HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - ASSISTÊNCIA
Anália Franco (1)
A instituição Anália Franco foi assim denominada em homenagem à educadora e escritora Anália Emília Franco (nascida em Resende/RJ em
1/2/1856 e falecida na capital paulista em 20/1/1919), que fundou e supervisionou mais de 70 asilos, creches e escolas em diversos estados nacionais.
Da mesma forma que a maioria das entidades assistenciais brasileiras, a Escola Maternal "Anália Franco", fundada em 5 de agosto de 1902, por dona Eunice Peregrino Caldas, sempre lutou com
muitas dificuldades para sobreviver. Esta entidade santista surgiu junto com o Liceu Feminino Santista (depois Liceu Santista), sendo as duas instituições mantidas pela Associação Feminina Beneficente e Instrutiva. Em 1977,
esta entidade repassou o Liceu Santista ao controle da Sociedade Visconde de São Leopoldo.
Em 1922, diante dos problemas enfrentados para a sua manutenção, com a insolvência que não lhe permitia manter o aluguel das instalações na antiga Rua do Rosário
(atual João Pessoa), 537, a Escola Maternal "Anália Franco" foi reformulada, como consta no jornal santista A Tribuna, edição de 27 de junho de 1922 (página 5 - ortografia atualizada nesta transcrição):
Imagem: reprodução da publicação original
DECLARAÇÕES
Associação Creche-Asilo "Analia Franco"
A comissão autorizada pela exma. sra. dª. Julieta Santos, diretora nesta cidade da Creche Asilo "Anália Franco", para elaborar seus estatutos, tendo
apresentado à mesma o seu projeto e tendo o mesmo sido por ela aprovado, vem, por intermédio deste, convidar as autoridades federais, estaduais, municipais, os mm. juízes de Direito e promotores públicos, imprensa, associações, alto comércio e
varejista desta praça e o público em geral, para assistirem à leitura e aprovação do referido projeto de Estatutos.
A comissão pede encarecidamente ao público desta cidade, cuja veia caritativa tem sido por várias vezes demonstrada, o seu comparecimento à aludida reunião, que será
levada a efeito quarta-feira, 28 do corrente, às 19,30 horas, no salão do Real Centro Português, desta cidade, gentilmente cedido por sua digna diretoria, e pelo que a todos antecipa os seus agradecimentos.
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No dia seguinte, 28 de junho de 1922, o mesmo jornal A Tribuna publicava, na página 3 (ortografia atualizada):
Imagem: reprodução da publicação original
Associação Creche-Asilo "Analia Franco"
A sua fundação, hoje, na sede do Real Centro Português
Diante da difícil situação que vem atravessando o Asilo "Anália Franco", a sua atual diretora, exma. sra. Julieta dos Santos, acaba de consentir, como foi
pormenorizadamente noticiado pela imprensa, na organização de uma sociedade cujo nome será o de "Associação Creche Asilo Anália Franco".
A nossa população, a quem a sorte dos menores que se abrigam sob o teto desse estabelecimento de caridade não é indiferente, vem acolhendo com muita simpatia a idéia de sua remodelação.
Por sua vez, a comissão organizadora, composta de pessoas de destaque no nosso meio social, não tem medido esforços nem sacrifícios para que aos orfãozinhos não falte o necessário para a
sua subsistência. E, graças à sua boa vontade, a referida associação vai ser hoje fundada, no Real Centro Português.
Assim, a comissão solicita, por nosso intermédio, o comparecimento do povo santista à assembléia de fundação, que se realiza hoje, às 19 horas, na sede da aludida
sociedade lusa.
Donativo
De L.F.S. recebemos 200$000, destinados ao Asilo Creche "Anália Franco". |
Continuava o jornal A Tribuna a registrar, na edição de 29 de junho de 1922 (página 2 - ortografia atualizada nesta transcrição):
Imagem: reprodução parcial da publicação original
Pelos pequeninos
Mal circulou a notícia de que o asilo "Anália Franco" atravessava uma hora difícil, de privações e de apreensões, vendo minguarem-se-lhe, progressivamente,
os recursos com que acudia à nudez e à fome dos seus pequeninos enjeitados, houve uma porção da cidade que se levantou num lindo e comovente movimento coletivo para impedir o desmoronamento iminente: foi um punhado de moços da nossa aristocracia
esportiva.
O esporte, ao que se vê, não serve apenas para aformosear o corpo; não se restringe ao só efeito de enrijar e de enobrecer as fibras musculares, de virilizar e de aprimorar a plástica
dos nossos mancebos. Parece que faz mais: cria dentro dum corpo novo uma alma nova, a qual, nem por ser uma expressão de fé e de varonilidade, se inutiliza para as suaves vibrações do bem.
Mas esses moços, que assim se dispuseram a unir forças para escorar a construção oscilante, têm tudo, menos dinheiro; e o dinheiro, por um estranho capricho das coisas, é o único
instrumento, o único e maravilhoso instrumento, com que seria possível aprumar de novo, equilibrar e estabilizar, para a sua fecunda e abençoada missão, o edifício que cambaleia.
E aqui se repete aquela formosa história, que um grave escritor católico, cheio da crença ingênua e salutar que há no fundo de todas as almas boas, narra, comovidamente, numa página
lapidar e imperecível: e é que um funâmbulo, a quem o cotidiano da luta pelo pão não havia deixado vagar para aprender a rezar, se postava, todas as manhãs, diante da imagem de Santa Iria, a Santa do seu afeto e, presa de sincero fervor, executava
todo um fatigante programa de bailados e de acrobacia.
Duma feita - e vai esta por conta exclusiva do singelo e sisudo narrador -, como o devoto funâmbulo se excedesse nas práticas da sua violenta liturgia e a fadiga o derrubasse extenuado,
a Santa, a luminosa Santa Iria, foi vista descer do seu trono de nuvens, acercar-se carinhosamente do seu fatigado amigo e erguê-lo nos polpudos braços de neve.
A moralidade desta fábula é, assim, fácil de resumir: cada um reza como sabe.
Os moços que tomaram a peito ajudar o convalescimento daquela caridosa instituição - que se nutre de sobras e de migalhas -, não têm, como o palhaço da lenda, senão um modo de fazer o
bem: brincando.
Ao que parece, não trazem depósitos em bancos, e a Deusa nunca lhes acenou com um daqueles livrinhos de cheques, tão úteis e tão maneiros, que eles costumam ver... nas fitas de cinema,
pagando amores e devassidões, premiando silêncios expressivos, remunerando torpezas e covardias, raramente consolando e beneficiando...
Para fazerem dinheiro com que garantam a tranqüilidade do teto e do pão aos orfãozinhos abrigados no asilo, e que mal percebem, na sua ridente inocência, o infortúnio que lhes ronda em
torno, os iniciadores da formosa idéia fazem o que lhes está à mão: uma tarde de riso e de jovialidade, com o seu quê de cômico sadio e desopilante.
É hoje, no campo da A. Atlética Portuguesa, a ruidosa festa dos nossos ruidosos sportmen em prol dos pequeninos do Asilo Anália Franco.
Bastaria consignarmos este alto intuito para que a mais viva, a mais acolhedora simpatia envolvesse a piedosa iniciativa.
E assim se provará que é possível fazer o bem... brincando.
Imagem: reprodução da publicação original
A fundação da Associação Creche-Asilo "Anália Franco"
Sua primeira diretoria
Como havíamos antecipado, realizou-se ontem, na sede do Real Centro Português, assistida por numerosa assistência e presidida pelo dr. Ibrahim Nobre,
delegado regional, a assembléia em que foi levada a efeito a fundação da Associação Creche-Asilo Anália Franco.
A primeira diretoria desta agremiação, cujos estatutos foram também discutidos e aprovados, nessa reunião, ficou assim constituída:
Presidente, Adelino Ferraz de Barros; vice-dito, dr. Ibrahim Nobre; 1º secretário, Arthur Pinto Reis; 2º dito, Archibaldo Martins Serra; 1º tesoureiro, Alberto Fernandes Leal; 2º dito,
Antonio José Rodrigues Guimarães; mordomos, Vicente Correia de Mello, José Domingues Duarte, Oscar Armando Costa e Eduardo Áureo Vahia de Abreu; bibliotecário, Raul Caldas.
Comissão de exame de contas: major José Baccarat, Benedicto Rodrigues e Polydoro de Oliveira.
Assembléia geral: presidente, Amando Stockler; vice-dito, Nicanor Pereira; 2º vice-dito, José Luiz Antunes; 1º secretário, Luiz Lascala; 2º dito, Álvaro José Alves. |
A instituição Anália Franco, apesar de todas essas dificuldades, conseguiu em 23 de agosto de 1925 se instalar em seu primeiro prédio,
na Avenida Ana Costa, 285 (que desde a década de 1970 é alugado à Secretaria Municipal da Educação, para a instalação das escolas Dino Bueno e Ayrton Senna, e onde foi criado depois o Centro Municipal de Inclusão Digital). Em dezembro de 1927,
tornou-se pessoa jurídica.
As instalações, na década de 1970
Foto: jornal Cidade de Santos, pesquisado pelo historiador
Waldir Rueda no acervo da Unisantos
Em 7 de janeiro de 1943, a entidade ampliou as suas instalações, com um segundo prédio, ao lado desse primeiro, e assim atravessou o século/milênio e permanece, no endereço da Avenida Ana Costa,
277, como Educandário Anália Franco. Entre suas atividades, criou em 1942 a Tribo de Escoteiros Anália Franco, incluindo uma banda marcial. E continua sendo mantida pela maçonaria (Loja Maçônica Fraternidade de Santos).
Após a presidência de Adelino Ferraz de Barros (1922-1942), uma atuante diretoria do Educandário Anália Franco foi presidida por Cordovil Fernandes Lopes (1943-1967), pai de
Silvio Fernandes Lopes, quando foi concluído o segundo prédio da Ana Costa. Na foto, Cordovil e colaboradores da época
Foto: acervo Anália Franco, publicada com essa legenda na revista comemorativa dos 85 anos
Registre-se ainda que, em 1940, o Educandário Anália Franco cedeu espaço para que a Sociedade União Operária guardasse a sua documentação (suas instalações na
Praça José Bonifácio haviam sido desapropriadas para a construção do Fórum, mas o dinheiro decorrente da desapropriação demorou a ser liberado), até que pudesse comprar as instalações da Avenida Ana
Costa, 164, onde funciona desde 1954 a Escola Modelo.
A escola Anália Franco, em meados do século XX
Foto enviada a Novo Milênio pelo internauta Ary O. Céllio, de Santos/SP, em 8/8/2007
Veja mais:
A educação... e as antigas escolas
Associação Creche Asilo Anália Franco (A Tribuna, 26 de março de
1944)
Liceu Feminino Santista
Sociedade União Operária de Santos - Escola Modelo
Anália Franco (fotos recentes)
Site do Educandário Anália Franco na Internet
Fotos - (acervo Anália Franco)
A instituição, em 1924
A revista comemorativa (clique >aqui< ou na imagem para obter o arquivo em formato PDF)
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