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ROTA DE OURO E PRATA
Navios: o Arandora

1927-1940 - depois Arandora Star

O Arandora realizou sua viagem inaugural em 22 de junho de 1927, saindo de Londres para Buenos Aires, com escalas em Boulogne, Lisboa, Madeira, Tenerife, Rio de Janeiro, Santos e Montevidéu. Iria servir na Rota de Ouro e Prata, junto a seus quatro gêmeos, o Almeda, o Avila, o Andalucia e o Avelona.

Dois anos após sua entrada em serviço, na linha regular, a Blue Star Line resolveu transformá-lo em navio cruzeiro e, para tanto, foi necessário modificar as acomodações de passageiros, a capacidade total passando para 350 pessoas.

Na mesma época, o Arandora foi rebatizado (tal como seus quatro outros gêmeos), recebendo o sufixo Star, acrescentado ao nome de origem. Com o novo nome e em suas novas funções, o Arandora Star passou a realizar cruzeiros no Mar do Norte, a maioria com destino às costas e aos fiordes noruegueses, com capacidade para 350 passageiros em classe única.

Seu casco era então pintado de preto, com superestrutura inteiramente branca. Em 1931, sofreu, porém, nova reforma e saiu desta com o casco em cor branca, cortado por uma faixa verde e com seu nome na proa, em letras douradas.

Sua superestrutura foi novamente alterada, e a parte do convés, a três quartos de proa, foi elevada até a altura do convés dos salões. Esta modificação tinha duas finalidades: aumentar o espaço recreativo interno e externo e, ao mesmo tempo, proteger o navio contra as ondas e o mar agitado, que eram características próprias das águas setentrionais por onde o Arandora Star cruzava.

Em 1936, nova reforma, desta vez aumentando-se seu comprimento e dotando-lhe de proa tipo Maier. Sua tonelagem era pouco superior à marca de 15.500 toneladas. Foi também removido o mastro de popa.


O Cap Norte, nesta foto feita em Hamburgo, era um navio compacto e sólido

Crise e guerra - Apesar dos anos de crise econômica, o Arandora Star conseguia atrair um bom número de passageiros e seus cruzeiros continuaram até o início da Segunda Guerra Mundial.

Em dezembro de 1939, o transatlântico foi requisitado pela Marinha Real Britânica e adaptado para servir como navio experimental para redes anti-torpedo. Alguns meses depois, foi adaptado para serviços no transporte-de-tropas e nesta nova condição o Arandora Star chegaria a um trágico fim.

O U-47 era um dos mais famosos submarinos da Marinha de Guerra alemã. Do tipo VIIB, de 753 toneladas, havia sido construído em 1938, pelos estaleiros da Germania Werft, no porto de Kiel. Seu comandante era o capitão-tenente Gunter Prien, que, em outubro de 1939, havia sido designado para atacar a base naval britânica de Scapa Flow.

Nessa patrulha de guerra, Prien e o seu U-47 haviam conseguido torpedear, no recinto desta base, o couraçado Royal Oak, da Marinha da Grã-Bretanha. Tal feito elevou o nome de Prien a nível de fama internacional, sendo condecorado pessoalmente por Adolf Hitler.

Durante 18 meses de atividade, de setembro de 1939 a março de 1941 (quando foi afundado no Atlântico Norte), a dupla U-47/Prien conseguiu afundar nada menos do que 34 navios, representando um total de 213 mil toneladas em dez patrulhas de guerra.

Em 4 de junho de 1940, o U-47 zarpou da base de Wilhelmshaven para realizar sua sexta patrulha de guerra. No dia 30 desse mesmo mês, Prien afundou o cargueiro grego Georgius Kyriakides a Sudoeste da Irlanda. Era o primeiro sucesso dessa patrulha.

Compatriotas - Contemporaneamente, o Arandora Star, sob o comando do capitão James Hall, e já transformado em navio-transporte de tropas, saiu em 1º de julho de 1940 do porto de Liverpool com destino ao Canadá, levando a bordo 1.564 pessoas, das quais 734 eram de nacionalidade italiana.

Alguns destes italianos eram prisioneiros de guerra, outros eram residentes na Grã-Bretanha, outros eram refugiados políticos que haviam ido para a Inglaterra a fim de escapar às perseguições políticas da época mussoliniana. Outras 444 pessoas eram de nacionalidade alemã, prisioneiros ou refugiados.

Por volta das 6 horas da manhã do dia 2, quando se encontrava a cerca de 75 milhas a Oeste da costa irlandesa, na altura de Bloody Foreland, o Arandora Star foi avistado a bordo do U-47. Gunter Prien sabia que o alvo era excepcional, um grande navio, veloz e imponente, que viajava sem escolta. Sua silhueta era também inconfundível: era um dos transatlânticos da Blue Star Line.

O que Prien desconhecia era o fato de que esse navio levava em seu bojo quase 1.200 homens que eram ou seus compatriotas, ou aliados de guerra. Prien deu ordens de que fossem disparados dois torpedos, e um deles atingiu em pleno centro o Arandora Star, explodindo logo abaixo da casa de máquinas.

O comandante inglês ordenou imediatamente o abandono do navio, mas sua evacuação correta não pôde ser executada devido ao grande pânico e confusão que se instalaram entre os alemães e italianos de bordo, que não haviam sido instruídos sobre o que fazer em caso de abandono. Uma hora após ter sido atingido pelo torpedo, o Arandora Star afundou no Atlântico, na posição 55º 20' de latitude Norte e 10º 33' de longitude Oeste.

O número de perdas humanas foi alto, pois, no total, 761 pessoas morreram no desastre. Deste número, 613 vieram do grupo de italianos e alemães, 57 entre os tripulantes do navio e 91 entre os soldados que estavam a bordo com a missão de manter a ordem. Os sobreviventes foram recolhidos, horas mais tarde, pelo contratorpedeiro canadense St. Laurent.

Do total de 12 lanchas salva-vidas a bordo do Arandora Star, dez foram postas ao mar após o torpedeamento fatal. Os sobreviventes, num total de  868 pessoas, foram desembarcados no porto de Greenock.


No cartão postal da coleção de J. C. Rossini, vendido a bordo por volta de 1930,
o Arandora Star, já inteiramente pintado de branco

Sobrevivente - Um dos sobreviventes da tragédia foi o ex-prisioneiro de guerra, o italiano Enrico Casci, nativo de Barga. Anos depois, ele assim descrevia aquela triste hora do afundamento do Arandora Star:

Naquela manhã, acordei às 6 horas, fui ao lavabo e voltei ao salão de baile onde estava alojado junto com uma centena de compatriotas. Tentei dormir novamente, quando ouvi um tremendo barulho. Pensei que o navio tivesse batido em um recife... Levantei em meio aos gritos e comecei a andar ao acaso.

Ninguém, no meio dos prisioneiros, sabia para onde deveria se dirigir, pois nada havia sido dito anteriormente. Junto a um amigo, me dirigi para um dos corredores externos... a barreira de arame farpado havia caído e, assim, pudemos atingir o bordo de um dos botes salva-vidas.

Fomos rechaçados e aí vislumbrei um outro bote, já arriado na água, e que se encontrava vazio. Apanhei uma corda e desci pelo costado, até que a corda arrebentou e caí no bote batendo a cabeça. Perdi os sentidos...

Quando voltei a mim, o bote já havia sido totalmente ocupado. Levantei-me e vi o navio, que se erguia de popa, mostrando os hélices... alguns instantes depois, um barulho ensurdecedor, ele desaparecia.

Ajudei um soldado inglês a subir... Havia muita gente dentro da água, mas no bote não havia mais lugar... os outros botes salva-vidas já se afastavam do ponto do naufrágio... De repente, estávamos sozinhos no meio do oceano...".

Arandora:

Outros nomes: Arandora Star
Bandeira: britânica
Armador: Blue Star Line
País construtor: Grã-Bretanha
Estaleiro construtor: Cammel & Laird (porto: Birkenhead)
Ano da viagem inaugural: 1927
Tonelagem de arqueação (t.a.b.): 12.848 (depois, 15.501 t)
Comprimento: 156 m (original), 163 m (após a reforma de 1936)
Boca (largura): 21 m
Chaminés: 2
Mastros: 2 (originais) e 1 após a reforma
Hélices: 2
Velocidade média: 16 nós
Passageiros: 162
Classes: 1ª -  162 (original)
                única de cruzeiro - 350 (a partir de 1929)

Artigo publicado no jornal A Tribuna de Santos em 23/12/1993