CÂMARA
E AGENDA 21 REGIONAL - PARTE I - Capítulo 1 (cont.)
Sílvia
de Castro Bacellar do Carmo
1.2 - Conceitos,
Dimensões e Indicadores de Sustentabilidade
A
conceituação dos termos sustentabilidade e desenvolvimento
sustentável possui uma enorme gama de interpretações
decorrente, principalmente por causa dos diversos fatores envolvidos. Devido
o embasamento deste trabalho estar estreitamente vinculado aos paradigmas
dos mesmos como suporte para o que se interpreta como a cidade sustentável
desejável,
são
aqui apresentadas algumas das questões levantadas sobre o assunto
de modo a ter-se uma abrangência geral e respaldar a seqüência
da pesquisa.
Anteriormente
ao conceito de desenvolvimento sustentável falava-se nos
princípios do eco-desenvolvimento. Este conceito foi lançado
em 1973 pelo canadense Maurice Strong, enquanto Diretor Executivo do PNUMA.
Segundo Layrargues (1998) tratou-se de uma tentativa de definir um novo
tipo de desenvolvimento voltado às áreas rurais do terceiro
mundo.
Na análise
de Machado (2000) os ideais iniciais do eco-desenvolvimento, que
contrapunham os termos subdesenvolvimento e superdesenvolvimento não
obtiveram boas repercussões naquele momento (início da década
de 1970) porque coincidiam com novas ondas de crescimento econômico
e tecnológico, surgindo então o termo países em desenvolvimento,
o qual já foi substituído na atualidade por países
emergentes.
Partindo das
idéias lançadas por Strong, Ignacy Sachs desenvolveu na década
de 80 a sua concepção do eco-desenvolvimento ampliando-a
para as áreas urbanas. De acordo com Sandra Silva (2000, p. 42 e
43), Sachs propôs a sistematização de cinco dimensões
para a sustentabilidade:
Sustentabilidade
Econômica: a eficiência deve ser medida em termos macros-sociais
e não através de critérios microeconômicos de
rentabilidade empresarial;
Sustentabilidade
Social: uma civilização com maior equidade na distribuição
de rendas e bens, reduzindo o distanciamento e as discrepâncias entre
as camadas sociais;
Sustentabilidade
Ecológica: obtida através da racionalização
do aporte de recursos, com a limitação daqueles esgotáveis
ou danosos ao meio-ambiente; redução do volume de resíduos,
por meio da conservação de energia e práticas de reciclagem;
pesquisas em tecnologias ambientalmente mais adequadas e implementação
de políticas de proteção ambiental;
Sustentabilidade
Geográfica ou Espacial: configuração rural-urbana
mais equilibrada, com redução de concentrações
urbanas e industriais; proteção de ecossistemas frágeis
e criação de reservas para a proteção da biodiversidade;
agricultura e agro-silvicultura com técnicas modernas, regenerativas
e em escalas menores.
Sustentabilidade
Cultural: consideração das raízes endógenas,
com soluções específicas para o local, o ecossistema,
a cultura e a área, com mudanças se dando num contexto de
continuidade cultural e com o respeito à diversidade em todas as
suas formas de expressão.
Pode-se considerar
historicamente que os debates em torno do eco-desenvolvimento representaram
os passos iniciais para o novo conceito de desenvolvimento sustentável,
proposto no Relatório Brundtland em 1987, conforme referenciado
anteriormente.
Neste documento
desenvolvimento
sustentável é definido como "um processo de mudança
no qual a exploração dos recursos, a orientação
dos investimentos, os rumos do desenvolvimento tecnológico e a mudança
institucional estão de acordo com as necessidades atuais e futuras"
(CNMAD, 1991, p. 9), e mais adiante com a expressão mais divulgada
e citada em vários estudos e artigos: "Aquele que atende às
necessidades do presente, sem comprometer as possibilidades de as gerações
atenderem às suas próprias necessidades" (idem, p. 46), tendo
sido definitivamente aceito e incorporado nos diversos discursos, políticos,
econômicos e ambientalistas, a partir da CNUMAD de 1992.
Em 1995 [1]
Sachs declarou que não aprovava a expressão desenvolvimento
sustentável por acreditar que gera confusões com o antigo
conceito dos economistas, o crescimento auto-sustentado, e ressaltou que
o termo crescimento não pode ser confundido com desenvolvimento.
Cavalcanti
(2002, p. 38) não se contrapõe a esta expressão dentro
da mesma linha de raciocínio de Sachs, ponderando que "a noção
de desenvolvimento sustentável representa uma alternativa ao conceito
de crescimento econômico, indicando que, sem a natureza, nada pode
ser produzido de forma sólida".
Esta idéia
também é defendida por Binswanger (2002) que associa o crescimento
econômico ao crescimento material e quantitativo da economia, enquanto
que o desenvolvimento sustentável qualifica o crescimento,
vinculando o desenvolvimento econômico à preservação
do meio-ambiente.
Cavalcanti
(2002) defende que não existe um único caminho para se alcançar
a sustentabilidade partindo da premissa de que a complexidade das
sociedades humanas faz com que cada situação deva ser compreendida
em seus desafios específicos, e conclui que se pode somente estabelecer
princípios e referências que orientem o processo da busca
da almejada sustentabilidade.
Referindo-se
ao crescimento econômico, coloca a sustentabilidade como uma
limitação ecológica ao processo tendo em vista
que a problemática ambiental consiste no uso saudável de
seus estoques, ou seja, não sobrecarregar as funções
de suprimento e recursos, assim como as funções de absorção
de dejetos do ecossistema.
Estabelece
desta maneira o desafio do desenvolvimento sustentável como
o de estabelecer políticas que levem à melhoria das condições
de vida dos seres humanos sem perturbar as funções ecossistêmicas
essenciais.
Bizelli (2001)
também defende que o conceito de sustentabilidade está
vinculado à ecologia, significando a capacidade de um ecossistema
se recompor e se regenerar. Ao se transportar este termo para as relações
entre a sociedade e o meio-ambiente, o conceito adquire novos aspectos,
englobando além das dimensões ecológicas, as dimensões
sociais e econômicas; o que vai de encontro às questões
levantadas por Cavalcanti e expostas no parágrafo anterior.
Na opinião
de Franco (2001) o conceito de desenvolvimento sustentável
é complexo e controvertido devido à necessidade de mudanças
fundamentais na maneira de pensar, viver, produzir e consumir, entre outras.
Sem estas mudanças sua implantação torna-se inviável.
Completando o pensamento afirma que são quatro os fatores de ordem
antropogênica que mais influenciam a sustentabilidade ambiental:
a poluição, a pobreza, a tecnologia e os estilos de vida.
Marina Silva
(1998/1999), no caso específico brasileiro, coloca a necessidade
de transformações nas políticas que norteiam o desenvolvimento
econômico do país para que se possa implantar a sustentabilidade,
aumentando assim a abrangência das mudanças necessárias.
Podem-se encontrar
todos estes fatores, além da inclusão do fator demográfico,
não referenciado em muitas conceituações, na análise
de Guimarães e Maia (1997), segundo o qual o processo de construção
do desenvolvimento sustentável é formado por várias
dinâmicas sócio-ambientais que se completam:
Sustentabilidade
Ecológica: base física do processo de crescimento; tem
como objetivos a conservação e o uso racional do estoque
de recursos naturais incorporados às atividades produtivas;
Sustentabilidade
Ambiental: relacionada à capacidade de suporte dos ecossistemas
de absorver ou de se recuperar das agressões sofridas pelas ações
antrópicas, implicando em um equilíbrio da emissão
e/ou produção de resíduos com as taxas de absorção
e/ou regeneração da base natural de recursos;
Sustentabilidade
Demográfica: limites da capacidade de suporte de determinado
território, e de sua base de recursos; relaciona as tendências
de crescimento econômico com as taxas demográficas, sua composição
etária e os contingentes da população economicamente
ativa esperados;
Sustentabilidade
Cultural: manutenção das diversidades culturais, valores
e práticas existentes no planeta, no país ou região,
e que identificam as identidades dos povos;
Sustentabilidade
Social: promoção da melhoria da qualidade de vida e redução
dos níveis de exclusão social, por meio de políticas
de justiça redistributiva;
Sustentabilidade
Política: construção da cidadania plena dos indivíduos
por meio do fortalecimento dos mecanismos democráticos de formulação
e de implementação das políticas públicas em
escala global.
Sustentabilidade
Institucional: criação e fortalecimento de instituições
com critérios de sustentabilidade.
Não
se encontra, no entanto, nas análises de Guimarães (1997)
e Franco (2001), o fator econômico como uma questão a ser
destacada, conforme difundido em outros estudos, estando esta dimensão
diluída entre as demais.
Goulet (2002)
discute o desenvolvimento sustentável a partir do questionamento
do que seja riqueza genuína e desenvolvimento autêntico.
Em relação à riqueza genuína considera
que seja a garantia de bens essenciais para todos, dentro de um modo de
produção que promova meios de vida justos, com o uso de bens
materiais para o crescimento da riqueza espiritual, e com prioridade à
riqueza pública em relação às posses pessoais.
Quanto ao desenvolvimento
autêntico, baseia-se na ponderação dos valores
de igualdade, justiça social e postura da sociedade em relação
à natureza, concluindo que "uma sociedade autenticamente desenvolvida
é a que proporciona respostas normativas e institucionais para estas
questões de valor" (p. 77).
A somatória
destas duas considerações leva à constatação
de que o desenvolvimento sustentável traduz-se numa sociedade
onde todos os seus membros tenham garantido um ótimo nível
de sustentação de vida, assim como de estima e liberdade,
aliado aos cuidados com os recursos naturais de sustentação
da vida e com o uso de tecnologias que preservem as liberdades humanas,
ressaltado que para a continuidade da espécie humana é imprescindível
a saúde ambiental.
Estabelece
quatro domínios para a garantia da sustentabilidade: econômico,
político, social e cultural, onde a questão ambiental encontra-se
inserida na viabilidade econômica que depende intrinsecamente do
uso adequado dos recursos de modo a evitar que seja atingido o esgotamento,
e do padrão de manejo dos resíduos resultantes do processo
produtivo.
O comentário
elaborado por Jöst (2002) é extremamente relevante. Segundo
este autor, "A sustentabilidade não é uma coisa a ser atingida,
mas um processo contínuo" (p. 106). Considera que a partir do diagnóstico
do estado de relação entre a estrutura da economia e do sistema
social, e de ambos com a natureza, procede-se à elaboração
de medidas políticas para atingir a situação sustentável
desejada para um futuro pré-determinado, sendo que estas medidas
políticas devem derivar de um processo participativo que traduza
o consenso da sociedade.
Esta noção
de continuidade do processo é essencial para a assimilação
do que seja a sustentabilidade, pois implica na hipótese
de que se trata de um trabalho gradual e do conjunto da sociedade, com
fases consecutivas e ininterruptas conforme as necessidades, anseios e
avaliações da comunidade em questão.
Este conceito
de que a sustentabilidade é um processo e não um estado,
também é encontrado no documento Cidades Sustentáveis
- Subsídios à Elaboração da Agenda 21 Brasileira
[2]
(BEZERRA; FERNANDES, 2000), sendo que esta constatação levou
a equipe que elaborou o documento a trabalhar com a noção
da sustentabilidade progressiva, além da noção
de sustentabilidade ampliada.
Esta última
integra as questões estritamente ambientais aos fatores sociais
e econômicos, desenvolvendo as questões sobre a degradação
do meio-ambiente em conjunto com o problema da pobreza da população.
A partir da
investigação sobre várias das conceituações
sobre o assunto, muitas delas expostas na presente discussão, Sandra
Silva (2000) considera que a noção de sustentabilidade
está vinculada a quatro aspectos:
1) compromisso
das gerações atuais com as futuras no que tange em garantir
as necessidades básicas, e as implicações decorrentes
deste desafio;
2) dependência
do aporte de contribuição de diversas áreas de conhecimento,
devido à pluralidade que a questão abarca;
3) influência
do fator tempo e das especificidades locais; e,
4) ação
dos agentes e atores sociais envolvidos na implementação.
Estas considerações
proporcionam à questão da sustentabilidade um caráter
mais prático, colaborando na promoção da transferência
da teorização para a realidade.
Em artigo sobre
a sustentabilidade, Marcuse (1998) sugere que a inserção
desta como meta no desenvolvimento urbano não é funcional,
baseando-se no argumento de que tanto o desenvolvimento urbano quanto o
habitacional constituem-se na realidade em uma arena de conflitos - onde
o que beneficia um, prejudica a outro, não existindo um consenso
único sobre os objetivos a serem alcançados.
Os questionamentos
aos quais se propõe, o levam à conclusão que a meta
maior a ser buscada é a justiça social integrada à
sustentabilidade
do meio-ambiente. Na verdade, suas colocações apontam para
o tripé de sustentação do desenvolvimento sustentável,
que além do desenvolvimento econômico e da preservação
do meio-ambiente, é composto também pela justiça social.
O posicionamento
de
Rattner (1992) sobre a questão da sustentabilidade é
inserido aqui como a integração das opiniões anteriormente
expostas, destacando-se a ênfase na questão social:
O conceito
de desenvolvimento sustentável só faz sentido à medida
que nos impele a lutar por uma sociedade mais equilibrada e racional, não
somente nas relações homem-natureza, mas, sobretudo nas relações
homem-homem, ou seja, em busca de maior harmonia e equilíbrio entre
elas, e dentro das sociedades contemporâneas.
A necessidade
de compatibilizar as políticas urbanas com o Meio-Ambiente
dentro da nova ótica de desenvolvimento desejado levou à
discussão sobre cidades sustentáveis. Esta afirmação
encontra respaldo no documento Cidades Sustentáveis, citado
anteriormente, onde se encontra o argumento de que a partir do momento
em que o termo sustentabilidade passou a ser enunciado como uma
qualidade que identifica diversos processos, sociais ou institucionais,
distinguindo-os do que eram antes, adquiriu uma característica paradigmática,
dando suporte à formulação de uma sustentabilidade
urbana, permitindo assim considerar possível e desejável
que o desenvolvimento urbano possa ocorrer em bases sustentáveis
(BEZERRA; FERNANDES, 2000).
Na opinião
de Bizelli (2001) para alcançar a cidade sustentável
é necessária uma interação entre as dimensões
ambientais, sociais e econômicas do desenvolvimento da cidade, devendo
ser considerado como um processo de sustentabilidade progressivo. A cidade
deve crescer sem destruir o espaço físico no qual viverão
as próximas gerações, caracterizando a relação
indissociável do meio-ambiente e do meio social.
Cabe aqui uma
ponderação sobre esta afirmação, pois não
é realisticamente viável o crescimento da cidade sem a destruição,
mesma que parcial, do espaço físico. Interpreta-se esta colocação
como uma integração entre o construir e o respeito e cuidados
devidos ao meio-ambiente natural, no que concerne às leis físicas,
com a procura da minimização dos impactos decorrentes.
Bizelli considera
também que a gestão urbana, voltada para a construção
de uma cidade sustentável, deva contar com uma participação
ativa da sociedade, deva utilizar-se de parcerias urbanas, e também
democratizar as informações sobre a cidade, com programas
de educação e comunicação para os cidadãos.
Segundo Grostein
e Jacobi (1998) a necessidade da implementação de novas políticas
públicas é essencial para a construção de cidades
sustentáveis, o que levará a novas práticas sócio-institucionais
em relação aos sistemas ecológicos e sociais das comunidades
urbanas.
Defendem mudanças
em relação a estilos de vida na busca da sustentabilidade
urbana, como a redução do desperdício, conscientização
da escassez dos recursos naturais, valorização da participação
da comunidade, além do reconhecimento das demandas e ações
relativas à atual degradação sócio-ambiental.
Colocam a pobreza
como fator central de grande parte dos problemas ambientais urbanos, os
quais podem ser detectados em assentamentos humanos localizados principalmente
nos municípios metropolitanos.
Devido a esta
última colocação, faz-se aqui um recorte para a situação
nacional a partir da idéia exposta por Maricato (2001) que defende
a idéia de que em termos da realidade brasileira, onde as áreas
de proteção ambiental são freqüentemente ocupadas
pela população pobre para loteamentos ilegais e para invasão
de terras, o caminho para se construir a cidade sustentável
aponta para a necessidade de ampliação do mercado imobiliário
legal, com soluções para a questão fundiária
urbana, e da formulação de políticas sociais.
Continuando
na linha de raciocínio da problemática social brasileira
cabe incluir nesta seqüência a opinião de Rolnik (1997,
p. 20): "não é possível pensar uma política
ambiental urbana no Brasil sem relacioná-la imediatamente a uma
política social, pois a equação urbano-ambiental nas
nossas cidades é absolutamente conectada com o tema da exclusão
social".
Este pensamento
deriva da realidade nacional onde impera grandes desigualdades econômica,
social e política, contexto que impossibilita a implantação
da sustentabilidade nas cidades. Estas idéias encontram resposta
na aprovação do Estatuto da Cidade [3],
que legaliza novos instrumentos a serem utilizados na gestão urbana,
apesar de que sua concretização fica dependente das ações
governamentais locais.
Logicamente,
as observações destas duas profissionais não restringem
o processo de construção de cidades sustentáveis
à simples adoção do procedimento de regularização
fundiária nos municípios, mas ressaltam a importância
da equidade social como um dos parâmetros básicos a sedimentar
o caminho para tal.
Sanches (2000)
argumenta que em decorrência do dinamismo do contexto urbano a sustentabilidade
urbana não pode ser alcançada como um fim absoluto, mas,
considerada como um processo contínuo - idéia já apresentada
neste mesmo item a partir da citação de outros autores. Contudo,
aponta para a viabilidade de formatação de etapas delimitadas,
começando pela construção de uma Agenda 21 Local,
onde se identificam os atores urbanos e definem-se não só
as metas desejadas e necessárias, como também o período
de tempo possível para alcançá-las.
Este parecer
corrobora a hipótese que deu origem a este trabalho, que tem na
Agenda 21 Local o instrumental detonador e capacitador para o processo
de busca da sustentabilidade nos aglomerados urbanos.
Continuando
na linha de investigação dos instrumentos relacionados à
construção da sustentabilidade, deve-se averiguar
o emprego de indicadores. De uma maneira genérica, os indicadores
são utilizados como "instrumentos de diagnóstico de uma determinada
realidade com a finalidade de se traçar políticas e apoiar
tomadas de decisões" (SILVA, S., 2000, p. 246).
O emprego de
indicadores iniciou-se na década de 40 do séc. XX e em um
primeiro momento eram voltados para análises de prospecção
econômicas e financeiras, tais como o Produto Nacional Bruto (PNB),
e o Produto Interno Bruto (PIB). Estes indicadores passaram a representar
os instrumentos de medição do crescimento econômico
dos países, onde a obtenção de valores altos indica
uma melhor situação econômica do país, e em
conseqüência, um melhor nível de vida de sua população.
Porém,
estes dois exemplos específicos não possuem em suas composições
as variáveis correspondentes à degradação ambiental
e a diferença na distribuição de renda entre a população,
podendo-se concluir que na realidade não podem ser utilizados como
referências ao nível de vida.
A esta crítica
de interpretação do PIB surgiu o Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH), criado em 1990, que considera em sua composição,
além da variável econômica, a longevidade - expectativa
de vida, e a escolaridade, representando um indicador mais apurado na análise
do desenvolvimento de um país.
Existem vários
indicadores ou índices com o objetivo medir o estágio de
diversas situações e ações, mas, sendo a pauta
desta pesquisa a dimensão ambiental, cabe focar a investigação
nos novos indicadores que surgem a partir da conscientização
sobre o meio-ambiente.
Na visão
desta mesma pesquisadora, os indicadores de sustentabilidade têm
por finalidade auxiliar a visão da realidade atualizada do meio-ambiente,
do ponto de vista da sustentabilidade, e dos fatores gerados pela
atividade antrópica ou intervenção urbana em determinado
meio-ambiente, permitindo a medição e comparação
de determinadas situações.
Reis (1999)
reforça esta definição quando pondera que os indicadores
de sustentabilidade colaboram nas tomadas de decisões devido
à comparação dos dados no tempo, o que permite que
haja um alerta para um determinado problema e que sejam providenciadas
as medidas cabíveis; acrescenta que desta maneira auxiliam no monitoramento
do resultado prático de ações efetuadas.
Porém,
ainda não existem parâmetros sedimentados para a formulação
dos indicadores direcionados às questões ambientais, devido
à enorme gama de variáveis pertinentes. A colocação
de Alexandre (1997), citada por Sandra Silva (2000, p.102), traduz com
propriedade a dificuldade desta elaboração:
Os indicadores
econômicos e financeiros têm sido usados há muito tempo,
enquanto que os indicadores ambientais ainda estão sendo desenvolvidos.
A principal razão para esta situação é que
existe uma linguagem simples e comum para descrever as trocas financeiras
e econômicas, que é o dinheiro, enquanto que não existe
uma linguagem simples e única para o monitoramento urbano e as alterações
ambientais [...].
O Departamento
de Coordenação Política e Desenvolvimento Sustentável
das Nações Unidas (DPCSD) [4]
desenvolveu um programa de indicadores para a construção
da sustentabilidade, com o objetivo de auxiliar nas tomadas de decisões
a nível institucional. Utilizaram o sistema denominado PSR (Pressure,
State, Response), ou PER (Pressão, Estado, Resposta), criado
pela Organization Economics Cooperation Development (OECD), como ponto
de partida, acrescentando dimensões não ambientais e ampliando
desta maneira o raio de utilização do instrumental. O sistema
PER é baseado nos seguintes parâmetros:
A
atividade humana exerce uma pressão no ambiente:"P" de Pressão;
A
pressão muda a qualidade do meio-ambiente e qualidade dos recursos
naturais: "E" de Estado;
A
sociedade responde a essas mudanças através de políticas
econômicas gerais e setoriais, interagindo com a pressão anteriormente
efetuada, através das atitudes humanas:"R" de Resposta (REIS,
1999).
Este programa
foi desenvolvido a partir da Agenda 21, tendo gerado em seus 40
capítulos um conjunto de 132 indicadores. Ao tema Ambiental foram
dedicados 14 capítulos e criados 55 indicadores, representando 42%
do total de indicadores gerados. O tema Social apresentou 39 indicadores,
o tema Econômico, 23 indicadores, e o Institucional, somente 15 (SILVA,
S., 2000).
No quadro
1.1 é apresentada a relação dos capítulos
abordados na elaboração dos indicadores da Agenda 21 Global
na temática ambiental.
Sub-Tema
|
Capítulos
Referenciados e Conteúdos
|
ÁGUA
|
Cap.
18: Proteção da Qualidade e do Abastecimento dos Recursos
Hídricos |
Cap.
17: Proteção dos Oceanos, de todos os tipos de Mares e das
Zonas Costeiras |
TERRA
|
Cap.
10: Abordagem Integrada do Planejamento e do Gerenciamento dos Recursos
Terrestres |
Cap.
12: Manejo de Ecossistemas Frágeis: a Luta contra a Desertificação
e a Seca |
Cap.
13: Gerenciamento de Ecossistemas Frágeis: D. S. das Montanhas |
Cap.
14: Promoção do Desenvolvimento Rural e Agrícola Sustentável |
OUTROS
RECURSOS NATURAIS
|
Cap.
11: Combate ao Desflorestamento |
Cap.
15: Conservação da Diversidade Biológica |
Cap.
16: Manejo Ambientalmente Saudável da Biotecnologia |
ATMOSFERA
|
Cap.
9: Proteção da Atmosfera |
RESÍDUOS
|
Cap.
21: Manejo Ambientalmente Saudável dos Resíduos Sólidos
e Questões Relacionadas com os Esgotos |
Cap.
19: Manejo Ecologicamente Saudável das Substâncias Químicas
Tóxicas |
Cap.
20: Manejo Ambientalmente Saudável dos Resíduos Perigosos |
Cap.
22: Manejo Seguro e Ambientalmente Saudável dos Resíduos
Radioativos |
Quadro
1.1: Relação dos Sub-temas do Aspecto Ambiental e Capítulos
Referenciados
Fonte: adaptação
de SILVA, S., 2000.
Na seqüência
relacionam-se os indicadores de sustentabilidade relacionados ao
tema Ambiental e que surgiram a partir do trabalho baseado na Agenda
21 Global a partir da metodologia do sistema PER - quadro
1.2.
Indicador
|
Capítulo de Referência
|
Classificação PER |
1. Extração
anual de águas subterrâneas e superficiais |
Cap. 18
|
Pressão
|
2. Consumo doméstico
de água per capita |
Cap. 18
|
Pressão
|
3. Reservas de água
subterrânea |
Cap. 18
|
Estado
|
4. Concentração
de coliformes fecais em água doce |
Cap. 18
|
Estado
|
5. DBO dos corpos
d’água |
Cap. 18
|
Estado
|
6. Tratamento dos
resíduos da água |
Cap. 18
|
Resposta
|
7. Densidade da rede
hidrológica |
Cap. 18
|
Resposta
|
8. Crescimento populacional
nas áreas costeiras do litoral |
Cap. 17
|
Pressão
|
9. Descargas de óleo
nas áreas costeiras |
Cap. 17
|
Pressão
|
10. Liberação
de nitrogênio e fósforo nas águas costeiras |
Cap. 17
|
Pressão
|
11. Máximo
admitido para a produção costeira |
Cap. 17
|
Estado
|
12. Índice
de algas |
Cap. 17
|
Estado
|
13. Alteração
no uso do solo |
Cap. 10
|
Pressão
|
14. Alteração
nas condições do solo |
Cap. 10
|
Estado
|
15. Descentralização
do gerenciamento em nível local dos recursos naturais |
Cap. 10
|
Resposta
|
16. População
vivendo abaixo da linha de pobreza em áreas secas |
Cap. 12
|
Pressão
|
17. Índice
nacional pluviométrico mensal |
Cap. 12
|
Estado
|
18. Índice
de vegetação |
Cap. 12
|
Estado
|
19. Terras afetadas
por desertificação |
Cap. 12
|
Estado
|
20. Alteração
na população em áreas montanhosas |
Cap. 13
|
Pressão
|
21. Uso sustentável
dos recursos em áreas montanhosas |
Cap. 13
|
Estado
|
22. Bem-estar das
populações de montanhas |
Cap. 13
|
Estado
|
23. Uso de pesticidas
na agricultura |
Cap. 14
|
Pressão
|
24. Uso de fertilizantes |
Cap. 14
|
Pressão
|
25. % de irrigação
nas terras agricultáveis |
Cap. 14
|
Pressão
|
26. Uso de energia
na agricultura |
Cap. 14
|
Pressão
|
27. Terras agricultáveis
per
capita |
Cap. 14
|
Estado
|
28. Áreas afetadas
por salinização e águas paradas |
Cap. 14
|
Estado
|
29. Educação
agrícola |
Cap. 14
|
Resposta
|
30. Intensidade do
desmatamento |
Cap. 11
|
Pressão
|
31. Alteração
nas áreas de florestas |
Cap. 11
|
Estado
|
32. Coeficiente de
reflorestamento |
Cap. 11
|
Resposta
|
33.% de áreas
de florestas protegidas em relação ao total de áreas
de florestas |
Cap. 11
|
Resposta
|
34. % de espécies
tratadas em relação ao total de espécies |
Cap. 15
|
Estado
|
35. % de áreas
protegidas em relação à área total |
Cap.15
|
Resposta
|
36. Gastos em pesquisa
e desenvolvimento de biotecnologia |
Cap. 16
|
Resposta
|
37. Regulamentação
ou normatização para a bio-segurança |
Cap. 16
|
Resposta
|
38. Emissões
de gases "estufa" |
Cap. 9
|
Pressão
|
39. Emissão
de óxidos sulfúricos |
Cap. 9
|
Pressão
|
40. Emissão
de óxidos de nitrogênio |
Cap. 9
|
Pressão
|
41. Consumo de substâncias
de depleção ozônica |
Cap. 9
|
Pressão
|
42. Concentração
de poluentes em áreas urbanas |
Cap. 9
|
Estado
|
43. Gastos com redução
da poluição atmosférica |
Cap. 9
|
Resposta
|
44. Geração
de resíduos sólidos industriais e municipais |
Cap. 21
|
Pressão
|
45. Geração
de resíduos sólidos domésticos
per capita |
Cap. 21
|
Pressão
|
46. Gastos no gerenciamento
de resíduos sólidos |
Cap. 21
|
Pressão
|
47. Reciclagem e reuso
de resíduos sólidos |
Cap. 21
|
Resposta
|
48. Disposição
de resíduos sólidos municipais |
Cap. 21
|
Resposta
|
49. Ocorrência
de envenenamentos químicos agudos |
Cap. 19
|
Estado
|
50. Nº de severas
restrições aos produtos químicos |
Cap. 19
|
Resposta
|
51. Geração
de resíduos perigosos |
Cap. 20
|
Pressão
|
52. Importação
e exportação de resíduos perigosos |
Cap. 20
|
Pressão
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53. Área de
solo contaminada por resíduos perigosos |
Cap. 20
|
Estado
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54. Gastos com tratamento
de resíduos perigosos |
Cap. 20
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Resposta
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55.
Geração de resíduos radioativos |
Cap. 22
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Pressão
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Quadro
1.2: Indicadores de Caráter Ambiental - Agenda 21 Global Fonte: adaptação
de SILVA, S., 2000
Referenciando
os indicadores de sustentabilidade à questão urbana
e à Agenda 21 Local, Sanches (2000) desenvolve ponderações
a respeito de indicadores urbanos, colocando que a definição
ou a escolha destes deve fazer parte do processo de elaboração
da Agenda 21 Local, pois permitem o estabelecimento de eqüidades
e a transparência administrativa.
NOTAS:
[1]
Palestra sobre Desenvolvimento Sustentável, proferida em Brasília,
em 22 de agosto de 1995, promovida pelo IBAMA.
[2]
As principais diretrizes deste documento podem ser verificadas no Cap.
2, item 2.1.2 - Agenda 21 Brasileira.
[3]
O Estatuto da Cidade é aprofundado no item 1.5.2.
[4]
DPCSD = Department of Policy Co-ordination and Sustainable Development. |