Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 10 — Das
aves
Capítulo
LXXXV
Em que se trata de algumas aves de rapina que se criam na
Bahia.
Urubus são uns pássaros pretos, tamanhos como corvos, mas têm o bico mais grosso, e a cabeça como galinha cocurutada, e as pernas pretas,
mas tão sujos que fazem seu feitio pelas pernas abaixo, e tornam-no logo a comer. Estas aves têm grande faro de coisas mortas, que é o que andam
sempre buscando para sua mantença, as quais criam em árvores altas; algumas há, mansas, em poder dos índios, que as tomaram nos ninhos.
Toató é um pássaro que é, na feição, na cor e no tamanho um gavião, e vive de rapina no mato; e em povoado não lhe escapa pintão que não
tome, e criam em árvores altas.
Uraçu são como os minhotos de Portugal, sem terem nenhuma diferença; são pretos e têm grandes asas, cujas penas os índios aproveitam para
empenarem as flechas, os quais vivem de rapina no mato, e em povoado destroem uma fazenda de galinhas e pintões.
Sabiá-pitanga são uns pássaros pardos como pardais, que andam pelos monturos, e correm pelo chão com muita ligeireza, e mantêm-se da
mandioca que furtam dos índios quando está a curtir; os quais criam em ninhos em árvores.
Caracará são uns pássaros tamanhos como gaviões, têm as costas pretas, as asas pintadas de branco e o rabo, o bico revolto para baixo, os
quais se mantêm de carrapatos, que trazem as alimárias, e de lagartixas que tomam; e quando as levam no bico vão após eles uns passarinhos, que
chamam suiriri, para que as larguem; e vão-nos picando até que, de perseguidos, se põem no chão, com a lagartixa debaixo dos pés, para a
defender.
Acauã são pássaros tamanhos como galinha, têm a cabeça grande, o bico preto voltado para baixo, a barriga branca, o peito vermelho, o
pescoço branco, as costas pardas, o rabo e asas pretas e brancas. Estes pássaros comem cobras que tomam, e quando falam se nomeiam pelo seu nome; em
os ouvindo, as cobras lhes fogem, porque lhes não escapam; com as quais mantêm os filhos. E quando o gentio vai de noite pelo mato que se teme das
cobras, vai arremedando estes pássaros para as cobras fugirem.
Pela terra adentro se criam umas aves, a que os índios chamam urubutinga, que são do tamanho dos galipavos; e são todos brancos, e têm
crista como os galipavos. Estas aves comem carne que acham pelo campo morta, e ratos que tomam; as quais põem um só ovo, que metem num buraco, onde
o tiram; e mantêm nele o filho com ratos que lhe trazem para comer. |