HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS -
TÚNEIS SECRETOS
Fotógrafo ficou sem magnésio...
Produto era necessário ao velho Marques Ferreira para fotografar na gruta...
Com localização imprecisa, mas confirmada por vários historiadores, há pelo menos um
túnel - talvez diversos deles - sob os morros santistas, destinado primeiro ao uso como refúgio contra piratas e depois como esconderijo para escravos.
Há relatos de que também poderia ter funcionado como capela ou mesquita dos judeus coloniais.
Uma das primeiras citações é que Mestre Bartolomeu, ferreiro da armada de 1532, anos antes de morrer, começara uma grande obra
para a vila de Santos, continuada pelo filho. Durante um ataque por piratas, Bartolomeu Fernandes, o filho de Mestre Bartolomeu, correu pela então vila
chamando as pessoas a acompanhá-lo até uma gruta, disfarçada entre rochas do talude, que disse ser a Gruta de Nossa Senhora do Desterro, que ligava o
Tachinho (N.A.: atual morro da Nova Cintra) a São Vicente.
Porém, não ficou registrada a localização dessa gruta - possivelmente construída junto à fonte do Desterro, nas
imediações do Mosteiro de São Bento - nem a extensão dos túneis, que segundo alguns
pesquisadores atravessariam todo o morro, tendo inclusive uma entrada secreta dentro do mosteiro. Um dos túneis, segundo a
lenda, ligaria o mosteiro ao cais, à igreja do Valongo e até ao Convento do Carmo.
Ribeirões - Para melhor compreensão das localizações citadas, vale recordar que um dos ribeirões
canalizados em Santos foi o de São Jerônimo, com nascente no Monte Serrat, que passa sob a Praça dos Andradas e a Rua Conde D'Eu, seguindo até o
Estuário.
Ele não deve ser confundido com o Ribeirão do Carmo, que nasce no sopé do Monte Serrat (junto à bica do Itororó)
e passa sob a Rua Itororó, prosseguindo sob a Rua Augusto Severo e a Praça Barão do Rio Branco, passando ao lado da igreja do Carmo.
Já o Ribeirão São Bento, antigamente chamado do Desterro, e canalizado como os demais no início do século XX,
começava no Morro São Bento e passava defronte ao Convento do Valongo, no atual Largo Marquês de Monte Alegre.
Desmoronamento do Monte Serrat, em 1928
Entrada - Conta o pesquisador Francisco Martins dos Santos, em sua História de Santos, que "em
1928, durante as obras de consolidação da encosta do Monte Serrat, após o desmoronamento ocorrido
nesse ano, o engenheiro municipal que chefiou os serviços, Dr. Antônio Gomide Ribeiro dos Santos (que mais tarde foi prefeito municipal), encontrou uma
pesada grade de ferro, vedando a abertura e que tombou oxidada pelo tempo.
"Ao entrar pela abertura, os operários municipais e da City encontraram um grande salão, de quatro por oito
metros aproximadamente e totalmente calcetado. Uma banqueta acompanhava as paredes, e um túnel, por onde os trabalhadores penetraram cerca de trinta
metros, aparecia no fundo. Aves noturnas atestavam a existência de um respiradouro. Por causa dos deslizamentos que ameaçavam as encostas do Monte
Serrat, a entrada teve que ser emparedada com muros de concreto, impossibilitando assim a continuação das pesquisas no local. O fato foi publicado pelos
jornais da época, com desenhos e fotografias do local, que atestam a veracidade do que, até então, se tinha por lenda", continuou o historiador.
Na História de Santos/Poliantéia Santista, (de Francisco Martins dos Santos e Fernando Martins Lichti), a
história é repetida, com mais detalhes, no trecho em que é descrita a origem do nome do Monte Serrate:
Por ocasião do grande desmonte de 1928, ficou a descoberto, durante alguns dias, a
três quartos da altura da encosta atingida, a entrada de uma gruta que ninguém supunha existir. Segundo a descrição do engenheiro-chefe da
Prefeitura (depois prefeito de Santos), o Dr. Antonio Gomide Ribeiro dos Santos, que nela esteve por alguns instantes, sem maior penetração, por se
temer, então, novo desmonte, havia à entrada dessa gruta um salão de 8 metros, por 4, com bancos laterais, de pedra ao que parecia, e com
inscrições, para ele incompreensíveis, nas paredes. Ao fundo daquele salão, havia um túnel muito escuro, que penetrava no coração do morro.
A nota curiosa do relato do engenheiro Gomide é que, logo após a queda do velhíssimo
portão de ferro, desfeito aos primeiros contatos com o ar, as pessoas que se animaram a penetrar no salão descrito, ali viram dezenas de corujas e
morcegos em revoada, denotando existência de oxigênio no interior da gruta, e, conseqüentemente, a existência de alguma saída ou respiradouro, em
qualquer outra parte, e decerto ao fim do túnel que ninguém penetrou.
À falta de magnésio no momento (pleno dia), o fotógrafo que lá esteve com o engenheiro
Gomide Ribeiro dos Santos (o velho Marques Pereira) só pôde fotografar a entrada da gruta, já com o portão esboroado.
Infelizmente, por sugestão dos técnicos, aquela entrada foi de novo tapada, não
sabemos se com tijolos e cimento, mas, pelo menos, com uma grossa camada do próprio barro do morro aluído.
Estudando o caso, chegamos à conclusão de que se tratava da Gruta de São Jerônimo, do
século XVI (...) |
Matéria do jornal A Tribuna em 1980 conta essas histórias, destacando-se o detalhe da grade de ferro na
entrada do túnel: no que seria a outra ponta do túnel, no chamado refúgio do Tachinho, junto à cachoeira, também haveria uma grade de ferro - podem ser,
portanto, as duas pontas do lendário túnel. A citação "um novo talude de barro e pedra desceu" parece referir-se ao deslizamento
na encosta do morro ocorrido na década de 1950:
O Túnel emparedado (*)
Quando ocorreu o catastrófico desmoronamento do Monte Serrate, em 1928, os operários
encarregados das obras de consolidação das encostas do morro, ao realizarem o desmonte de taludes, encontraram uma pesada grade de ferro, vedando a
entrada de uma gruta, e que acabou tombando, oxidada pelo tempo.
Os funcionários da Prefeitura e da Companhia City penetraram pela abertura, e
descobriram um amplo salão, de quatro metros de largura por oito de comprimento, aproximadamente, totalmente calcetado. Em todo o seu perímetro
havia uma banqueta, e depois do salão surgia um túnel. A descrição do local foi feita pelo então engenheiro municipal, Antônio Gomide Ribeiro dos
Santos, que depois seria prefeito de Santos, ao historiador Francisco Meira, que tempos depois tentou estabelecer o local exato da entrada do túnel,
em Santos de Ontem, publicação do Diário Oficial de 1952, republicada, com a devida atualização, em 1970.
Os operários penetraram cerca de 30 metros no túnel, que, segundo os relatos,
"sumia-se ao fundo". Francisco Meira cita: "Aves noturnas, despertas pela luz penetrante, esvoaçavam, o que indica a existência de um respiradouro
que assegura a perfeita oxidação do ambiente.
"Pessoas já falecidas e outras vivas ainda, sabe-se que penetraram por ele. Nunca o
revelaram ou perderam a sua localização. Sua lendária configuração é, porém, sempre idêntica".
Assim Geraldo Perrone descreveu o local: "Ao limiar da porta, que está encravada na
face oriental do morro, há um vastíssimo salão com bancos de pedra em toda sua volta, e estavam atacados pelo limo. Ao fundo divisavam-se três
portas de pequenas dimensões que davam acesso a outro compartimento. As correntes de ar desafiavam os archotes..."
Antônio Gomide mostrou o local, tempos depois, para o historiador Francisco Meira,
exibindo até mesmo uma fotografia da entrada do túnel, onde aparece um significativo encanamento lateral. Porém, a entrada foi, segundo as palavras
de Meira, "afanosamente emparedada, visto os perigos que naquela ocasião os deslizamentos no Monte Serrat ofereciam". E, assim, foi enterrada a
oportunidade de saber-se um pouco mais sobre a nossa história.
Seta na foto de Carlos Marques mostra onde seria o túnel fechado em 1928
Outro historiador, Francisco Martins dos Santos, denominava o local de Gruta de São
Jerônimo, e levantava diversas hipóteses sobre sua origem. Segundo ele, poderia ser um refúgio contra o ataque de piratas, ou ainda serviria para
guardar tesouros e riquezas. Mas, ainda segundo Francisco Martins dos Santos, poderia ser uma "capela ou mesquita dos judeus coloniais... um muro de
lamentações dos cristãos-novos". Ele diz que, em 1952, apenas dois homens poderiam localizar a entrada, mas não cita quem seriam os dois - e ainda
que a gruta foi fechada com tijolos e cimento, e "um novo talude de barro e pedra desceu".
Em artigo publicado por A Tribuna em 1953, Martins dos Santos refere-se a uma
expedição que tentaria localizar a entrada da gruta de São Jerônimo: "Muito breve, neste outono, lá iremos com seus descobridores". Mas, além de
dizer que haveria inscrições nas paredes do salão, não se sabe o resultado desta expedição, e o mistério e as lendas continuam, sem que o local seja
realmente explorado.
Para a historiadora Wilma Terezinha de Andrade, seria preciso ir ao local acompanhado
de técnicos e operários, e realizar um trabalho científico, com escavações, para determinar a época em que foi construído o túnel e procurar outros
vestígios. Mas ela não acredita tratar-se de um refúgio de judeus, pois isto chamaria muita atenção, por causa de sua localização.
De acordo com as indicações de Francisco Meira, a entrada da gruta e do túnel - que
ninguém sabe aonde vai dar - fica nas encosta oriental do morro, próximo à antiga escadaria, junto à subida do Morro do São Bento, na altura do
elevado Prefeito Aristides Bastos Machado.
Resta apenas alguém habilitar-se a procurar a Gruta de Sao Jerônimo.
(*) Extraído da matéria
Os subterrâneos de Santos, de Lane Valiengo, com foto de Carlos Marques, publicada em
6/1/1980 no jornal A Tribuna, de Santos/SP. |
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