HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS
O vulcão do Macuco (1)
Tornou-se quase uma lenda em Santos a história do vulcão no bairro do
Macuco. O falecido escritor Olao Rodrigues recolheu a história em sua Cartilha da História de Santos (Santos, 1980)
desta forma:
No dia 29 de dezembro de 1896, trabalhadores da
Comissão Sanitária perfuravam o solo com uma sonda, quando foi provocado o fenômeno, jorrando a grande altura substância gasosa de cor escura.
Quanto mais penetrava a sonda no subsolo, maior era a quantidade de lavas lançadas pelo vulcão.
Afinal, segundo apuraram uns técnicos, aquilo não era vulcão, senão fenômeno de natureza
dos poços artesianos. Atraiu não apenas a curiosidade da população de Santos, mas também a do Planalto que, com esforço e dificuldade, afluiu à área
do vulcão, lá na Rua Ana Carvalhais, hoje Rua Almirante Tamandaré, no Macuco. Negociantes e não negociantes armaram barracas e passaram a vender
cervejas e refrigerantes, bem como sanduíches e petisqueiras, abusando nos preços.
Foi tal a exploração havida que hoje podemos dizer que o Turismo santense começou
naquela oportunidade, em 1894, no outro século...
O vulcão, em bico-de-pena do desenhista Ulisses Veneziano
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O historiador Francisco Martins dos Santos também relatou o episódio, em sua História de Santos (volume
2, 1986):
Foi em meados de dezembro desse ano (N.E.: 1896) que a população amanheceu, um dia, alarmada com o aparecimento,
lá na região mais interior do Macuco, de um estranho e extraordinário fenômeno. Um buraco se abria junto à
mata do varjão dos Outeirinhos, vomitando lama e fumaça, intercaladas de apitos fortes como de
sirena. Logo após, grandes chamas amareladas se elevaram também, ameaçadoras, chiantes como labaredas de fogareiro de pressão, subindo a dez metros
de altura. Foi um estouro na pacatez da vida santista. A cidade inteira movimentou-se para lá. Os bondinhos de burros da Empresa Viação Paulista
desviaram-se todos para aquela zona, e lá se iam ramerrando pela avenida acima, apinhados de gente até à tolda, como nos grandes dias do entrudo no
coração da cidade. Foi uma procissão. Todos queriam contemplar o ineditismo do espetáculo.
De fato, o fenômeno lá nas proximidades do estuário era digno de ser visto, como coisa nova e imprevista, apesar
da face possivelmente trágica do seu aparecimento. Era um indagar daqui e um arregalar de olhos dali, e beatas em benzimentos e céticos em sorrisos,
e sobre toda aquela amálgama de pensamentos, juízos e interpretações, os boatos de fim de mundo, de submersão da ilha e as indefectíveis explorações
do púlpito:
- Meus irmãos: (a voz trêmula, o dedo espetado no ar): Deveis estar preparados!
Filas intermináveis de povo seguiam pela avenida cumprindo a pé toda a distância, por falta de lugar nos bondinhos
e as beiradas do grande picadão, que servia mais tarde à Avenida Taylor, se apinhavam de gente
de toda casta, sem esquecer quitandeiras e criolinhos em pregões insistentes de amendoim, bolinhos de fubá, pamonhas, munguzá, doçarias e
pasteizinhos quentes, a par de limonadas. Todo o caminho largo se tornou uma feira povoada, cruzada e recruzada de vultos e de vozes e gritos da
molecada assanhada.
De São Paulo e do interior, onde a notícia se espalhara como o vento, descia gente todos os dias para ver o
vulcão, e, em redor daquele fato, lá mesmo muita lenda se levantara, fruto da distância e da imaginação, como as que em Santos já haviam nascido
como produtos da ignorância ou da exploração.
Muitas famílias achavam mais fácil ir até lá em botes de aluguel, e embarcavam então nas catraias que às dezenas
esperavam os passageiros certos, no Valongo, na
Alfândega, ou no Paquetá (onde ficava o Mercado das canoas).
Iam embarcadas e apeavam na atual Bacia do Macuco, ainda em seu estado primitivo, seguindo depois pelo varjão
encharcado e daí pela terra firme até junto ao fenômeno. Junto ao local do fato espetacular que a natureza proporcionara passageiramente aos homens,
extasiavam-se todos à vista do grande penacho de fogo jalde e rubro, cruzado de fagulhas e tresandando forte a enxofre, admirado cada um da cara que
apresentava o vizinho, amarela cerosa como se ressuscitados ou cadáveres estranhamente animados. E o fogaréu grugrulhava nas entranhas da terra,
enquanto um ligeiro tremor abalava o piso dos circunstantes colocados respeitosamente a uma distância de seis ou sete metros em derredor. Era a
solfatara de Santos, era o vulcão do Macuco!
Por mais de um mês foi o espetáculo santista contemplado por milhares de criaturas de todas as distâncias, e só se
extinguiu em fins de janeiro de 1897. José Inácio da Glória, o grande amigo das tradições locais, teve a lembrança de fixar no vidro de uma câmara
fotográfica ao que ele estava assistindo no primeiro dia da erupção.
Hoje, sobre o lugar em que ele existiu, assentam-se ruas e casas novas, e, ali perto, uma grande chaminé
industrial vulcaneja para o céu grandes rolos de fumo, como simbolismo talvez." |
Sobre o tema, comentou a Prefeitura Municipal de Santos, em
página Web de cerca de 2003:
Vulcão
Quem disse que no Brasil não tem vulcões estava enganado. Na Cidade, mais precisamente no bairro do
Macuco, existiu um. Ele surgiu em 29 de dezembro de 1896, segunda consta do Almanaque de Santos, no título Estes são os Grandes Sinistros
em Santos, capítulo escrito por Geraldo Ferrone.
A novidade movimentou não só os moradores mas também gente de fora, da Capital. Tudo
começou quando um engenheiro acompanhava os trabalhos na antiga Rua Dona Ana Carvalhais e atual Almirante Tamandaré. Um equipamento chamado sonda
exploratória atingiu 17 metros de profundidade. Gases começaram a se desprender com tamanha pressão, que fizeram a mão de um dos operários, colocada
no instrumento, produzir a vibração de um apito de máquina a vapor.
O Almanaque conta que muita gente foi conferir de perto o vulcão. "Todos foram
para o Macuco. Ou de bondes de burros, ou de canoas e catraias ou ainda de troles de carretões". Até os comerciantes da
época, tão espertos quanto os de hoje, armaram barracas no lugar para vender cerveja.
Infelizmente ou felizmente, o fenômeno fora desmascarado em pouco tempo. Em 31 de
dezembro do mesmo ano, o doutor Orvile Derby esclarecia no jornal O Estado de São Paulo que, o tão famoso vulcão do Macuco, não passava de um
poço artesiano (com água). As explicações dele foram comprovadas quando, em meados de janeiro de 1897, as erupções acabaram para sempre. |
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