Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
PRIMEIRA PARTE - ROTEIRO GERAL DA COSTA BRASÍLICA
Capítulo LI
Em que particularmente se explica a baía do Rio de
Janeiro da ponta do Pão de Açúcar para dentro.
É tamanha coisa o Rio de Janeiro da boca para dentro, que nos obriga a gastar o tempo em o declarar neste lugar, para que se veja como é capaz de
se fazer mais conta dele do que se faz. E comecemos do Pão de Açúcar, que está da banda de fora da barra, que é um pico de pedra mui alto, da feição
do nome que tem, do qual, à ponta da barra, que se diz de Cara de Cão, há pouco espaço; e a terra, que fica entre esta ponta e o Pão de Açúcar, é
baixa e chã; e virando-se desta ponta para dentro da barra se chama Cidade Velha, onde se ela fundou primeiro.
Aqui se faz uma enseada, em que podem surgir navios, se quiserem, porque o fundo é de vasa, e tem cinco, seis e até sete braças. Esta enseada se
chama de Francisco Velho, por ter aqui sua vivenda e granjearia, a qual é afeiçoada em compasso até outra ponta adiante, que se chama da Carioca,
junto da qual entra uma ribeira, que se chama do mesmo nome, donde bebe a cidade. Da ponta da Cara de Cão à cidade pode ser meia légua; esta ponta
de Cara de Cão fica quase em padrasto da lájea, mas não é muito grande por ela não ser muito alta.
A cidade se chama São Sebastião, a qual edificou Mem de Sá, num alto, numa ponta de serra que está defronte da ilha de Viragalham, a qual está
lançada deste alto por uma ladeira abaixo; e tem em cima, no alto, um nobre mosteiro e colégio de padres da companhia, e ao pé dela uma estância com
artilharia para uma banda e para outra, um modo de fortaleza numa ponta, que defende o porto, mas não a barra, por lá não chegar bem a artilharia.
Ao pé desta cidade, defronte da ponta do arrecife dela, tem bom surgidouro, que tem de fundo cinco e seis braças, e chegando-se mais à terra tem
três e quatro braças, onde os navios têm abrigo para os ventos gerais do inverno, que são Sul e Sul-Sudeste.
E quem quiser ir para dentro há de passar por um banco, que tem de preamar até vinte palmos de água; e passando este banco, virando para detrás da
ponta da cidade, acharão bom fundo, onde os navios estão seguros de todo tempo, por a terra fazer aqui uma enseada.
E quando os navios quiserem sair deste porto carregados, hão de botar fora por entre a ilha e a ponta da terra firme, pela banda do Norte, e hão
de rodear a ilha em redondo para tornarem a surgir defronte da cidade, e surgirem junto da Ilha de Viragalham, entre ela e a cidade; no qual lugar
acharão de fundo três braças, e três e meia, onde tem porto morto e defronte desse porto é o desembarcadouro da cidade, onde se diz as casas de
Manuel de Brito. |