Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 12 — Dos
mamíferos terrestres e anfíbios
Capítulo
CIV
Que trata das castas dos bugios e suas condições.
Nos matos da Bahia se criam muitos bugios de diversas maneiras; a uns chamam guigós, que andam em bandos pelas árvores, e, como sentem
gente, dão uns assobios com que se avisam uns aos outros, de maneira que em um momento corre a nova pelo espaço de uma légua, com que entendem que é
entrada de gente, para se porem em salvo. E se atiram alguma flechada a algum, e o não acertam, matam-se todos de riso; estes bugios criam em tocas
de árvores, de cujos frutos e da caça se mantêm.
Guaribas é outra casta de bugios que são grandes e mui entendidos; estes têm barbas como um homem, e o rabo muito comprido; os quais, como
se sentem flechados dos índios, se não caem da flechada, fogem pela árvore acima, mastigando folhas, e metendo-as pela flechada, com que tomam o
sangue e o curam; e aconteceu muitas vezes tomarem a flecha que têm em si, e atirarem com ela ao índio que lha atirou, e ferirem-no com ela; e
outras vezes deixam-se cair com a flecha na mão sobre o índio que os flechou. Estes bugios criam também nos troncos das árvores, de cujas frutas se
mantêm, e de pássaros que tomam; e as fêmeas parem uma só criança.
Sagüis são bugios pequeninos mui felpudos, e de cabelo macio, raiado de pardo e preto e branco; têm o rabo comprido, e muita felpa no
pescoço, a qual trazem sempre arrepiada, o que os faz muito formosos; e criam-se em casa, se os tomam novos, onde se fazem muito domésticos; os
quais criam nas tocas das árvores, e mantêm-se do fruto delas, e das aranhas que tomam.
Do Rio de Janeiro vêm outros sagüis, da feição destes de cima, que têm o pêlo amarelo muito macio, que cheiram muito bem; os quais e os de
trás são muito mimosos, e morrem em casa, de qualquer frio, e das aranhas de casa, que são mais peçonhentas que as das árvores, onde andam sempre
saltando de ramo em ramo.
Há nos matos da Bahia outros bugios, a que os índios chamam saí-anhangá, que quer dizer "bugio diabo", que são muito grandes, e não andam
senão de noite; são da feição dos outros, e criam em côncavos de árvores; mantêm-se de frutas silvestres e o gentio tem agouro neles, e como os
ouvem gritar, dizem que há de morrer algum. |