Daqui de cima, a vista é impagável

Bairro, que completou 44 anos, fica entre os morros da Nova Cintra e do São Bento e é o ponto mais alto habitável da Cidade

Luiz Gomes Otero

Da Redação

Santos tem o seu pedacinho do céu. E ele fica no ponto mais alto habitável da Cidade; a Vila Progresso, um pacato bairro situado entre os morros da Nova Cintra e do São Bento, a exatos 184,7 metros do nível do mar.

O local completou 44 anos no dia 15 de março. E tem até padroeiro próprio: Nosso Senhor Bom Jesus da Vila Progresso, cuja data festiva foi comemorada em 6 de agosto.

E apesar das dificuldades naturais provocadas pela posição do morro, que dificulta o acesso de veículos, quem mora lá nem sonha em se mudar. A tranqüilidade e a solidariedade entre os moradores são marcas principais do bairro, que se diferencia dos demais da Cidade pela proximidade das pessoas.

No início, as ruas eram cobertas de barro. A ausência de infra-estrutura urbana era evidente, como bem lembra Conceição Aparecida Silva Pereira, de 52 anos, nascida e criada na área da Vila Progresso.

"Meus pais trabalharam muitos anos no comércio daqui. E ajudaram a trazer o que temos hoje em dia. Os moradores que decidiram povoar essa área naquela época foram chamados de malucos, porque realmente não tinha nada mesmo aqui", disse Conceição.

E ela lembra bem desse período inicial, quando não havia asfalto nas vias principais. E também da construção do prédio da Escola Estadual Emílio Justo, construída sobre uma rocha, em um local onde anteriormente possuía um bica que era usada pelas donas-de-casa para lavar roupa.

"Ainda me lembro de ver as mulheres lavando roupa ali. Aqui no morro não existia água tratada nesse ponto. Ela era captada de nascentes que existiam naquela época", assinalou a moradora.

A evolução veio em forma de asfalto para as vias. A Rua Três, por exemplo, conta com igreja em homenagem ao padroeiro do bairro, a escola estadual e uma unidade municipal de ensino. Também abriga a sede da Sociedade de Melhoramentos do bairro, fundada em 1977.

Quase em frente à sede da sociedade de melhoramentos existe um pequeno local que funciona como um mirante, em função da vista panorâmica privilegiada da Cidade.

Dali se observa, por exemplo, o ponto de atracação de embarcações da Alemoa e o Conjunto Habitacional Mário Covas, ao lado do Conjunto dos Estivadores e do Cemitério da Filosofia, no Saboó.

Por estar e um dos pontos altos, o local foi apelidado de Praça do Céu. Mas ainda precisa de melhorias. O piso da calçada está danificado pela ação do tempo. E mesmo os bancos de alvenaria precisam de uma manutenção mais adequada.

Apesar dos avanços, Conceição disse que há problemas que precisam ser solucionados pelo Poder Público. "As ruas estão bastante esburacadas. E temos algumas vias que estão mal iluminadas há vários anos".

Do alto do morro é possível ver Santos de uma outra maneira. A tranqüilidade é um dos aspectos agradáveis da Vila Progresso, segundo os moradores

Foto: Walter Mello, publicada com a matéria

Contas de luz - Não bastasse isso, os moradores estão encontrando dificuldades para pagar as contas de consumo de energia elétrica. Com a suspensão dos pagamentos nas casas lotéricas, eles estão tendo que descer o morro para pagar em postos autorizados no Jabaquara e no Centro.

"Para quem mora em pontos mais distantes, isso foi prejudicial ao extremo. Só espero que a empresa concessionária resolva isso. É bom lembrar que nem todos os consumidores têm acesso à Internet", pondera Conceição.

Comerciante há oito anos estabelecido na Rua Três, na Vila Progresso, Edvaldo Aparecido dos Santos se diz satisfeito com o negócio montado. "A principal qualidade do bairro é a tranqüilidade. Não tem aquela correria que você vê nos centros comerciais lá embaixo. Parece mesmo que estamos perto do céu, porque a paz impera aqui".

Quadra de esportes só em 2011

Até o final do primeiro semestre de 2011, a Vila Progresso deverá contar com a tão sonhada quadra esportiva, ao lado do reservatório da Sabesp. Os trabalhos de desmonte dos blocos rochosos da área já foram iniciados pela Prefeitura.

O secretário municipal de Serviços Públicos, Carlos Alberto Tavares Russo, informou que os trabalhos estão sendo conduzidos pelo Departamento da Administração Regional dos Morros.

Também está sendo avaliada a possibilidade de intervenções na drenagem da Rua Três. A idéia é tentar incluir a via no cronograma do futuro contrato de serviço de drenagem e pavimentação da Cidade, que terá o processo licitatório concluído até o final do ano.

A construção da quadra esportiva é reivindicação antiga da comunidade da Vila Progresso. E o sistema de drenagem precisa mesmo ser implantado na Rua Três, pois a via registra diversos pontos de alagamento em dias de chuva forte.

No que se refere ao espaço conhecido como Praça do Céu, a Prefeitura está programando um mutirão de pintura e manutenção na área no próximo dia 18, quando serão oferecidos outros serviços para a população, como o corte gratuito de cabelo.

Também está prevista para 2011 a construção de seis escadas e 20 muros de arrimo por parte da Prefeitura. O serviço integra o cronograma do Programa Santos Novos Tempos.

O secretário municipal de Desenvolvimento e Assuntos Estratégicos, Márcio Lara, explica que será preciso concluir primeiro a atualização do mapa das áreas de risco dos morros, para poder programar a intervenção em 2011.

Pouca oferta de linhas de ônibus e vans é uma das reclamações

Foto: Walter Mello, publicada com a matéria

Transporte e água são as queixas

Melhorias no serviço de transporte coletivo e de abastecimento de água, além de novos equipamentos para o lazer dos moradores. Estas são algumas das reivindicações que a Sociedade de Melhoramentos da Vila Progresso tem feito ao Poder Público.

Parece irônico que a Rua Três, onde está situado o reservatório da Sabesp, apresente casas com falta de água. Mas é o que realmente acontece. "O problema é antigo e até hoje não se tem uma previsão de quando será solucionado", disse Antonio Silva, que preside atualmente a entidade.

Sobre o transporte coletivo, Silva garante que as queixas são as mesmas de quem mora na chamada parte baixa da Cidade. "Os intervalos são muito grandes. Quem depende do horário para fazer a prova de um concurso, por exemplo, precisa sair com muita antecedência para não perder a hora".

Outro ponto que precisa avançar, segundo Silva, é quanto à regularização fundiária dos imóveis. A Prefeitura tem acompanhado os casos por intermédio da Secretaria Municipal de Planejamento (Seplan). Mas os processos se desenrolam de forma morosa.

"Todos estão ansiosos para regularizar a situação de seus imóveis. Isso dará mais tranqüilidade para as famílias", assinalou o líder comunitário.

Funcionária de escola nem pensa em mudar de local

Funcionária mais antiga da Escola Estadual Deputado Emílio justo em atividade, Nanci Oliveira da Silva conta que chegou a chorar quando escolheu o colégio para fixar sua sede de trabalho. Ela não gostava do local na época. Mas mudou de opinião com o passar dos anos. E hoje não consegue se ver trabalhando em outra unidade da rede estadual.

"No início não gostava da idéia de morar e trabalhar aqui, porque sabia da falta de estrutura do bairro. Mas o fato é que encontrei um sentimento de solidariedade incrível das pessoas. Isso eu não vejo em outros bairros lá embaixo na Cidade".

Um fato marcante aconteceu recentemente, quando o pai de uma aluna da escola sofreu um grave acidente automobilístico. "Os moradores formaram uma corrente de orações. Ele acabou se recuperando e graças a Deus está bem. Quando algo de grave acontece com um morador, todos se mobilizam para tentar ajudar de alguma forma".

Na saída da escola, Nanci cumprimenta quase todos que passam em frente à unidade. E garante conhecer a maioria pelo nome. "Aqui não há qualquer receio ou aquele tipo de isolamento frio. O sentimento de união é sincero. Nós realmente gostamos de morar aqui".

Personagem

Edvaldo Aparecido dos Santos - 43 anos

Comerciante estabelecido há oito anos em um bar da Rua Três da Vila Progresso, Edvaldo tem na verdade uma história de vida que inclui ainda os morros de Nova Cintra e São Bento.

Ele se criou na chamada Cidade Alta e nem pensa em se mudar.

 "Temos o sossego do Interior no Litoral. E essa paz não tem preço. Não troco por nada desse mundo".