HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS -
CINEMA
O cinema em Santos (4)
Como em outras cidades brasileiras, Santos também teve sua
época áurea do cinema de rua, usando telas improvisadas com lençóis e precários sistemas de projeção, mas que representavam grande divertimento para a
criançada de antes da Segunda Guerra Mundial, numa cidade de noites quentes, que justificou até mesmo a construção no Gonzaga de um cinema com teto
basculante.
Cine-teatro Cassino cerca de 1920, com o teto basculante (entre a edificação do 1º plano e
a torre à direita), na edificação que, reformada, abrigaria depois o hotel Atlântico, no final da Av.
Ana Costa
Foto: acervo do cartofilista Laire José Giraud
Mas, mesmo que não houvesse projetor nem filme, o pessoal improvisava, em suas
brincadeiras, a mesma idéia surgindo simultaneamente em diferentes bairros.
Por exemplo, na Vila Belmiro, como registrou em 1982 a
jornalista Leda Mendes Mondin na série Conheça o Seu Bairro: "Por falar em brincadeiras, a criançada só sossegava um
pouco para assistir às sessões de cinema do Silvestre. Um cineminha muito mambembe, mas não tinha quem não gostasse. Olhem só a idéia do Silvestre:
recortava figuras de revistas, montava uma tela com um lençol e, com a ajuda de uma vela, conseguia "projetar" imagens. Dava um efeito bem bonito e era
a melhor opção quando os pequenos não conseguiam dar uma escapadinha para assistir a filmes de verdade, nos cines Avenida e Campo Grande."
Na mesma série, memórias do bairro Aparecida:
"(...) quem passou a infância lá não cansa de recordar coisas boas. E entre essas coisas boas figura sempre o cineminha do
padre Luís Araújo. Ninguém sabe dizer onde o padre conseguia filmes de Carlitos e de O Gordo e o Magro, mas o certo é que ele fazia a
alegria da garotada com as sessões realizadas lá mesmo na Igreja de Nossa Senhora Aparecida. João Alves da Silva não esconde as saudades desse tempo
(...).
"Quantas vezes esse grupo não seguiu para o Cine Popular munido de sanduíche de pão com
ovo e bananas para assistir aos filmes de faroeste? O reforço alimentar era indispensável, pois a sessão de domingo durava das 13 às 18 horas. Ninguém
reclamava das cadeiras, que eram dessas comuns de cozinha, ou da tela pintada na parede. Valia a pena, porque afinal, por apenas 900 réis, assistiam a
nada menos que sete filmes. E em cada intervalo se formava cada briga de deixar o dono do cinema de cabelo em pé. Com tanto moleque lá dentro disposto a
farrear, não podia ser diferente. Inspirado por esses filmes, o Lio se divertia fantasiando-se de Durango Kid. Punha uma capa preta, improvisava arco e
flecha com vareta de guarda-chuva e ficava na laje de sua casa atormentando a vida dos mais incautos.
"Uma vez seu irmão comprou um projetor de filmes, daqueles à base de vela, que se vendia
por reembolso postal. Acompanhavam a máquina três pequenos filmes, e o Lio não teve dúvidas em se associar ao irmão na hora de cobrar um tostão
da molecada interessada em assistir. Quando se cansaram de assistir sempre aos mesmos desenhos, o Lio logo tratou de produzir alguns, em papel
manteiga. Só que a imagem aparecia muito de vez em quando, e esses momentos eram invariavelmente acompanhados de muitos apupos e palmas".
Também na série publicada em 1992, as lembranças do Valongo:"Valongo
ou Bairro Chinês, o certo é que as pessoas guardam muitas e boas recordações de lá. Coisas como as concorridas sessões do Cine São Bento, que sempre
mantinha uma programação para agradar a todos os gostos. A princípio, funcionava em uma sala apertada da Rua São Bento, cheia de bancos de madeira. Como
o chão era todo no mesmo nível, quem se sentava atrás não conseguia ver nada e ainda saía com dor no pescoço. Mesmo assim, as matinês de domingo ficavam
repletas; os moleques adoravam fazer bagunça batendo com seus tamancos contra o chão. A barulheira durava exatamente das 13 às 19 horas, período durante
o qual eram apresentados dois seriados, desenhos e dois longas-metragens.
"Mais tarde, o cinema ganhou novas instalações e se destacou como o primeiro de Santos a
ter o piso irregular, de modo a permitir que a platéia visse a tela. O filme O Petróleo é Nosso, com Violeta Ferraz, fez o maior sucesso quando
apresentado lá. E foi naquele cinema que o jornalista Áureo de Carvalho (e tantos outros santistas) assistiram pela primeira vez a um filme colorido:
Ramona."
O escritor Nelson Salasar Marques também recorda desses tempos, como cita no volume II de
Imagens de um Mundo Submerso (Editora do Escritor/Luz e Silva Editor, São Paulo/SP, 2000), no capítulo IV ("Ainda o gibi, e a nossa iniciação
ao teatro itinerante de arrabalde"):
"(...) A introdução das mágicas revistas em quadrinhos, todas coloridas, nos afastou dos
brinquedos e nos arremessou em outro mundo: o mundo da ação e da aventura. Dali a pouco já haviamos criado uma espécie curiosa de cinematógrafo que
consistia num enorme caixote de maçãs argentinas com uma abertura quadrada de um palmo na frente em forma de uma pequena tela de cinema, atrás do qual
havia alguns metros de tiras dos quadrinhos dos gibis que eram desenrolados por uma manivela, fazendo com que os assistentes pudessem seguir as
aventuras do Tarzan, do Super-Homem, do Fantasma e do Capitão Marvel. A manivela de cima desenrolava as aventuras dos gibis coladas em tiras e a debaixo
recolhia essas tiras. Quando eu estava com pressa, fazia as manivelas correrem mais rapidamente para terminar logo, mas então a garotada protestava e eu
voltava à lentidão antiga. Eram sessões concorridas e a coisa toda ia se sofisticando. Em pouco tempo toda a molecada da vizinhança já imitava a minha
invenção e nós enchemos o Macuco com esses cinematógrafos improvisados com caixas de maçãs argentinas. Os dias e as noites ficaram mais alegres (...)".
No primeiro volume dessa série (Editora Leopoldianum, Santos/SP, 1995), o escritor também
registra, no capítulo VI ("Santos, os anos incertos e os anos frenéticos"):
"(...) As crianças de minha geração foram criadas com o fascínio pela espada. Revólver não
era arma nobre, era coisa vulgar, coisa de bandido. No campo da honra a espada prevalecia. Errol Flynn e Tyrone Power viravam espadachins famosos...
Zorro nunca usava revólver. Ainda nas telas o rei da Inglaterra, Ricardo o Coração de Leão, de espada na mão, cantava hinos religiosos e matava turcos e
árabes em nome de Cristo.
"Isso incendiava a nossa imaginação. Eu improvisava uma espada de um cabo de vassoura,
amarrava ao pescoço um pano de enxugar pratos e na cabeça enfiava o escorredor de macarrão e virava um soldado romano. As ruas Frei Francisco Sampaio e
Benjamin Constant eram palco de batalhas memoráveis e de grandes duelos. Os filmes de cow-boy e mais tarde John Waine poriam abaixo aquele mundo
romântico de duelos de espada. E Santos viu uma outra geração, a geração dos revólveres de espoleta. A garotada iria sair pelas ruas gritando palavras
até então desconhecidas: 'come on, boy'. Muitos diziam: 'Vamos brincar de camones boy', aportuguesando os sons. Era a devastadora
influência americana que chegava para ficar com os seus cow-boys, o swing e o boogie-woogie (...)"
Enquanto as grandes salas de cinema foram sendo transformadas em conjunto de salas menores
ou desaparecendo, o antigo hábito do cinema ao ar livre começou a ser retomado, nos primeiros anos do século XXI.
Cine Gonzaga, instalado no mesmo local do Cassino (que fechou em 1954),
ainda com teto removível, na edificação situada no final da Avenida Ana Costa
Foto: autor desconhecido
Sete décadas depois de ser construído no Gonzaga o Cine Teatro
Cassino, com teto removível para refrescar o público nas noites de calor, e de particulares exibirem filmes em telas improvisadas, a Prefeitura
Municipal, através de sua Secretaria de Cultura (Secult), passou a promover apresentações de cinema nos bairros, com um veículo dotado de tela em uma
das laterais e projetores: é o projeto Cinema de Rua.
Ônibus do Cine Trânsito, da CET
Foto: Marcelo Saitta, publicada no Diário Oficial de Santos em 6/10/2004
Já
a Companhia de Engenharia de Trânsito (CET) também criou um cinema móvel: um ônibus adaptado para apresentação em seu interior de filmes voltados à
educação no trânsito: é o Cine Trânsito.
Ambos os veículos (da Secult e da CET) estiveram presentes na festa pelo Dia da Criança
realizada pela Prefeitura Municipal em 12 de outubro de 2004, junto ao Jardim Botânico Chico Mendes (situado na Rua João Fraccaroli, s/nº, na Zona
Noroeste de Santos). Assim, além de aprenderem mais sobre questões de trânsito, as crianças puderam ver (a partir das 18 horas) um desenho animado da
Turma da Mônica, de Maurício de Souza.
Interior do ônibus do Cine Trânsito, da CET
Foto: Marcelo Saitta, publicada no Diário Oficial de Santos em 6/10/2004
No Diário Oficial de Santos, de 9 de outubro de 2004, outra promoção da
Secult era registrada:
Foto: divulgação/Secult, publicada com a matéria
CULTURA
Cine Arte retoma exibição de filmes ao ar livre
As sessões de cinema ao ar livre realizadas no Cine Arte
Posto 4 estão de volta. O Projeto 2º Andar retorna amanhã, às 19 horas, no piso superior do cinema, com a exibição do filme Amantes e Ladrões.
A entrada é franca.
O projeto, desenvolvido pela Secretaria de Cultura (Secult) contará com apresentações
todos os domingos, de filmes em 16 mm, de diversas nacionalidades, produzidos entre as décadas de 1930 e 1980.
Dirigido por Sacha Guitry, Amantes e Ladrões conta a história de Philippe, que
tem sua casa assaltada justamente no momento em que tenta se matar. Mediante esta situação absurda, o infeliz proprietário resolve contar ao
assaltante toda sua vida.
Em caso de chuva a sessão será cancelada. O Cine Arte fica na orla da praia do Gonzaga
próximo ao canal 3. Informações: 3201-5031.
Cinema da França - Já dentro da mostra O Cinema da França - Passado x
Presente, o Cine Arte Posto 4 exibirá hoje, amanhã e terça-feira, às 14 horas, a animação A Criança Invisível (classificação livre).
Entre os dias 11 e 15 estará em cartaz no local o drama Bar dos Trilhos. Sessões às 16, 18h30 e 21 horas. Classificação 14 anos. Os ingressos
para a mostra custam R$ 3,00.
Cine-Arte Posto 4, uma sala municipal de cinema-arte criada no posto 4 de salvamento
na praia
Foto: Prefeitura Municipal de Santos, cerca de 1998
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