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Publicado em 21/6/1982 no jornal A Tribuna de Santos
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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - OS IMIGRANTES
A colônia japonesa (3)

Beth Capelache de Carvalho (texto), equipe de A Tribuna e arquivo (fotos)

Idosos sem família, protegidos pela Beneficência Nipo-Brasileira

Amparo à velhice

Há uma tradição japonesa que os imigrantes conservam até hoje: numa família natural de Okinawa, o primeiro filho homem sempre tem certos privilégios sobre seus irmãos. Entretanto, quando os pais envelhecem, e o chefe da família se aposenta, é do primogênito a responsabilidade de cuidar da casa e prover de conforto e segurança a vida de seus pais e irmãos.

No Japão, também é ponto de honra amparar os velhos. Muitas moças chegam a pensar duas vezes antes de se casar, se seu noivo é o primeiro filho, porque sabem que ele estará sempre ocupado com sua família e com seus pais, e nada o afastará desse dever. Mas não há velhos japoneses abandonados. Nem no Japão nem aqui.

Manter essa tradição de amparo ao idoso é a função da Casa de Reabilitação Social, mantida em Santos, na Av. Campos Sales 60/64, pela Sociedade Beneficência Nipo-Brasileira, de São Paulo. Para lá a colônia de São Paulo encaminha os velhos japoneses que perderam a família, ou não tiveram filhos, e por isso estão sozinhos. É um dever da sociedade cuidar de seu conforto.

Foi só por volta de 1967 que começaram a aparecer, na colônia paulista, casos de pessoas idosas sem família. Primeiro elas foram instaladas em São Paulo, numa casa alugada, até que a Beneficência Nipo-Brasileira recebeu, em doação, a antiga Casa dos Imigrantes, que pertencia ao governo do Japão até o final das imigrações para o Brasil. Funcionando em Santos há dez anos, a Casa de Recuperação é a única entidade japonesa exclusiva para pessoas idosas em todo o Brasil.

Lá estão, atualmente, 12 mulheres e 38 homens, vindos de vários estados, que trabalham em serviços artesanais e contribuem com o que podem para ajudar na manutenção da casa. Confeccionam invólucros especiais para proteger os pêssegos contra insetos, nas plantações; saquinhos para os palitos de comer, usados pelos japoneses; almofadas, esteiras, além de trabalhos manuais com conchas e invólucros de cigarros. Há também os que trabalham fora, por meio expediente.

São quase todos pioneiros da imigração, trabalharam na lavoura, e alguns recebem aposentadoria pelo Funrural. Nas horas de lazer, vêem televisão, jogam o shogui (espécie de xadrez) e o go (espécie de bingo), além de participar de festas promovidas pela entidade durante todo o ano. O presidente da Beneficência Nipo-Brasileira, Tadashi Takenaka, é um japonês que chegou ao Brasil há 40 anos, trabalhou na lavoura, foi atleta do Saldanha da Gama, e hoje é industrial, em São Paulo.

História de um japonês sozinho - Shisuo Abe veio para Santos, morar na Casa de Reabilitação, em 1977. No Brasil, ele chegou em 1941, e, no meio de tantas famílias, era um dos poucos que conseguiram viajar sozinho. Era viúvo, não tinha filhos, e fugia da situação ruim por que passava o Japão naqueles anos. Começou numa fazenda de café de Ribeirão Preto, onde ficou cinco anos.

Em São Paulo, conseguiu emprego numa tinturaria, onde trabalhou durante 15 anos, até se estabelecer por conta própria, no mesmo ramo, por mais 10 anos. Ao se mudar para Santos, trabalhou durante algum tempo no Restaurante Nipo-Brasileiro, como ajudante de cozinha, e só parou quando se sentiu muito fraco para trabalhar.

Agora, Shisuo vive na Casa de Reabilitação Social da Beneficência. Ele já deu sua contribuição em trabalho para a sociedade, e merece receber o amparo da comunidade japonesa, já que não tem família. Como seus companheiros que não gostam de falar de suas vidas, ele acha que valeu a pena vir para o Brasil, apesar de todas as dificuldades.

A luz, pelo jorei messiânico

Jorei, a purificação do espírito

A Igreja Messiânica foi criada no Japão a 15 de junho de 1931, por Mokite Okada, chamado de Meishu Sama (Senhor da Luz). Em Santos, começou no mesmo ano, primeiramente em casa de uma japonesa, no Bairro do Paquetá, mas seus seguidores sempre foram brasileiros em maioria.

Ester Oliveira Guerra, assistente de ministro, explica a filosofia da igreja: "A religião messiânica é o pensamento em Deus. Sua prática é o jorei (purificação do espírito), aplicado por membros da igreja. Eles levantam as mãos e transmitem a luz às pessoas que procuram o templo".

A Igreja Messiânica é aberta a todos. Geralmente as pessoas que chegam trazem problemas de saúde, dinheiro ou desarmonia no lar. Através do jorei, recebem a graça. Depois, se tiverem vontade, podem participar das aulas necessárias para tornarem-se membros da igreja e até aplicar o jorei.

Há três templos messiânicos em Santos, nas ruas Silva Jardim, 156; Conselheiro João Alfredo, 365; e Gonçalves Ledo, 29. Todas têm atividades paralelas, como as aulas de ikebana (arranjos florais), que permitem receber a luz e a força através das formas das flores.

Lar do Progredir Infinito

Quem chega ao núcleo da Seicho-No-Iê, da Rua Euclides da Cunha, é recebido por pessoas alegres, que agradecem e sorriem. São adeptos da filosofia do otimismo, que não surgiu por acaso, mas para preencher as lacunas deixadas pelas religiões. O professor Chotoku Iraha e várias dendoins (instrutoras) procuram tornar ainda mais claros os ensinamentos que já foram feitos para acabar com qualquer dúvida.

Um dos princípios básicos da Seicho-No-Iê (Lar do Progredir Infinito) diz que deve haver perfeita harmonia no lar, para que as pessoas vivam felizes. E o professor Iraha explica: "Cristo não foi casado, e Buda viveu apenas uma noite com sua mulher, e depois saiu em busca da Verdade". Portanto, nenhum dos dois poderia falar com perfeito conhecimento sobre os problemas que surgem nas famílias.

Professor Iraha

A Seicho-No-Iê tem uma palavra para cada problema, explicando-o em profundidade. Sempre partindo do princípio de que o corpo carnal não existe, e o importante é o espírito. E, como espíritos, somos filhos de Deus, perfeitos, sem doenças ou problemas insolúveis. É preciso apenas progredir espiritualmente, ter fé e amor, para conseguir suplantar os problemas e viver com alegria.

Inteiramente aberta a quem quiser procurá-la, a Seicho-No-Iê tem uma série de cultos regulares, que são considerados importantes para que se atinja o estado de espírito almejado pelos seguidores: a Oração aos Antepassados, a Oração Mútua, a Oração do Perdão, a Oração dos Anjinhos (abortados) e outras, que são feitas regularmente nos vários núcleos da Baixada, e podem ser assistidas por todos.

Dendoins também estão sempre prontas a dar instruções e orientações a quem quer que procure o núcleo, de maneira que as casas da Seicho-No-Iê estão sempre cheias de gente com histórias incríveis para contar. Gente alegre, que já foi triste; gente saudável, que um dia foi doente.

Foi o próprio professor Iraha que trouxe a Seicho-No-Iê para Santos, divulgando-a através da revista Acendedor, primeiro publicada apenas em japonês. Também foi ele que publicou as primeiras revistas em português, permitindo a difusão da filosofia entre os brasileiros, que agora são os mais numerosos.

No Budismo, a alegria da vida

O altar budista
O Budismo chegou ao Brasil com os primeiros japoneses. Existem várias ramificações dessa religião, e cada um trouxe a sua. Mas em Santos espalhou-se o Nitiren Shoshu, ou Budismo de Nitiren Daishonin (Buda), que hoje conta com cerca de mil famílias adeptas, das quais 90 por cento são brasileiras.

O adepto do Nitiren Shoshu aprende a viver a vida com alegria e ultrapassar qualquer problema, baseando-se na Lei de Causa e Efeito (Nam Miocho Rengue Kyo). A recitação dessa lei faz com que as pessoas se tornem felizes, sanando seus problemas espirituais e até curando doenças, desarmonia doméstica ou dificuldades financeiras.

Cada família tem o seu altar, onde está consagrado o objeto de adoração - o gohozon (um pergaminho com o Nam Miocho Rengue Kyo). Ali são feitas as cinco orações da manhã e as três orações da noite, que levam de 25 a 30 minutos, todos os dias, e também é praticado o dedaimoku (recitação do Nam Miocho Rengue Kyo), na posição correta.

Não há ministros, mas um chefe da organização responsável pela igreja, a Organização Nitiren Shoshu do Brasil, sede de Santos. Os budistas reúnem-se para palestras, durante os quais os membros contam seus relatos (benefícios recebidos), e também em festivais, que representam a alegria da prática da fé. Os membros da Nitiren Shoshu de Santos vão participar, em julho [N.E.: de 1982], do Concurso Estudantil de Bandas e Fanfarras, em três categorias de bandas.

Veja as partes [1] e [2] desta matéria