Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/santos/h0134d.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 07/13/05 14:10:28
Clique na imagem para voltar à página principal
HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - MADEIRENSES
Madeirenses em Santos (3-B)

Leva para a página anterior
Quando habitantes da montanhosa ilha da Madeira resolveram migrar para o Brasil, encontraram na região de Santos um dos melhores lugares, a começar pelo nome da ilha, São Vicente, que recordava localidade homônima em seu arquipélago do meio do Atlântico. Além disso, ilustres patrícios já os antecederam, trazendo na bagagem os instrumentos e as técnicas para a usinagem do açúcar e o preparo do vinho, além de atuarem como entreposto no comércio entre Brasil e Portugal.

E, em Santos, as encostas dos morros lembraram também sua montanhosa terra natal. Em terras santistas, a colônia madeirense ficou conhecida por suas festas e pelas bordadeiras, que continuaram em terras brasileiras as técnicas ancestrais que deram fama à sua ilha.

Esse é o tema de um livrete editado em 1992 pela Secretaria de Cultura da Prefeitura Municipal de Santos, com apoio da Comissão Municipal de Folclore e Artesanato, em trabalho escrito por Francisco Ribeiro do Nacimento, com ilustrações de Lauro Freire, capa de Eugênio Lara e fotos do arquivo do Diário Oficial/D.O.Urgente, Casa do Folclore, Assessoria de Comunicação/PMC e Tadeu Nascimento:

BORDADOS DA MADEIRA NOS MORROS DE SANTOS [2]


Muita semelhança, a tônica entre a Ilha da Madeira...
Foto: Hélder Marques

Introdução

Num cenário que reflete, muito de perto, os contornos da Ilha da Madeira, localizada no Arquipélago do mesmo nome, e situada na metade norte do Oceano Atlântico, a 978 quilômetros de Lisboa, vivem nos morros de Santos algumas centenas de senhoras que lidam incessantemente com tecidos, agulhas, dedais e linhas multicoloridas. Essas dedicadas bordadeiras passam o dia, e muitas vezes a noite, num mergulho mágico ao mundo do bordado. Não é um bordado qualquer. Este, a que nos referimos, é o mesmo produzido pelas bordadeiras madeirenses, cuja fama, há muito tempo, atravessou fronteiras e o além-mar, sempre encantando a todos por sua beleza.


...e o morro santista. Herdamos, inclusive, a arte dos bordados
Foto: Nivair Neves

Um pouco de História

Os primeiros povoadores vindos de Portugal chegaram à região de Santos, principal porto do litoral vicentino, por volta da 1ª década de 1510, nos primórdios da colonização. Inicialmente se fixaram na planície, dedicaram-se à agricultura, principalmente ao cultivo da cana-de-açúcar.

Um testemunho importante do primeiro ciclo da cana-de-açúcar na Capitania de São Vicente e que ainda permanece em Santos, elevada a vila na década 1540, encontra-se no sopé do Morro da Caneleira. São as ruínas do Engenho de São Jorge dos Erasmos, cuja construção foi efetivada na década de 1530. Recentemente, a Prefeitura de Santos assinou convênio com a USP (N.E.: Universidade de São Paulo) visando a restauração desse marco histórico.

Os imigrantes da Ilha da Madeira instalaram-se nos morros de Santos e especialmente no Morro de São Bento, por volta de 1885, onde abrigariam suas famílias. Encostas, elevações, curvas de nível acentuadas, rochedos íngremes, nada disso constituía medo ou recuo para os portugueses. Muito pelo contrário, eram desafios a vencer. Afinal de contas, esses destemidos lusitanos possuíam muita experiência em construção erguida em relevos acidentados nos seu lugar de origem.

Instaladas as famílias, os homens foram à cata de serviço nas obras do cais do porto, inaugurado em 2/2/1892; trabalhar nos armazéns de estocagem e exportação de café e ainda na construção civil. As mulheres ficaram com a incumbência de cuidar das crianças, e dos demais afazeres domésticos.

Mas, os tempos eram difíceis, muito natural para quem chega a terras estranhas, começar vida, de novo, não é tarefa fácil! E foi com aquela garra que caracteriza o povo português que as ilhoas, ainda com as mãos calejadas pela ajuda no erguimento das casas, retomaram com toda a fé o tradicional hábito da execução dos bordados da Ilha da Madeira. Era mais uma preciosa fonte de renda para o custeio das despesas do lar. E não só: estava nascendo no Brasil - e justamente em Santos - O Bordado da Ilha da Madeira.

O morro dos bordados

Santos, elevada à categoria de Cidade em 26/1/1839, tem 753 km² de área territorial. A sede do Município, situada na Ilha de São Vicente, possui 39,4 km² e sua área continental fica com o restante: 713,6 km². Seus 20 morros ocupam uma área de aproximadamente 650 hectares, os quais correspondem a 16,5% da sede de Santos (fonte: Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Meio-Ambiente/Sedam).

O São Bento está situado entre os morros do Fontana, Bufo, Jabaquara, Nova Cintra, Saboó, Penha e Pacheco. Do alto do morro avista-se o porto, considerado um dos maiores e mais bem equipados da América Latina. Vê-se também a 12 quilômetros o maior pólo petroquímico do Brasil, no vizinho município de Cubatão.

O Morro São Bento, local deste nosso trabalho, possui uma área de 48 hectares e mais de 10 mil habitantes.

Ganhou essa denominação porque em sua encosta encontra-se o antigo Mosteiro de São Bento, instalado em 1650, prédio de estilo colonial, originário da Capela de Nossa Senhora do Desterro, construída em 1644. Reconstruído em 1725, e após várias ampliações, foi desativado em 1968. Em seguida, transformado no imponente Museu de Arte Sacra de Santos.

A partir de 1945 até 1950, em decorrência da crise econômica que assolava a Europa, depois da II Guerra Mundial, grande leva de imigrantes madeirenses chegou a Santos. Muitos chegaram por intermédio da "Carta de Chamada", documento assinado por patrícios ou parentes e submetido à aprovação e registro no Consulado de Portugal, da região.

Essa "Carta de Chamada" assegurava ao imigrante passagem marítima e outras condições, tais como: emprego, acomodação com domicílio por algum tempo etc. Essas despesas posteriormente eram reembolsadas pelo favorecido.

A maioria se fixou nos morros de Santos, principalmente no São Bento, onde exerce uma influência significativa na vida cultural e religiosa da população local.

Além do bordado da Ilha, os madeirenses mantêm algumas manifestações do folclore lusitano, como o Rancho Folclórico Típico Madeirense, fundado em maio de 1976, integrado por jovens descendentes de portugueses e brasileiros, encantando com os seus bailados e canções tradicionais, e a Folia do Divino Espírito Santo, que há anos sai às ruas do Morro no primeiro domingo após a Páscoa.

Na noite de Natal, os madeirenses e a comunidade do morro festejam a data com romaria acompanhada pela tocata do Rancho Folclórico, carregando miniatura de um barco cheio de oferendas, recolhidas junto aos moradores.

Essas oferendas são levadas à Igreja para serem doadas às obras sociais da paróquia. Frutas, pão, vinho, doces, cereais, inclusive dinheiro, integram a relação dos óbolos. Durante as romarias são entoados cânticos natalinos. E com a representação do Auto do Anjo Gabriel, seus integrantes anunciam o nascimento do Menino Jesus, fortalecendo ainda mais as tradições culturais trazidas de suas terras distantes.


Museu de Arte Sacra de Santos, antigo Mosteiro de São Bento

Advento industrial

Nosso país, em 1950, impulsionava o seu parque industrial, e como era de se esperar, as bordadeiras iniciaram uma luta desigual contra a concorrência das máquinas e a conseqüente desvalorização dos bordados feitos à mão, por serem mais caros que os produzidos à máquina.

É certo que o bordado feito à mão é mais perfeito e durável, daquele à máquina. Diante da produção em escala industrial, o trabalho artesanal não poderia competir com os preços de mercado. Outro fator pesou negativamente para a manutenção do lindo bordado típico da Madeira: a necessidade do trabalho da mulher fora do lar em atividades menos desgastantes e melhor remuneradas.

Por outro lado, os bordados passaram a ser comercializados através de intermediários (agenciadores) das grandes lojas e oficinas de São Paulo-Capital e de Santos. Eles traziam e ainda trazem as encomendas já definidas: tipo de pontos, tecido, linha, riscado e com preço de mão-de-obra pré-estabelecido, não permitindo assim qualquer espaço à criatividade, desestimulando ainda mais o interesse das bordadeiras, de transmitirem às filhas a sua técnica, adquirida por quando muito crianças, de avós e mães.

Desta forma, o ciclo da assimilação e da preservação desse artesanato português passou a sofrer interferências. Diante desse quadro de total desestímulo, essas habilidosas bordadeiras, continuadoras do fino artesanato, diminuíram a produção, e muitas delas chegaram a abandonar a atividade.


O dia-a-dia das bordadeiras da Madeira nos Morros de Santos

Leva para a página seguinte da série