HISTÓRIAS E LENDAS DE GUARUJÁ -
BONDES - LINHA FÉRREA
No tempo da Maria-Fumaça (1)
"A história do bonde do Guarujá se confunde
com a própria história da cidade", conta Ralph Mennucci Giesbrecht, em suas
páginas na Internet alusivas a esse município, continuando: "Construída em 1893 para levar a alta sociedade paulista para suas casas de veraneio
recém-construídas na praia de Pitangueiras, no Guarujá, a linha da Cia. Balneária da Ilha de Santo Amaro ligava o porto de Santos, via balsa, até a
estação inicial de Itapema, e daí seguia para a estação final, em Pitangueiras.
No centro, a estação da praia de Pitangueiras, tendo à esquerda o Morro do Maluf
Foto: cartão postal da década de 1950
"A propriedade da linha mudou de mãos várias vezes, até se tornar estatal, em 1927. Em 1925, com a eletrificação
da linha, bondes elétricos passaram a circular com as locomotiva a vapor. A linha seguiu funcionando ininterruptamente até a sua desativação, em 1956.
Os bondes foram transferidos para a E. F. Campos de Jordão, onde trabalham até hoje, e uma de suas locomotivas está exposta na avenida Leomil, em
Pitangueiras, no Guarujá".
Os bondes já foram mostrados em outra página desta série; vejamos agora as estações de
parada desse misto de trem e bonde, usando um pouco da experiência do pesquisador Ralph:
A estação de Itapema e o bonde elétrico nº 9 com reboque,
sem data
Foto: acervos dos pesquisadores Marcello Tálamo (São Paulo/SP) e Allen Morrison (New
York/EUA)
Conceiçãozinha - "A estação de Conceiçãozinha aparece em mapas ainda dos anos 50, mas não aparece na
relação de estações do Guia Levi em 1953. Não consegui descobrir se a estação existia desde a inauguração da linha. Um das poucas referências a
ela está no livro de Eduardo Etzel, O Guarujá e Eu: '... o trenzinho do Guarujá (...) nova partida e a viagem através do
imenso mangue com uma única estação no meio'. Esta era a estação, na época num deserto, hoje cercada de casas simples e perto do terminal de
cargas de Conceiçãozinha, que tem um movimento enorme de contêineres transportados por via marítima. Não sei realmente se algo ainda resta hoje da
antiga estação".
A estação de Itapema e o bonde elétrico, sem data
Foto: coleção do pesquisador Marcello Talamo, de São Paulo/SP
Itapema - "O dia da inauguração da estação de Itapema, em 2/9/1893, é relatado no livro de Waldemar Stiel,
História dos Transportes Coletivos de São Paulo: '(...) (O trem da SPR, com várias autoridades) chegou a Santos às
13:30, e em bondes especiais dirigiram-se à Alfândega, onde tomaram o vaporzinho Cidade de São Paulo, a fim de atravessar o estuário. (...) Em Itapema
tomaram o trem inaugural, que em pouco tempo passava em frente ao Grande Hotel (...)'.
Raríssima foto da estação de trens Itapema (Vicente de Carvalho) do Tramway do Guarujá
Foto: acervo de Octávio Luís Bertacin, filho de Luís Bertacin e neto do engenheiro Ettore Bertacin, da
Casa Siemens, que dirigiu os trabalhos de eletrificação da ferrovia. Imagem cedida a Antônio Gorni,
disponibilizada no site
Tramway do Guarujá
"Também Eduardo Etzel, em seu livro O Guarujá e Eu, relata que, depois de atravessar a barca o estuário,
vê 'do outro lado do estuário, a estação e outro trem: o trenzinho do Guarujá, com máquina de bitola estreita e dois vagões, o
de carga e o de passageiros. Nova partida, e a viagem através do imenso mangue (...)'. Itapema é hoje o imenso distrito de Vicente de
Carvalho, de população maior que o do próprio Guarujá, ao qual pertence. Não sei, realmente, se algo sobrou da antiga estação, desativada em 13/07/1956,
juntamente com o bonde".
Estação do Guarujá, em 1905
Foto: livro Lembranças de São Paulo-II, de Gerodetti/Cornejo
Guarujá - "A estação do Guarujá foi inaugurada com festas em 2/9/1893, e se confunde com a fundação da
cidade, transformada em município em 1934, separando-se de Santos. '...o trem inaugural (...) em pouco tempo passava em frente
ao Grande Hotel, entre entusiásticos vivas e aclamações, ao som do Hino Nacional, executado pela banda do Corpo Policial'. A estação original
ficava em frente ao hotel, junto à praia das Pitangueiras.
Vista da varanda do Grande Hotel, a estação do Guarujá, à esquerda, ao fundo, em 1905
Foto: livro Lembranças de São Paulo-II, de Gerodetti/Cornejo
"Eduardo Etzel, no seu livro O Guarujá e Eu, escreve que quando o trem se aproximava da estação,
'Por fim, uma rua com algumas casas, uma curva à direita e o mar visto através de um jardim, o Grande Hotel e finalmente uma
simples estação'. Realmente, a linha chegava perpendicular à praia, pela atual avenida Puglisi, e no final fazia uma curva de 90 graus para a
direita, para atingir a estação.
Bonde nº 9 saindo da Estação Pitangueiras com destino à estação Itapema, como se deduz pela placa do
bonde que puxa a composição. Note-se que são vistos os três modelos de veículos fechados operados nessa linha pela Companhia do Guarujá
Foto: cartão postal no acervo de Allen Morrison,
disponibilizada no site
Tramway do Guarujá
"A estação durou lá até 1935, quando, já caindo aos pedaços, foi desativada e substituída por outra, a
dois quarteirões da praia, na avenida Leomil. Um ano antes, parte do telhado da plataforma havia desabado. Logo que mudado o ponto de embarque, a velha
estação foi demolida. (Fontes: Waldemar Stiel, História dos Transportes Coletivos de São Paulo, 1978; Guia Histórico do Guarujá, verão
2002).
Estação Guarujá, com uma composição de três carros de passageiros tracionados por um bonde, em cartão
postal publicado logo após a inauguração do prédio
Foto: acervo de J. E. Gerodetti e Carlos Cornejo, publicada no seu livro As ferrovias do Brasil e
disponibilizada no site
Tramway do Guarujá
"Com a deterioração da estação original do Guarujá construída em 1893 entre a praia e o Grande Hotel, foi
necessário se construir uma nova, e o local escolhido foi outro: o antigo pátio de cargas do bonde, na avenida Leomil, a dois quarteirões da praia. Em
1935, a inauguração do novo prédio aconteceu e o velho foi desativado e demolido.
A estação nova e o bonde, em foto não datada
Foto: coleção do pesquisador Marcello Talamo, de São Paulo/SP
"A estação de Guarujá-nova foi ativa até 1956, quando, a 13 de julho, o tráfego dos bondes e da locomotiva foi
paralisado definitivamente e a estação, desativada. Eu ainda me recordo dela, na esquina da avenida Leomil com uma das ruas que davam na praia, no
início dos anos 80, fechada e abandonada, até que, por volta de 1982, foi iniciada a sua demolição. O prédio ainda ostentava o dístico: Guarujá",
completa o autor da série Estações Ferroviárias do Estado de São Paulo.
A estação Guarujá (na Avenida Leomil) e o bonde nº 7, indo para
Itapema, no retorno desde a Estação Pitangueiras, possivelmente na década de 1940
Foto: Carl Heinz Hahmann, no acervo do pesquisador estadunidense Allen Morrison
Seu relato é completado por Antonio Augusto Gorni, em suas páginas
EFBrasil (lembrando que tramway é a palavra inglesa para designar os bondes):
As praias do Guarujá são muito belas e, no final do século XIX, virtualmente desertas, já que o
acesso à região era muito difícil. O acesso direto pelo continente, via Cubatão, somente foi viabilizado no final da década de 1960 devido ao
terreno de mangue, que dificultava sobremaneira a construção de estradas estáveis. A opção mais viável de acesso ao Guarujá consistia em se
atravessar o estuário em frente ao porto de Santos, atingindo-se Itapema, já na ilha de Santo Amaro, e daí seguir até a cidade do Guarujá.
Apesar das dificuldades de acesso, a beleza das praias do Guarujá fez com que o empresário Elias
Pacheco Jordão fundasse, no final do século XIX, a Companhia Balneária. Esta companhia construiu o Grande Hotel de la Plage na praia das
Pitangueiras. Logo o Guarujá se torna grande atração turística para brasileiros e estrangeiros.
Para facilitar o acesso dos turistas à nova estância em 1892 é iniciada a construção do Tramway do
Guarujá - na verdade, uma pequena ferrovia - entre o porto de barcas de Itapema e a Praia das Pitangueiras, com extensão aproximada de nove
quilômetros. Ela é inaugurada a 2 de setembro de 1893, numa solenidade que contou com a presença do presidente do Estado, Bernardino de Campos, além
de outras autoridades. Os turistas que se destinavam ao Guarujá tomavam um pequeno vapor no porto de Santos, chamado Cidade de São Paulo, que
atravessava o estuário até Itapema. Lá havia uma estação onde os turistas pegavam um trem a vapor que seguia até a frente do Grande Hotel, na praia
das Pitangueiras.
O Tramway do Guarujá incluía também um pequeno ramal entre o Guarujá e a localidade de Santa Rosa,
em frente ao bairro da Ponta da Praia em Santos, com extensão aproximada de três quilômetros. No final da década de 1910 esse ramal foi desativado,
sendo construída uma estrada de rodagem. Em 19 de Janeiro de 1918 é implantado um serviço de balsas entre a Ponta da Praia e Santa Rosa,
viabilizando o tráfego direto de automóveis entre Santos e o Guarujá. Estava plantada a semente que destruiria, quase quarenta anos depois, o
Tramway do Guarujá. Contudo, a incipiente evolução rodoviária do país ainda lhe garantiu uma boa sobrevida. (...)
A eletrificação foi inaugurada a 11 de janeiro de 1925. Infelizmente, essa melhoria não impediu
que a Companhia do Guarujá viesse a apresentar déficits crescentes, requerendo auxílio do governo estadual. Em 1° de Outubro de 1926 a Lei Estadual
n° 2140 permite a encampação da Companhia Guarujá. Seus bens passam a ser propriedade do governo através do decreto estadual n° 4192, de 12 de
Fevereiro de 1927. Foi então criada uma repartição municipal denominada Serviços Públicos do Guarujá que administrava, entre outros serviços, o
Tramway do Guarujá. (...)
A 3 de julho de 1934 foi criada a Estância Balneária do Guarujá, evento que motivou a realização
de melhorias no serviço do Tramway do Guarujá. Decidiu-se então construir uma nova estação e oficinas, localizadas agora na Av. Leomil, a dois
quarteirões da praia. Elas foram inauguradas a 21 de dezembro de 1935.
Em 1952 foram realizadas novas obras de melhoria no Tramway Guarujá, mas sua situação vinha se
tornando cada vez mais crítica devido à pesada concorrência das empresas de ônibus. A estrada de rodagem que ligava Santa Rosa, o ponto onde
atracavam as balsas vindas da Ponta da Praia, até o Guarujá havia sido asfaltada. Dessa forma, os passageiros podiam seguir de Santos até o Guarujá
sem precisar baldear para uma barca e, de lá, para o bonde; sem dúvida uma comodidade que aumentou decisivamente a competitividade do transporte
rodoviário. O serviço de bondes acabou por ser interrompido a 13 de julho de 1956. |
Subestação Convertedora (Retificadora) do Tramway do Guarujá, localizada no KM 4 da ferrovia (na então
vila de Conceiçãozinha) e encarregada de converter a energia elétrica de 6.600 volts de corrente alternada em 750 volts de corrente contínua para a
ferrovia. Um trem de passageiros é visto à esquerda na imagem
Foto: acervo de Octávio Luís Bertacin, filho de Luís Bertacin e neto do engenheiro Ettore Bertacin, da
Casa Siemens, que dirigiu os trabalhos de eletrificação da ferrovia. Imagem
disponibilizada no site Tramway do Guarujá
De acordo com Antônio Gorni, em seu livro sobre a
Eletrificação da Ferrovias Brasileiras,"Os equipamentos usados na
eletrificação foram fornecidos pela Siemens; as obras foram dirigidas pelo engenheiro Ettore Bertacin, da Casa Siemens de São Paulo e tiveram duração de
oito meses. A subestação elétrica principal, que também abastecia o distrito de Itapema, estava localizada 'próximo das
torres grandes da Companhia Docas de Santos', recebendo a corrente em 40.000 volts e transformado-a a 6.600 volts. A subestação retificadora, que
reduzia e retificava a corrente alternada de 6,6 kV para 750 volts a ser usada na linha de contato, situava-se no quilômetro 4 da via férrea, ou seja,
próximo à metade de seu percurso, no bairro da Conceiçãozinha.Todo o material rodante era de origem alemã, tendo sido produzido pelas firmas Siemens e
M.A.N. - Maschinenfabrik Augsburg Nürnberg. Foram adquiridos dois bondes de 106 HP, numerados #3 e #9, e uma locomotiva elétrica de 106 HP para
tracionar trens de carga. Esta máquina, com 18 t de peso, tinha capacidade de tracionar trens de 47 t de carga a uma velocidade de 45 km/h. A
eletrificação foi inaugurada a 11 de Janeiro de 1925.”
Subestação Retificadora do Tramway do Guarujá, localizada no KM 4 da ferrovia, com dois bondes se
cruzando durante as operações, em foto do Álbum dos Serviços Públicos de Guarujá
Foto: acervo de Wanderley Duck,
disponibilizada no site Tramway do Guarujá
Oficinas do Tramway do Guarujá, com quase todos os materiais de tração da linha férrea: em seqüência a
partir da esquerda, o bonde, a locomotiva a vapor, um carro fechado de teto alto, a Loco Elétrica, um carro de
passageiros de teto baixo e os carros abertos
Foto: reprodução do relatório Serviços Públicos do Guarujá, enviado por Wanderley Duck ao site
Tramway do Guarujá
Sobre essa ligação férrea, registrou o site Wikipedia
(consulta em 25/6/2011):
Tramway do Guarujá
Com a prosperidade da cultura do café no estado de São Paulo áreas próximas dos locais onde
circulavam fazendeiros, corretores, comerciantes e profissionais envolvidos no comércio de café começaram a desenvolver o turismo.
Neste contexto o empresário Elias Pacheco Jordão funda no final do século XIX a Cia. Balneária da Ilha de Santo
Amaro, que construiria o Grande Hotel de la Plage, no balneário do Guarujá na praia das Pitangueiras, assim como uma linha férrea em bitola
métrica.
A companhia ao longo do tempo já foi denominada de Companhia Balneária,
Companhia do Guarujá, Estrada de Ferro do Guarujá, Estrada de Ferro Itapema-Guarujá, Serviços Públicos do Guarujá, Estância Balneária do Guarujá e
por algum período também foi batizado Tramway do Guarujá [1] [2].
Companhia Balneária da Ilha de Santo Amaro - A Cia Balneária
[3] iniciou em 1882 a construção de uma
ferrovia com tração a vapor [4], entre o porto
de Itapema e a Praia das Pitangueiras, com aproximadamente 9 km. Foi inaugurada em 2 de setembro de 1893, contando com a presença de Bernardino de
Campos (Presidente da Província), entre outras autoridades.
Foram construídas inicialmente as estações de Itapema
[5] (chegada das barcas de Santos) e
Guarujá [6], esta edificada em frente ao hotel e
demolida na década de 1930. Existiu uma estação intermediária chamada de Bento Pedro [7],
mas cuja data de inauguração não é conhecida.
Foi construído um ramal com aproximadamente 3 km, entre Guarujá e a localidade Santa Rosa.
O "Grand Hotel La Plage" foi consumido por um incêndio em 1897, sendo substituído por outra construção.
Companhia do Guarujá - Em 1901 a Companhia do Guarujá assume o controle do hotel e da linha férrea. O ramal Santa Rosa
é erradicado no final da década de 1910, sendo substituído por uma estrada de rodagem. Percival Farquhar,
empresário americano, adquire em 1910 [2] a
companhia, em meados da década de 1920 o império construído por Farquhar começa a desmoronar, principalmente pela perda de investidores europeus
em decorrência da 1º Guerra Mundial [8].
A eletrificação é anunciada em 4 de maio de 1923, sendo a responsabilidade pela execução a cargo do Engº Ettore
Bertacin, o sistema foi executado em 8 meses sendo inaugurado em 11 de janeiro de 1925. O fornecimento de materiais ficou a cargo da Siemens, já o
material rodante foi de responsabilidade das empresas Siemens e MAN.
Inicialmente foram adquiridos em 1924 dois bondes (nº3 e 9) de 106 hp e uma locomotiva elétrica
modelo Siemens E 69 (nº1) de 104 hp, para os serviços de carga [9].
Mesmo com as melhorias implantada a Cia Guarujá continuava a apresentar déficits crescentes.
Serviços Públicos do Guarujá -
A Lei Estadual n° 2140 (1 de outubro de 1926) permitiu a encampação pelo estado da Cia Guarujá,
sendo seus bens incorporados ao estado através do decreto estadual n° 4192, de 12 de Fevereiro de 1927, sendo criados os Serviços Públicos do
Guarujá (autarquia municipal).
Foi construído um ramal de aproximadamente 3 km até a localidade do Sítio Cachoeira para
transporte de carga [10], também sendo
adquiridos mais dois bondes da MAN (nº5 e 7). Na década de 1930 ocorre o sucateamento, após um acidente, do bonde nº3.
Estância
Balneária do Guarujá -
A Estância Balneária do Guarujá foi criada em 3 de julho de 1934. Foram construídas nova estação
[11]
e oficinas, sendo inauguradas em 21 de dezembro de 1935. Foram realizadas obras de melhoria na linha de bondes do Guarujá em 1952, mas devido à
concorrência com as linhas de ônibus o sistema foi fechado no ano de 1956.
Fim -
Em 13 de julho de 1956, após um período de 63 anos de operação, foi interrompido o serviço de bondes e seu material rodante que estava em
bom estado foi transferido para a E.F. Campos do Jordão. A locomotiva a vapor nº2, fabricada pela Baldwin em 1891, original da Companhia Balneária
encontra-se preservada em condição estática [12]
na cidade do Guarujá.
Referências
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