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Publicado em 2 de novembro de 1992 no jornal santista A Tribuna
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 02/23/03 13:59:29
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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - CIDADE FESTIVA
A vida noturna de Santos (4)

Bandeira Jr. (*)
Colaborador

O lusitano Custódio Gomes Martins (quando no exterior se considera brasileiro) desembarcou em nosso porto na década de 1920; aqui deu duro, como quase todos os imigrantes, mas, já em 1938, com um sócio, abriu o Bar A.B.C., na esquina das ruas General Câmara e Xavier da Silveira.

Em 1970, o A.B.C., served by girls, teve de mudar para a Rua João Octávio, porque a antiga loja foi desaproprieda pela Prefeitura para alargamento da Avenida Portuária; por sinal, até hoje seu Custódio e outros proprietários daquele trecho não receberam as indenizações... Coisas do governo...

Em 1980, seu Custódio, o gentleman da Boca, juntou-se a seus sobrinhos (Aurélio, Augusto e Alberto), donos do Beer House e do Bar Gold & Silver, para a construção do A.B.C. House Night Club, complexo noctívago de maior movimento na atual ex-zona boêmia de Santos.

O sr. Custódio Gomes Martins é pessimista quanto a essa zona que, para ele, está com os dias contados, devido a dois fatores: a AIDS e os contêineres: "O pavor da moléstia fatal e a curta estadia dos navios no porto, pela movimentação rápida de cargas contidas nos imensos recipientes metálicos, vão esvaziar a velha Boca, muito em breve".

Raul Jordão de Magalhães

Cassinos - Santos tinha quatro e outros dois estavam instalados em São Vicente e Guarujá, com rendas astronômicas provenientes das roletas - eram, por lei, obrigados a mander diversão para as classes menos favorecidas, razão porque todos eles possuíam grill room, com música ao vivo, pista de danças e shows variados.

No tablado giratório do Cassino de São Vicente (hoje Ilha Porchat Clube) revezavam-se as orquestras de Luiz Argento e Mário Silva - sua interpretação da melodia Rève d'Amour, em ritmo de samba, era maravilhosa.

No Cassino Atlântico, dirigido pelo gentleman dr. Raul Jordão de Magalhães, dono da Vila dos Pássaros e o mais perfeito anfitrião que conhecemos, atuava a orquestra de Clóvis Mamede, com os cantores Simoney (pai do ator Ney Latorraca) e Jarina Rezende, que viria a ser a primeira rainha do Carnaval Santista, numa feliz iniciativa da saudosa Rosinha Mastrângelo, cronista Pierrô Azul, do desaparecido O Diário (1936-1968).

O conjunto de Pascoal Melillo brilhava no Cassino do Parque Balneário Hotel (fundado em 1895), com destaque para a lady-crooner Wanda Ardanuy e, no Guarujá (Cassino La Plage), os músicos do regente Victor Sérgio cadenciavam as danças ou acompanhavam show de cartazes famosos, como Margarite Lecuona, Libertad Lamarque, Glória Warren (Sempre em Meu Coração), John Boles (Son cosas de la Vida), Carlos Ramirez (Muñequita Linda) e outros artistas procedentes de Holywood.

Paschoalino Costa, em foto tirada no Cassino Monte Serrate

No Cassino do Monte Serrate, a orquestra do maestro Cloretti explorava o filão da música mexicana, com muitos aplausos para o bandoneón do jovem Paschoalino Costa quando solava românticos boleros, principalmente Noches de Ronda, da compositora Maria Thereza Lara. Nesses momentos, poucos pares saíam dançando, pois quase todos preferiam curtir a gostosa melodia asteca.

Diga-se de passagem, que é muito antigo o amor dos brasileiros pelo repertório mexicano; basta lembrar que a canção Casinha Pequenina, incorporada ao folclore nacional, possui melodia originária da terra de Agustin Lara.

Paschoalino é músico eclético; começou no mango, passou para a clarineta e depois o saxofone; viveu muitos anos na Suíça como bom pianista e é como tal que brinda os freqüentadores do sofisticado restô [N.E.: restaurante...] Le Coq D'Or, do Hotel Mendes Plaza.


Até a proibição do jogo, em 1952, os cassinos propiciaram alta fonte de renda para a região

Falando em cassinos, é-nos grato revelar que o melhor maitre do País, nesse período, foi o santista Luiz Pinto, nascido e criado na Rua do Sol (Barão de Paranapiacaba).

Luizinho, que estudou no Grupo Escolar Visconde de São Leopoldo e apanhou muito jambolão nas mirtáceas do Canal 3, começou sua fulminante carreira de homem da noite no Cassino de São Vicente e demonstrou tais aptidões que logo foi transferido para o Cassino Atlântico, da Belacap [N.E.: São Paulo].

Alto, tez clara e cabelos pretos, olhar penetrante e emoldurado numa circunspecta casaca, nosso conterrâneo lembrava os nobres russos que a revolução bolchevista expatriou para as casas noturnas da Cidade-Luz. O porte elegante e o savoir fair transformaram Luiz em maitre itinerante por quase todos os cassinos do País.
Fechado o jogo (1952), Luiz Pinto não enfrentou solução de continuidade, e ei-lo servindo aos melhores endereços noctívagos do Rio: Sacha's e Vogue. Nessas casas, o impecável maitre teve a oportunidade de atender gente do jet-set internacional, como madame Chiang Kai-Chek, Gina Lollobrigida etc.

Seguindo seu amigo J.K., Luiz foi para Brasília, onde inaugurou a primeira boate dessa promissora capital. A Candango tinha a melhor freqüência da República, nomes tão importantes que somente assinavam as notas de despesas e... tchau mesmo!

(*) Bandeira Jr. é historiador e escritor em Santos. Este artigo foi publicado em cinco partes, nas edições de 12, 19, 26 de outubro, 2 e 9 de novembro de 1992, no jornal santista A Tribuna. As imagens são reproduções do arquivo do autor.

Veja as partes [1], [2], [3] e [5] desta série


Música de fundo: A Casinha Pequenina