Luís de Camargo da Fonseca e Silva (de óculos)
governava Cubatão,
quando a intervenção foi decretada
Foto: reprodução, publicada
com a matéria original
MEMÓRIA
Município comemora 20 anos de autonomia
A suspensão da autonomia política foi efetivada pelo governo militar em 4 de junho de 1968
Thiago Macedo
Da Redação
Há 41 anos, os cubatenses perdiam o direito de escolher quem
governaria a Cidade. Em 4 de junho de 1968, o Município foi considerado como Área de Interesse para a Segurança Nacional, pela Lei nº 5.449. Os
eleitores passaram a eleger apenas vereadores. Só 17 anos depois, em 1985, voltariam a escolher, pelo voto, o seu prefeito.
"Foi um período em que retiraram parcialmente o direito mais nobre do cidadão", resumiu Armando
Campinas, que de 1977 a 1989 foi vereador por três mandatos e ativista na luta pela retomada da autonomia político-administrativa de Cubatão.
Durante esse tempo, Cubatão foi governada por cinco diferentes prefeitos interventores indicados
pelo Governo do Estado, com a aprovação prévia da ditadura militar. Quando perdeu sua autonomia política, o Município era governado por
Luís Camargo da Fonseca e Silva, um capitão médico que, apesar de ter sido eleito pelo voto, segundo testemunhos da
época, apoiou a intervenção da ditadura.
As marcas desses 17 anos de ausência da democracia ainda podem ser vistas claramente pelas ruas de
Cubatão. Não são poucos os próprios públicos que remetem ao golpe militar. O principal centro esportivo da Cidade se chama Humberto de Alencar
Castelo Branco, primeiro presidente do regime.
Um dos primeiros conjuntos habitacionais erguidos na Cidade foi batizado de Jardim Costa e Silva,
sucessor de Castelo Branco. Outro conjunto popular e um dos
principais viadutos da Cidade têm o nome de 31 de Março, data que marca o início do golpe.
"Foi uma enxurrada de próprios públicos batizados com datas e nomes de personagens de um período
triste de nossa história", disse o empresário Nicola Granato, que foi vice-presidente da Associação dos Amigos de Cubatão em Prol da Autonomia,
fundada em 1963. Para Nicola, o batismo dos prédios públicos com nomes de militares não representava a vontade do povo. "Ninguém homenageia quem o
submete", analisou. Nenhum prefeito eleito democraticamente na Cidade teve homenagem semelhante.
MUDANÇA |
Os prefeitos Clermont Castor e Marcia Rosa são os
primeiros a romper qualquer vínculo com o período militar que influenciou a política de Cubatão
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Mais lembranças - O primeiro a ocupar a chefia do Executivo como prefeito interventor foi o
engenheiro Aurélio Araújo, que comandou Cubatão de 1969 a 1971; depois vieram Zadir Castelo Branco
(1971 a 1975), Carlos Frederico Soares Campos (1975 a 1982), José Osvaldo Passarelli (1982 a
1985) e Nei Eduardo Serra, que governou Cubatão em 1985 por dez meses, como último prefeito nomeado.
A recuperação da autonomia política veio em 15 de maio de 1985. As eleições diretas foram
realizadas e, curiosamente, o prefeito eleito foi Oswaldo Passarelli, que se alternou no poder com Nei Serra (que seria também eleito por mais dois
mandatos) durante mais 15 anos.
Na visão de Armando Campinas, mesmo depois da retomada das eleições diretas para prefeito ficou
clara a influência do período em que a Cidade permaneceu sob o comando direto dos indicados pelos militares.
"Durante o período de intervenção, o surgimento de lideranças políticas foi dificultado. As
lideranças daquela época foram construídas no período em que éramos dirigidos por governos arbitrários".
Prefeitura funcionou no período militar onde hoje é a
Biblioteca Central
Foto: reprodução, publicada com a matéria original
Cidade ficou sem prefeito por dois dias
Cubatão foi transformada em área de segurança nacional em 1968. Os eleitores só podia eleger
vereadores. E um deles foi Aldomiro de Oliveira Pereira, o Manau, membro do MDB, partido de oposição à Arena, composto por governistas aliados dos
militares.
Manau contou que durante dois dias, em 1969, ano da posse dos parlamentares eleitos e do término
do mandato de Luís Camargo, Cubatão ficou sem prefeito e o então presidente da Câmara, José Edgar da Silva, do MDB, foi impedido de assumir a
Prefeitura.
Segundo Manau, naquela época a Câmara era composta por 13 vereadores. Os eleitor tomavam posse em
9 de abril. Após assumirem, José Edgar foi eleito presidente da Casa. A Prefeitura funcionava onde hoje é prédio da Biblioteca Central. O prefeito
nomeado, Aurélio Araújo, um engenheiro sanitarista de São Paulo, não apareceu para tomar posse.
"Havia acabado o mandato do Luís Camargo. Então os vereadores acompanharam o presidente da Câmara
para assumir a Prefeitura, como determinava a lei. Mas fomos impedidos. Quem assumiu a Administração Municipal, durante os dois dias anteriores à
chegada do prefeito interventor, foi o procurador do Município Luiz Jorge Freire".
DEPOIMENTOS |
"Com a intervenção, retiraram um dos maiores direitos do
cidadão,
que é o voto"
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Armando Campinas
ex-vereador de Cubatão |
"Ver a sociedade envolvida na luta pela autonomia e fazer parte desta história foi gratificante"
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Adilson Antônio
presidente da Associação em Prol da Autonomia |
Luta pela autonomia nasce em 83
O principal movimento pela retomada da autonomia política de Cubatão foi lançado no dia 9 de
setembro de 1983, no templo da Loja Maçônica 9 de Abril-Cubatão 239. Os maçons mobilizaram vereadores, lideranças políticas, profissionais liberais,
principalmente advogados, e a sociedade civil para criar a Associação dos Amigos de Cubatão em prol da Autonomia.
Presidida por Adilson Antônio, a entidade faz com que o debate sobre a autonomia não fique mais
restrito aos meios políticos. Envolve a sociedade. Adilson conta que um dos principais atos da associação aconteceu durante o desfile de 9 de abril
de 1984. Com o apoio do PMDB, partido que governava o Estado, a associação realizou uma passeata no final do evento.
Em uma das fotos o então vereador Michajlo Halajko e outros militantes
aparecem segurando uma faixa exigindo a autonomia política. Um outro fato foi o plebiscito pela retomada das eleições diretas, em fevereiro de 1984.
Votaram sim 8.080 pessoas; e, não, 131. E 50 votos foram nulos e em branco.
O resultado não foi divulgado, pois no dia em que ocorreria aconteceu o incêndio da Vila Socó,
onde oficialmente 93 pessoas morreram. Pouco tempo depois, Cubatão recuperaria o direito de eleger prefeitos. |