lugar O Noroeste, sob a inteligente direção do sr. Souza Filho. O Noroeste não vingou, por ser um noroeste pacífico, sem o calor torrificante e insuportável de palavras mal polidas e polêmicas jogadas em linguagem desbragada, dessa linguagem por demais aberta e afinada num diapasão grotesco. O Noroeste era um conjunto de leitura amena, sensata e portanto proveitosa.

Logo depois, surge a Actualidade, cujo pai foi o nosso popular e amigalhão velho da imprensa - o Cartolinha. Mas, o Cartolinha, que não tem muita paciência para agüentar crianças, deu-a ao Pedrinho, que é pai de filhos e sabe como se educa uma menina, mormente uma menina de imprensa. E o Pedrinho a tem sustentado com paternal carinho, dando-lhe uma educação primorosa.

Mal nascida, com tal ou qual desalento, apareceu-nos a Vida Santista, de Quintino de Macedo e Petrarchi. Deu apenas, a Vida, dois sinais de vida em dois bons números, e... morreu...

Desenfreou-se então O Cupido, semanário literário e... amoroso. Não sei por quê, rapidamente, O Cupido abandonou as setas, a aljava e os corações gotejantes de volúpia, e vestiu a capa da Semana.

Por último, deu entrada na imprensa santense o jornal diário A Tarde, sob a direção da distinta trindade jornalística - dr. Souza Filho, Euclides de Andrade e Affonso Schmidt -, sendo a sua direção técnica entregue ao hábil artista Miguel Pierre, e a gerência ao ativo e criterioso moço Ariosto Ribeiro da Costa.

A A Tarde foi bem recebida e, dadas as invejáveis penas que a redigem, está destinada a fazer brilhante carreira em nosso meio jornalístico. Fundada em 9 de agosto de 1915, no seu 3º número fez luz sobre o intrincado caso do Crime da mala, que até hoje é um dos fatos bem palpitantes.

Antes, tivemos A Prensa, jornal de combate e independente que, por sua orientação ou coisa que o valha, valeu uma estúpida agressão ao seu redator, Orlando Corrêa, num vagão de 1ª classe da São Paulo Railway, quando viajava para Santos.

***

O que não é mais novidade é a continuação de embarques de reservistas italianos para a grande e malfadada guerra européia. Temo-los, desembarcando na gare da Ingleza, e embarcando nos transatlânticos, quase todos os dias.

***

Termino, pois, esta crônica de fatos ocorridos em Santos, com uma resenha unicamente de epígrafes extraídas dos nossos jornais, o que bastará para ver-se o andamento agitadíssimo dos nossos dias.

É inteiramente impossível fazer um trabalho completo sobre as ocorrências. Teria que empregar muito mais tempo e 10 volumes não chegariam.

Eis a resenha das epígrafes, e isto, infelizmente, é o bate-enxuga da nossa imprensa, acreditando-se mesmo que os jornais que não trazem notícias assim epigrafadas são jornais quase que sem importância.

Vejamos:

"A Conflagração Européia" (esta epígrafe medonha há um ano e meses está estereotipada nos jornais) - "Abalroamento" - "Queda desastrosa" - "Repressão ao lenocínio" - "Grande roubo" - "Rapto" - "Suicídio" - "Facadas" - "Tiros" - "Mais dementes" - "Incêndio" - "Morreu afogado" - "Mais reservistas" - "Encrenca na zona" - "Bebeu Lizol" - "Ladrão de galinhas" - "Tentou suicidar-se" - "Ferido num pé" - "Empregado infiel" - "Decepou o nariz do Francisco com uma dentada" - "Espancou a mulher" - "Criança abandonada" - "Sempre os automóveis" - "Ainda os automóveis" - "Caiu duma escada" - "Torceu a mão direita" - "Esmagou um dedo do pé esquerdo" - "Morreu fulminado" - "Um bonde vai de encontro a uma carroça" - "Cuspido da boléia" - "Amores... amores" - "Pinga e bordoada" - "Sinistro no mar" - "O Largo do Rosário em chamas", e... outras que tais, tomando parte ativa, neste assombroso movimento desagradável, a polícia e os cuidados da Santa Casa de Misericórdia.

***

Houve, ultimamente, uma epígrafe lutuosa: os jornais do Rio apregoavam, em letras garrafais, o hediondo assassinato do general Pinheiro Machado; e os jornais daqui teceram em redor desse bárbaro e infame quadro, do qual foi cenário o hall do Hotel dos Estrangeiros, comentários reprováveis à prática de tão ordinário procedimento de Manso, o assassino. Esse horroroso e cruel assassinato inspirou geral odiosidade contra o assassínio, em todo o Brasil.

- Tivemos, pois, que registrar nas páginas da história lutuosa esse fato miserabilíssimo ocorrido na Capital Federal no dia 8 de setembro de 1915.

Aqui está, pois, a "chave" envolta em crepe com a qual, um tanto horrorizado, fecho este trabalho.

Praza aos céus que melhores dias ocorram daqui por diante.


Imagem de fecho de texto, publicada com a obra