À memória do
Professor José Eduardo de Macedo Soares
- mestre perfeito, e modelo de mestres pelo saber e pela estatura moral -
dedica e consagra
O AUTOR
Prólogo
Esta é a segunda vez que reúno em livro alguns dos meus trabalhos publicados no jornal A Tribuna, de Santos, acerca de assuntos históricos.
Formaram os escritos anteriores o volume intitulado Santos noutros tempos.
Tanto no livro que ora dou a público, como nesse que apareceu antes, procurei aliar a variedade à unidade, entrosando no conjunto cada uma das diferentes peças. Constituem elas, deste
modo, uma pequena galeria de quadros históricos, que pintei às vezes a talhe doce, mas sem enfeitá-los pela imaginação. A história se não compraz com fantasias.
Na verdade Bouvard e Pécuchet, os dois bertoldos que se meteram a historiadores, pregavam que "sem imaginação, a História é falha"; que "ela muda todos os dias"; e que "na escolha dos documentos, costuma dominar certo estado de
espírito, e como este varia, segundo as condições do escritor, jamais será fixada a história" (Flaubert, Bouvard e Pécuchet, cap. IV, págs. 94, 95 e 100).
Indubitavelmente, quando eles se afoitaram a isso afiançar, já estavam sofrendo da doenças de Froude, ou doença da inexatidão, mal tão traiçoeiro, que tem transformado em mitólogos,
até na época presente, alguns divulgadores das coisas de Santos.
A história não deve ser escrita ao sabor dos nossos achaques, das nossas conveniências ou das nossas excentricidades, mas conforme à realidade dos acontecimentos públicos, à verdade
notória e conrrentia dos fatos.
Frei Luís de Sousa, num dos seus mimos do dizer, assim se enunciava sobre o assunto:
"Escrever história com as partes que ela requer, é mais obra da Providência divina, que das forças humanas" (Vida do Arcebispo, I, I, pg. 8).
Julgo, destarte, que não andarei mal se disser que tive como pensamento dominante, ao compor estas páginas, não empregar material de segunda mão. A luz dos documentos é que me serviu
de guia. Muitos deles foram pela primeira vez por mim escavados no veio pouco explorado dos arquivos notariais, cujos livros e autos tenho compulsado desde que principiei a freqüentar a escola forense.
Foi aí que me tomei de uma curiosidade imensa pelo passado de Santos. Vivo hoje, por isso mesmo, a maior parte do meu tempo como um pobre fradinho encantoado no meu gabinete de estudo
a dessoterrar coisas preciosas do subsolo histórico da terra dos Andradas. E quanta canseira, quantas buscas áridas exigem trabalhos destes! Levo muitas vezes dias inteiros para encontrar em documentos carunchosos, poeirentos, um dentezinho de
história.
Justiniano, Virgílio e Gaston Boissier deram-me o amor às ruínas de Roma.
O meu pecúlio de notícias históricas, as minhas jornadas de investigações e certos vultos eminentes por engenho e erudição, como, pondo exemplo, os três Andradas da Independência,
deram-me o amor a Santos de outrora.
O seu passado é, para mim, um concerto interior que ouço permanentemente, num delicioso encantamento.
A meu ver, cumpre à nova geração estudá-lo a fundo. E, com alto senso e lúcida visão retrospectiva, erigir o monumento perdurável a que Santos tem direito.
Se algum dia estes limitados subsídios vierem a concorrer para tal empreendimento, ter-me-á Deus concedido, mais uma vez, a munificência da sua proteção. E, então, a estas palavras
preambulares se ajuntará o seguinte subtítulo: - Em prol dos direitos da História.
José da Costa e Silva Sobrinho
Santos, 30-10-1957.