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HISTÓRIAS E LENDAS DE S. VICENTE - BIBLIOTECA NM
1532+460 anos de S. Vicente (C)

Um álbum comemorativo mostra aspectos da cidade que muitos vicentinos desconhecem. Outros, já mudaram bastante desde então, ou viraram história

Ao longo dos séculos, as povoações se transformam, vão se adaptando às novas condições e necessidades de vida, perdem e ganham características, crescem ou ficam estagnadas conforme as mudanças econômicas, políticas, culturais, sociais. Artistas, fotógrafos e pesquisadores captam instantes da vida, que ajudam a entender como ela era então.

Em 1992, comemorando os 460 anos da chegada de Martim Afonso, que oficializou o nome São Vicente, foi publicado o livro São Vicente - 1532-1992, com pesquisa e texto da jornalista Noemi Francesca de Macedo, editora do jornal Espaço Aberto), tendo projeto gráfico e editorial da EF Editora Ltda., fotos e reproduções de José Dias, arquivo do jornal Espaço Aberto, edição da Poliantéia Vicentina e arquivo pessoal de Santo Bordinhon. A capa, criada por Maurício Menezes, teve ilustração de Eduardo Jardim. A revisão foi feita por Exceção Assessoria de Texto S/C Ltda., enquanto Impressão, Fotolito e Acabamento foram providenciados por Maynard & Poladian Associados Gráfica e Editora Ltda., de S. Paulo. A obra de 103 páginas teve apoio cultural de Carrefour Comércio e Indústria S/A e chega agora pela primeira vez ao meio digital, em Novo Milênio (páginas 15 a 21):

 

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Noemi Francesca de Macedo

Quem não conhece a Biquinha de São Vicente? A lenda sobre o poder curativo e afrodisíaco de sua água atravessou fronteiras

Imagem: reprodução da página 16 da publicação (cor acrescentada por Novo Milênio)

Biquinha, santuário de Anchieta

As notícias sobre a água especial que descia de um morro em São Vicente já eram de conhecimento de Portugal desde 1520, doze anos antes da fundação da cidade.

Na época, quem muito dela se servia era o grupo social formado pelo degredado Cosme Fernandes, localizado atrás da baía de Paranapuã.

Mestre Cosme Fernandes fora deixado em terras vicentinas durante a expedição de André Gonçalves e Américo Vespúcio. Após pequena estada na área de São Vicente, que ainda não havia sido fundada, Cosme Fernandes foi para Cananéia, onde deveria permanecer. Mas, depois de conhecer a beleza daquele primeiro local em que ficara, e de tomar daquela água considerada abençoada, Cosme Fernandes, quatro ou cinco anos mais tarde, voltou para São Vicente.

Como era um fora-da-lei, construiu seu povoado atrás da baía de Paranapuã, cuja barra não dava acesso para navios de grande calado. E era daquela água que vertia do morro em frente à praia que Cosme Fernandes se utilizava e, com o passar do tempo, abastecia navios, aportados nas proximidades, naturalmente os que lhe interessavam.

Saindo do Morro do Tumiaru (antigo Outeiro de São Vicente, depois Morro Santo Antonio, Morro dos Padres e hoje Morro dos Barbosas), junto à Praia Mahuá, atual Gonzaguinha, existiam três nascentes de água potável.

Uma das fontes se chamava Fonte do Povoado (Biquinha); a segunda, mais ao centro do morro, era considerada uma pequena cachoeira e tinha o nome de Fonte dos Padres, que deu origem, inclusive, ao Rio Sapateiro, onde hoje está localizado o reservatório municipal do Morro dos Barbosas. A terceira fonte, no outro extremo do morro, perto de onde começa a Ponte Pênsil, era a mais próxima do povoado de Cosme Fernandes, mas ele preferia a primeira delas, por sua beleza.

Naquela época, a água que vertia da Fonte do Povoado desaguava num riozinho, a cem metros da praia, exatamente onde se encontra a Praça 22 de Janeiro, local depois ocupado pelos jesuítas para suas apresentações artísticas e preleções.

Assim, quando São Vicente foi fundada, uma de suas potencialidades já era conhecida em Portugal. "O grande problema para os portugueses na santa terrinha era ficar imaginando o gosto dessa água". Assim brincava o velho Leôncio José de Carvalho, nordestino que faleceu aos 100 anos, em 1984, e que durante muito tempo vinha a São Vicente, pelo menos uma vez por ano, para visitar os filhos. Um de seus passatempos preferidos era ficar sentado próximo à bica e inventar histórias sobre portugueses.

Não é fácil fazer uma criança deixar a Biquinha sem antes alimentar os pombos do local

Imagem: reprodução da página 17 da publicação (cor acrescentada por Novo Milênio)

Fonte do povoado

Em 1533, com a vinda dos jesuítas, sob a chefia dos padres Manoel da Nóbrega e Leonardo Nunes, que fundaram o colégio dos Meninos de Jesus de São Vicente, a 80 metros de distância da Biquinha, aquela bica teve uma nova utilidade.

Padre Leonardo Nunes criava a primeira bica de serventia pública, a atual fonte, quando mandou fazer a captação da cachoeira do centro do Morro. Todos passaram a frequentar somente a Fonte do Povoado, ou Biquinha.

José de Anchieta começou a frequentar o local somente em 1555, mas foi em 1567, um ano após ter sido ordenado padre na Bahia, que Anchieta veio residir em São Vicente, onde durante dez anos foi o superior do Colégio dos Meninos de Jesus.

Foi a partir de então que a Fonte da Vila (já não mais se chamava Fonte do Povoado) começou a se tornar célebre. Isso porque Anchieta dava preferência àquele local para suas práticas religiosas e meditação, além de aulas de catecismo.

Foi ali que se fundamentou sua fama de santidade. Dizem que teria sido ele quem construiu o primeiro monumento rústico da Biquinha. O mosaico da Biquinha, que retrata cenas de Anchieta ensinando os índios, tem a inscrição do ano de 1553, mas, desde esse longínquo ano, em que padre Leonardo Nunes oficializou o local como bica, muita história rolou morro abaixo.

O romântico coreto mais parece um pequeno caminho em direção ao morro. No alto, a grande cruz de pedra bruta, inaugurada em 1974

Imagem: reprodução da página 18 da publicação (cor acrescentada por Novo Milênio)

A tradição da feira do doce

Além da bica, a Biquinha de São Vicente oferece área de lazer que compreende uma "Feira de Doces", um coreto, um pombal e um viveiro de peixes.

Funcionando diariamente, a tradicional "Feira de Doces" da Biquinha é muito procurada, principalmente em fins de semana e temporadas. Formada por quatorze barracas de doces, duas de salgados e três de souvenirs (N. E.: lembranças turísticas), a feira é uma tradição.

Inácio Euzébio da Silva, com sua barraca de souvenirs, diz que está no local desde 1954, ano em que seu pai, já falecido, plantou a imensa jaqueira localizada junto ao coreto. Inácio, assim como Odete Fernandes, Sineide Pacífico de Sá e José Pereira, das barracas de doces, não sabem quando começou o funcionamento daquela atividade.

José Pereira, no entanto, lembra que muito antes de 1954 a feira já funcionava com carrinhos de ambulantes. "Eram carros de madeira que no final do expediente tinham que ser levados para estacionamentos, um na Rua Padre Anchieta e outro na praça, próximo ao cruzamento com a Rua Martim Afonso".

De acordo com Sineide Pacífico de Sá, cada barraca oferece doces caseiros que variam de maria-mole a massa folheada, mas tem também maçã-do-amor, milho verde e pipoca.

Monumento na Praça 22 de Janeiro lembra a unidade do povo brasileiro

Imagem: reprodução da página 20 da publicação (cor acrescentada por Novo Milênio)

Herança histórica

Em meio ao verde da Praça 22 de Janeiro - que muitas pessoas também chamam de Praça da Biquinha - está o monumento comemorativo do IV Centenário da descoberta do Brasil. No monumento, inaugurado em 22 de abril de 1900, a inscrição em latim: "À sombra da cruz foi feita a aliança das armas, a união das gentes e, sob tais auspícios, cresceu unido o povo brasileiro".

Toda a praça era conhecida até o século passado (N. E.: século XIX) como o Campo ou Largo da Fonte. Com a abolição dos escravos, em 1888, passou a se chamar Largo Treze de Maio, até 1918, quando a Câmara Municipal de São Vicente, através de lei, alterou a nomenclatura de alguns locais, entre eles o da praça.

Nela, além do marco do IV Centenário encontra-se a herma do Padre Manoel da Nóbrega, o marco comemorativo da fundação da primeira escola vicentina, o Colégio dos Meninos de Jesus de São Vicente, que foi a segunda escola do Brasil, e o relógio de sol.

O relógio de sol é considerado marco primordial do cadastro da cidade, construído durante a gestão do então prefeito Polydoro de Oliveira Bittencourt, que inclusive morava num dos poucos casarões ainda existentes na praça.

Inaugurado em 22 de janeiro de 1943, através desse relógio tem-se a referência do nivelamento: altitude desse marco em relação à aresta do cais de Santos e do preamar médio. Através do quadrante solar é possível obter, inclusive, índices de longitude e latitude com base na escala W de Greenwich.

A praça é uma extensa área verde destinada ao lazer, reunindo vários monumentos e sintetizando grande parte da história de São Vicente.

Os bancos sob as imensas árvores e a tranquilidade do local parecem conspirar para que o romantismo floresça. Um sentimento de carinho, liberdade e tranquilidade parecem tomar conta das pessoas que passeiam pela praça, onde aos domingos é realizada, desde 1974, a tradicional "Feira Hippie", criada por iniciativa do jornalista Sérgio Salles Galvão.

De repente, principalmente aos domingos e feriados, em meio às barracas e aos monumentos, um apito de trem. Para os desavisados, primeiro um susto, depois o riso. Para as crianças, a alegria de "viajar" pelas alamedas da praça no trenzinho que tem de tudo, desde locomotiva, uma réplica da "Maria Fumaça", aos vagões de passageiros, fechados e abertos.

Ir à Praça 22 de Janeiro e não ver as crianças no trenzinho é a mesma coisa que ir à Biquinha e não tomar de sua água, nem brincar com os pombinhos.