TERROR NOS EUA
Atentado é comentado via
correio eletrônico
Montagens
fotográficas que revelam o sonho dos oposicionistas, críticas
à política externa dos Estados Unidos e até "fotos"
do milionário terrorista saudita Osama Bin Laden
uniformizado com camisetas de times de futebol do Rio de Janeiro e São
Paulo são alguns dos temas abordados em mensagens que circulam pelo
correio eletrônico no Brasil. Na lista de debates Novo Milênio,
o internauta J. Carlos Santana Cardoso postou no dia 17/9/2001 uma mensagem
com imagem animada que explica o motivo de os aviões sequestrados
não atingirem a Estátua da Liberdade, em New York.
Mantido na Alemanha pelo brasileiro
Antonio Bulhões, o boletim eletrônico ABKNet destacou
ter criado em 17/9/2001 uma página
especial com detalhes sobre o desdobramento na Internet da guerra anti-terrorista:
O site extra-oficial
do Taleban possui versões em diversos países do mundo. Um
hacker
invadiu a versão alemã do mesmo e copiou a lista de e-mails,
divulgando-a em seguida. A lista contém entre outros o e-mail
de um estudante árabe na Alemanha, que está envolvido no
atentado aos EUA e encontra-se foragido. Os
e-mails são na
maioria da Alemanha, e muitos com domínio de universidades.
Mohammed Atta,
um dos pilotos suicidas, reservou sua passagem on-line, pelo programa
de milhas da companhia aérea American Airlines. |
Um dos textos transcritos em listas
de correio eletrônico nos dias seguintes ao atentado em New York
é "Até tu, Arafat?", de Héctor Luis Saint-Pierre:
Até
tu, Arafat?
Héctor
Luis Saint-Pierre
Alguns analistas
consideraram a Guerra do Golfo a primeira da nova ordem. Mas também
pode considerar-se a última das guerras clássicas. Ela deixou
claro que nenhum Exército convencional poderia resistir à
força da emergente Guardia da nova ordem mundial. Depois daquela,
observou Eric de La Maisonneuve, a superpotência só se preocuparia
pelo poder igualizante do átomo e pelas guerras infraclássicas
(guerrilha, terrorismo), acessíveis aos povos pobres, e contra as
quais aquela não tem escudo.
Os recentes
atentados, simbolicamente assestados ao coração financeiro
e à cabeça da maquinaria militar da potência hegemônica
do mundo, reforçam a pavorosa percepção de que, contra
o acionar do terrorismo, nenhuma defesa é suficiente. Nem a maior
fortaleza do mundo, com o seu poderio militar e os severíssimos
cuidados nos aeroportos, consegue deter o golpe audaz do terror. Ante essa
evidência, o cidadão, que sustenta com seus impostos aquele
Estado cujo único compromisso é garantir a sua segurança,
sente-se exposto e vulnerável ante um inimigo invisível que,
sem brandir poderosos mísseis nem fantásticos escudos nucleares,
rouba um avião de linha para acertar em cheio a segurança
nacional do guardião do mundo.
Essa situação
leva o cidadão ao desamparo, afrouxando o tecido social. Por isso
o presidente Bush irrompe ao grito de ''Guerra!''. Precisa recuperar rapidamente
a coesão social e o controle político do país. Necessita
mostrar ao votante que o Estado pode protegê-lo e que não
há proteção fora dele. Convoca à grande Guerra
do Bem contra o Mal: quem não está com o Bem e a resguardo
do Estado norte-americano, estará contra e será aniquilado.
A idéia é levantar o sentimento patriótico e de proteção
gregária.
Mas, contra
quem é essa guerra? O terrorismo não tem cara, não
tem território, não tem campo de batalha nem frente de combate.
''Guerra contra o terrorismo'' não passa de eufemismo: o terrorismo
não se combate com guerra, é invulnerável a grandes
Exércitos. Por isso é necessário determinar um território
onde aplicar a fúria punitiva e mostrar o poderio bélico
de grande potência, definir uma frente política de combate,
determinar um inimigo. Daí que as ameaças recaiam sobre nações
suspeitas: os Estados que protegerem o terrorismo serão aniquilados,
e mais ainda, aqueles que tendo alguma informação e a omitirem
também serão considerados inimigos e combatidos. Ante a possibilidade
de dissolução social, o presidente Bush crispa a epiderme
política do mundo com a radicalidade ''amigo'' ou ''inimigo'', separando
ambos pela luta ou a morte.
Com essa ameaça
pairando sobre os continentes, o terror não apenas atingiu a capital
do mundo, mas se projetou pelo orbe. O terror ante a possibilidade de ser
considerado inimigo pelo governo norte-americano não parece menor
do que o medo infundido pelo terrorismo. Talvez esse terror explique a
patética expressão facial de Yasser Arafat quando, trêmulo
ante as câmeras de televisão, prometeu apoio ao povo americano.
Quiçá narcotizado pelas quotidianas punições
militares, Sadat disse o que muitos pensam mas temem explicitar: quem planta
ódio, violência colhe. Mas foi o único no mundo árabe
que confirmou a regra do alinhamento antiterror. Nem Fidel Castro, de verbo
fácil contra seu gigantesco vizinho, animou-se a tanto desde sua
redundante ilha. Mas Arafat, máxima autoridade palestina, talvez
a maior vítima da intransigência diplomática norte-americana
no Médio Oriente, foi muito mais longe e, aproveitando o festival
de símbolos, ofereceu seu sangue árabe para socorrer aqueles
cuja bandeira é queimada pelos enfurecidos palestinos. Nisto não
há qualquer paradoxo: há muito medo.
Lamentados
os mortos e condenada a violência, que esse fato leve à reflexão
aqueles que têm capacidade e liderança para interceder nos
muitos conflitos que açoitam o mundo. Que compreendam que ninguém
está fora da lógica da violência e que o ódio
oculto debaixo do tapete pode irromper como um vulcão em qualquer
parte com a face oculta do terrorismo. Que a forma de deslegitimar essa
violência é com justiça internacional. Que todos, como
Arafat simbolicamente, doem seu sangue no hospital e não nos altares
de Marte.
Héctor
Luis Saint-Pierre é professor de Filosofia da Unicamp e autor de
A
Política Armada, Fundamentos da Guerrilha Revolucionária |
Com o título "Sonho Meu" -
e dispensando outros comentários para quem conhece os prédios
do Congresso Nacional, em Brasília - circula pelas listas de mensagens
eletrônicas a sugestiva imagem, recebida em 14/9/2001 na lista Novo
Milênio:
Também está circulando
pela Internet o texto atribuído ao jornalista e político
Seastião Nery, que Novo Milênio recebeu em 17/9/2001:
Subject:
Sebastião Nery
Quem mata mais,
Bush ou Bin Laden?
SÃO
PAULO - Naquela manhã, bem cedo, 8 de maio de 45, a primeira aula
do seminário da Bahia era de latim. Pelas janelas abertas, chegou
a gritaria do povo cantando nas ruas: "Hitler morreu, o urubu comeu, o
couro é teu". O padre Correia, cearense de Sobral, sacerdote do
mundo, colega do cardeal Dom Sebastião Leme em Roma, professor de
filosofia e teologia em Paris, vermelhão com sua cabeleira branca
esvoaçando nos quase oitenta anos, aposentado mas dando aulas até
morrer aos noventa, olhou a rua e chorou:
- Acabou a
aula. Hoje vai ser feriado. O mundo se livrou dos assassinos. Meses depois,
a aula era de grego. O padre Correia entrou na sala com os olhos molhados
de lágrimas:
- Os americanos
jogaram uma bomba atômica em cima de uma inocente cidade japonesa,
apesar de o Japão já ter se rendido. São uns assassinos.
E disse um palavrão. Era o primeiro palavrão que eu ouvia
saído da boca de um padre. E muito pior, de um venerando e santo
padre.
A perna
branca e a sirene - Em 57, na porta do hotel francês na Argélia,
ouvi um estrondo e uma perna branca veio voando, voando, em cambalhotas
no céu, e caiu amassada, ensangüentada, esmagada, como um bife
malpassado, quase em cima de mim e dos que estavam nos empurrando para
conseguir proteger-nos no hotel.
Era a perna
branca de um branco oficial francês, que, com outros, voou de dentro
de um jipe detonado por uma bomba poderosa enfiada embaixo do asfalto.
Era a perna do colonialismo francês que tentava manter eternamente
escravizada a Argélia, árabe e parda. Tiveram que chamar
De Gaulle e sua incontestada autoridade e sabedoria para acabar com o vôo
das pernas brancas.
Em 63, em Hanoi,
a cama do hotel estremecia com as sirenes alucinadas berrando para acordar
a cidade em pânico, avisando que as bombas americanas poderiam começar
a cair. Logo depois começaram. Eu não estava mais lá.
Era o branco
colonialismo americano tentando substituir o branquíssimo colonialismo
francês, que também não tinha conseguido manter subjugada,
esmagada, a miserável pátria amarela de Ho Chi Min, um bambu
de gênio. O racismo sempre foi o verdadeiro nome do colonialismo.
O cuspe
no árabe - Em 90, a fila da bilheteria do trem de Roma para
Nápolis (e de lá para Positano e Chipre) estava longa e lerda
naquele fim de semana. Eu e meu filho já estávamos perto
do guichê, onde uma jovem francesa, pulôver vermelho, comprava
seu bilhete. À nossa frente, um velho árabe, alquebrado e
triste.
Chega uma italiana
espavanada, bem vestida, grã-fina, toda perua nos seus mais de cinqüenta
anos, pega no braço do velho árabe, dá-lhe um puxão,
tira-o da fila e toma o lugar. O árabe tenta resistir, reclama,
a mulher empurra: - Vá lá para trás, seu árabe
imundo. E deu-lhe uma cusparada na cara. O homem limpou o rosto com a manga
do casaco, baixou a cabeça, foi saindo. A fila toda viu e ouviu,
ninguém disse nada. Meu filho não agüentou: - Meu pai,
se você não tomar uma providência, vou tirar essa mulher
daqui no tapa.
A francesinha
linda já havia saído do guichê e o homem da bilheteria
olhava atônito, mas calado. Peguei meu passaporte diplomático
vermelho (de adido cultural em Roma), mostrei-lhe e falei alto: - Isto
é um crime de racismo diante da lei italiana. Falo em nome da ONU.
Ou o senhor
tira esta mulher e põe o velho aqui, ou chame a polícia.
O pobre bilheteiro ficou perplexo, a mulher puxou-me pelas costas. Dei-lhe
um empurrão e a arrastei até lá fora, no começo
da fila, ela aos berros, eu aos gritos, chamando-a de racista. Pensei que
ela ia me cuspir, não cuspiu. Meu filho já pegava o árabe,
que chorava na calçada encostado na parede, e trazia para a bilheteria.
Ninguém disse absolutamente nada. São ambos assassinos
Em 91, em Madri,
na Conferência Ibero-Americana, vi o primeiro-ministro Felipe Gonzalez
dizer ao presidente Fernando Collor: - A tragédia do século
XX foram os conflitos ideológicos. A tragédia do século
XXI vão ser os conflitos raciais.
O nosso mundo
rico está, aos poucos, fazendo de nossos países novas cidades
medievais, cercadas de muros, para os imigrantes, sempre mais numerosos
e miseráveis, não entrarem. Eles vão reagir.
A Europa, durante
séculos, chupou a África e outros pedaços do mundo,
até os ossos das crianças de Biafra, em nome de interesses
econômicos mas também por achar que os povos inferiores têm
que servir aos superiores.
Os Estados
Unidos jogam bomba em Hiroshima, Nagasaki, Coréia, Vietnã,
Iraque, Belgrado, Kosovo, negam-se a assinar a ata de Kyoto contra a poluição,
em nome de "nossos interesses". O resto do mundo que se dane.
Quem é
pior? Quem mata mais? Bush ou Bin Laden?
São
ambos assassinos. |
Outra mensagem distribuída
em diferentes listas de debates (e que Novo Milênio recebeu
com diferentes origens nos dias 15 e 16/9/2001) relata uma suposta conversa
entre Deus e o Diabo:
Quando
o demônio soube da tragédia que atingiu os Estados Unidos
solicitou um encontro com Deus. O Senhor estranhou o pedido, mas atendeu
o chefe do inferno. Deus estava muito triste e encarou o demônio
perguntando:
- O que
você quer depois de tudo o que aprontou contra milhares de pessoas
inocentes?
O diabo
não deu bola para a dureza da pergunta e declarou com voz cheia
de raiva:
- Eu vim
aqui para protestar, pois sou acusado de um crime que não cometi.
Não tenho nada a ver com tudo aquilo que aconteceu nestes dias.
Eu sou mau, mas nunca causei uma morte sequer. Tenho vergonha e sinto-me
revoltado pelo que alguns fanáticos fizeram. Os homens são
piores do que eu, e isso me revolta. Eu nunca causei a morte de ninguém
e não quero levar uma culpa que não tenho. Quem inventou
a morte foi Caím, uma sua criatura feita à imagem e semelhança
sua. Sempre são os homens que repetem a bobagem de Caím.
Eu não tenho nada a ver com esta horrível tragédia.
Quero, sim, que os homens pequem, mas não que matem desse jeito.
Uma tragédia como esta leva todo mundo a rezar. Isso me revolta,
pois só o cheiro da oração me enlouquece.
Deus perguntou:
- Então,
o que você quer?
O diabo
não perdeu tempo e disse num fôlego:
- Quero
que o Senhor aceite o meu pedido de demissão. Diante de tanta maldade
não tem mais sentido o trabalho que nós diabos fazíamos,
e eu perdi o gosto por tudo o que, há séculos eu vinha inventando
para induzir na tentação os seus filhos. Basta-me a alegria
de poder dizer que o seu Cristo é um fracassado e morreu em vão.
Não sou eu quem o derrubou, mas a humanidade que ele tentou salvar.
Deus encarou
com severidade o desabafo do demônio, mas permaneceu calado por um
bocado de tempo. Finalmente, apesar de evidentemente abalado, disse com
um grande soluço:
- Mesmo
assim, a misericórdia há de vencer. |
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