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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - BIBLIOTECA - TEATROS
Memórias do Teatro de Santos (10)


Clique na imagem para voltar ao índice da obraComo em muitas outras cidades brasileiras, a memória do teatro santista raramente é registrada de modo ordenado que permita acompanhar sua história e evolução, bem como avaliar a importância dos artistas no contexto nacional, rememorando as grandes atuações, as principais montagens etc.

Uma tentativa neste sentido foi feita na década de 1990 pela crítica teatral santista Carmelinda Guimarães, que compilou depoimentos escritos e orais, documentos e outros registros, nas Memórias do Teatro de Santos - livro publicado pela Prefeitura de Santos em 1996, com produção de Marcelo Di Renzo, capa de Mônica Mathias, foto digitalizada por Roberto Konda. A impressão foi da Prodesan Gráfica.

Esta primeira edição digital em Novo Milênio foi autorizada pela autora, Carmelinda Guimarães, em 6 de janeiro de 2011. O exemplar aqui utilizado foi cedido pelo ator santista Osvaldo de Araujo:

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Memórias do Teatro de Santos

Carmelinda Guimarães

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O Real Centro Português

O Centro Português de Santos é uma entidade da colônia portuguesa da Baixada Santista. A fundação do Centro Português de Santos iniciou-se nos fins do século XIX. Com fins culturais, educativos, recreativos e beneficentes.

No dia 3 de novembro de 1895, na Praça Mauá número 33, foi realizada a primeira reunião instaladora por convocação feita através da imprensa, onde compareceram 49 personalidades portuguesas.

No dia 10 de novembro já eram mais de 100 indivíduos que se reuniram na Capitania dos Portos, à Rua Xavier da Silveira, para discutir os espetáculos da entidade elaborados sob a orientação do dr. Manoel Homem de Bittencourt, cirurgião dentista efetivo da Sociedade Portuguesa de Beneficência e figura muito popular na cidade.

Lançadas as bases do Centro Português, realizou-se a 1 de dezembro (data em que Portugal comemora a restauração do reino) sessão solene no Teatro Guarani, onde usou a palavra o jornalista Alberto Veiga, que historiou os fatos referentes à restauração do Centro Português.

Seus sócios iniciadores foram: Luiz José de Mattos, José M. de Macedo Guimarães e José Maria Soares. Formaram a galeria dos sócios fundadores: Adelino Correa da Costa, Adriano Antonio, Alexandre Ventura, Antonio Alves Agante, Antonio Dias Pereira, Antonio Germano, Antonio Marialva, Antonio Pereira Marques, Antonio Rodrigues Mercador, Antonio Simões Gonçalves, Artur Mendes Guimarães, Augusto Rosa da Fonseca Junior, Basílio da Fonseca, Basílio Pinto de Jesus, Durval Augusto Lourenço, Fernando Cerquino, Firmino Antonio de Almeida, Francisco Antonio de Almeida, Francisco Augusto de Souza, Francisco Marques Gaspar, Francisco Martins, Francisco Xavier Nunes, Joaquim Agostinho, Joaquim de Almeida, Joaquim Fróes Pião, Joaquim Soares, João Gonçalves dos Santos, José Adelino Corrêa, José Alves Agante, José da Silva Mascarenhas, José Gaspar, José Maria Simões Lopes, José Moreira Maia, Júlio de Almeida Cardador, Leon Beri Ohel, Manuel Antonio Gomes Tinhela, Manuel Antonio Teixeira, Manuel de Almeida, Manuel de Sousa Carvalho, Manuel Domingues Guerra, Manuel Ferreira de Menezes, Manuel Leal, Manuel Pereira Ribeiro, Manuel Rosa, Manuel Soares, Sebastião Mendes Ferreira e Vítor Soalheiro.

A primeira atividade do Centro Português de Santos foi a fundação da Escola "João de Deus", da qual foi professor o jornalista Alberto Veiga. A escola ensinava o curso primário; música, sob a direção do maestro João Gonçalves Lolo, que chegou a formar uma banda com seus alunos, virando mais tarde a Sociedade Musical Colonial Portuguesa, e ainda dança e arte dramática.

A corporação cênica do Centro Português é uma das criações mais antigas da entidade, pois a primeira apresentação teve lugar no dia 2 de maio de 1899. Inúmeros foram os espetáculos promovidos e muitos nomes da cena teatral brasileira aí foram revelados.

Em 1876, o rei d. Carlos I concedeu à instituição o direito de usar a palavra "FEAL" antecedendo sua designação. Em 1845 (N.E.: SIC: a palavra correta é "Real" e os anos corretos são 1896 e 1945), porém esse privilégio deixou de ser utilizado.

A primeira sede social do Real Centro Português foi na Praça da República, número 11.

Em 1898 foi lançada a pedra fundamental do edifício que os engenheiros portugueses Ernesto de Maia e João Esteves Ribeiro da Silva projetaram, inspirados no estilo manuelino.

O edifício é considerado ainda hoje um dos mais belos da Baixada Santista, foi decorado com motivos próprios do estilo evocado, janelas e portas em arcos redondos, com cordas, estrelas, cruzes de Cristo, escudos reais, esferas armilares entre colunas em forma de troncos esguios, com espiral nas pontas. Apenas outros dois edifícios mantêm essas características no Brasil: Gabinete Português de Leitura de Salvador, Bahia, e o Real Gabinete Português de Leitura, do Rio de Janeiro.

No dia 8 de outubro de 1900 o Centro se transferiu para o prédio novo e em 15 de maio de 1908 foi inaugurada a sala de espetáculos especialmente destinada a apresentações teatrais e concertos.

O Salão Teatro, com 500 lugares, foi reformado em 1914, quando teve as suas paredes decoradas, apresentando um aspecto belíssimo de arte e de luxo.

Nilda Pedra Teixeira.

Salão Camoniano

A decoração deste Salão Nobre foi feita em 1909 pelo notável pintor espanhol Antonio Fernandes. Sua inauguração solene deu-se em 1913, e possui algumas obras de arte. O adorno das paredes imita damasco. Correndo por cima das janelas e portas, notam-se medalhões de nobreza, com as armas das cidades e vilas mais importantes de Portugal, os painéis do teto representam episódios de "Os Lusíadas" e são baseados em cantos e estrofes. Era neste salão que em tempos áureos se reunia o que havia de mais expressivo na cidade.

Grandes bailes de gala eram promovidos neste salão, fazendo dessa instituição uma das maiores expressões sociais da região.

Rancho Folclórico Verde Gaio

O Rancho Folclórico Verde Gaio foi fundado no Centro Português em 1961. O primeiro Rancho contava com aproximadamente 60 componentes – 20 pares e mais os membros da Tocata. Hoje o número de componentes continua bem grande, num total de 50 pessoas. A Tocata é formada por alguns instrumentos musicais que dão o tom à festa portuguesa: concertina, acordeon, cavaquinho, violão (viola), reco-reco, ferrinhos e bumbo.

O Rancho Folclórico Verde Gaio é reconhecido internacionalmente e ja fez apresentações em Portugal em 1986 e 1992. Além disso, percorreu quase todos os estados brasileiros. Tem como ensaiador o sr. Luís de Figueiredo, que desde 1962 faz com que seja o mais típico Rancho Português.

Depoimento de José Duarte Germano.

Diário de uma época

Crônica registrada nos livros de atas do Centro Português de Santos:

Domingo, 22 de janeiro de 1922.

Seguindo o hábito desta veterana sociedade portuguesa, mais uma festa domingueira será proporcionada hoje os associados e exmas. famílias.

Consta esta noitada de arte de representação da peça francesa em 1 ato, gênero "Grand Guignol", "O Agulheiro", tradução de Eduardo Vitorino.

A peça foi distribuída aos aplaudidos amadores sr. Antonio Covas e d. Julieta Rocha.

Os ensaios da corporação sr. Alberto Vieira tem sido incansável nos ensaios desta peça, o que faz crer mais um sucesso a registrar nos festivais promovidos por esta corporação cênica.

Domingo próximo, representação da peça de Julio Dantas "Rosas de Todo o Ano".

Domingo, 29 de janeiro de 1922.

O Grêmio Dramático "Almeida Garret" inaugura hoje os seus trabalhos, com a nova direção do centro.

Assim prosseguindo na conquista de louros para seu acervo levará hoje a cena chistosa comédia em I ato intitulada "Boa Peça".

Monteiro, Leite, Armando, Gil e as senhoritas Alzira e Lucilia Ferreira, os competentes amadores, já por demais conhecidos, terão um feliz ensejo para demonstrarem mais uma vez os seus méritos.

Leite Pereira, o exímio diretor cênico, põe à prova, nesta peça, a sua competência.

Terminada a representação, terá início a costumada soirèe dançante.

Domingo, 29 de janeiro de 1922.

Em homenagem à nova diretoria desta sociedade, que foi empossada ontem, a corporação cênica organizou para hoje um grandioso festival que, por certo, levará grande concorrência de associados e exmas. famílias à sede do Real Centro Português.

O sr. Alberto Vieira, a quem está afeta a direção da parte técnica do grupo dramático, escolheu para o  espetáculo de hoje a finíssima peça original do poeta Julio Dantas.

"Rosas de Todo o Ano", com a seguinte distribuição: Sosar, Ines, Srtas. Iracema, Rocha, que fará a sua estréia: Suzana, Srta. Hermantina Tavares.

Findo o espetáculo, a corporação reserva uma agradável surpresa para a nova diretoria. O magnífico sexteto da corporação abrilhantará a costumada "soirèe" dançante. Entrou em ensaios a comédia em 3 atos "A viúva dos 500 contos", repertório do dr. Leopoldo Fróes.

Quarta-feira, 1 de fevereiro de 1922.

Entrou em ensaios, estando marcada para muito breve a sua primeira apresentação, a delicada comédia em 1 ato "Os priminhos" da lavra do talentoso jovem santista Benedito Merlim, que com essa produção faz sua estréia na literatura teatral.

Domingo, 12 de fevereiro de 1922.

Decorreu com o máximo brilhantismo a bela soirèe dançante teatral de ontem nessa querida sociedade lusa.

Subiu á cena, tendo um magnífico desempenho por parte dos talentosos amadores do centro, a desopilante comédia em três atos "A viúva dos 500 contos", original de Gastão Togeiro, considerado no Rio como o mais engraçado dos comediógrafos. Na interpretação da peça salientaram-se Sartini, Silveira, Covas, Cruz, Junot, Vilela, Hermentina Tavares, Julieta Rocha, Helena Marques e Carminda Ventura, que fez uma auspiciosa estréia.

Do brilhantismo da festa merece o seu quinhão o incansável ensaiador Vieira, que não poupou esforços para que a peça do Togeiro alcançasse o êxito que alcançou.

Foi notada com certo desagrado a ausência da banda de música da Colônia Portuguesa, a quem a digna diretoria do Real Centro ofereceu em sua homenagem a bela festa de ontem.

Uma animada partida dançante deu fecho ao grandioso sarau.

Sábado, 18 de fevereiro de 1922.

É hoje enfim, que se realiza o magnífico festival organizado pelos batutas que compõem a orquestra deste centro. O festival constará da representação da fina comédia em 3 atos "A Senhora do Cinema". A seguir um grandioso baile, para o qual o Lord Eduardo anuncia uma verdadeira surpresa. O maestro Odair promete não descansar um segundo, a fim de que a macacada dance à beça.

Mr. Nelson, com sua bateria americana, tem a certeza que nos tangos fará até as cadeiras dançarem.

Domingo, 19 de fevereiro de 1922.

Para a festa domingueira de hoje o distinto ensaiador Alberto Vieira organizou um esplêndido programa. Subirá à cena o drama em 1 ato "O Comboio 107", cujos papéis foram distribuídos pelos amadores Antonio Covas e Senhorita Julieta Rocha.

Encerra-se o sarau por um grandioso baile, ao qual não faltará o concurso da orquestra da corporação, que contém novos elementos.

Depoimentos

Wyner Batista: ator e operador de cinema lembrou o ambiente aberto e despido de preconceitos.

José Duarte Alves Germano: Lembrou que o Real Centro Português era aberto a todas as colônias, num ambiente sem preconceitos. Prestou homenagem à memória de Antonio Faraco, grande figura humana, grande amigo e grande artista. Ficou no grupo de teatro de 67 a 72. Fez "Pega Ladrão" e "Devagar com a dor que o santo é de barro". Acha que em 72 foi levada a última peça no Real Centro Português.

Dorival da Silva (jornalista de O Estado de Mato Grosso e que foi ator no Real Centro Português):

Fui colocado dentro do teatro por condições familiares. Meu pai era diretor do Real Centro Português. Era uma forma de ele me ver trabalhar, já que, sendo rico, me sustentava e eu vivia estudando. É um plano meu escrever minha vida em forma de peça teatral, uma vez que comecei com Mário Faraco, um grande nome do teatro santista.

Fui pressionado pela revolução de 64 a sair de Santos e obrigado a me esconder em Pato Velho, Rondônia, e me fixei em Mato Grosso. Eu era químico da Petrobrás e fui cassado. Para sobreviver virei jornalista, meio por baixo do pano, mesmo porque lá não existia faculdade de jornalismo.

Pude pôr em prática coisas aprendidas aqui em Santos quando trabalhava em teatro. A PRG5 tinha um programa de Berta Zimmel e depois a rádio-novela de Rosinha Mastrângelo, onde eu protagonizei vários personagens.

Cena de O Rústico, de Checov. Jansen Cavalcanti e Cida Celestino

Foto publicada com o texto