Imagem: anúncio publicado na edição de 6 de abril de 1938, pág. 15, do jornal santista
A Tribuna
Os primeiros cinemas de Santos
Bandeira Jr.
Já tivemos a oportunidade de registrar que a primeira
manifestação de cinema (exibidor) na Baixada Santista ocorreu em 1897, no Recreio Miramar (Praia do Boqueirão), que
exibiu, com muita publicidade e concorrência de espectadores, "fotografias animadas".
Na edição de 29 de junho de 1899, publicava Tribuna do Povo:
"Continua a atrair grande concorrência, à Rua de Santo
Antonio (hoje do Comércio) nº 45, o cynematographo que ali funciona.
"Todas as noites lá se fazem duas exibições de boas e lindas vistas, sendo a primeira
às 7 horas e a segunda, às 8,30.
"Não deixem os nossos leitores de ir apreciá-las, pois que, com franqueza, valem bem o
dinheiro que se dá pela entrada".
E na seção comercial há o seguinte anúncio:
"Última maravilha do Século XIX – Londres e Paris em
Santos, no incomparável cynematographo de Lumiére.
"Haverá todas as noites duas exibições de 8 encantadoras cenas de movimentos naturais
* Ver para Crer *
"Só assim se poderá certificar da sublimidade desse maravilhoso invento *
Entrada, 2$000 (dois milréis); Crianças, 1$000".
Apesar do sucesso, somente em 1903 teríamos outra oportunidade de ver a nova arte que
estava revolucionando a Europa e América do Norte. Desta vez coube ao Teatrinho Variedades (Praça dos Andradas esquina da Rua 15 de Novembro)
apresentar o Biocópio Inglês que, na última semana de junho, exibiu a Vida e Paixão de Jesus Cristo em 64 quadros fixos (slides?) e 19
com movimento, todos coloridos.
Essa promoção, muito elogiada pela imprensa local, foi o canto do cisne do Variedades.
Anos depois (1907) tentou-se transformá-lo em Pavilhão Mourisco, mas suas condições eram muito precárias e acabou mesmo sendo demolido.
Em 1904 a cinematografia toma conta da cidade: no Parque Miramonte (fundado em 1900)
havia o Salão Fantástico exibindo o Biógrafo Americano "que é um bem acabado cinematógrafo, diversão puramente
familiar, por 1$000 a entrada inteira e $500 meia". Diga-se de passagem que desde 1902 o Parque da Rua do Rosário (João
Pessoa), nº 45, dedicava-se ao comércio das novas invenções como fonógrafo, máquina de escrever, estereoscópios, fotografias-rolantes (Cosmograma)
etc.
Imagem: anúncio publicado na edição de 1 de setembro de 1942 do jornal santista A
Tribuna
A 23 de setembro começava no Teatro Guarani temporada de 3
dias do cinematógrafo falante Lumière com os filmes Vistas do Japão (natural), Sansão e Dalila e Dom Quixote, sendo que estes
dois de enredo eram a cores! O camarote para esse inusitado espetáculo custava 10$000 (cinco lugares), a poltrona 2$000 e a geral 1$000. A empresa
E. Hervert, promotora da temporada, informava que haveria bonds (de burro) para todas as linhas. Comentando o fato, o Diário
registrava "que o cinematógafo falante de ontem no Teatro Guarani é, na verdade, o mais aperfeiçoado aparelho que tem
vindo a esta cidade. A ilusão é completa por meio de fonógrafo combinado com o projetor" (25/9/1904).
Dias depois (27 de setembro), o Circo Martinelli, instalado num
terreno da Rua Amador Bueno (defronte ao prédio da S. Humanitária, onde foi sucessivamente o Redondéu de Touros, o Cine
Central e a atual Cagesp) apresentava "Grande Companhia de Atrações e Variedades com iluminação elétrica e o único
cinematógrafo americano (nunca visto nesta cidade) – premiado com medalha de ouro na Exposição de Paris, 1901". No
programa Os Sete Pecados Mortais, Joana D'Arc etc.
Os quadros com movimento já eram filmados em celulóide de 35 mm com perfuração
lateral, como se usa até hoje (16 quadros por segundo é a sua velocidade no projetor, depois com a sonorização aumentaria para 24 quadros).
Enquanto os quadros fixos eram gravados em tiras de vidro mais resistentes ao calor do
foco luminoso, diante do qual ficavam parados o tempo que o operador quisesse, como os slides de hoje.
Quanto à tentativa de cinema "falante", foi preocupação constante dos pioneiros, em
todas as partes do mundo, porque a maioria (como Edison) não acreditava viesse o povo a interessar-se por um teatro mudo.
O fato é que a nova arte progredia assombrosamente e por causa dos direitos de patente
tomava os nomes mais esdrúxulos como animatógrafo, cromofoto, grafoscópio, comografoscópio, hinoscópio, umógrafo, movimentoscópio, fantógrafo,
biógrafo, bioscópio, kinógrafo, kinematógrafo etc.
Os jornais também destacavam o interesse que a nova diversão despertava entre as
cortes imperiais e os governos dos países europeus.
Imagem: anúncio publicado na edição de 1 de setembro de
1942 do jornal santista A Tribuna
Enquanto o Salão Fantástico continuava com suas pequenas sessões diárias, o Guarani só
veio a receber novo cinema em abril de 1905, quando a empresa Candbourgh (Pathé Frere Paris) apresentava "a última
palavra em cinematógrafo falante". O sucesso fez a temporada de três dias ser prorrogada por uma semana, merecendo
ainda elogiosas referências (e crônicas) do Cidade de Santos, que destacava a cena da tomada de Porto Artur, no filme da Guerra
Russo-Japonesa.
No ano seguinte o Candbourg voltava ao Teatro Guarani para temporada mais longa e, em
1907, permaneceu dois meses, sempre com sessões repletas.
O programa era sempre aberto por uma orquestra e a seguir com música em background
eram projetados filmes, geralmente de uma ou duas partes, na tela (previamente molhada). Eis um desses programas: Ouvertur por excelente
banda de música; O Guarda-civil em apuros - Tascado de fogo - Quem aposta louco é - Policiais e contrabandistas - A
Pulga - O tesouro do Rajá. II Parte: Sinfonia (pela orquestra), O vendedor de castanhas - Lição de patinagem - Um
espirro em cada andar - O enforcado por amor - Touros e touradas. III Parte: Viagem ao Ceilão - Desquite de crianças
- A fuga cômica - O árabe mágico - Carro de praça e O casamento na roça (nacional?). Comentário dos jornais: "Não
podia ser mais auspiciosa a estréia de ontem no Guarani, da empresa Richbourg, possuidora de magnífico aparelho de projeção de vistas animadas. O
público que lotou o Teatro deixou-o pesaroso, tão bem lhe soube o divertimento".
A empresa tinha contrato com Marc Feerenz, do Rio de Janeiro, acreditado pioneiro da
indústria cinematográfica, o que garantia renovação contínua da programação. Nos últimos dias foi apresentado "jornal" brasileiro que
focalizava a visita do General Rocca ao Brasil e outras atualidades.
Tão boa foi a temporada que o sr. Antônio Godatti, representante do exibidor, doou
100$ à Santa Casa de Misericórdia, ao seu final.
Imagem: anúncio publicado na edição de 3 de novembro de 1978 do jornal santista A
Tribuna
Em outubro a Empresa Star ocupava o Guarani com "cinema falante" que incluía os
filmes: La femme est un jouat - linda cançoneta interpretada por Merçadier do Cassino de Paris; Bonsoir, madame La Luna, pelo mesmo
cantor; Au Telephone, conversação sobre valores da Bolsa por Mr. Galipeau. Essa experiência foi um fracasso, como bem assinala Carlos
Vitorino no seu livro Reminiscências. A voz (do gramofone) não combinava com o movimento da imagem projetada na tela, o que dava motivo a
deboche e a pateada da platéia.
Em novembro, não houve mais cine "falante" e a temporada iniciou com o Nascimento,
Vida, Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, o mesmo que passa até hoje, na Semana Santa, apesar de decorridos 70 anos...
Imagem: anúncio publicado na edição de 3 de novembro de 1978 do jornal santista A
Tribuna
A partir de 1908, o Teatro Guarani ia ter muitos concorrentes: o Centro Santista (Rua
do Comércio); em janeiro, começou o cinema Candbourg no Redondéu (Praça de Touros) da Rua Amador Bueno, com sessões ao ar livre quando não chovia...
A 25 de julho, inaugurava o Cinematógrafo Excelsior (Rua 15 de Novembro nº 88) e em outubro estreava cinema ao ar livre nos jardins do
Parque Balneário Hotel, no Gonzaga.
A partir de março de 1909 o Clube XV - sempre na linha do
vento - oferecia domingueiras cinematográficas aos associados e familiares, na sede da Rua Amador Bueno (esquina da Rua Constituição).
No mesmo mês (dia 6), abriu um cinema com o nome de Iris Teatro num armazém da Rua do
Comércio, que durou poucos dias.
A 30 de abril, a Câmara aprovava as obras de construção do Coliseu,
cine-teatro pertencente ao sr. F. Serrador, do Rio de Janeiro.
Em maio, era o Miramar, lá no Boqueirão, que começaria com cinema ao ar livre, aos
sábados e domingos, e houve igualmente a tentativa de uma sala exibidora (Cinema Predial) na Rua Pego Júnior sob a direção do sr. J. Neves, mas
durou poucos dias – era localizada longe do centro...
Imagem: anúncio publicado na edição especial de lançamento do
antigo jornal diário Cidade de Santos, em 1º de julho de 1967
Em compensação, o Bijou Salon de Gustavo Pinfild & Filho, com 400 lugares, era
inaugurado, em junho, na loja nº 88 da Rua 15 de Novembro, e ficou famoso por exibir filmes eróticos...
Outro fracasso foi o Eden Salão na Praça dos Andradas nºs 11 e 13 (onde foi
posteriormente a sede do P.S.P.), que somente funcionou algumas semanas, o mesmo acontecendo com o Cinema Smart (Rua 15 de Novembro nº 46).
A 23 de julho de 1909 era solenemente inaugurado o Coliseu Santista, rigorosamente
construído para cine-teatro, o mais chic do município. Com 800 poltronas afora frisas e galerias, o Coliseu dispunha de feérica iluminação
elétrica e das galerias ao teto tinha tapamento de madeira tipo veneziana para melhor ventilação. O terraço de entrada era descoberto e possuía bem
sortido buffet. Reformado e aumentado em 1924, a nossa principal casa teatral tornou-se uma das melhores do mundo, na opinião de ilustres
visitantes conhecedores do assunto.
Infelizmente temos que encerrar este humilde trabalho informando que o velho Coliseu
Santista está com os dias contados...
Imagem: anúncio publicado na edição especial de lançamento do
antigo jornal diário Cidade de Santos, em 1º de julho de 1967
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