Os Independentes
Evêncio da Quinta, um dos
fundadores do grupo, fazia teatro para o povo, no auditório do Círculo Operário de Santos – que ficava na esquina das ruas da Constituição com
Marechal Pêgo Júnior. Em 57 montava com Os Independentes a peça de sua autoria, Num Bar Qualquer. O grupo venceu o Festival, derrotando até o
Clube de Arte.
"Isso nos animou a prosseguir e, já que não encontrávamos
espaço nas sociedades existentes, resolvemos criar a nossa própria panela e fundamos o grupo" – Evêncio da Quinta, em depoimento de época.
Eles estrearam oficialmente no I Festival Regional.
Em 53, o grupo apresentou Disque M Para Matar, peça convidada a
participar do I Festival Nacional de Teatro Estudantil. "Achamos que não valia a pena participar do festival", afirma Evêncio, "e não fomos". No
mesmo ano participamos do II Festival Regional com as peças A Demissão, de Evêncio, e O Urso (com o nome modificado para O Rústico),
de Anton Checov.
Um festival depois, o grupo passou pela tristeza de ser desclassificado do
evento. A reação negativa da platéia influenciou os jurados. Era a primeira vez que um grupo amador encenava uma peça de Eugene Ionesco. O texto era
O Improviso d'Alma. Depois disso, construíram nos fundos do Clube de Arte o Teatro de Bolso, onde montaram: A Respeitosa, de Sartre;
A Infidelidade ao Alcance de Todos, de Silveira Sampaio, Uma Coletânea de Gil Vicente, entre outras peças. De autoria de Evêncio, Os
Troncos Podres, Enquanto o Rei Joga Buraco e A Rosa Verde também foram encenadas.
Esta última, montada em 66, foi o maior sucesso de público do grupo. Também
foi apresentada no Festival Estadual de São Carlos e trouxe vários prêmios. Em janeiro deste ano montaram Os Físicos, de Friedrich Durrenmatt.
Mas a peça não alcançou repercussão. O número de espectadores não passava de vinte. "Desesperados, apelamos para o prefeito Sílvio Fernandes Lopes e
ele mandou a Secretaria de Turismo comprar um espetáculo", desabafa Evêncio.
Mesmo com a venda do espetáculo, o grupo ficou com um prejuízo de dezessete
cruzeiros. Desgostosos, declararam Os Independentes por extinto. Numa entrevista ao jornal A Tribuna (29/8/83), Evêncio confessou 17 anos
depois que sente saudades daquele tempo. "O teatro de lá para cá tornou-se uma porcaria tão grande que a gente até desiste de assistir, não tivemos
substitutos. Não apareceu nenhum grupo jovem contestando nossa supremacia, simplesmente fechamos a porta e fomos para casa dormir".
O grupo de teatro Os Independentes foi oficialmente fundado em 1958, por
Evêncio da Quinta, Wilson Geraldo, Jansen Cavalcanti e Jacinto Antunes. Seu último espetáculo realizou-se em 1969, portanto durante 11 anos existiu
o grupo. Participaram também deste núcleo: Maria Aparecida Celestino, Iracema, Silvio Roupa, Paulo Lara, Jonas Mello, Vilson Santos, Greghi Filho e
outros.
Entrei para Os Independentes em 1959, através de um amigo comum, Carlos
Eduardo Palmieri, amigo do Evêncio e que trabalhava comigo na Rádio Atlântica. Evêncio precisava de alguém para fazer o mordomo na peça em um ato,
com três personagens. Os outros dois eram a Cida Celestino e o Jansen Cavalcanti que, com o Evêncio e o Wilson Geraldo, foram os fundadores do
grupo. A peça era O Urso, de Tchecov.
A partir dessa participação me dediquei de corpo e alma aos Independentes,
porque sempre gostei muito de teatro e nunca tinha pensado em fazer parte de um grupo. A filosofia dos Independentes era diferenciada de outros
grupos de teatro amador de Santos. Todo mundo fazia tudo, desde a bilheteria até a parte técnica. Não tínhamos especificamente um cenógrafo, um
figurinista, um marceneiro. Com isso se criou um grupo unido muito aguerrido.
Além disso,não funcionava só para se apresentar em festivais. Muitas vezes
até participávamos como "hors concours". A partir dessa cooperativa que foi se formando, já tínhamos idéia de ter nosso próprio teatro.
Surgiu então a oportunidade, no extinto Clube de Arte, de muito boa memória.
E na casa que existe até hoje ali na Ana Costa, construímos atrás um galpão
e ali fizemos o nosso teatro. Feito por nós mesmos, de serrote, tinta e pincel na mão. Felizmente tivemos nosso teatrinho de arena, rústico,
simples, sem grandes cenários e figurinos, mas sempre com peças de qualidade e bom trabalho artístico.
Chegamos a ter três núcleos de teatro profissional atuando. Enquanto um se
apresentava, outro estava em fase de montagem e outro iniciando leitura de uma nova montagem. Tínhamos também um núcleo de teatro infantil dirigido
pelo Chico Santa Rita, jornalista de A Tribuna.
Montamos A Rosa Verde, que venceu o Festival Nacional de Teatro com a
participação do dr. Lamuel Martins, de sua esposa Valdíria e do Luís Freire, já falecido. Começamos a integrar uma turma nova que ia ampliando cada
vez mais. Fizemos uma montagem de Gil Vicente dirigida pelo Paulo Roberto Malegni. Participaram do grupo a Lenimar Rios, o Paulo e gente do TEVEC.
Chegamos a ter aqui em Santos, naquela ocasião,nos anos 60, mais ou menos
18 grupos de teatro amador. A Prefeitura incentivava proporcionando aulas de dicção, trazendo gente importante como Ademar Guerra, Ziembinski.
Nesse meio tempo o Paulo Lara inaugurou o TIC. O Evêncio e eu fazíamos
parte da Comissão de Cultura. A Prefeitura trazia, no mês de julho, companhias profissionais para um festival de inverno, com todas as peças que
estavam em cartaz em São Paulo, a preços bem populares. Era no teatro Coliseu, que lotava de cima a baixo.
Tudo isso foi formando não só os
grupos de teatro, mas também uma grande platéia de teatro. Foi uma época maravilhosa de teatro amador de Santos.
Silvio Roupa – 8/10/94
Em 1957 eu tinha feito O Sr. Ventura no Real Centro Português.
Quando o Círculo Operário venceu o Festival com a peça Em Um Bar Qualquer e eu soube que o grupo tinha fundado Os Independentes, sem que
ninguém me convidasse, já me senti fazendo parte face à amizade que nos ligava há muitos anos.
E quando o Evêncio falou para Maria Alice "Veja se a Cida quer ficar", eu
fiquei. Logo a seguir montamos Assassinato a Domicílio, de Frederico Knott, que seria Disque M Para Matar, em benefício do Lar das
Moças Cegas. Foi a primeira peça que fiz com Os Independentes.
Eu já trabalhava com os atores em Num Bar Qualquer, que, por ter
ganho o festival, fora convidada a se apresentar na televisão. Aqui em Santos, naquela época, existia uma subestação da Embratel, acho que era o
canal 5, a Excelsior, qualquer coisa desse tipo. (N.E.: na verdade, a
TV Santos, criada pela Rebratel em 1957, em associação da Rádio Clube de Santos com a TV Paulista, canal 5).
Aí houve uma coisa engraçada. A atriz que fazia a mocinha não podia fazer o
papel. Me convidaram. Aceitei. Os diretores não quiseram. No fim, a moça realmente não podia e eu fiz o papel. Então a coisa ficou assim: me deram o
papel na terça, ensaiei na quarta, devolvi na quinta, me deram novamente na sexta, ensaiamos no sábado e no domingo foi para o ar. Foi o meu
primeiro trabalho com o grupo, que ainda não era Os Independentes. Fiquei com o grupo até 1969, com Os Físicos, de Durrenmatt.
O nosso trabalho era tão sério que quando concorremos em 62 em um festival
com O Improviso d'Alma ou O Camaleão do Pastor, de Ionesco, não ganhamos nenhum prêmio porque o nosso espetáculo tinha nível profissional e
ficamos alijados do festival. Os grupos, daí para a frente, passaram a concorrer para ganhar dos Independentes.
Em 66, por insistência do dr. Oscar Von Pfuhl, voltamos a concorrer com
A Rosa Verde, do Evêncio. Vencemos e fomos representar Santos na cidade de São Carlos. Foi um sucesso muito grande.
Fiz trabalhos e poesia com a Nélia Silva. Tentamos fazer teatro no Centro
Cultural Brasil Estados Unidos mas não conseguimos, por problemas de direitos autorais. Daí eu parei.
Devo muito aos amigos. Ao Greghi
que me incentivou, ao Evêncio que sempre depositou confiança em mim, ao Wilson Geraldo pelo trabalho de direção. Nós éramos, antes de tudo, um grupo
de amigos que comungava aquele grande amor pelo teatro. Isso nos mantém unidos até hoje.
Cida Celestino – 8/10/94. |