O fidalgo português se destacou como administrador e agricultor,
apesar da resistência dos índios
Foto: Paulo Freitas, publicada com a matéria
Brás Cubas, 1º garimpeiro
do ouro das Minas Gerais
Aproveitando as trilhas abertas pelos índios, a expedição, que partiu da Baixada
em 1561, chegou à Serra da Mantiqueira e ao Rio S. Francisco
Se a estátua de Brás Cubas, da Praça
da República, pudesse ganhar vida por alguns instantes, o fundador de Santos por certo diria que, além de cavaleiro fidalgo da Casa Real de
Portugal, fora um ativo agricultor, notável administrador e sertanista bandeirante, realizado política, social e financeiramente.
Em 1561, explicaria, organizou e chefiou uma expedição, tipo entrada, serra-acima,
aproveitando trilhas abertas pelos índios, as mesmas que levaram os jesuítas à fundação de São Paulo de Piratininga. Cruzando matas e córregos, a
expedição chegou ao Rio Paraíba e à Serra da Mantiqueira, onde descobriu ouro junto ao Morro Jaraguá. Mas não parou, avançando até alcançar o Rio
São Francisco.
"Voltamos ricos à Capitania de São Vicente", diria Brás
Cubas, dando ciência das descobertas ao rei de Portugal, "mas não tivemos saúde nem forças para explorar o que fora descoberto. Havia ouro, muito
ouro mesmo, além de pedras preciosas de valor inestimável, mas nenhum de nós conseguiu retornar à Serra da Mantiqueira. Fomos os primeiros
exploradores das riquezas minerais do Brasil, e os primeiros garimpeiros".
Brás Cubas nasceu na cidade do Porto (Portugal),
em dezembro de 1500 (N.E.: o historiador Waldir Rueda corrigiu a informação, o ano correto seria 1507),
filho do fidalgo português João Pires Cubas e de Ana Adelaide. Veio para o Brasil em fins de 1531, na armada de Martim
Afonso de Souza, de quem logo ganhou uma sesmaria (terreno inculto que os reis de Portugal distribuíam aos colonos) nos campos de Piratininga,
em 10 de outubro de 1532. No ano seguinte, ou pouco depois, Brás Cubas regressou a Portugal, com seu pai, a fim de regularizar seus negócios.
Presume-se que essa viagem tenha sido feita num dos navios da frota de Martim Afonso de Souza, em companhia deste.
"Foi sim", confirmaria Brás Cubas, "pois Martim Afonso fora convocado pela corte para
chefiar uma grande expedição às índias. Eu tinha bens, mas não tinha barcos".
Todos os Santos - Quando Martim Afonso de Souza se ausentou de Portugal, em
viagem às Índias, sua esposa, dona Ana Pimentel, ficou como sua procuradora, e isso se justificava: chegar às Índias era uma aventura que poucos
conseguiam completar com êxito.
Foi dona Ana Pimentel quem cedeu a Brás Cubas as terras de Biritiba (hoje região de
Mogi das Cruzes), no Planalto, também pertencentes à Capitania de São Vicente, da qual Martim Afonso de Souza era donatário. Brás Cubas, todavia,
não foi feliz, apesar das muitas tentativas para povoar as suas terras: os índios ferozes que ali habitavam não consentiam.
"Isso é verdade", diria Brás Cubas: "os índios Tamoios sempre foram rebeldes e
traiçoeiros. Moravam em Bertioga, e dali partiam em ataques contra as nossas terras, na Ilha de São Vicente.
Por isso, comprei as áreas pertencentes ao genovês Pascoal Fernandes, e as do patrício Domingos Pires, e aí fundei em 1540 uma
Casa de Misericórdia, a primeira do Brasil. Junto a ela levantei um hospital para marítimos, em 1º de novembro, Dia de
Todos os Santos, e por isso mesmo assim chamado".
Uma tempestade, com inundações em São Vicente, obrigou a transferência do porto para o
outro lado da baia, na foz do Rio Santo Amaro do Guaibê, hoje Guarujá, e depois para o lagamar do Enguaguaçu - onde Brás Cubas já havia construído
sua casa, vizinha ao Outeiro de Santa Catarina, levantado por iniciativa de Luiz de Góis e sua esposa, Catarina de
Aguiar, ambos devotos daquela santa.
Entre a casa de Brás Cubas e o Outeiro existia uma
capela também mandada construir por Luiz de Góis e sua mulher. Quando o Porto do Enguaguaçu foi
atacado por piratas, não houve praticamente resistência. "Sem armas", explicaria Brás Cubas, "não havia como se fazer
frente aos piratas, que também conquistaram a simpatia dos índios Tamoios, em troca de bugigangas. Por isso, a população fugiu para os lados do
Monte Serrat, enquanto os piratas saquearam e destruíram a capela de Santa Catarina. A imagem da santa foi jogada no
estuário, e resgatada posteriormente por pescadores".
Santos não celebra a data da fundação da cidade,
e não se preocupa com o fato que originou o povoamento
Foto: Paulo Freitas, publicada com a matéria
Casa da Misericórdia, portas sempre abertas
O hospital construído perto do Porto do Enguaguaçu, semelhante aos que existiam em
Lisboa e no Porto (Portugal), atraiu novos moradores para o povoado, elevado por Brás Cubas à categoria de vila em 19 de junho de 1545, logo depois
de assumir o cargo de capitão-mor, governador da Capitania de São Vicente. Foi ele nomeado para tal cargo por dona Ana Pimentel, em provisão datada
de Lisboa, a 26 de novembro de 1544.
À frente da Capitania de São Vicente, Brás Cubas se distinguiu principalmente pela
luta contra os Tamoios, que atacavam Santos e São Vicente pela entrada de Bertioga. Dessa luta resultou, em Bertioga, a construção de dois fortes, o
de São Felipe e o de São Tiago.
Em 1560, Brás Cubas voltou a Portugal, mas ali permaneceu pouco tempo, retornando
novamente a São Vicente, onde continuou como governador da capitania, exercendo também outros importantes cargos como provedor e contador de rendas
e direitos; provedor e contador de rendas das capelas, confrarias e albergarias de São Vicente, e provedor da Capitania de Santo Amaro. Em 1561,
estabeleceu uma fazenda de criar gado e de plantio em suas terras de Biritiba (Mogi das Cruzes).
Além de ativo agricultor e notável administrador, Brás Cubas possuía excelentes
qualidades de guerreiro, tendo participado das defesas de São Paulo de Piratininga, de Pernambuco, no assalto dos silvícolas (1562), quando,
sozinho, venceu o cerco imposto pelos índios, levando mantimentos e água potável à população sitiada. Participou das lutas visando a expulsão dos
franceses da Baía de Guanabara, e da fundação da Vila de São Sebastião do Rio de Janeiro, em 1567.
Seus feitos foram recompensados: ganhou como prêmio três sesmarias, sendo duas no Rio
de Janeiro e a terceira em São Paulo, entre Ilhabela e São Sebastião, esta última com mais de 20 alqueires de frente para o mar.
Cristão convicto e católico praticante, além de outras obras de caridade, Brás Cubas
doou em Santos o terreno para a construção de uma casa de jesuítas, em 1569, e em São Paulo cedeu as terras onde, em 1594, seria erguido o Convento
do Carmo, que resistiu ao tempo até hoje.
Nos últimos anos de sua vida, o fundador de Santos acumulou o cargo de
alcaide-mor da Capitania de São Vicente, vindo a falecer na cidade que viu nascer, onde foi sepultado sob o altar-mor
da primitiva igreja paroquial. A lápide que cobria seu jazigo fixava o ano de 1592 para o seu passamento.
Brás Cubas deixou três filhos: Isabel Cubas, Antônio Ribas Cubas e Gonçalo Nunes
Cubas.
Mas a cidade preserva o local das primeiras
edificações e a história de mais de 450 anos
Foto: Paulo Freitas, publicada com a matéria
Uma festa para perpetuar a memória do fundador
Os restos mortais de Brás Cubas - fundador e construtor da Casa da Misericórdia, 1º
hospital do Brasil, em cujas vizinhanças se formou um povoado que o mesmo Brás Cubas, em 1545, elevou à categoria de vila - provavelmente
permaneceram sob uma lápide de 1592 da 1ª igreja paroquial de Santos, ou igreja-matriz, que existiu na atual
Praça da República.
Esse templo católico teve o adro abençoado em 1º de junho de 1752, depois de seguidas
restaurações, e tinha o altar-mor consagrado à Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. A Matriz de Santos foi demolida em
janeiro de 1908 e já estava em ruínas: na área foi construída a Praça da República, no centro da qual ergueu-se o Monumento a Brás Cubas, inaugurado
solene e festivamente a 26 de janeiro daquele ano.
A estátua de Brás Cubas foi esculpida em Gênova, em 1905, pelo italiano Lorenzo Masza,
em mármore Carrara Lavacchoni. É uma das mais valiosas a artísticas existentes na Cidade, quer pela beleza de suas linhas, quer pela pureza de
estilo, notável pelo equilíbrio estético, sempre muito visitada por artistas, que nela encontram a inspiração para suas concepções criadoras.
Toda em mármore branco, com alegorias à indústria, ao comércio e ao gênio criador do
Homem, a estátua apresenta a figura de Brás Cubas na parte superior, tendo na mão esquerda o bastão da realeza, conforme esboço de Roque Gameiro.
Sobre uma coluna de pergaminho se vê a cidade, cujo desenvolvimento se desenrola na abertura do documento.
Dois escudos de bronze ostentam a palavra Labor. Numa coroa, também de bronze, vê-se o
brasão da Cidade, na época: dos chanfros pendem festões de louro, que representam a honra e a vitória.
A escultura do genovês Lorenzo Masza, uma das
mais valiosas e artísticas da Cidade,
é destaque na praça
Foto: Paulo Freitas, publicada com a matéria
Um dia de festa - Santos teve um dia festivo naquela 26 de janeiro de 1908, com
as autoridades locais reunidas na Praça da República, em frente ao antigo prédio da Alfândega, substituído posteriormente
pelo atual.
Sob muitos aplausos do povo, às 16 horas em ponto foi retirada a cobertura de pano da
estátua de Brás Cubas e descerrada a obra escultória pelos srs. Almeida Morais, Castro Faria, Bias Bueno, coronel Vasconcellos Tavares, Domingos
José Martins e José Rodrigues Sette.
Primeiramente falou o orador oficial da cerimônia, José de Freitas Guimarães, que se
reportou às origens de Santos, destacando a figura de Brás Cubas, seu autêntico fundador. Pela colônia portuguesa discursou o jornalista Alberto
Veiga, de A Tribuna. Falaram ainda os srs. Sizino Patusca e Domingos Jaguaribe.
As bandas musicais do Corpo Municipal de Bombeiros e a Colonial Portuguesa animaram a
festa com marchas e dobrados. Todos os navios fundeados no porto apitaram às 16 horas, saudando a inauguração. À noite, com a Praça da República
feericamente iluminada, aquelas corporações musicais realizaram retretas, bastante aplaudidas pelo povo, que se deslocou em massa para o local.
O monumento a Braz Cubas é considerado o mais antigo de Santos
Foto: PMS/Decom, publicada no Diário Oficial de Santos em 6 de maio e em 5 de
junho de 2002
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