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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - ROCHAS NO PORTO
Uma pedra no caminho dos navios (1)

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Embora acolhedor para a navegação - tanto que foi escolhido por Braz Cubas como o melhor atracadouro da região para as caravelas portuguesas - o porto de Santos teve no seu estuário algumas formações rochosas que representavam obstáculo significativo à expansão dos serviços portuários. Algumas dessas rochas ficaram memoráveis, e foram demolidas em épocas diversas da história do porto santista.

Uma rocha importante foi a Pedra do Teffé, que começou a ser demolida em 1999, como noticiou o jornal santista A Tribuna, na edição de 1º de setembro de 1998:

Imagem publicada com a matéria

OBSTÁCULO
Pedra do Teffé começa a ser retirada em 3 meses

A remoção permitirá atracação de navios de maior calado

Da Reportagem

A próxima temporada de verão contará ainda com uma pedra no caminho dos navios de passageiros que chegarão à Cidade. Batizada de Pedra do Teffé, ela está, entretanto, com seus dias contados. Os trabalhos preparatórios começarão em três meses. A pedra deverá permanecer no canal do porto, na região do cais dos armazéns 25 e 26, até junho de 1999, quando provavelmente estará retirada. O processo que envolve medição, batimetria e implosão custará R$ 5 milhões.

A iniciativa privada é a responsável pelo trabalho. A Multicargo, que arrendou os silos da Codesp - localizados naquele trecho do porto - deverá começar a implodir a pedra em até 90 dias, no início de dezembro. A empresa iniciou contatos com três firmas especializadas em implosão. "Vão ser feitas batimetrias sísmica e geotécnica", adiantou Virgílio Gonçalves Pina Filho, presidente da Multicargo.

Segundo ele, as implosões devem ocorrer na região central do estuário, onde estão localizados dois picos da pedra. Neste trecho, o canal oferece calados distintos, de 9,80 metros e de 10,30 metros de profundidade. O problema também pode ser observado na região próxima ao cais do Armazém 25, onde o calado ainda é menor, variando de sete a oito metros, ao longo de 100 metros.

"Ao invés de demolir a pedra na parte perto do cais, vamos avançar com o cais para cima dela", disse Pina. "A retirada do obstáculo segue um plano de gerenciamento ambiental". Para iniciar os trabalhos, a Multicargo deverá receber a aprovação da Codesp e de órgãos ligados à proteção do meio-ambiente.

Maior calado - A retirada do obstáculo também permitirá que transatlânticos de maior calado possam atracar no cais do Armazém Frigorífico, que fica ao lado do cais do Armazém 25 e integra parte do Terminal Turístico de Passageiros do Porto.

Na próxima temporada, praticamente só um transatlântico do calado do Funchal poderá encostar no cais do Armazém Frigorífico ou no cais do Armazém 25, onde o Consórcio Concais instalará a estação de atracação de navios de passageiros, que pretende inaugurar em 1º de dezembro.

Ainda que inaugurada a estação de passageiros no Armazém 25, um navio como o Rembrandt, por exemplo, não poderá atracar. Terá de esperar a remoção da Pedra do Teffé e as obras complementares posteriores para encostar naquele trecho do porto.

Há 122 anos, a pedra era um obstáculo muito maior do que hoje, a ponto de dificultar a navegação do estuário, como conta o pesquisador J. Muniz Júnior.

A empresa Multicargo, que arrendou os silos da Codesp,
vai se encarregar dos trabalhos de demolição
Foto: Carlos Nogueira - 16/7/1997, publicada com a matéria

Laje dificultava acesso ao porto

J. Muniz Júnior (*)
Colaborador

Em tempos idos, os navios veleiros que adentravam pelo canal da barra demoravam para chegar ao porto, uma vez que dependiam de ventos favoráveis ou tinham que ser rebocados dos escaleres impulsionados a remo, cujo percurso era entrecortado por pequenas enseadas dotadas de perigosos bancos de areia ou lajes submersas, que provocavam grossas avarias nas embarcações.

O primitivo atracadouro ficava entre as imediações do Outeiro de Santa Catarina e Valongo, sendo que muitos capitães tiveram seus barcos perfurados pelos temíveis obstáculos naturais do estuário, que infundiam temor entre a marujada.

Assim é que, no sítio dos Outeirinhos, de propriedade de José Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca, havia um penhasco ou recife que se estendia até o mar, onde sobressaíam picos à flor da água (com a maré rasa), prejudicando assim o tráfego normal das embarcações, cujas companhias reclamavam, pedindo a demolição urgente daquele empecilho intransponível.

O caso parecia irremediável e, uma vez pressionada pelos comerciantes que dependiam das mercadorias trazidas pelos barcos que transitavam pelo porto, coube à Associação Comercial de Santos recorrer ao setor de Hidrografia do Império, que resultou na chegada, no decorrer de 1876, do navio Lamêgo, sob o comando do capitão-de-fragata Antônio Luiz Von Hoonholtz, diretor da repartição hidrográfica, com o objetivo de remover a ameaçadora e inabalável laje submarina.

Após efetuar um levantamento da área portuária, o oficial da Marinha conseguiu destruir parte do embaraçoso obstáculo, isso depois de 156 dias de exaustivo trabalho. Segundo relatório da época, a rocha foi perfurada através de várias rodadas, de acordo com a sua elevação, com brocas maiores de um metro de profundidade, quando foram implantadas 98 minas em tubos especializados, carregados com pólvora granulada de artilharia raiada, explodindo pelo sistema elétrico.

Com as explosões, um amontoado de pedrouços foi deslocado para o fundo do estuário, tendo sido alçadas 339 lingadas com lajedos e blocos rochosos, além de 244 caixões de fragmentos, num total de 750 toneladas de matérias sólidas. É válido ressaltar que, naquele serviço, foi empregado, pela primeira vez, um sino hidráulico, acoplado ao casco de um iate.

No final daquele memorável ano, a Associação Comercial de Santos oficiou ao comandante Von Hoonholtz, elogiando-o pelo notável trabalho e agradecendo, em nome da Cidade, cujo porto ficou livre daquela perigosa laje submersa, que tantos danos vinha causando à navegação.

Convém lembrar que o ilustre oficial da Marinha Imperial brasileira destacou-se, através de longa carreira, como marinheiro, astrônomo, hidrógrafo, cientista, polemista, geógrafo, historiador, diplomata e escritor. Foi o criador do Serviço de Hidrografia do Ministério da Marinha, além de organizador, na Marinha, dos serviços de meteorologia no Brasil. E, além de alcançar o posto de almirante, foi agraciado pelo Governo Imperial com o título nobiliárquico de Barão de Teffé.

Desde então, ao longo dos anos, foram removidos obstáculos que prejudicavam seriamente o acesso ao porto, cujas muralhas de pedra foram assentadas a partir de 1888. Tanto é que, ainda em 1903, a Companhia Docas de Santos (CDS) executou o arrasamento total daquele mesmo trecho, utilizando, igualmente, um sino hidráulico. E, na descida do aparelho ao fundo do mar, os tripulantes do mesmo, engenheiros da CDS, Guilherme Weinschenck, Ulrico Mursa, Victor de Lamare e Gama Lobo, brindaram o acontecimento com taças de champanhe, completamente submersos.

Quanto ao local onde existiu o Outeirinho, com suas rochas pontiagudas junto ao mar, ficava nas imediações do atual Armazém 25, onde está sendo instalado o novo Terminal de Passageiros.

(*) J. Muniz Jr. é jornalista, pesquisador de História, escritor e Amigo da Marinha (turma/1983)

E o Almanaque de Santos 1971, de Olao Rodrigues (Santos/SP, 1971) registrou:

Lembrando a demolição de um recife em frente do Outeirinhos, em 1876

Havia no Estuário, entre a ponte de atracação de barcas em Vicente de Carvalho e a Base Aérea, uma pedra submersa, de grande porte, perigosa à navegação, em cuja área se assentavam bóias demarcatórias como aparelhos de segurança de tráfego. Era laje que apresentava profundidade de "menos de 3 metros", fazendo-se necessário o derrocamento para deixá-la a menos de 12 metros do nível do mar, reduzida assim de quase 9 metros sua superfície em relação ao zero hidrográfico do Porto de Santos, sem, portanto, mais perigo para a navegação do Estuário.

Aliás, há cerca de 3 anos cuidou-se do derrocamento dessa laje submersa, chegando-se a abrir concorrência, anulada, que agora se efetivou regularmente, com tomada de preços que recebeu o nº 27/70, promovida pela Companhia Docas de Santos, à conta dos recursos do Fundo de Melhoramento do Porto.

Quem executou o serviço, pelo preço de Cr$ 530 mil, foi a Construtora Aulicino, de São Paulo, que programou 22 explosões a dinamite, com prazo até novembro de 1970 para conclusão da obra, fiscalizada pela Inspetoria Fiscal do Porto de Santos, do Departamento Nacional de Portos e Vias Navegáveis.

Em 1876, quando as condições de nosso porto eram precaríssimas, pois nem cais havia, senão trapiches obsoletos, o tráfego de embarcações pelo Estuário era dificultado por uma laje que se erguia em agudos picos à profundidade de 2,4 metros abaixo do nível do mar em ocasiões de marés secas.

Sua demolição era reclamada pelas companhias de navegação como pelos comerciantes da Praça, por meio do seu órgão representativo, a Associação Comercial de Santos.

Quem se encarregou pessoalmente do serviço, dirigindo-o, foi o capitão-tenente Barão de Tefé, chefe da Repartição Hidrográfica do Império.

Durante 156 dias de trabalho ininterrupto, foram perfurados 93 metros por meio de 98 minas, que produziram o deslocamento de 74 toneladas de rocha.

Era mais que uma laje. Pelas dimensões, não passava de um penhasco ou de recife, situado em frente do Outeirinhos, provocando, não raro, danos em navios de longo curso. Nossa Associação Comercial, em 4 de dezembro de 1876, oficiou ao Barão de Tefé, por manifestação tomada em reunião de 29 de novembro daquele ano, não só lhe consignando agradecimentos em nome do Município, como também elogiando seu obsequioso serviço técnico, livrando o porto daquela montanha rochosa submarina, que tantos prejuízos causara à navegação.

Como se vê, quase 100 anos depois, uma laje submersa no Estuário também ofereceu perigo aos navios que demandavam o movimentado ancoradouro, ou dele saíam, hoje dos melhores do mundo pelas condições técnicas, longe, muito longe das deficiências que assinalavam e emperravam o porto de um século passado...

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