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CONTÊINER...
Conteiner revoluciona os transportes

E surge o conteiner...

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Em fins de 1981, quando o Brasil começava a debater, organizar e normatizar o transporte de cargas conteinerizadas, foi realizado de 25 a 27 de novembro em Santos o 1º Seminário de Informática sobre Conteineres e Transporte Intermodal. As mudanças que a conteinerização trouxe aos transportes foram enfocadas nesta palestra, registrada pelo editor de Novo Milênio, então responsável pelo caderno Marinha Mercante em Todo o Mundo do jornal O Estado de São Paulo, na edição de 22/12/1981:

Augusto da Silva Saraiva, vice-presidente da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, fala no seminário (ao centro), pleiteando a criação de depósitos alfandegados. À sua esquerda, Paulo Romano Moreira, secretário executivo do Cideti, e Fernando Nunes Cunha, presidente da Câmara Brasileira de Containers (CBC)
Foto: Marinha Mercante/OESP, 1/12/1981

SEMINÁRIO DE CONTEINERES E INTERMODAL/SANTOS
Com o conteiner, uma revolução nos transportes

"A Navegação Marítima e o Conteiner" foi o tema da palestra de Reginaldo A. Figueiredo, da Moore McCormack/Santos, durante o 1º Seminário de Informática sobre Conteineres e Transporte Intermodal, realizado em Santos.

Ele começou citando os tipos de navios empregados pela navegação marítima: graneleiros, destinados ao transporte de granéis sólidos; tanques, para transportar petróleo e outros granéis líquidos; combinados, destinados ao transporte de todos os tipos de granéis, e que se subdividem em ore-oil (para petróleo e minérios) e ore-bulk-oil (para transporte de minérios, granéis não minerais e petróleo); lash, para transportar cargas em geral previamente carregadas em barcaças, as quais são içadas para bordo com equipamento próprio do navio; sea-bee, idêntico ao sistema lash, só que utilizando outro sistema de elevação de barcaças; frigorífico, para transporte de produtos refrigerados, congelados e semelhantes; roll-on/roll-off, para transportar veículos e caminhões ou carretas carregados ou não, e em que a entrada a bordo é feita por rampas apoiadas no cais; carga geral, destinados ao transporte de cargas em geral; e porta-conteineres, destinados exclusivamente ao transporte de carga geral conteinerizada e que possuem capacidade em unidades de 20 pés (TEU) variando entre 100 e 3.100 conteineres (N.E.: posteriormente surgiram navios para até 4.500 TEUs).

Os navios podem ser chamados de liner trade (navios de linha regular, geralmente operando de acordo com as regras de uma Conferência de Fretes), ou tramp trade (comumente chamados como navios-pirata, pois não têm linhas regulares e podem ser empregados em diversos tráfegos, mas não pertencem a nenhuma Conferência de Fretes. Têm suas próprias regras e sua entrada num tráfego conferenciado depende de autorização).

As Conferências de Fretes e acordos de rateio de carga têm suas próprias características, como explica Reginaldo. Entretanto, a maioria das conferências estuda cada tarifa por um comitê, composto pelas linhas-membros, e como base para suas reuniões plenárias. Este comitê estuda as tarifas e as recomenda. Na maioria dos tráfegos (como é o caso Brasil/EUA) as Conferências são fiscalizadas por órgãos governamentais, que ratificam ou não as decisões tomadas em plenário.

Os fatores levados em consideração para a fixação de fretes são: custo direto da operação; taxas, custos e despesa fixas; seguros do navio; distância considerada entre origem e destino; condições dos portos servidos; taxas de passagens em canais; flexibilidade de acesso aos portos; possibilidade de obter carga de retorno; qualidade e característica de carga; volume a ser transportado, num período considerado; disponibilidade para embarque; valor intrínseco da mercadoria; embalagem; suscetibilidade a danos, avarias e roubos; fator de estiva e quebra de estiva; relação peso/volume; necessidade de equipamentos especiais; necessidade de estivagem especial; concorrência de outros mercados fornecedores.

Por suas peculiaridades, Reginaldo entende que as companhias de navegação compõem um eixo centralizador e ativador de um número de atividades envolvendo um sem-número de empresas dos mais variados portes e de atividades comerciais diversas. Conseqüentemente, a navegação marítima é uma empregadora em potencial de um sem-número de trabalhadores de todas as categorias, e prova disso é que esse eixo, antes mesmo de batizar um navio, já utilizou um enorme contingente de pessoas, nos campos da Engenharia, financiamentos, governos, administradores, planejamentos, indústrias de todos os tipos, seguradoras, operações etc.

"Ao colocar seu navio na água, o armador automaticamente começa a gerar emprego direta ou indiretamente a mais alguns milhares de pessoas, e a utilizar um batalhão de máquinas e equipamentos. Tripulação, abastecimentos, praticagem, rebocagem, amarração, estiva, conferentes, vigias, consertadores, portuários, médicos, dentistas, barcaças, barcaças d'água, oficinas de reparos, serviços públicos em geral, são alguns deles. Acrescente-se a esses o pessoal administrativo do próprio armador, para planejar, acionar e coordenar tecnicamente essa população de homens e máquinas, e chegaremos a números volumosos.

Em decorrência da revolução industrial e da expansão do comércio internacional, a navegação marítima foi obrigada a rever os tipos de navios então em uso para adequá-los ao transporte de cargas em geral, que começaram a se espalhar de um ponto ao outro do globo. Essas cargas tinham volumes e pesos os mais indiscriminados e já não se destinavam a cidades limítrofes ao porto de descarga, mas eram interiorizadas nas nações em desenvolvimento.

O transporte de mercadorias, qualquer que seja o meio utilizado, tem de ser corretamente trabalhado para evitar que o preço final do produto atinja índices inegociáveis, sendo que na composição desses custos entram outros fatores que não somente o ato de transporte em si. As peculiaridades dos equipamentos de cada porto de escala, tipos variados de carga, conferências de fretes, competitividade, a origem e o destino final da mercadoria, obrigaram o armador a se reesquematizar operacionalmente para manter seus padrões de serviços dentro de um plano que melhor se adaptasse às circunstâncias predominantes no âmbito do comércio internacional marítimo.

O armador raciocinou, então, que se não convivesse com as necessidades mercadológicas impostas pelo desenvolvimento industrial, trazendo consigo um novo fator econômico também gerador de altos custos para o transporte, a sobrevivência dos que não acompanhassem esse ritmo estaria ameaçada.

Para agilizar suas operações e assim diminuir o tempo de estadia nos portos, para evitar os constantes roubos e avarias e para humanizar a mão-de-obra, dando-lhes condições de trabalho mecânico, a navegação marítima iniciou a unitização, através da pré-lingada e da paletização (métodos que continuam a ser usados em operações de navios convencionais, ou mesmo para estivar certos tipos de cargas nos conteineres).

Segundo Reginaldo Figueiredo, a teoria era simples: a carga seria toda arrumada previamente em estrados de madeira ou lingas e, à chegada do navio, o embarque se efetuaria nessas formas de unitização, cada uma contendo determinado número de volumes, e assim estivadas a bordo. Empilhadeiras carregariam ou descarregariam os caminhões. Era uma forma inicial de se atingir as metas estabelecidas, e que deu e dá alguns bons resultados, mas, em contrapartida, esbarra em três fatores negativos:

1) o pallet e a linga comem espaços, provocando uma quebra de estiva superior ao fator de estiva causado pela própria característica da carga em si;

2) os custos dos estrados, lingas e empilhadeiras;

3) a dificuldade de executar o controle de uso e manutenção desses materiais.

Os custos globais, quando comparados com as vantagens, tornaram-se o fator primordial para que se continuasse a testar outras soluções, se não para total substituição das anteriores, mas para pelo menos minimizar a necessidade de utilização de tantos pallets, lingas e empilhadeiras. Reverter ao tradicional sistema já começava a se tornar impossível, pois os países mais desenvolvidos tinham em seus portos trabalhadores que se recusavam a trabalhar com carga não-mecanizada. Além disso, o importador queria preservar a integridade física de sua carga e pressionava o exportador para que desse preferência a certos armadores que operassem com sistemas mecanizados.

O conteiner chegou timidamente. Havia quem gostava mas não queria, quem queria mas não gostava, e quem, como Reginaldo, gostava e entendeu que a conteinerização estava muito acima de qualquer gosto particular.

Afinal, alguma coisa surgia que não obrigava a se ver, do passadiço de um convés de navio, um porão cheio de homens suados abaixando-se para fugir do balanço da lingada para logo em seguida nela se dependurarem e forçá-la para baixo, para em seguida colocarem - volume por volume - a mercadoria daquela lingada nos cantos dos porões; todos cansados, mas correndo, querendo atingir o índice de produtividade; empilhadeiras correndo, volumes espatifando-se pelo chão numa manobra insegura e todo o conteúdo se espalhando por todos os lados; homens deitados por sobre a carga, dormindo após correrem quarto, ou descansando à espera de nova lingada; o abrir e fechar de porões por causa da chuva que vai e vem; a fila interminável de caminhões no costado do vapor, aguardando sua vez de embarque das mercadorias - direito, aliás, nem sempre adquirido pela ordem de chegada, mas ditado pela necessidade de estivagem.

E surge o conteiner - "Dias infindáveis, operações inacreditáveis, trabalho subumano. Do outro lado do navio, o velho e lento Sansão (uma cábrea - guindaste flutuante existente no porto santista) suspende tranqüilamente uma peça de uns seis metros de comprimento, por cerca de dois metros de largura e de altura. Uma peça que muitos não tinham visto ainda, e que, por isso, olhavam com curiosidade. Mansamente, como lhe é peculiar, o Sansão colocou aquele conteiner sobre uma carreta da Companhia Docas de Santos, no cais, sem nenhuma correria ou esforço sobre-humano. Nenhum barulho, a não ser a voz do homem que conhece a todo mundo como cunhado (o estivador santista com sua gíria característica). Nenhuma avaria, nenhuma sujeira. Trabalho limpo e humano".

Reginaldo continua, lembrando ter lido recentemente em uma revista de uma companhia seguradora que o conteiner é econômico. "Certamente, não foi de nenhum armador essa informação. Pela ótica do armador, o conteiner não é, absolutamente, econômico. A conteinerização permite todo o planejamento, desde a origem da carga até o seu destino final, com vantagens operacionais ímpares, mas com isso não se quer dizer que há economicidade".

Hoje, como cita ele, qualquer armador com mais de 3.000 TEUs em operação tem de contar com o auxílio de um computador (N.E.: lembre-se que em 1981, quando ocorreu esta palestra, o computador PC-XT da IBM, que revolucionou a informática pessoal, tinha apenas um ano de existência), de oficinas de reparos nos portos de escala, e, principalmente, tem de reposicionar sua frota de conteineres vazios de onde estiverem disponíveis para os locais onde forem requisitados.

Como exemplo, Reginaldo cita o porto de Rio Grande, que em 1980 descarregou 250 conteineres de 20 pés com carga e embarcou 2.214 também com carga (diferença, 1.956 unidades); no mesmo período, desembarcou 67 conteineres de 40 pés com carga, embarcando 2.272, igualmente com carga (diferença: 2.205 unidades). Nos primeiros dez meses deste ano, as estatísticas de movimentação de conteineres com carga demonstram o recebimento de 385 unidades de 20 pés, com saída de 3.825 unidades (diferença: 3.440 unidades) bem como a chegada de 57 unidades de 40 pés e saída de 2.616 unidades (diferença: 2.559 unidades).

Em resumo, e transformando os conteineres em TEUs, constata-se a seguinte movimentação de unidades com carga durante os últimos 22 meses, em Rio Grande: 891 conteineres descarregados e 15.815 embarcados. A diferença (14.924 unidades) teve que ser reposicionada de outros portos, em atendimento ao movimento de exportação em conteineres daquele porto no período mencionado, e que, só nesses conteineres, correspondeu a 110 mil toneladas de mercadorias, embarcadas para os mais diversos destinos.

"O exportador e o importador têm de ser atendidos, quando engajam o conteiner. O que eles pedirem tem de ser entregue e em tempo hábil. O navio não pode atrasar e os conteineres têm que aparecer. Este é o nosso caso particular. Navios porta-conteineres custam milhões de dólares mais que os convencionais, e frotas de conteineres que custam milhares de dólares/dia não podem ficar estagnadas. Tem que haver um bom planejamento. O armador sabe onde está cada conteiner seu, onde vai conseguir alugar outros e desalugar alguns, quais são seus conteineres que estão cheios, vazios, avariados, de 20 ou 40 pés, quais são de meia-altura, de teto aberto, frigoríficos, graneleiros, bandejas, quais são os apropriados e estão prontos para carregar café, doces, motores e outros produtos, quais os que precisam de uma reforma geral, quais os que têm de ser desativados, quais os que precisam ser emplaquetados conforme as normas da CSC, quais os que podem ser embarcados para a Austrália, quais os que devem embarcar para Londres etc."

O armador tem de promover meios para manejar essa estrutura toda. Se algum elo dessa engrenagem começar a falhar, provocará uma paralisação inconcebível. Estima-se que os investimentos de capital na conteinerização representam atualmente mais de 30 bilhões de dólares, e acredita-se que esse montante se dilata dia a dia.

Por outro lado, a impressão que dão esses investimentos continuados é a de que meios e instalações não apropriados para a conteinerização ficam cada vez mais isolados da corrente principal do comércio interno e externo de cada nação, e, assim, mais sujeitos à substituição ou à convenção.

"E isso nos traz ao ponto chave", como lembrava recentemente a Reginaldo um técnico no assunto: "A tecnologia da conteinerização trabalhou tão bem e se desenvolveu tão rapidamente que pode ser considerada como muito mais do que uma solução para os problemas de transporte. A conteinerização revolucionou a indústria dos transportes e assim a ajudou a adquirir uma importância cada vez maior em nosso mundo moderno. Por quê? Porque, em grande parte, graças à conteinerização o transporte agora é reconhecido como um dos elementos importantes no fomento do desenvolvimento econômico no mundo inteiro".

A força motriz que está moldando a indústria dos transportes é a procura acelerada em todo o mundo de níveis mais altos de vida. O progresso econômico, ligado ao avanço nas comunicações, criou um nível cada vez mais alto de expectativa: "Todos querem um pedaço do quinhão, e o querem sem a mínima demora".

Reginaldo finaliza, lembrando: "Um resultado importante dessas expectativas mais elevadas é a maior interdependência entre as nações. A essência da vida moderna é a variedade e a escolha - mercadorias e serviços vindos de longe e de perto. A sociedade industrial moderna baseia-se numa escala cada vez mais ampla de materiais, produtos e especializações. As nações que não têm já não podem ser simplesmente ignoradas ou exploradas pelas que têm, porque as exigências são as mesmas, não unilaterais. O sucesso de todos depende da inclusão de cada um no fluxo principal, tão eqüitativamente quanto possível. O elemento que liga essa interdependência é o comércio - comércio mundial estável e seguro. Toda nação moderna depende dele, e sua importância relativa cresce junto com a elevação dos padrões de vida. Na realidade, o crescimento a longo prazo do comércio chegou para ficar".

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