V
Atravessei mais algum tempo no
Diário de Santos e resolvi mudar de oficina. Iria para
A Vanguarda, novo jornal diário que em breve apareceria sob a direção intelectual de Benjamin Mota
e direção industrial de Fernando de Magalhães.
A A Vanguarda devia aparecer em setembro de 1908 e só apareceu em 26 de outubro desse ano,
porque devido a uma greve de carroceiros, o material não podia sair da estrada de ferro por falta de veículos para conduzi-lo.
O aparecimento da A Vanguarda foi bem recebido, pois tratava-se de um jornal independente e
que vinha "pôr sal na moleira" de muita gente boa.
Instalou-se a A Vanguarda na Rua do Rosário, nos baixos do
sobrado ocupado por demi-mundaines, o mesmo onde em tempos idos foi a sede do Grêmio Dramático Arthur Azevedo. Benjamin Mota lançou o artigo
de apresentação de modo a receber unânimes aplausos da população e parabéns de toda a imprensa.
Entre outras questões que Benjamin Mota tomou a peito, saindo-se galhardamente de todas elas,
houve uma que foi levada em caráter cômico.
No jardim da Praça dos Andradas, no lugar onde os recreantes iam matar
a sede, não existia caneca e sim uma pequena lata que fora de manteiga e já enferrujada.
Benjamin não deixou passar o caso em branco e começou de incitar a Câmara para que pusesse na
Praça dos Andradas uma caneca decente. A Câmara fez ouvidos de mercador.
Então, Benjamin lembrou-se de oferecer uma caneca à municipalidade para ser colocada naquele
logradouro público, e assim fez.
Certa tarde, acompanhado de muitas pessoas, foi levar a caneca ao jardim, e disso tinha pela A
Vanguarda dado prévio aviso. O ato da colocação da caneca foi revestido de toda a solenidade, havendo um discurso pronunciado por Benjamin ao
prender-se a alça da caneca na corrente de metal ali existente.
Muita risota, aplausos e a prisão do falecido Redondo por um cabo de polícia, pois o cabo queria
obstar a colocação ali de um objeto que ia prestar relevantes serviços aos recreantes que sentissem sede.
No carnaval de 1909, o Gimenez, um trocista de marca maior, lembrou-se do
caso da caneca e fez a ele uma alegoria cômica e, na qualidade de músico, compôs uma valsa que em dado momento eram obrigadas as palavras "Olha a
caneca"..., e continuava a música.
No mês seguinte ao do Carnaval (N.E.: em
março de 1909, já que a terça-feira de Carnaval nesse ano foi em 23 de fevereiro), apareceu
A Tribuna Popular, de propriedade de Miguel Pierre e redatoriada pelo autor deste trabalho.
Era de publicação vespertina e teve bom acolhimento, mas a sua venda avulsa crescendo de dia para
dia, indo enfim de vento em popa, o sr. Magalhães enciumou-se com a boa sorte da jovem Tribuna Popular, obstando que ela continuasse a
ser confeccionada e impressa nas oficinas da A Vanguarda. A resolução do sr. Magalhães ocasionou o desaparecimento desse jornal, que se ia
tornando querido do público.
.
Jardim e ponte central da Praça dos Andradas, em 1898. O cartão-postal foi postado em 1900
Foto:
Acervo José Carlos Silvares/Santos Ontem |