Três atrizes
Em 1958 comecei no Coral Vicentino, regido por Jesus de
Azevedo Marques, onde fiquei seis anos. Lá conheci Lizette Negreiros e descobrimos que queríamos ser atrizes e isso nos tornou mais unidas. Um dia
li que estavam abertas as inscrições para o teatro do Real Centro Português. Fomos aceitas e ficamos por muitos anos, sob a direção de Faraco,
responsável por muitas carreiras artísticas. Fizemos teatro sem sentir nenhum preconceito de cor, mas, quando quisemos entrar no grupo folclórico
português, não conseguimos.
Depois montamos um grupo chamado Os Hífens, com o violonista
Ezequiel, com Glorinha Ribeiro, e encenamos durante algum tempo Gente Como a Gente. O músico Roberto Sion, que estava começando, trabalhou muito conosco. Depois fui para o TEFFI na
montagem de A Falecida, com direção de Celso Nunes e grande elenco, hoje famoso: Ney Latorraca, Jandyra Martini, Neide Veneziano, Soffredini,
Eliana Rocha, Perito Monteiro, Edoner Messias, Dráusio da Cruz.
O TEFFI acabou quando a maioria de seus integrantes foi para
São Paulo. Aí fui convidada para integrar o Persan, onde trabalhei com Lizete Negreiros, Cleide Queiroz, Jorge Elias, Gilberto Molihnari, em
Pedro Mico.
Em 1967 fui eleita
Rainha do Carnaval e depois Bonequinha do Café. Foi então que Paulo Lara me convidou para integrar o TIC e montamos
Dona Patinha Vai ser Miss. Ele era um diretor essencialmente de ator, era muito querido. Depois o TIC acabou e fui para o
TEVEC na montagem de A Invasão, com poucas apresentações por causa da censura. A Lizette e a Cleide foram para São Paulo para testes no
Morte e Vida Severina. Como não tinha como sobreviver em São Paulo, não fui. No TEVEC fizemos Lugar de Padre, As Confrarias e
Sang City.
Terezinha Tadeu, nome artístico de Antonia Therezinha dos Santos
Comecei a fazer teatro em Santos em 1954, no Teatro do
Comerciário,no Senac, sob a direção de Benigno Magno, que também fazia circo-teatro. Conheci a Lizette na Santa Casa, onde trabalhávamos e ela me
convidou para fazer o Persan – Grupo Teatral Perspectiva de Santos, sob a direção de Florence e Otto Buschabaun, que tinham um projeto de teatro
popular, do teatro que vai ao encontro do povo. E fizemos o Pedro Mico,
que foi uma viagem gloriosa.
Nos apresentamos no
porta-aviões Minas Gerais, nos morros, nas praças, onde houvesse possibilidade. Graças à Florence, vivíamos nas páginas do jornal
Cidade de Santos e ela conseguiu até uma reportagem colorida em O Cruzeiro. O lugar onde ensaiávamos era vigiado e nós não sabíamos o
risco que corríamos. Fazíamos teatro por amor, sem preocupações políticas.
Cleide Eunice Queiroz.
Só muito tempo depois, quando Cleide e eu estávamos
em São Paulo, é que fomos aquilatar a importância desse nosso trabalho. O Persan ficou só nesse trabalho, porque Florence e Otto, que fizeram letra
e música do espetáculo, foram obrigados a sair de Santos por pressões políticas.
Eu e a Terezinha Tadeu, como todos os integrantes do grupo,
já tínhamos trabalhado com o Faraco no Real Centro Português e a nossa ida para lá tinha sido com muito medo, o medo de ser ou não aceitas por
sermos negras. Depois fomos para o TEVEC, as três, e participamos da montagem da
Invasão, que não foi levada por problemas de censura.
Cleide e eu fomos para os testes de
Morte e Vida Severina e fomos convocadas para trabalhar na Cia. de Paulo Autran sob direção de Silney Siqueira. Era meu primeiro trabalho
profissional e não parei mais. Participei de Jesus Cristo Superstar sob a direção de Altair Lima.
Cleide e eu fomos contratadas pelo Sesi, onde ficamos oito
anos fazendo ótimas montagens: O Santo Milagroso, A Falecida,
O Mambembe, esta última com direção de Gabriel Vilella, entre outras.
Nós fizemos também comerciais, ganhamos vários prêmios. Mas
parei de fazer comerciais porque era chamada somente para fazer a empregada.
Nada contra a
categoria, mas acho que está na hora de parar de fazer papéis submissos, servis. Por isso me dediquei ao teatro infantil, graças ao Paulo Lara. Se
não obtive fama nestes 25 anos de trabalho, conquistei algo muito importante: o respeito da minha classe. Sou uma atriz negra, santista, com muita
honra, embora não seja reconhecida estou há 25 anos trabalhando no teatro. Se estivesse na TV todo mundo me reconheceria.
Lizette Negreiros
Outros depoimentos
Comecei minha carreira artística aos nove anos, na
Rádio Clube de Santos, PRB4, no programa Hora Infantil, dirigido por Vovó Carlota. Depois fui para a
PRG5, Rádio Atlântica de Santos, para participar do Teatrinho da famosa Dindinha Sinhá. Foram minhas amigas e contemporâneas, Lolita Rodrigues e
Selma, cujo sobrenome me escapa e que também atua na Globo.
O Teatrinho de Brinquedos apresentou-se por diversas vezes
no Teatro Coliseu em espetáculos belíssimos. O povo santista prestigiava, comparecendo em massa,numa época sem televisão, onde o rádio, a imprensa e
o teatro eram os únicos meios de comunicação entre o público, a cultura, o lazer.
No palco do Coliseu apresentavam-se grandes companhias de
comédias, revistas, musicais, óperas e o nosso grupo de cantores e bailarinos. O espetáculo
Isto é Brasil teve grande sucesso e repercussão pelos números de dança, canto,
cenários e temas originais que lhe rendeu uma apresentação no Teatro Municipal de São Paulo. Os espetáculos eram sempre em benefício de instituições
de caridade.
Através do Teatrinho fui convidada a participar, aí como
profissional, do cast da Rádio Atlântica como cantora – duas vezes por
semana com orquestra e como rádio-atriz no programa diário Um romance para você.
Eu era a mocinha das
telenovelas e no dia do meu casamento as fãs quase acabaram com meu vestido de noiva, na ansiedade de me ver e tocar.
Brites Quaresma de Figueiredo
O movimento artístico da cidade, dos grupos teatrais,
começou depois que Cacilda Becker foi reconhecida como uma das grandes estrelas fulgurantes, das grandes
artistas de teatro. Como Miroel Silveira, ela não era reconhecida na cidade e ficou um tempão no rádio antes de ir para São Paulo.
Nunca rompi meus laços com a cidade, embora tenha saído
daqui.
Lá no Teatro do Sesi, vejo as pessoas que ficam na fila,
chegam cedo para conseguir ingresso e têm uma participação muito diferente da elite. A elite é fria, parece que vai ao teatro por uma função social.
O trabalhador, o mais marginalizado, ele vai lá e vê um pedaço de vida que não é a dele e da qual ele gostaria de estar dentro.
Shakespeare aqui é
muito elitizado. "Ninguém vai entender". É tudo mentira. Ele escrevia para uma grande massa popular. Ele escreve um remendo dramalhão e todo mundo
gosta de um folhetim.
Liba Frydman. |