Escolas tradicionais lutam para sobreviver
Enquanto o
Liceu Santista aguarda a decisão da Diocese de Santos de aceitar ou não transferência de seu patrimônio para a
Sociedade Visconde de São Leopoldo, outras escolas tradicionais de Santos enfrentam grandes dificuldades para sobreviver.
Algumas encerraram as atividades, outras mudaram de orientação, ou diversificaram seus cursos. Mas, algumas escolas particulares experimentam um
surto de progresso e continuam se desenvolvendo, indiferentes à crise por que outros de estabelecimentos de ensino semelhantes passam.
Cecília Novaes de Paula Santos presidente da Associação Feminina Santista, mantenedora
do Liceu Santista, e Júlio Moreira, diretor desta escola, explicam os problemas que, segundo eles, levaram à decisão de transferir o patrimônio:
"Grande parte dos colégios particulares hoje são deficitários. No nosso caso, a folha de remuneração dos professores, administração e material de
expediente é maior do que a receita produzida pelo colégio. Há casos como a terceira série de profissionalização para magistério que é mantida com
13 alunos e 5 aulas remuneradas diárias, em média. Como as mensalidades são padronizadas pelo Ministério da Educação, não podemos aumentá-las, pois
as alterações de mensalidades são oficialmente comunicadas aos órgãos de ensino locais".
Sobre o fato de aquela escola não estar conseguindo se manter, o diretor explicou:
"Atribuo o problema à localização do imóvel, neste caso, pois este local (Rua da Constituição) é pouco propício a atrair alunos e seus
acompanhantes, devido ao trânsito intenso que oferece a rua e a freqüência nas imediações, onde prolifera elevado número de marginais. Temos por
exemplo o curso pré-primário com mensalidades relativamente pequenas com número reduzido de alunos e sem novas procuras de vagas. Existem escolas na
praia com pré-primário que cobram três ou quatro vezes mais que nós e as classes de lá estão cheias".
A presidente da Associação Feminina Santista contou que "quando o poder público
assumiu o primeiro grau, até a oitava série, surgiu o problema com as escolas particulares. Então, muitas escolas que tinham essa parte do ensino
deixaram de ter alunos. Os cursos que ainda dão lucro são os supletivos e os colegiais profissionalizantes. Quando foi fundado o Liceu, a idéia era
se criar uma escola gratuita. Quando o poder público assumiu essa função, não havia razão de ser a gratuidade, tornando-se colégio pago. Como havia
colégios públicos gratuitos, estes passaram a ser preferidos pelos estudantes, ficando apenas minoria que podia pagar colégios particulares".
Para as escolas particulares, segundo Cecília, existe ainda uma opção: o governo não
tem condições de dar o curso de segundo grau profissionalizante, pois suas escolas têm poucas vagas. As escolas particulares podem então sobreviver
dessa forma, partindo para os cursos profissionalizantes e supletivos.
O Liceu, entretanto, segue uma tradição de não lucratividade, por esse motivo não
pretende entrar nesse setor. Cecília Novaes explica que isso também se deve ao fato de "estarmos lutando há muitos anos para manter a escola. Se
abraçarmos agora um curso supletivo, teremos outra série de lutas e não seria mais o ensino de antigamente. Temos, entretanto, o curso de
laboratorista de análises clínicas, uma opção nova em Santos, com um curso bem ministrado, pois existe ainda no Liceu aquela vontade de ensinar.
Quanto a outros cursos, já pensamos, mas seria um esvaziamento dos objetivos da escola".
Local - Quanto à possibilidade de se mudar a escola de local, a presidente da
Associação Feminina explica que "é difícil a gente conseguir na zona residencial, na praia, um local bom, com prédio e condições do mesmo porte. Se
hoje vendêssemos o prédio, não conseguiríamos outro de iguais condições, em outro local, pelo mesmo preço deste".
Devido a esses problemas, o ex-Liceu Feminino Santista, hoje Liceu Santista, com mais
de 75 anos de existência, é mais um colégio ameaçado de fechamento. Enquanto nada é decidido a respeito, a presidente da mantenedora informa ter
sido apresentada a proposta de transferência do patrimônio à Diocese, no final da semana passada, devendo sair em breve a resposta. Algumas
condições foram exigidas: que o patrimônio, ao ser recebido pela Diocese, passe para a Sociedade Visconde de São Leopoldo; que os atuais alunos
possam concluir seus cursos no mesmo local; e, que o prédio somente seja usado para fins educacionais.
Extra-oficialmente, se comenta que a Sociedade Visconde de São Leopoldo teria
interesse no imóvel para transferir os alunos da escola Dom Idílio José Soares e da Faculdade de Comunicação, que funcionam em prédios alugados,
para aquele local, a partir do próximo ano. Além disso, o prédio da escola é atualmente ocupado no período noturno por alunos da
Associação Instrutiva José Bonifácio, que ali fazem o curso supletivo.
Problemas crescem - Enquanto a ação das escolas particulares vai sendo
restringida, com a absorção do ensino profissionalizante pelo Governo, espera-se para breve que outras escolas venham a fechar. Um outro motivo é a
falta de espaço para a ampliação, que forçaria muitas escolas tradicionais a manterem determinada arrecadação, vinda dos alunos que suas instalações
comportam. Depois, acabam fechando por não mais terem condições de sobreviver.
Assim, escolas como o Liceu Santista - que já teve prioridade para que seus alunos,
que concluíam o curso de magistério, ingressassem no quadro de professores municipais - hoje começam a fechar ou a mudar de orientação. O
Colégio do Carmo, religioso, fundado em 1917, foi comprado pelo Instituto Santista de Empreendimentos Culturais, a 4 de
dezembro de 1975. Funcionava na Praça Barão do Rio Branco, esquina da Rua Augusto Severo, e há alguns anos foi
transferido para a Rua Egídio Martins, na Ponta da Praia.
Um dos mais antigos estabelecimentos da cidade é o Colégio Santa Rita, na Avenida
Bernardino de Campos, também ameaçado de fechamento. O colégio Ordem e Progresso já foi demolido e seu terreno, na
direção da Rua Azevedo Sodré, deverá ser utilizado na prolongação dessa rua, entre a Avenida Ana Costa e Rua Bahia. O Instituto
Musical Santa Cecília é outro estabelecimento que encerrou suas atividades, no prédio da Avenida Conselheiro Nébias.
O Colégio Coração de Maria também esteve ameaçado de
fechamento em fins de 1972, quando o prédio onde funcionava, na Rua da Constituição, foi vendido pela Congregação, sem que as irmãs daqui fossem
consultadas. O estabelecimento, que na época já contava com 70 anos, quase fechou, mas a diretoria resolveu continuar, incentivada por alunas e
familiares. O colégio foi então transferido para dependências da Casa de Nossa Senhora, no bairro do Jabaquara, e, em
1974, estava em sede própria novamente, na Rua César Lacerda de Vergueiro.
Devido a esses problemas, as principais e antigas casas de ensino foram fechando, e em
breve só restarão o Colégio São José, fundado em 1924, o Colégio Santista, com 73 anos de
existência, e o Colégio Stella Maris, de 1927. Há ainda o Colégio Tarquínio Silva, o Liceu São Paulo e o Colégio
Anglo-Americano, mas com orientação reformulada.
No Stella Maris, a irmã Maria Lúcia, diretora desde 1966, considera boa a situação do
colégio. Particular, a escola se mantém, sem prejuízos, embora haja uma entidade mantenedora, a Associação Instrutora da Juventude Feminina. O
colégio não recebe subvenção e ainda cede, à noite, gratuitamente, oito classes para o Serviço Social da Indústria e mais três para um curso
supletivo de 1º grau. Conta com aproximadamente 476 alunos pagantes.
Já o Liceu Santista recebe subvenção federal de pouco mais de Cr$ 3 mil, subvenção
municipal de Cr$ 4 mil e oitocentos cruzeiros e ainda pequena verba provinda da mantenedora, a Associação Feminina Santista, que é formada por
ex-alunas do Liceu, sendo entretanto muito pequeno o número das que pagam a mensalidade da entidade: "Se todas pagassem a mensalidade da Associação,
o patrimônio do Liceu Santista não precisaria ser doado", diz Cecília Novaes.
Mas a solução para a falta de alunos seria a melhoria do ensino nas escolas
particulares, para que estas fiquem em melhores condições que as públicas. Entretanto, para isso é necessário um grande investimento em
equipamentos, que muitas escolas não têm condições de fazer. Outras, como o Instituto Superior de Educação Santa Cecília,
percebendo o desinteresse por ensino básico pago, acabaram criando suas faculdades, entendendo sua diretoria que também a formação de técnicos, e
acordo com a lei 5.692 - que estabelece o segundo grau como curso profissionalizante - é outra solução para a crise das escolas particulares. |