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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - URBANISMO (U)
Sem memória (9-a)

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Metropolização, conurbação, verticalização. Os santistas passaram a segunda metade do século XX se acostumando com essas três palavras, que sintetizam um período de grandes transformações no modo de vida dos habitantes da Ilha de São Vicente e regiões próximas.

A transformação contínua das cidades nem sempre é devidamente documentada. Em conseqüência, perdem-se valiosas referências para os pesquisadores não apenas da evolução arquitetônica, como também das mudanças comportamentais, históricas, geográficas etc. Apenas nos primeiros anos do século XXI os remanescentes do patrimônio arquitetônico santista começaram a ser tratados como relíquias e valorizados como referência de suas épocas, como se observa nesta matéria de 16 de outubro de 2004 do jornal santista A Tribuna:


RELÍQUIA - Um casarão em estilo neocolonial, na Vila Nova, em Santos, está à venda. 
O imóvel, com 104 anos, desperta o fascínio de milhares de pessoas que passam pelo local. 
Preço da jóia: R$ 700 mil.
Foto: Édison Baraçal, publicada com a matéria

RELÍQUIA
O passado à venda

O centenário casarão da Vila Nova pode mudar de proprietário em breve

Carlos Ratton
Da Reportagem

Setecentos mil reais. Esse é o valor a ser pago por quem adquirir o casarão em estilo neocolonial, localizado no cruzamento das ruas 7 de Setembro e Constituição, na Vila Nova, e considerado uma das maiores e mais bem conservadas relíquias arquitetônicas de Santos.

Praticamente impenetrável por boa parte de seus 104 anos de existência, o imóvel, que está à venda e que já despertou a curiosidade e fascínio de milhares de pessoas que passaram pelo local, foi aberto na quinta-feira, com exclusividade, para A Tribuna, que desvendou um pouco do mistério que o envolvia.

Construído pela antiga Companhia Docas de Santos, segundo registros do centro de Documentação da Universidade Católica de Santos (UniSantos), o casarão, que possui 21 cômodos e 1.200 metros quadrados de área construída, já está em fase de tombamento no Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico de Santos (Condepasa).

Isso quer dizer que quem comprar o imóvel, que possui uma área total de 1.00 metros quadrados e tem como único herdeiro o português José Duarte Castelo Branco, terá que mantê-lo original.

Erguida para ser residência de funcionários das Docas, por volta de 1900, e comprada, oito anos depois, pelo comendador Francisco Bento de Carvalho - um próspero comerciante da Rua XV de Novembro - a casa permanece praticamente intacta e proporciona ao visitante uma viagem no tempo. Época em que a Vila Nova, com suas ruas iluminadas por lampiões e suntuosos palacetes, era o glamour da sociedade santista.


Escadaria de mármore e corrimão de madeira dá acesso à cozinha
Foto: Édison Baraçal, publicada com a matéria

Detalhes - Com sua fachada repleta de azulejos portugueses e espanhóis, cercada por grades de ferro trabalhadas e preservadas, a residência encanta já a partir de sua entrada principal (Rua da Constituição, 278), onde o visitante se depara com uma grande escadaria em mármore, que dá acesso ao piso superior.

Cercada por calçadas conservadas, bancos de alvenaria construídos entre largas pilastras (em forma de arco) e belos jardins, que abrigam flores e árvores frutíferas, a casa é uma verdadeira obra de arte a cada metro quadrado.

A parte de trás, composta por uma imensa área verde, abriga vários viveiros de pássaros e alguns equipamentos - lavanderia, barracão para guarda de equipamentos de jardinagem, coberturas para eventos externos e outros cômodos destinados aos antigos funcionários. Um caramanchão, ao lado da entrada de veículos, completa o charme do lugar.

Projetado pelo engenheiro Ricardo Severo, da empresa Ramos de Azevedo (a mesma que construiu o Teatro Municipal de São Paulo), o imóvel, em seu entorno, já dá sinais da grandeza de quem o ocupou. Em uma de suas paredes externas, um azulejo possui a seguinte inscrição, datada de 1938: "Bem-vindo quem venha por bem".


A frase transcrita nos azulejos dá as boas-vindas aos visitantes
Foto: Édison Baraçal, publicada com a matéria

Térreo - Ao circular na parte térrea da casa, o visitante se depara com 11 cômodos - seis quartos, uma despensa, uma cozinha, uma sala, um salão de jogos e um banheiro. O piso de alvenaria e o contra-piso de cortiça (talvez para evitar umidade) demonstram a preocupação de seus antigos ocupantes.

Ao subir por uma escadaria de mármore branco e de corrimão de madeira, o visitante chega a uma cozinha (que ainda possui fogão à lenha), cercada por uma copa e um banheiro, com bidê e banheira do início do século 20.


Na cozinha, o contraste dos fogões, fabricados em épocas distintas
Foto: Édison Baraçal, publicada com a matéria

Depois, seguindo por um extenso corredor de piso de madeira, cujo brilho chama atenção até de pessoas menos detalhistas, o visitante se depara com mais sete cômodos - dois quartos, um escritório e quatro salas. Na de jantar, existe um grande e pesado lustre de ipê - madeira também escolhida para compor o piso, as janelas, as portas e outras peças. Nos quatro cantos da sala existem luminárias de teto. Outros detalhes também chamam a atenção, como as maçanetas de ferro e porcelana, assim como os demais lustres da parte superior do imóvel.

As salas de estar, recepção e leitura (que ainda possui livros e revistas antigas) completam o ambiente, que remonta aos velhos tempos de grandes reuniões, onde os destinos da Cidade eram debatidos por comerciantes do ramo cafeeiro, empresários, profissionais liberais e políticos.

Ainda na sala de leitura, existe um quadro com a foto do comendador Francisco Bento de Carvalho, outro de sua esposa e ainda alguns diplomas, entre eles um que tornou o comerciante sócio honorário do Gabinete Português de Leitura, datado de 1944.


Em cada ambiente, a iluminação possui um lustre diferente
Foto: Édison Baraçal, publicada com a matéria

Dono pretende se transferir para Bertioga

Estabelecido em Santos desde 1950, o comerciante José Duarte Castelo Branco, de 73 anos, que está vendendo o imóvel e deverá mudar-se para Bertioga, onde possui um sítio, não esconde que a casa representou muito em sua vida.

Com parentes em Portugal, seu país de origem, Castelo Branco disse que sempre se manteve longe da popularidade e que a propriedade, desde sua construção, praticamente ficou restrita à apreciação de familiares.

"Cerca de 11 anos atrás, a casa era ocupada ainda pelos meus tios, que eram comerciantes e sobrinhos de Francisco Bento de Carvalho. Minha mãe, irmã deles, sempre morou em Portugal. Também moravam aqui seis funcionários. Depois que meus tios faleceram, eu passei a ocupá-la", conta o comerciante, que não possui filhos. O comerciante ainda lembra de muitos momentos gostosos, vividos no interior da residência.


José Duarte, ladeado pela enfermeira Ana Maura e a cozinheira Isabel
Foto: Édison Baraçal, publicada com a matéria

Funcionária - Funcionária da família desde os 20 anos de idade, a cozinheira Isabel de Góes Lima, hoje com 53 anos, disse que irá se aposentar no dia em que José Duarte se mudar para Bertioga.

"A única funcionária viva sou eu. Quando o senhor José for embora, vou morar com um sobrinho e viver o resto da minha vida, que teve muitos momentos felizes, principalmente dentro desta casa", disse, ressaltando que a casa sempre foi palco de grandes festas de família, principalmente durante a geração dos tios de Castelo Branco.

A enfermeira Ana Maura Leopoldina, que vai continuar dando assistência ao comerciante José Castelo Branco, acredita que a casa dará muita satisfação a quem adquiri-la. "Ela é muito espaçosa e rodeada de muito verde. Quem comprar esse imóvel fará um grande negócio", comenta.


A despensa é um dos cômodos da parte térrea do imponente casarão
Foto: Édison Baraçal, publicada com a matéria

O corretor responsável pela venda do imóvel, Nélson de Freitas Domingues, da Expoente Assessoria e Empreendimentos Imobiliários, disse que quatro pessoas já se interessaram pelo imóvel.

"As três primeiras tinham intenção de demolir, o que é impossível, devido ao processo de tombamento. A quarta ofereceu um imóvel no Guarujá, proposta que está sendo estudada pelo proprietário", finaliza.


Em estilo colonial, o imóvel é considerado uma das maiores relíquias arquitetônicas
Foto: Édison Baraçal, publicada com a matéria

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