Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 16 — Dos
crustáceos, moluscos, zoófitos, eqüinodermos etc. e dos peixes de água doce
Capítulo
CXLV
Que trata do marisco que se cria na água doce.
Assim como a natureza criou tanta diversidade de mariscos na água salgada, fez o mesmo nos rios e lagoas da água doce, como se verá pelos
mexilhões que se criam nas pedras destes rios e no fundo das lagoas, que são da feição e tamanho dos do mar, os quais não são tão gostosos por serem
doces.
Também se criam nas pedras destes rios caramujos maiores que os do mar e compridos, a que os índios chamam sapicaretá.
No fundo das lagoas, nas lamas delas, se criam amêijoas redondas que têm grande miolo, a que os índios chamam como as do mar, as quais são, pelo
lugar onde nascem, muito insossas.
Mais pelo sertão se criam, nos rios grandes, muitos mexilhões de palmo de comprido e quatro dedos de largo, que são pela banda de dentro da cor e
lustro da madrepérola, que servem de colheres aos índios, os quais têm grandes miolos; por serem de água doce não são mui gostosos como os do mar.
Também se criam nestes rios muitos e mui diversos camarões, dos quais diremos o que foi possível chegar à nossa notícia; começando primeiro dos
mais gerais, que os índios chamam poti, que são muitos, do tamanho dos grandes de Lisboa, mas mais grossos e têm as barbas curtas, os quais
se criam entre as pedras das ribeiras e entre raízes das árvores, que vizinham com a água, e em quaisquer ervas que se criam na água; de que os
índios se aproveitam tomando-os às mãos; e são muito saborosos.
Há outra casta de camarões, a que os índios chamam aratus, que são da mesma maneira dos primeiros, mas mais pretos na cor, e têm a casca
mais dura, que se criam e tomam da maneira dos de cima, os quais cozidos são muito bons.
Nestas ribeiras se criam outros camarões, a que os índios chamam araturé, que têm pequeno corpo e duas bocas como lacraus e a cabeça de
cada um é tamanha como o corpo, os quais se criam pedras no côncavo delas, e da terra das ribeiras, que são muito gostosos e tornam-se às mãos.
Potiuaçu são uns camarões que se criam nas cavidades das ribeiras, e têm tamanho corpo como os lagostins, e o pescoço da mesma maneira; têm
a casca nédia e as pernas curtas, os quais criam corais em certo tempo, e em outro têm o casco gordo como lagostas, que se também tomam às mãos, e
são muito saborosos; e estes e os mais não são nada carregados. |