A voz das ruas voltou a ser ouvida a partir de meados da década de 80, sem os traumas e repressões
do período anterior, uma mudança bem-vinda. Os trabalhadores avulsos de Santos fizeram das praças seus espaços de protesto contra as ameaças. Na
foto, a manifestação de fevereiro de 93, na Praça Mauá, na ocasião em que se votava o PL8 no Congresso. Uma luta inacabada
Foto publicada com o texto
Os desafios impostos pela democracia e o pesado jogo das
pressões
O longo reaprendizado da ordem democrática que, por si só, não significa uma garantia de justiça
social. Ela garante o direito de lutar
Democracia dá certo. Demonstrar, na prática, essa assertiva arduamente defendida durante duas décadas
por todos os democratas, foi uma tarefa inglória nos novos tempos. Tarefa ainda inconclusa, na verdade. O fato é que se a democracia tem defeitos,
ainda não se inventou nenhum sistema melhor para a convivência política.
Os resultados a nível municipal - e até porque restrito geográfica e socialmente - foram muito
melhores que aqueles alcançados a nível nacional Dois mandatos e meio de prefeitos eleitos devolveram à Cidade um vigor que se julgava perdido
definitivamente.
Desde 1984, quando os santistas voltaram a decidir nas urnas quem governaria Santos, os ganhos têm
sido expressivos e inegáveis. A própria vinculação desses governantes com os cidadãs avançou muito em relação ao que ocorria sob os governos
nomeados da segurança nacional.
Para o País as coisas não têm sido fáceis. São marchas, contra-marchas, oscilações que mais lembram
pêndulos de velhos relógios. Sarney, Collor e seu impeachment,
Itamar, Fernando Henrique, um caminho longo e tortuoso, embalado a planos
e choques que alteraram por seis vezes a moeda nacional, derrubaram a renda dos brasileiros aos mais baixos níveis de nossa história. Diga-se em
defesa da democracia, que ela paga, através de governos eleitos, os desmandos de um longo período de silencioso desmonte.
Foi um período também de intensas paixões, de esperanças, fundadas ou não, de lutas vigorosas das
quais o impeachment de um presidente da República inepto, sob acusações de corrupção em escala nunca vista - ou, pelo menos, nunca dita - é
um emblema histórico. Vivemos, naquele período, um momento raro, não apenas na política brasileira, mas nos registros mundiais. A democracia, entre
nós, passou vitoriosa pelo seu primeiro e mais duro teste: a substituição pacífica de um presidente.
Santos e seus trabalhadores - mais que tudo, trabalhadores de um porto - viveram muitas e longas
histórias e, de certo modo, sabem que tudo é efêmero. Por mais que a urgência da vida pareça decisiva, os fatos passam, a realidade muda. Mais de
cem anos nos separam do início de atividades do porto organizado como o conhecemos hoje e, certamente, estaremos aqui mesmo nos próximos cem.
O jornal O Conferente,
tradicional voz do Sindicato, numa nova fase, busca debater os problemas derivados do largo período de transição que a categoria e a própria
atividade portuária atravessam. Os jornais, temáticos, vão além da fronteira dos interesses imediatos
Imagens: reproduções, publicadas com o
texto
Nem sempre, ao longo dessa história dos que construíram o maior terminal marítimo brasileiro,
estiveram unidas as diversas categorias.
Mas os episódios fundamentais, aqueles momentos de encruzilhada histórica, demonstraram e têm
demonstrado, pela unidade nas lutas, que a longa saga produziu uma maturidade rara.
As mudanças nos portos, encaminhadas de modo angustiante na maior parte das vezes, não se constituirão
em fim de nada. Apenas mudam maneiras, situações, modos de fazer o que tem de ser feito e continuará sendo enquanto navegarem navios e tiverem de
circular mercadorias e riquezas.
Após a redemocratização do país, em 84, surgiram muitos conflitos graves. Mais que em outros
tempos, tornaram-se claras as intenções dos diversos setores envolvidos na questão portuária. E essa clareza, ao contrário do que fazem parecer os
sobressaltos da vida cotidiana, é uma vantagem. Conhecendo-se as intenções, melhor se luta contra elas, se isso for necessário.
Nestes novos tempos que atravessamos, as demandas dos trabalhadores do porto tornam-se também demandas
da Cidade e seu povo, indissoluvelmente ligados pelo efeito econômico de alterações súbitas. O que ficou para trás, com o fim do autoritarismo,
entre outras coisas, foi a possibilidade de alterar, sem avisos ou recursos, a vida de cada um de nós.
Isso não elimina a necessidade de manter a luta acesa. Para Santos, a maior demonstração disso foi o
episódio de fevereiro de 1991, quando a mobilização geral da Cidade produziu efeitos históricos. Mas é certo que, à exceção de fatos de tal
gravidade, o debate político, social e econômico mudou.
Mudamos também com esses novos tempos e temos de prosseguir no esforço de nos prepararmos para tomar
parte em um diálogo diferente daquele que se tinha anteriormente. Globalização, produtividade, equilíbrio tecnológico, automação, blocos econômicos,
são conceitos com os quais teremos de ter tanta afinidade quanto aquela que os trabalhadores da década de trina souberam construir em relação à
mecanização do trabalho. Não é uma transição fácil, mas é necessária. |