Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/baixada/bslivros08a58.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 08/04/13 20:54:18
Clique aqui para voltar à página inicial de Baixada Santista

BAIXADA SANTISTA - LIVROS - Docas de Santos
Capítulo 58

Clique aqui para ir ao índicePublicada em 1936 pela Typographia do Jornal do Commercio - Rodrigues & C., do Rio de Janeiro - mesma cidade onde tinha sede a então poderosa Companhia Docas de Santos (CDS), que construiu o porto de Santos e empresta seu nome ao título, esta obra de Helio Lobo, em 700 páginas, tem como título Docas de Santos - Suas Origens, Lutas e Realizações.

O exemplar pertencente à Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos/SP, pertenceu ao jornalista Francisco Azevedo (criador da coluna Porto & Mar do jornal santista A Tribuna), e foi cedido a Novo Milênio para digitalização, em maio de 2010, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, sendo em seguida transferido para o acervo da Fundação Arquivo e Memória de Santos. Assim, Novo Milênio apresenta nestas páginas a primeira edição digital integral da obra (ortografia atualizada nesta transcrição) - páginas 429 a 442:

Leva para a página anterior

Docas de Santos

Suas origens, lutas e realizações

Helio Lobo

Leva para a página anterior

QUARTA PARTE (1911-1915)

Capítulo LVIII

Fim agitado de ano

De fato, quatro dias antes dessa carta, havia o secretário da Agricultura de São Paulo dirigido requerimento ao ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, solicitando a concessão. Dizia Paulo Moraes Barros (18 de setembro de 1914):

Tomando essa iniciativa, o Governo do Estado de São Paulo teve em vista atender às reclamações do comércio e da lavoura contra o regime de pesadas taxas aplicadas pela atual empresa encarregada dos serviços de carga e descarga de mercadorias no porto de Santos, prestando igual atenção à alta conveniência de prover, em tempo oportuno, ao alargamento dos ditos serviços cujas insuficiências já se tornaram patentes, e não poderão mais, dentro de poucos anos, satisfazer ao crescimento rápido do movimento de importação e exportação que se efetua pelo dito porto.

Atendendo a essas circunstâncias, o Congresso Legislativo do Estado, pela lei n. 369, de 28 de dezembro de 1912, autorizou o Governo a realizar as obras necessárias, para o melhoramento e aumento da capacidade do porto de Santos, podendo para esse efeito entrar em acordo com o Governo Federal e com ele celebrar contrato e devendo também providenciar sobre os estudos, projetos e orçamentos para execução dos trabalhos.

Acha-se assim o Governo do Estado legalmente habilitado para contratar a execução das obras com a União, dependendo apenas a celebração do contrato da resolução que cabe ao Governo Federal nos termos da alínea 6ª, artigo 65, da lei n. 2.842, de 3 de janeiro do corrente ano, a qual autoriza a outorga aos Estados, que o requererem, de concessões para melhoramentos dos portos situados nas respectivas costas com os ônus e favores da lei n. 1.746, de 13 de outubro de 1869, decreto n. 3.314, de 16 de outubro de 1886, decreto n. 6.368, de 14 de fevereiro de 1907, e mais leis e decretos atualmente em vigor, respeitados os direitos adquiridos.

Não escapava ao Governo Federal, lia-se nesse documento, a necessidade urgente dessas obras, à vista do crescente movimento comercial do porto de Santos, movimento que só tendia a aumentar, pois servia também a outras zonas limítrofes. Não se tratava, assim, de uma questão regional, mas nacional [47].

Para ter ideia daquele movimento, bastava assinalar que a quantidade de mercadorias carregadas e descarregadas passou de 387 mil toneladas em 1888 para 2 bilhões de toneladas em 1913. De modo que se justificava, ainda nas palavras da mensagem, a insistência do Governo do Estado junto ao ministro da Viação, em renovar nos mesmos termos as condições do seu pedido anterior:

Na proposta que o Governo do Estado apresentou ao Governo Federal, solicitando a concessão para construir o prolongamento do cais, de Outeirinhos até à Barra, com todo o aparelhamento técnico exigido pelas condições atuais e necessidades futuras do porto de Santos, inclusive a construção do dito e a possibilidade para atracação para navios de 8 até 11 metros de calado, sujeitou-se a administração pública estadual às seguintes condições especiais, que representam um considerado benefício para o público em comparação com os favores de que goza a Companhia Docas:

a) o capital, para os efeitos de contrato, não será o que consta dos orçamentos, embora aprovados pelo Governo Federal, mas sim o que se verificar ter sido efetivamente gasto nas obras;

b) a revisão da tarifa e a redução geral das taxas não ficarão dependentes da conclusão final de todas as obras, mas sim da aceitação definitiva delas pelo Governo da União, sendo a primeira de cinco em cinco anos, contados da aprovação da última revisão; e a segunda quando, sem atenção a qualquer prazo, se verificar que os lucros líquidos tenham sido excedidos de 12% ao ano;

c) a taxa de armazenagem só será devida sobre mercadorias que forem efetivamente armazenadas nos armazéns;

d) a taxa de capatazias não será devida sobre a exportação do Estado.

A esse requerimento opôs a Companhia outro, fazendo ver que na zona tinha privilégio exclusivo e que se havia oferecido para a construção sem aumento de prazo da concessão ou nenhum outro favor, ao contrário reduzindo as taxas. Foi então que opinou o consultor geral da República tratar-se de zona exclusiva da empresa, como vimos no capítulo anterior.

Apesar disso, o Governo Federal, dois dias antes de transmitir o poder ao sucessor, despachou num e noutro caso pela negativa, contestando à empresa seu direito exclusivo. A 13 de novembro de 1914, esta foi a decisão do ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, Barbosa Gonçalves (Diario Official, de 17 seguinte):

Governo do Estado de São Paulo, pedindo concessão para melhorar o porto de Santos de Outeirinhos à Barra. – A construção pedida só poderá ser levada a efeito depois de estudos realizados pelo Governo e mediante concorrência pública a ser aberta oportunamente, quando for verificada a necessidade e conveniência da execução das obras.

Companhia Docas de Santos, pedindo ser autorizada a construir o prolongamento do cais de que é concessionária de Outeirinhos em diante. – Não tendo a Companhia Docas de Santos privilégio para a construção do prolongamento do cais, conforme resulta da cláusula VII do seu contrato, a construção pedida só poderá ser levada a efeito depois de estudos realizados pelo Governo e mediante concorrência pública a ser oportunamente aberta quando for verificada a necessidade e conveniência da execução dos trabalhos, ressalvando o direito de preferência da Companhia em igualdade de condições.

Contra essa decisão, no que lhe dizia respeito, protestou a empresa junto do novo ministro da pasta, seis dias depois de publicada: "A elevação ou exagero das taxas da Companhia Docas de Santos, escreveu então Candido Gaffrée, não passava, como se vê, de falso pretexto, pois o Estado de São Paulo, pretendendo prolongar o cais da concessão das obras de melhoramento do porto de Santos, exigia as mesmíssimas taxas que esta percebia e mais o imposto de 2% ouro sobre toda a importação, para lhe garantir os juros do capital que empregasse nas obras".

Além disso, era de lembrar que, poucos dias depois de lançada a última pedra do cais, a Companhia se dirigira ao Governo Federal (27 de novembro de 1909) demonstrando "que se achava aparelhada a oferecer, durante muitos anos, ao comércio e à navegação, um serviço perfeito e suficiente, levando em conta o natural desenvolvimento da importação e exportação do Estado de São Paulo, e solicitou a declaração sobre a oportunidade de prolongar o cais, para no caso afirmativo, em vez de desmontar a sua custosíssima instalação, prosseguir nas obras, tudo de acordo com o direito que lhe asseguravam seus contratos".

E o despacho foi (8 de novembro de 1910): "Verificando-se que a capacidade do cais atual será atingida, na pior hipótese, em um período de quarenta e quatro anos, torna-se por isso desnecessário cuidar do seu prolongamento dentro daquele prazo".

No mesmo ano de 1909, requereu o Estado, como vimos, a concessão para um novo cais, com todos os direitos e favores da Companhia mais a taxa de 2% ouro sobre toda a importação, requerimento renovado depois, também sem resultado. Fora além disso do próprio chefe da nação, ainda em 1914, a iniciativa do prolongamento, ao que acedeu a Companhia propondo reduções que ofereceu também ao Governo de São Paulo (23 de novembro de 1914):

No começo do ano de 1913, o exmo. sr. presidente da República (marechal Hermes da Fonseca), em conferência que se dignou conceder aos representantes da Companhia Docas de Santos, depois de manifestar-se plenamente convencido dos direitos desta Companhia, lembrou-lhes a conveniência de ser prolongado o cais atual, para que tivessem satisfação algumas reclamações sobre a necessidade de se dar profundidade necessária para facilitar a atracação de navios modernos de grande calado.

Não hesitou a diretoria da Companhia satisfazer a esses desejos do Governo e nesse sentido procurou o exmo. sr. ministro da Viação (dr. Barbosa Gonçalves), que já conhecia a deliberação do exmo. senhor presidente da República, apresentando-lhe a 24 de janeiro de 1913 o pedido de autorização para o prolongamento do cais nas condições acima mencionadas.

Adiante:

Declarou ainda a Companhia concessionária que não solicitava favores novos, nem pedia ônus ao comércio, à lavoura e à indústria para a construção desse prolongamento, não obstante o grande aumento do seu capital. Ao contrário, confiante no desenvolvimento e prosperidade do Estado de São Paulo, faria o sacrifício que o Governo lhe lembrava, senão exigia, e o levava ao extremo, propondo o abatimento de 33% sobre as taxas de capatazias do café e de 50% sobre as de capatazias dos demais gêneros de produção do Estado.

Do exmo. sr. presidente da República ouviram os representantes da Companhia os mais calorosos aplausos por esse ato espontâneo, que se traduzia em granes vantagens e auxílio à lavoura e à indústria daquele Estado, e seguros do cumprimento da palavra do chefe do Poder Executivo, com a aquiescência deste, a Companhia mandou proceder os estudos técnicos, que já se acham prontos.

Ainda em fins de outubro e no correr dos primeiros dias de novembro, os representantes da Companhia tiveram a honra de ouvir, em conferência com o exmo. sr. presidente da República, que a autorização para o prosseguimento das obras do cais de Santos seria dada à concessionária das respectivas obras de melhoramento do porto de Santos, mormente depois da audiência do exmo. sr. consultor geral da República, cujo luminoso parecer esclarecia e tornava evidente o direito inconcusso da Companhia à construção daquelas obras.

Esse protesto concluía assim:

Não se compreende, exmo. sr. ministro, que se procure atentar contra os direitos da Companhia docas de Santos, acatados e respeitados pelo Governo, conforme já dissemos, durante mais de um quarto de século.

As obras do porto de Santos não pesaram um só real aos cofres da União; foram construídas pelo capital de particulares e é a única empresa de docas que se mantém em mãos de brasileiros.

A tarifa da Companhia Docas de Santos é a mais baixa de todas as tarifas de empresas congêneres, sob o regime da lei de 13 de outubro de 1869, ainda das que se acham aquinhoadas com a garantia de juros.

Desde anos passados, ela vem baixando as suas tarifas.

Quando o chefe do Governo, o exmo. sr. marechal Hermes, exortou-a a prolongar o cais, ela se prontificou a fazer grande redução na sua tarifa, beneficiando à indústria e à lavoura de São Paulo.

Na hora presente, em que as estradas de ferro de São Paulo elevam as suas tarifas com a baixa do câmbio (tarifa cambial), a Companhia Docas de Santos mantém as suas tarifas reduzidas.

Só a injustiça mais requintada ou o despeito mais condenável podem justificar os ataques caprichosos e injustos contra essa Companhia, partidos de quem mais devia zelar no respeito aos direitos alheios.

E nisso ficou, em 1914, a questão. Ela reapareceria ainda em 1915, quando, já por força da guerra europeia, a importação ia decrescer consideravelmente, não se explicando, pois, a urgência de um novo cais. No Parlamento, na imprensa, apesar disso, a questão retomou sua feição combativa. Deu-se isso justamente entre o requerimento do Estado de São Paulo e o encerramento da legislatura federal, ou, com mais precisão, no último quartel do ano.

Foi vária e, por vezes, áspera a polêmica. Momentos houve em que se estabeleceu réplica e tréplica entre o Senado (Adolfo Gordo, primeiro; Alfredo Ellis, depois; Francisco Glycerio, por último) e o Jornal do Commercio, pois este contestava, e já vimos, a legitimidade e a vantagem da pretensão paulista.

Vale a pena renovar alguns dos argumentos ouvidos, coisas passadas e mais de uma vez desfeitas? Em cada campanha que a empresa teve que enfrentar, foi assim, a enumeração de coisas velhas, já respondidas. Ainda para fins apenas expositivos, se deixa disso consignação resumida.

A polêmica teve, nesse fim de ano, um ou outro aspecto inédito, embora secundário, como a aparição por São Paulo de uma nova voz, a de Adolfo Gordo, ou a autoria de um manifesto distribuído no Velho Mundo, manifesto a que já nos referimos atrás.

Pela primeira vez apareceu também a Companhia, sob a assinatura de seus cinco diretores, Candido Gaffrée, G. Osorio de Almeida, J. X. Carvalho de Mendonça, G. B. Weinschenck e Guilherme Guinle, replicando ao eu dela se disse no Senado, num estilo combativo, distante dos comunicados anteriores. Maior, o perigo? Ou enfado diante de tantas e tão velhas arguições? Alfredo Ellis orou, aliás, referindo-se a essas defesas coletivas (Senado, 30 de outubro de 1914):

Quando, à primeira vista, lancei os meus olhos sobre o artigo, observando o número de assinaturas, pensei que fosse subscrito pelos Sete Infantes de Lara. Verifiquei depois que os diretores eram cinco; cinco, sr. presidente, representando os cinco dedos, cinco dedos longos, duros como tenazes de mão de ferro calçada de pelica com que a empresa asfixia e garganteia o Estado que tenho a honra de representar nesta Casa.

Foi primeiro a arguição de que São Paulo, que tanto acusava as tarifas da Companhia, pedia estas acrescidas de 2% ouro, procedimento que o velho órgão classificou de ilógico [48]. Para Adolfo Gordo, com o apoio do Correio Paulistano [49], São Paulo queria apenas o necessário para garantir o juro de 6% do capital (27 de outubro de 1914):

Não é exato que São Paulo pretende, além dos favores e direitos de que goza a referida Companhia, ainda um imposto de 2%, ouro. Se tal pretendesse, seria absurdo o seu pedido, para a concorrência pública, e bastaria que aquela Companhia mantivesse, em sua proposta, as taxas que ora exige, para obter a concessão!

Não! São Paulo quer, da renda desse imposto, a parcela mais indispensável para garantir juros correspondentes a 6% do capital empregado, e o cobrará durante um período que não excederá o da construção do primeiro trecho do mesmo cais.

Ao que respondeu a diretoria (Jornal do Commercio, 24 de outubro de 1914):

O Estado de São Paulo declara, atualmente, pelo órgão do seu representante, que não quer todo o produto do imposto de 2% ouro, mas o necessário para lhe garantir os juros de 6% sobre o capital que pretende empregar nas novas obras do cais de Santos.

Ora, a Companhia Docas de Santos constituiu e aparelhou até atora 4.726 metros de cais sem que o Governo Federal lhe garantisse um real do avultado capital que empregou nas suas obras!

Sem pedir a garantia de juros, propõe-se, na forma dos deus contratos, a construir as obras complementares do melhoramento do porto de Santos que lhe foram concedidas; vai além, reduz 50% e 33% em suas tarifas de capatazias de exportação.

O Governo do Estado de São Paulo, porém, acha que defende melhor os interesses do comércio, da indústria e da lavoura, aconselhando ao Governo Federal que viole a lei, que rompa os contratos que celebrou com a concessionária das obras e onde empenhou a sua palavra e a sua honra, e lhe dê, além da taxa de 2%, ouro, "todos os direitos, favores e ônus que cabem à companhia Docas de Santos, em virtude de leis, decretos, avisos e contratos que regulam as suas relações com o Governo Federal!"

Foram, depois, e para recomeçar, os "extraordinários favores recebidos pela empresa" – prorrogação do prazo para 90 anos, duplicação do capital, fixação deste como soma dos apurados, dragagem, recusa à exibição de livros.

Quanto à duplicação do capital (Alfredo Ellis, 30 de outubro de 1914):

Mas, sr. presidente, se dobrasse no capital, era da conveniência da empresa porque do capital primitivo ela vinha retirar, não 12%, mas 30%. Mas como obteve ela este favor, esta concessão? Por um passe de mágica. E como foi feita esta mágica? Por esta forma: existe no arquivo do Ministério da Viação um memorial, que não foi informado nem pelo engenheiro fiscal das obras nem por empregado algum da Secretaria, memorial este datado de 12 de julho de 1892, e que foi reduzido a decreto três dias depois, a 15 desse mesmo mês e ano, sob o nº. 942, tendo sido as suas cláusulas minutadas e assinadas por um dos atuais diretores da Companhia Docas de Santos, como se vê no respectivo documento, existente no referido arquivo.

Uma vez por todas pôs Osorio de Almeida fim a essa acusação, já anteriormente feita, como vimos (Jornal do Commercio, 1 de novembro de 1914):

Na data daquele decreto eu era consultor técnico do dr. Serzedello Corrêa, ministro então da pasta da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, e, dele recebendo ordem para minutar as cláusulas de qualquer contrato, era de meu dever cumpri-la. Entre parênteses, se me houvesse dado ordem para, além de minutá-las, assiná-las, não poderia a ele obedecer, por exceder isso das minhas atribuições, cabendo esse dever ao próprio ministro.

Tudo se passou em julho de 1892. Dessa época para cá já fui diretor dos Telégrafos, da Estrada de Ferro Central do Brasil e estive desempregado durante tempo não muito curto. Só em abril de 1907, isto é, perto de quinze anos depois, fui eleito diretor da Companhia Docas de Santos.

Se o senador Ellis teve, pois, em mente a intenção de me ferir, ligando os dois fatos – minutação de um decreto promulgado pelo marechal Floriano Peixoto e referendado pelo dr. Serzedello Corrêa, e ser eu hoje diretor das Docas de Santos -, perdeu o seu tempo, mesmo porque a condenação do primeiro não se coadunaria com as cartas que, a ele posteriores, recebi de s. excia. em termos que, a serem sinceros, só revelavam admiração e respeito.

Quanto à dragagem (Alfredo Ellis, 23 de outubro de 1914):

Numa cauda orçamentária, com uma simples emenda, a Companhia conseguiu que se lhe desse mil reis por tonelada, pelo trabalho de dragagem do porto.

Ora, esta empresa, sr. presidente, já tinha a taxa de carga e descarga, já cobrava ilegalmente a taxa de capatazias, tanto sobre exportação, como sobre gêneros despachados sobre água; já cobrava uma taxa de estiva e, além disso, procurou onerar a mercadoria com mais uma taxa quádrupla de dragagem do porto, produzindo esta taxa para a Companhia Docas de Santos dezenas de milhares de contos.

Mas, sr. presidente, a empresa quando cogitou de fazer o cais, porventura não tinha verificado a necessidade de dragar o canal para que os vapores pudessem atracar a esse cais? Era ou não era ela obrigada a fazer esse serviço independente de uma taxa especial? Seria lançar dinheiro fora se, porventura, ela fizesse um cais que se tornasse inacessível à navegação.

Mas o que é curioso é que ficou estabelecida uma taxa de mil réis por tonelada de mercadorias para a dragagem do porto, ficando a Companhia obrigada a dragar 20 milhões de metros cúbicos por ano. O que se verifica, sr. presidente, é que nesses 20 anos, à medida que a dragagem decresce, a taxa se torna maior.

Respondeu a diretoria da Companhia, repondo, mais uma vez, as coias nos seus lugares (Jornal do Commercio, 30 de outubro de 1914):

A Companhia Docas de Santos foi encarregada pelo Governo de fazer a dragagem e desobstrução do porto de Santos (note-se: do porto de Santos).

Não se trata de um serviço extraordinário, passageiro, porém de um trabalho permanente, constante, como se verifica da cláusula 3ª do contrato de 1896.

"O mínimo do serviço a executar anualmente será de um milhão de metros cúbicos".

Esse serviço não podia ser gratuito, bem se compreende.

O Governo, para indenizá-lo, contratou o seguinte na cláusula 4ª? "Como indenização do serviço que se trata, fica a Companhia autorizada a elevar a taxa 1½ reais por quilograma, estabelecida no decreto n. 1.072, de 5 de outubro de 1892, a 2½ reais por quilograma das mercadorias que forem carregadas ou descarregadas no cais de sua propriedade".

Temos, conseguintemente, que a Companhia Docas de Santos: a) Tem a concessão para dragar todo o porto até à Fortaleza da Barra (nas palavras do contrato); b) Não percebe taxa especial por esse serviço, que é remunerado pela taxa sob o nome de carga e descarga.

Essa taxa de carga e descarga, que aliás é a taxa mínima que se cobra nos outros portos onde as respectivas empresas concessionárias não dragam o porto que exploram, vem, desse modo, a remunerar duplo serviço: a utilização do cais e a dragagem do porto de Santos.

Não era de admirar que reaparecesse também, como peça de acusação, a taxa de capatazias. Declarada válida pela justiça no princípio do ano, ela surgiria de novo no fim, perante o Senado, como "ilegal e abusiva". Só pelo stock da valorização, disse a acusação, essa taxa rendia à empresa 4.000 contos de réis, e nos planos do engenheiro Saboia – lá vinha de novo a alegação destruída atrás -, a capatazia seria de 80 réis, e já estava em 480 réis, e a tonelada em vez de 3$000, passou para 10$000 e 12$300 (28 de outubro de 1914):

Só de capatazias pelo stock da valorização que tem na Europa o Governo de São Paulo pagou às Docas, na exportação desse café, cerca de 4.000 contos de réis.

Entretanto, sr. presidente, voltando ao passado, quando o engenheiro Eduardo de Saboia foi enviado pelo Governo Federal para fazer os estudos e orçamentos necessários para a construção do cais de Santos, disse que breve o povo de São Paulo ficará satisfeito, porquanto, pagando nessa época 80 réis por saca de café, com os guindastes e aparelhos modernos poderá esse serviço ser reduzido a 20 ou 30 réis.

Feito o cais, essas esperanças se desvaneceram e o povo, desiludido, verificou que, em lugar das pontes antigas de embarque, que cobravam 80 réis, esse mesmo café com o novo cais tem de pagar por seu embarque 450 réis. Quando a tonelada de mercadoria pagava naquela época, dois ou três mil réis por carga ou descarga, paga, agora, às Docas de Santos, de 10$000 a 12$300.

Voltou também à tona o pretendido aumento de 50% nas taxas [50], bem como o auxílio do Banco do Brasil e o prejuízo deste nos debêntures, e se a Província não pôde arcar com a concessão foi porque não tinha renda, como veio a ter na República.

Esta foi a acusação (28 de outubro de 1914):

O SR. ALFREDO ELLIS – A então província de São Paulo, em 1888, tinha uma receita insignificante, e dada a centralização do tempo do Império, não possuía recursos absolutamente para uma construção dessa ordem, não gozava de crédito no estrangeiro e nem dispunha, como empresa, do Banco do Brasil.

Essa empresa não tinha também o capital. Ela o foi buscar no Banco do Brasil, conforme eu já disse, e sem contestação desta tribuna, só o Banco do Brasil lhe forneceu 20.000 contos a descoberto.

De que modo a empresa das Docas os pagou? Emitindo debêntures de 200$00 e fazendo o seguinte contrato com a diretoria do Banco da República: o Banco da República se obrigava a aceitar esses debêntures de 200$000, por 220$000, e para o resgate a empresa só era obrigada a das 180$000 pelos mesmos debêntures que haviam sido recebidos por 220$000. Quer isso dizer que o Banco da República perdia 20% na operação.

Merecia contestação a renovada referência ao Banco do Brasil? Não deixou a empresa de pô-la expressamente abaixo, ao defender-se em 1924 de um despacho fiscal sobre selo de ações ao portador e debêntures. De um exame realizado nos livros da Companhia, confirmado pela mesma Recebedoria, ficou demonstrado o pagamento dos títulos pelo valor recebido [51].

A discussão se prolongou entre a diretoria e o senador paulista. "A empresa, se fosse honesta…" orou este; ao que respondia aquela: "Os adversários da Companhia Docas de Santos são admiráveis na invencionice e no truque…" Escreveu a diretoria num de seus artigos (Jornal do Commercio, 30 de outubro de 1914):

Os representantes do Estado de São Paulo compreenderam a situação tristíssima em que se colocaram, atacando furiosamente os contratos da Companhia Docas de Santos e solicitando, ao mesmo tempo, a concessão para o prolongamento do cais com os mesmos direitos e favores decorrentes desses contratos e com as mesmíssimas taxas dessa malsinada Companhia, agravando-as com 2%, ouro, sobre toda a importação, para garantir os juros do capital das obras; mudam de tática; desejam, agora, que o Governo Federal mande abrir concorrência para esse prolongamento!

Ao que revidava Alfredo Ellis (Senado, 31 de outubro de 1914):

Sr. presidente, a diretoria das Docas comparece, neste momento, solicitando uma concessão que, se fosse feita, algemaria o povo paulista para sempre. A diretoria das Docas, constituída por milionários, ainda presume ter direito de receber um largo quinhão na herança governamental.

Faltam poucos dias para o presidente da República deixar o palácio do Catete. Neste pouco espaço de tempo eu sei que eles procuram, por todos os meios e modos, arrastar o presidente da República a esse ato de iniquidade e injustiça.

Clamo e clamarei, porque aqui não é o senador, representante de São Paulo, quem clama; pela minha boca clama o povo inteiro de São Paulo.

Havia a Companhia exposto em 1912 as razões do seu direito exclusivo aos melhoramentos do porto, entre as quais:

1) A reunião de grandes capitais para a exploração do porto, o que se não daria no caso de concorrência, pois, para amortizar e retribuir aqueles, a empresa precisava das rendas do movimento de todo o porto. O próprio engenheiro Saboia escreveu, e já vimos que, se a exploração deste fosse entregue a uma empresa comercial, esta não poderia deixar de monopolizar o serviço;

2) Pelos decretos ampliativos da primeira concessão (10.277, de 30 de julho de 1889; 966, de 7 de novembro de 1890; 942, de 15 de julho de 1892), ficou reconhecido à Companhia esse direito exclusivo, aliás referido expressamente como privilégio no segundo deles;

3) A obrigação de dragagem de todo o canal, constante do decreto n. 2.411, de 23 de dezembro de 1896, pois "não se compreenderia que o Governo autorizasse outra empresa a construir docas para receber navios, gozando gratuitamente do serviço executado pela Companhia Docas de Santos";

4) A linha férrea de serviço do cais ao Forte Augusto, autorizada pelo decreto n. 4.056, de 24 de junho de 1901, para o serviço do cais em todo o litoral do porto de Santos, desde a Alamoa até a barra e certamente "não a teria se não gozasse privilégio sobre o porto";

5) O decreto n. 7.578, de 4 de outubro de 1909, ao estabelecer as bases para a prestação de contas do tráfego do cais, computou todas as rendas do porto, que são as que percebe a Companhia, e sobre essas rendas totais fixou as quotas para as despesas e para remuneração do capital. Se o direito exclusivo não existisse, não se justificaria essa providência;

6) Finalmente, a instituição de concorrentes viria comprometer as rendas da Companhia e, pois, da União, a quem reverteria a concessão; além de agravar a sorte do comércio, pois, dada a concorrência, o rendimento da Companhia diminuiria, tornando mais difícil a redução das taxas.

Agora dizia (Jornal do Commercio, 5 de novembro de 1914):

Em boa fé ninguém dirá que se trata de uma concessão odiosa. O direito exclusivo à exploração do porto de Santos que o Governo Provisório assegurou à concessionário das obras de melhoramento não representa outra coisa que uma garantia ao seu direito de propriedade.

As estradas de ferro, que também exploram serviços públicos, têm o direito de proibir a concorrência de empresas congêneres dentro de certa zona. O chamado privilégio de zona constitui a garantia dos capitais empregados nas obras.

Não há privilégio odioso desde que é temporário e fiscalizado e desde que pode desaparecer com o resgate das obras construídas pela concessionária, nos termos do art. 1º, § 9º, da lei de 1869.

É absurdo falar em privilégio odioso desde que o Governo limitou os lucros a 12% do seu capital.

Tivesse a União construído à sua custa as obras de melhoramento do porto de Santos e o explorasse diretamente ou por meio de arrendamento, julgar-se-ia um atentado a pretensão ambiciosa e ilegal do Estado de São Paulo de prolongar o cais federal ou construir novo cais em continuidade àquele.

Quem ousaria requerer a concessão para um novo cais nos portos do Rio de Janeiro ou Pernambuco?

Pois bem: em igualdade de situação está a Companhia Docas de Santos, a qual, como todas as outras concessionárias de obras públicas, na boa linguagem do direito administrativo, é uma delegada da União, é usufrutuária de uma propriedade federal.

Em 1911 recebera o ministro da Viação denúncia anônima sobre a distribuição de um manifesto na Europa pela própria Companhia ou por seus diretores, apregoando favores escandalosos e ilegais recebidos do Governo. Ouvida a diretoria da Companhia, esta respondeu então (16 de março de 1911):

O manifesto em língua francesa, cuja cópia acompanha o memorial, é outra peça anônima, da qual a diretoria da Companhia Docas de Santos teve notícia pela primeira vez quando um senador da República, enganado sem dúvida, o leu e mandou publicar no Diario do Congresso.

Atenda v. excia. a que a Companhia Docas de Santos emitiu trezentas mil ações de duzentos mil réis cada uma e mais um empréstimo em obrigações ao portador no valor de 60.000:000$000, e na bolsa de fundos públicos desta capital estes títulos estão cotados, os primeiros a 370$000 e os segundos a 203$000, ambos, portanto, acima do par.

Que interesse podia ter a Companhia Docas de Santos ou seus diretores em distribuir manifesto pela Europa par a colocação desses títulos, se eles se acham no Brasil cotados como talvez nenhum outro?

Atualmente são em número de 366 os acionistas inscritos no registro da Companhia, afora os possuidores de 55.000 ações ao portador e os obrigacionistas.

Se teve existência real o malsinado manifesto, necessariamente foi obra de alguns possuidores estrangeiros de ações e obrigações ou de seus corretores, com o intuito de bem colocar a sua propriedade no mercado.

Adiante:

Nessas condições, que culpa, que responsabilidade tem a Companhia docas de Santos ou a sua diretoria nas declarações, porventura exageradas, desse prospecto ou manifesto anônimo? Como se podem considerar essas declarações confissão de um contrato ilegal ou imoral celebrado entre o Governo e a Companhia?

Aqueles interessados, se autores do manifesto, não viriam certamente dizer em público que era lesivo à Companhia o acordo que esta celebrara com o Governo ou que a empresa estava ou está insolúvel!

Somente um espírito infantil poderá fundar nessa peça, se real, a mais tênue acusação contra a Companhia Docas de Santos ou seus diretores.

A diretoria desta Companhia achou-se escusada de contestar a balela, logo que surgiu, porque nãohouve pessoa de bom senso que não enxergasse a sua futilidade.

O manifesto ou circular era um desses prospectos comuns de propaganda, no qual se fazia referência às reservas latentes da empresa, ao excelente emprego de dinheiro, que constituíra. Fizera-o um banqueiro francês que aqui esteve quando do acordo de 1909, e, tendo adquirido importante lote de títulos, cuja segurança pressentiu, procurou colocá-los no Velho Mundo, nas melhores condições.

"A Diretoria da Companhia Docas de Santos faz público, mais uma vez – declarou a empresa, contestando essa distribuição por sua conta (1 de novembro de 1914) - que nunca lhe constou semelhante coisa, nem forneceu a quem quer que fosse dados ou informações para prospectos ou manifestos fora de propósito".

Antes escrevera (10 de outubro de 1914): "Declaramos, uma vez por todas, que o papelucho, manifesto, prospecto ou que melhor nome tenha, ao qual continua aludindo o sr. senador Ellis para injuriar os diretores da Companhia Docas de Santos, não tem a assinatura do presidente ou de qualquer outro diretor desta Companhia".

Tendo apelado para Alfredo Ellis no sentido de citar a origem [52], disse s. excia. tratar-se do Bankverein Suisse, com capital de 75 milhões de francos suíços e uma reserva de 25 milhões e meio de francos; a circular de 1910 dizia:

Temos a honra de vos remeter com a presente uma nota sobre a Companhia Docas de Santos, cujas ações serão proximamente introduzidas na nossa Bolsa ao preço, mais ou menos, de 685 francos. Esta Companhia, que existe desde 1892, encontra-se entre as empresas mais sérias e mais florescentes do Brasil. Há 17 anos que ela distribui um dividendo de 24$000 por ano, ou sejam 12%, à exceção de um único ano em que o dividendo distribuído foi de 11%.

Chamo a vossa atenção sobre o fato porque esta introdução compreende o "coupon" semestral de 6%, pagável a 1 de julho próximo. O rendimento passa de 6%.

Os títulos desta empresa, com base de concessão em um país que já fez sua prova e que se acha em pleno desenvolvimento, parece-nos constituir uma colocação de dinheiros importantes. Acreditamos em consequência disso poder recomendar as ações das Docas de Santos sob um duplo ponto de vista não só do rendimento, como da quase certeza de maior valor
[53].

Juntara Alfredo Ellis a questão dessa circular à relativa à fazenda Pelaes, a que se referira antes (1910). E a resposta da empresa sobre a circular não deixou de abranger também a da mesma fazenda Pelaes, comentada no referido memorial anônimo. Dizia este memorial, sobre o qual o Ministério da Viação pedira informações:

A instalação hidrelétrica de Itatinga acha-se em terras que não pertencem à Companhia Docas de Santos, mas a Gaffrée & Guinle. Estes somente concederam àquela uma faixa de 50 metros de terras, em servidão.

Respondeu a Companhia (16 de março de 1911):

O memorial não teve coragem de frisar bem essa acusação, aliás malevolamente repetida alhures.

Gaffrée & Guinle eram, na verdade, os proprietários das terras da fazenda Pelaes, onde existe a cachoeira do Itatinga, mas desde que esta cachoeira e as terras necessárias para a instalação hidrelétrica foram compreendidas nos estudos e plantas aprovadas pelo decreto número 6.139, de 11 de setembro de 1906, se consideraram ipso facto desapropriadas a favor da Companhia Docas de Santos (decreto n. 4.956, de 9 de setembro de 1903, artigo 8º).

Revela-se ignorante dos mais rudimentares princípios quem afirma que Gaffrée & Guinle procuram ou procuraram manter ali sua propriedade.

Desapropriada desde 1906 a cachoeira e terras necessárias para a instalação do Itatinga, restava simplesmente regular entre os interessados a devida indenização, e isso se fez pela escritura pública de 12 de julho de 1910, passada em notas do 2º tabelião e Santos e registrada no dia 18 do mesmo mês no Registro Geral de Hipotecas desta Comarca, sede do imóvel.

Mais:

Esta escritura prova que a Companhia Docas de Santos pagou como indenização a Gaffrée & Guinle a quantia de 60 contos de réis, não somente pela Cachoeira de Itatinga e pelas terras da fazenda Pelaes compreendidas na planta aprovada pelo já citado decreto número 6.139, de 1906, como ainda pela transferência de outras terras cobertas de matas no município de Mogi das Cruzes, indispensáveis para manterem a regularidade das águas do Rio Itatinga.

Apuradas as contas, Gaffrée & Guinle transferiram todas essas terras à Companhia Docas de Santos pelo preço mais ou menos porque as adquiriram.

É preciso observar que além das terras do Itatinga desapropriadas pelo decreto n. 6.139, de 1906, Gaffrée & Guinle constituíram a favor da Companhia Docas de Santos a servidão para a passagem dos condutores de fios de energia elétrica, cabendo-lhe gratuitamente uma faixa na extensão de 11.875 metros e com uma largura de 50 metros. Esse foi o objeto da escritura de 22 de junho de 1908, passada no cartório do tabelião Evaristo, desta capital e que por cópia acompanha o memorial.

Foi nesse fim de 1914 que Francisco Glycerio lembrou de novo como dera a concessão. A visão do porto, por parte dos concessionários, ampliando a construção, só era equiparada à desse paulista, como membro do Governo Provisório, concedendo-a. Francisco Glycerio falou (31 de outubro de 1914):

Vinham, em 1890, lutando, cerca de 30 anos, para obter este melhoramento do porto de Santos. Esta concessão foi dada pelo Império a vários cidadãos e a várias empresas, inclusive à antiga Província de São Paulo. Ninguém pôde, entretanto, levar a efeito a construção.

Em 1888 um dos atuais concessionários pediu essa concessão, que lhe foi dada pelo sr. Antonio Prado. Em 1890, entrava eu para o Governo Provisório, quando fui procurado pelo ilustre cidadão, sr. Gaffrée, que me representou acerca das dificuldades sobrevindas ao empreendimento dessa obra.

Senti-me logo empolgado pela necessidade de atender, pela primeira vez na minha vida, a essa grande necessidade exigida pelo primeiro porto comercial do meu Estado. Eu disse francamente ao sr. Gaffrée:

- O senhor tem elementos financeiros para levar a efeito esta obra?

Ele respondeu-me que sim.

- Mas porque não executa a sua concessão?

- Porque preciso remodelar o contrato. Basta dizer que o prazo da concessão é de 39 anos, insuficiente para permitir o levantamento dos capitais necessários.

Estou informando o Senado com toda a lealdade do que se passou.

Voltei-me para o sr. Gaffrée e disse:

- Volte para seu escritório e faça-me um requerimento solicitando tudo que entender necessário para a construção dessa obra.

No dia seguinte esse requerimento transitava pela repartição a meu cargo e meses depois o sr. Gaffrée tinha o contrato remodelado, elevando-se o prazo da concessão de 39 para 90 anos.

Havia dito, porém, s. excia. ser então tempo de abrir mão dos excessos, "Pondo-se em harmonia com os interesses do comércio, da agricultura e indústria do Estado de São Paulo". Respondeu a isso a diretoria (Jornal do Commercio, 5 de novembro de 1914):

Negar as boas disposições da Companhia nesse sentido é clamorosa injustiça.

A Companhia não percebe no porto de Santos uma só taxa que as empresas concessionárias dos outros portos também não cobrem.

A sua tarifa atual é a mais baixa de todas as das empresas congêneres.

Desde anos passados, ela tem feito reduções em certas taxas, algumas bem sensíveis.

Em 1907, instalou armazéns gerais com uma tarifa tão módica, especialmente para o café, que as empresas de armazéns gerais, dotadas pelo Estado com a garantia de juros, não a puderam imitar.

Em 1913, propôs ao Governo Federal o abatimento de 50% sobre a capatazia de gêneros de exportação, e 33% sobre a do café.

Poderá fazer mais a Companhia?

O Estado tem o direito de exigir-lhe a prestação de serviços gratuitos?

É honesto pleitear a ruína de uma empresa, que tantos e tão assinalados serviços tem prestado ao Estado de São Paulo, cooperando para o seu desenvolvimento e progresso?

Qual outra empresa de obras públicas no Estado de São Paulo já propôs tão sensível redução em suas taxas?

As estradas de ferro gozam da tarifa móvel-cambial. Com a baixa do câmbio todas aumentam as suas rendas.

A Companhia Docas de Santos não goza desse descomunal favor.

O Estado, por sua vez, ainda não reduziu um real nas suas taxas de exportação, e sobretaxa ouro da valorização; ao contrário, impõe uma pauta arbitrária pra cobrança dos impostos de exportação.

Havia-se falado, como vimos acima, nos 4.000 contos que o cafá da valorização traziam à Companhia. Isoladamente, essa cifra era de impressionar. Examinada, porém, com referência à parte do Estado, a impressão seria outra. Assim "Um lavrador" (Jornal do Commercio, 2 de dezembro de 1914):

Vemos que os dez milhões de sacas de café a 60 quilogramas correspondem a 600.000 toneladas, que pagam:

de imposto ad valorem ….……... 43.700:000$000
de taxa de valorização …..……… 35.000:000$000
ou o total de .………....……………. 78.700:000$000

Dividida essa importância pelas seiscentas mil toneladas dá para o imposto total sobre a tonelada de café 131$166.

A mesma tonelada de café paga à Companhia Docas apenas 5$000, e só pagaria 3$350 se houvesse sido aceita a sua proposta para o prolongamento do cais.

Estranhando essa enormíssima diferença, espero que o senador Alfredo Ellis procure fazê-la desaparecer, para o que tem talento e tenacidade, salvo se só dispõe dessas duas qualidades nos ataques à Companhia Docas e não propriamente na defesa da lavoura do seu Estado.

Gabriel Osorio de Almeida

Foto: reprodução da página 438-a


[47] "A questão não se reveste tão somente de caráter regional, o de interesse exclusivo de São Paulo. Ela tem, principalmente, alcance nacional, porque se não se cuidar em tempo de ampliar os melhoramentos do porto de Santos, e modo a torná-lo capaz de satisfazer ao recebimento e ao recebimento e ao escoadouro das mercadorias e produtos que constituirão o intercâmbio das vastas regiões servidas pelas estradas de ferro aludidas, a crise que daí resultará não será exclusivamente paulista, mas, sim, principalmente nacional, afetando seriamente a hegemonia que o nosso país pode exercer no comércio internacional sul-americano". Paulo de Moraes Barros. Representação ao Governo Federal, 18 de setembro de 1914.

[48] "São Paulo já de uma feita pediu, além da taxa dos 2% ouro, "todos os direitos, favores e ônus, que cabem à Companhia Docas de Santos, em virtude de leis, decretos, avisos e contratos que regulam suas relações com o Governo da União".

"Logicamente, não tem, pois, o direito de incriminar agora esses favores de excessivos. Talvez o sejam de fato. Mas o recurso para corrigir isso só pode estar na toca de compensações entre o Governo e a própria Companhia das Docas, nunca na intromissão de um concorrente novo, embora este advogue e represente interesses dignos da maior atenção, que não devem ser sacrificados e podem ser perfeitamente atendidos de outra maneira". Jornal do Commercio, 22 de outubro de 1914.

[49] "As increpações formuladas pelo grande órgão da imprensa nacional são destituídas de qualquer fundamento e parecem inspiradas, exclusivamente, na necessidade de defesa de interesses menos legítimos daquela importante Companhia.

"O requerimento que o Governo de São Paulo dirigiu ao sr. ministro da Viação e o memorial que acompanhou esse documento oficial tornam bem claros os intuitos da administração pública paulista e as valiosíssimas razões em que ela se funda". Correio Paulistano, 26 de outubro de 1914.

[50] "O primitivo edital consignava a taxa de 1 real por quilo de mercadoria e de 3 reais por quilo para as mercadorias de grande volume e pequeno peso. Pois bem: ela, astuciosamente, aceitou o modus vivendi, ficando estabelecida uma taxa de 1 ½ reais por quilo para todas as mercadorias. Mais tarde, creio que em 1896, sorrateiramente, apresentou uma emenda na Câmara dos Deputados para a célebre taxa de dragagem do porto, obrigando-se a retirar um milhão a um milhão e meio de metros cúbicos de lama, e a desobstruir o porto de navios velhos naufragados no canal.

"Essa emenda, que mandava incorporar a essa taxa a taxa de 1 ½ reais por quilo de carga e descarga, veio para o Senado, e o meu ilustre confrade, o preclaro republicano sr. dr. Bernardino de Campos, que então honrava uma dessas cadeiras, a ela se opôs com todas as forças, não tendo conseguido aprovação da emenda supressiva por ele apresentada. O que é fato, sr. presidente, é que a empresa, astuciosamente,uniu a taxa de dragagem à taxa de carga e descarga que ficou, de então em diante, elevada a 2½ reais por quilo de mercadorias, em lugar de 1 ½, conforme o acordo anteriormente feito entre ela e o Governo.

"Pois não vê que ela hipocritamente, astuciosamente, procurou unir esta taxa indecente de dragagem do porto à de carga e descarga, porque assim fundidas nunca mais o Estado de São Paulo poderia pedir um alívio, sendo certo que quanto menos serviço dá, maior receita apresenta em favor da empresa". Alfredo Ellis, Senado, 6 de novembro de 1914.

[51] Recurso da Companhia Docas de Santos ao Exmo. Sr. Ministro da Fazenda de um despacho do diretor da Recebedoria, cit., 1924.

[52] "Os manifestos de subscrição de ações e de debêntures publicados pela Companhia Docas de Santos foram assinados pela sua diretoria e por um corretor de fundos públicos e pelas declarações contidas nesses documentos assume esta diretoria a mais plena responsabilidade.

"Esperemos que o sr. acusador indique o nome da casa bancária que distribuiu na Europa o pseudomanifesto e prove que a Companhia Docas de Santos ou qualquer dos seus diretores cooperara, direta ou indiretamente". No Jornal do Commercio, 1 de novembro de 1914.

[53] "O exemplar que me foi remetido o amigo que m'o mandou obteve-o de uma casa bancária da Suíça. É crível, sr. presidente, que uma casa bancária conhecesse os pormenores da escrituração das Docas de Santos, quando ela obrigada pelo Governo, obrigada pelo Supremo Tribunal a exibir seus livros, nunca o fez? Como poderia o representante europeu, fosse banqueiro ou corretor, devassar os segredos íntimos da escrituração dessa empresa?

"Como poderia saber, sr. presidente, do acordo entre a empresa e o governo transato, acordo ilegítimo e nulo, de 4 de outubro de 1909? Como poderia conhecer seu alcance, as vantagens que a empresa auferia em virtude do fato de ter o Governo aberto mão da faculdade de fazer examinar seus livros?

"Como poderia saber que essa empresa tem reservas latentes? Como poderia saber que essa empresa tinha obtido 40% da renda bruta para o seu custeio? Como poderia saber que essa empresa, desde 1893, tem distribuído dividendos de 12%?" Alfredo Ellis, Senado, 30 de outubro de 1914.