Em
1962, foi publicado em Sorocaba/SP este livro de 200 páginas (exemplar no acervo do historiador santista Waldir Rueda), composto e impresso nas
Oficinas Gráficas da Editora Cupolo Ltda., da capital paulista (ortografia atualizada nesta transcrição):
Pequeno histórico da Mayrink-Santos
Meus serviços prestados a essa linha entre Mayrink e Samaritá
Antonio Francisco Gaspar
[...]
1ª PARTE - PREÂMBULO
VI - A Sorocabana em Santos
O jornal A Noite do Rio de Janeiro, em 1927, ao saber que o governo de São
Paulo decidiu levar os trilhos da Sorocabana a Santos, teceu longo comentário a esse respeito e à grande crise de transportes que havia naquela
data, devido ao monopólio da Inglesa. A S.P.R. açambarcava tudo quanto era mercadoria de exportação e importação destinada ao porto de
Santos, vinda do estrangeiro ou vice-versa.
O porto de Santos estava constantemente congestionado, com afluência de navios.
A linha Mayrink-Santos, libertadora dos planos inclinados com que a Inglesa
afogava a saída de São Paulo para o mar, iria ser uma realidade.
Após a inauguração da Inglesa, lá por 1872, já o Governo Imperial nomeava
especialistas, chefiados pelo engenheiro João Martins da Silva Coutinho, e esse engenheiro concluía, de modo peremptório, na conveniência da ligação
da Sorocabana a Santos. Se esse engenheiro, que há 90 anos previu mais uma estrada de ferro para o mar, ressuscitasse, certo, veria que a
Mayrink-Santos tinha razão de ser construída.
Mas, vamos transcrever para este capítulo um trecho da nota da A Noite, de 27
de julho de 1927:
"O sr. Júlio Prestes acaba de tomar uma providência que
envolve os mais amplos interesses da economia brasileira. Dizem telegramas de ontem que s.ex. mandou sustar, imediatamente, todas as obras da
Sorocabana, com o fim de executar o prolongamento dessa ferrovia, até o mar.
"O escoamento de quase dois terços da produção exportável do Brasil se efetua pelo
porto de Santos.
"Não há quem o ignore. O caso, porém, é que todo o movimento de cargas do interior
para esse embarcadouro quem o faz é uma única estrada de ferro - a São Paulo Railway -, ou, mais claramente, a Inglesa. De sorte que temos,
além do monopólio das Docas de Santos, em torno do qual se levanta incessante a grita da mais laboriosa população do Brasil, esse outro privilégio,
confiado a estrangeiros, com os mais danosos resultados para a nação.
"O Sul de Minas, Goiás, Mato Grosso, o Norte do Paraná, todo o Estado de São Paulo -
presos no aranhol dos trilhos da Mogiana, Paulista, Noroeste, Sorocabana, São Paulo-Rio Grande e Norte do Paraná e de tantas outras linhas
secundárias - toda a extensa região em que mais se trabalha e produz, o poderoso núcleo da mais intensa vida útil do país, como que vive para
sustentar a Inglesa.
"Não é o fator de impulsionamento de irradiações benéficas, o estimulante da produção,
mas o explorador do constante esforço de milhões de brasileiros. É o funil por onde escorrega o ouro do nosso máximo labor, o rufião da vida
nacional".
Da mesma forma deste comentário de valor, muitos outros periódicos e revistas do Rio
de Janeiro inseriram em suas páginas artigos sobre a linha Mayrink-Santos e, principalmente, também, quase todos os jornais de São Paulo, entre 1927
e 1930, falaram simultaneamente nesse importante tentamen, levado a efeito pelo eminente tino do dr. Júlio Prestes, governador do Estado,
naquela época.
Seria longo transcrever todos os artigos que, pacientemente, eu fui arquivando com
carinho no meu livro Diário dos Serviços feitos por mim nessa magnífica arrancada - a linha Mayrink-Santos.
Neste capítulo contento-me em transcrever um telegrama de Santos para O Estado de
São Paulo, domingo, 8 de setembro de 1929:
"O primeiro trecho concluído - SANTOS, 7. Hoje, às
9 horas, partiu da estação da Avenida Conselheiro Nébias um trem especial para fazer experiência do trecho da Estrada de Ferro Sorocabana que vai
desta cidade à Raiz da Serra, e que acaba de ser concluído, sob a direção do engenheiro dr. Agenor Guerra Corrêa. Sobre o rio Branco, que essa linha
atravessa, foi construída uma ponte que mede 60 metros de comprimento e os trens de lastro já podem trafegar entre a Serra e esta cidade, de modo
que os aterros da nova linha serão feitos com terra transportada daquela região. Em companhia do dr. Agenor Guerra Corrêa foram outros engenheiros e
pessoas gradas. O trem especial, em seu regresso, chegou à estação da Avenida Conselheiro Nébias às 14 horas. A experiência foi coroada de êxito.
Oportunamente, será feita a inauguração oficial desse trecho, que é o primeiro a ser concluído. Essa inauguração revestir-se-á de grande brilho e a
ela comparecerão o sr. presidente do Estado e membros do Governo". (N.E.: não é conhecida
a existência pretérita de alguma estação ferroviária na Avenida Conselheiro Nébias. Portanto, o correto é
estação da Avenida Ana Costa).
Estação Estaleiro (provisória em uma casa de tábuas) inaugurada em 15-2-1930
Imagem e legenda reproduzidas do livro
Enfim, a inauguração da Estação de Estaleiro, então, foi marcada para o dia 15 de
fevereiro de 1929, pelo presidente dr. Júlio Prestes.
Nesse dia, o dr. Júlio Prestes e sua comitiva deram entrada em Santos às 10 horas e,
após os cumprimentos, os excursionistas rumaram para a Avenida Ana Costa. Às 10 horas e 6 minutos, o comboio especial pôs-se em movimento, sob
entusiásticas aclamações, rumo ao trecho a ser inaugurado.
A chegada ao quilômetro 19 da linha Santos a Juquiá, início da linha Mayrink-Santos,
deu-se às 10 horas e 30 minutos, por entre ruidosas manifestações populares. Foram queimados rojões e uma banda de música executou o Hino
Nacional. O dr. Júlio Prestes, desembarcando, dirigiu-se para o arco triunfal, ali armado junto ao Marco 0, ponto inicial da nova linha a ser
inaugurada, cortando a fita auriverde, sob uma prolongada salva de palmas. Todos estavam jubilosos por esse grande acontecimento.
Iniciou-se, então, a viagem pelo recente trecho que ia ser oficialmente inaugurado,
que serve a uma região fertilíssima e já bastante habitada.
Às 11 horas e 30 minutos, chegava o trem presidencial à nova estação de Estaleiro,
situada num pitoresco local. O povo que ali aguardava a chegada do trem especial fez ao dr. Júlio Prestes uma significativa manifestação,
demonstrando a sua alegria pela inauguração de tão importante melhoramento, que iria trazer, naquela zona, benefícios incalculáveis.
Chegada do trem especial na Estação Estaleiro
Inauguração do trecho Samaritá a Estaleiro - 15-2-1930
Imagem e legenda reproduzidas do livro
Depois do sr. presidente, dr. Júlio Prestes, declarar esse trecho da nova linha
inaugurado, foi lavrada e assinada a Ata da Inauguração. Em seguida, o almoço foi servido em um amplo caramanchão de madeira, artisticamente
ornamentado com bandeiras nacionais e galhardetes festivos, entrelaçados em tufos graciosos de flores silvestres. O local não poderia ser melhor
escolhido. Numa esplanada fronteira à estação inaugurada, junto à encosta, e, dali se descortinava o panorama exuberante da baixada imensa que é a
orla marítima da Praia Grande, onde se destacavam as extensas plantações de bananeiras, que é a maior riqueza da região.
O cardápio constou de saborosos pratos nacionais.
Terminado o almoço, o sr. dr. Júlio Prestes e comitiva embarcaram novamente no trem
especial, de regresso a Santos e dali para São Paulo.
"Circular nº 193 - Linha Santos a Juquiá. Com a abertura
ao tráfego, das estações Samaritá e Estaleiro, em 15 de fevereiro, todos os trens entre São Vicente-Samaritá e Estaleiro estão sujeitos ao regime
comum de jogo de staff. A chave do quilômetro 19 se conservará fechada a cadeado, como as demais existentes na linha.
"(a) Agenor de Souza Campos
Chefe do Tráfego
Santos, 10 de fevereiro de 1930".
(N.E.: o staff consiste em bastões dados em cada estação aos maquinistas, para
que eles entreguem na estação seguinte, como parte de um sistema de sinalização, de linha férrea ocupada por trens ou não)
Entre Samaritá e Estaleiro foram estabelecidos os trens M X 3 e M X 4 que,
provisoriamente, somente, corriam às terças-feiras. Certa ocasião, eu indo a serviço na Mayrink-Santos, viajei com o esforçado e competente
engenheiro dr. Agenor Guerra Corrêa, da 5ª Divisão, chefe do trecho S.1
Almoço em Estaleiro - dr. Júlio Prestes, discursando após a inauguração - 15-2-1930
Imagem e legenda reproduzidas do livro
"ESTRADA DE FERRO
SOROCABANA
LINHA DE MAYRINK-SANTOS
ABERTURA AO TRÁFEGO PÚBLICO - 1º TRECHO
Faço público que é o seguinte o horário organizado para o trecho de Mayrink a Cangüera,
o qual começará vigorar do dia 25 de janeiro próximo em diante.
IDA
M S 1
Estações 3ªs, 5ªs e Sab,
Mayrink - 12,00
Guayaná 12,20 12,25
Cangüera 12,40 -
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VOLTA
M S 2
Estações 3ªS, 5ªs e Sáb.
Cangüera - 13,10
Mayrink 13,50
Guayaná 13,25 13,30
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OBSERVAÇÕES - O trem M S 1 está em correspondência com o P 3 que parte de São Paulo às
9 horas e chega a Mayrink às 11,26.
O trem M S 2 está em correspondência com o P 6, que parte de Mayrink às 14,35 e chega
a São Paulo às 17 horas.
Provisoriamente circulará com a locomotiva de recuo.
São Paulo, 21 de janeiro de 1930
(a) Gaspar Ricardo Júnior
Diretor".
Este foi o primeiro horário estabelecido para passageiros nesse trecho. Depois, à medida que
se iam inaugurando as estações, o horário ia sendo modificado.
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