Clique aqui para voltar à página inicial  http://www.novomilenio.inf.br/ano01/0111a022.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 11/07/01 16:14:16
TERROR NOS EUA
Os pica-paus na guerra do Afeganistão

III - O problema das fontes de energia

Emilio Gennari (*)
Colaborador

Com certeza, você deve ter percebido que o pica-pau anterior nos alertou sobre uma disputa que vem acontecendo há mais de uma década: a guerra pelo controle das reservas de petróleo e de gás natural. Sabendo da importância deste assunto, ouvi com atenção o que outro pássaro destemido tinha a dizer após a olhada que ele conseguiu dar através do segundo pequeno furo que já foi feito na muralha.

Antes de começar o seu relato, ele me aconselhou a pegar um Atlas e a abri-lo nas páginas que contém os mapas do Oriente Médio e da Ásia Central. Dessa forma, é bem mais fácil acompanhar e entender os seus argumentos. Dada a dica, aí vai a Clique no mapa para ir ao Atlas Interativo NM. Mapa: copyright Flags of the World (FOTW)narração que ele me fez com uma paciência e precisão surpreendentes.

Diz o pica-pau que se o consumo mundial de petróleo continuar aumentando do jeito que está, até 2020 estarão esgotadas cerca de dois terços das reservas de combustíveis fósseis do planeta. Um prazo de 19 anos parece algo distante no tempo, mas, como se trata de uma matéria-prima estratégica para a economia mundial, a corrida para garantir o acesso a estes recursos vai se acirrar cada vez mais.

Neste contexto, a posição dos Estados Unidos é bastante vulnerável por, pelo menos, três razões. A primeira vem de uma constatação inquietante. Se os EUA tivessem que contar somente com as reservas que estão em seu território, teriam petróleo suficiente para não mais do que quatro anos. Isso sem contar que, por exemplo, a exploração das jazidas do Alaska demandaria investimentos mínimos da ordem de 20 bilhões de dólares só na construção de um oleoduto e enfrentaria fortes oposições dos grupos ecologistas.

A segunda está no fato de que 82 em cada 100 barris do petróleo importado pelos Representante da Arábia Saudita confirma apoio aos EUA. Captura de tela da TV CNN em espanhol/EUA em 23/9/2001 - 19h14Estados Unidos vem da Arábia Saudita. A monarquia que governa este país, principal aliado dos EUA no mundo árabe, enfrenta uma oposição crescente contida através de uma dura repressão a toda expressão de sentimento antigovernamental. Apesar dos sucessos obtidos até agora, a freqüência dos ataques terroristas na Arábia e o descontentamento em relação ao seu governo são suficientes para vislumbrar que esta dominação não vai durar para sempre.

O último motivo de preocupação não repousa somente na constatação de que países como o Irã e o Iraque estão longe de ter um relacionamento amigável com os Estados Unidos, mas, sobretudo, no fato de que as empresas de capital francês (Total e Elf) fizeram pesados investimentos no Irã e se associaram à Rússia na exploração das jazidas do Mar Cáspio. Esta aliança permite à Rússia controlar, direta ou indiretamente, um território que inclui as regiões produtoras do Cáucaso (entre elas a Chechenia) e de boa parte da Ásia Central.

Uma saída para a situação desconfortável em que se encontram os interesses norte-americanos já havia sido revelada no início de 1998 pelo tenente-coronel da reserva Lester W. Grau, que, entre outras coisas, foi assessor político e econômico no quartel geral das Forças Aliadas da Europa Central em Brunssum, Holanda. Na matéria publicada pela revista Foreign Affairs, Lester reconhece a fragilidade das condições de abastecimento dos Estados Unidos, avalia as alternativas para melhorar esta situação e aponta como caminho mais viável a construção de um oleoduto que sairia das jazidas do Cazaquistão ou do Turcomenistão, próximas ao Mar Cáspio, passaria pelas cidades de Herat e Kandahar, no Afeganistão, entraria no Paquistão por Quetta e terminaria no porto de Karachi.

Daí, petróleo e gás seriam facilmente embarcados rumo aos EUA, China e Japão, evitando assim as águas conturbadas do Golfo Pérsico, que já foram palco de violentos enfrentamentos. O custo da obra giraria em torno dos 2 bilhões de dólares e daria acesso a reservas de petróleo 33% maiores que as do Alaska e a uma quantidade de gás natural estimada em 50% do total já descoberto a nível mundial. O único problema técnico é a presença em território afegão de um tal de Osama Bin Laden, cujas forças se recusam em atender às expectativas de seus antigos aliados.

Eu já estava fechando o Atlas quando o pica-pau enfiou o bico entre as páginas e o abriu no mapa do Extremo Oriente. De início não entendi, mas ele me disse que eu Noticiário japonês registra estreitamento de laços entre EUA e China - Captura de imagem - TV NHK/Japão - 19/10/2001 - 08h21estava esquecendo de dois países importantes nesta disputa pelo acesso aos combustíveis fósseis: a China e o Japão.

Aquele pássaro sabido me contou que, nos dois últimos anos, a China mudou a configuração de sua Força Aérea de defensiva para ofensiva e produziu novos mísseis estratégicos de longo alcance. Além disso, vem deslocando boa parte de seus efetivos militares que estavam na fronteira Norte com a Rússia para seu lado Oeste (de onde espera aumentar o fornecimento de petróleo e gás natural) e para os mares do Leste e do Sul da China. Aparentemente, isso poderia ser explicado em função das conturbadas relações políticas deste país com a ilha de Taiwan, que já sofreu sérias ameaças militares. Mas uma análise mais atenta revela que é justamente nestes mares que se encontram jazidas promissoras de petróleo e gás natural.

Na corrida às reservas de combustíveis fósseis, a China já declarou o Mar do Sul como parte do seu território marítimo nacional e reafirmou o seu direito de usar a Presidentes dos EUA e da China se reúnem em Shanghai - Captura de imagem - TV Band News/Brasil - 19/10/2001 - 07h51força para protegê-lo. Esta postura agressiva estimulou a Indonésia, a Malásia, a Tailândia, o Vietnam e as Filipinas a reforçar seus efetivos aéreos e navais nesta região, cujo controle é objeto de disputa.

O Japão não ficou pra trás e aumentou a sua capacidade de operação com novos navios de guerra e aviões de combate armados com mísseis. No Mar do Leste, os japoneses estão disputando diretamente o controle das futuras jazidas e no do Sul procuram garantir não só a manutenção de suas rotas comerciais com o sudeste asiático, como o próprio abastecimento de petróleo. De fato, 80% dos petroleiros que levam o produto para o país atravessam as águas do Mar do Sul da China e uma guerra nesta região representaria um alto custo para o Japão.

Ciente de todas as implicações e do jogo de interesses que estariam envolvidos num possível conflito neste canto do globo, há três anos os Estados Unidos vêm pressionando o Japão para que assuma um papel mais ativo no equilíbrio militar daquela área. Isso implicaria em pesados investimentos que superariam as necessidades de autodefesa permitidas pela constituição nipônica. 

Além dos limites legais, o horror e a rejeição diante de um ataque armado a outro país são sentimentos ainda presentes entre o povo que não consegue esquecer os efeitos devastadores das bombas atômicas. Ao mesmo tempo, porém, não faltam especialistas que vêm apontando os gastos em armamentos, a serem realizados pelo estado japonês, como um caminho para enveredar numa nova fase de crescimento econômico, além, claro, de poder enfrentar melhor as tensões com as nações vizinhas.

Diz o pica-pau que ele ficou preocupado com a decisão do Japão de enviar navios de guerra em apoio à esquadra norte-americana. Ele sabe que a ajuda se dará nas Belonaves japonesas apóiam esforço de guerra dos Estados Unidos - Captura de imagem - TV Band News/Brasil - 18/10/2001 - 11h13áreas de transporte, reabastecimento, serviços médicos, proteção às instalações militares dos EUA no Japão, apoio aos serviços de inteligência e ajuda humanitária aos refugiados. Mas, após o fim da Segunda Guerra Mundial, esta é a primeira vez que o país envia parte de suas forças armadas para uma zona de guerra longe de seu território e a utiliza para tarefas que nada têm a ver com a sua autodefesa.

Ao que parece, em nome da necessidade de responder aos ataques terroristas do dia 11 de setembro como "renovado desafio à liberdade", o Japão ensaia os primeiros passos para justificar um aumento dos gastos militares e levar as pessoas a reduzir suas resistências em relação à idéia de uma guerra ofensiva. É como se os senhores do poder estivessem tirando os sapatos para entrar na consciência do povo sem serem ouvidos e plantar aí as sementes das atitudes que gostariam de ver brotar no futuro.

O pica-pau me garante que as nuvens no horizonte dos Mares da China não estão ainda tão escuras a ponto de ameaçarem uma tempestade iminente. A chuva ainda pode demorar, mas a depender do desfecho dos enfrentamentos no Afeganistão, o aumento da tensão nesta região do mundo tende a ser inevitável. Na dúvida, é melhor ficarmos de olhos e ouvidos bem abertos já que, por um bom tempo, as notícias que virão do Extremo Oriente serão cobertas pelo show de imagens da parafernália de guerra norte-americana.

(*) Emilio Gennari. Brasil, 18 de outubro de 2001. Texto distribuído pela Internet.

Partes deste artigo:
I - Introdução/Bibliografia
II - A história e suas revelações surpreendentes
III - O problema das fontes de energia
IV - A guerra nas estrelas como caminho para a dominação mundial
V - Matando quatro coelhos com uma paulada só

Veja mais:
Especial NM - Terror nos EUA